A uma semana de completar o primeiro de quatro anos de mandato à frente da Câmara Municipal de Lisboa, Carlos Moedas esteve na Assembleia Municipal para o debate anual sobre o estado da cidade para defender a governação que tem aplicado. Contou com a defesa do próprio partido — o que, por estes dias, nem sempre é garantido — e ainda teve tempo para uns minutos de oposição ao Governo socialista — o que já vem sendo um prática.

Sem surpresas, a oposição demorou-se a tentar desmontar aquilo que o presidente da Câmara veio apresentar como conquistas e avanços; e os partidos que suportaram a coligação Novos Tempos defenderam o presidente. Com a Assembleia Municipal a ser um dos principais palcos de dificuldades e embaraços para o próprio Moedas, foi mesmo Luís Newton quem se apresentou como principal escudeiro de Moedas esta tarde.

Um ano depois, Moedas garante que “não está de passagem”

Respondendo a uma das principais criticas que lhe tem sido feita, sobre a ausência de compromisso à recandidatura à autarquia lisboeta, no encerramento do debate sobre o estado da cidade Carlos Moedas respondeu ao deputado municipal do PS Miguel Coelho para lhe dizer que “não está de passagem“.

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“[Este debate] permite-me clarificar a ideia errada de que poderia estar de passagem, não estou. Estou aqui para continuar, de pedra e cal. Os lisboetas sabem disso, sabem que estou presente, comprometido e para ficar em Lisboa”, afirmou o presidente da autarquia depois de o deputado socialista ter frisado uma vez mais que falta a resposta sobre uma eventual continuidade de Moedas nos Paços do Concelho.

A abrir o debate, Carlos Moedas voltou a defender as “pessoas no centro da decisão e ação política” e defendeu algumas conquistas na área “do combate às mudanças climáticas”, “habitação”, “combate à corrupção”, “urbanismo”, “higiene urbana” e na “redução de impostos”.

Com a polémica da remoção dos cartazes na zona do Marquês de Pombal a pintar os últimos dias, Carlos Moedas disse que o “interesse público” neste caso é “claramente o interesse dos lisboetas que têm todo o direito a usufruir de uma das mais importantes praças da cidade” e que “também nesta questão permanecerá irredutível ao lado dos lisboetas”.

Lembrando o pacote de ajuda extra às famílias e empresas em Lisboa, Moedas lembrou o consenso conseguido entre todas as forças políticas e fez questão de “agradecer a todos as contribuições”. “Admitimos com naturalidade que não fizemos tudo ‒ porque não se faz tudo num ano ‒ mas cumpriu-se um início de futuro. Temos três anos para trabalhar, todos os dias, 24 horas por dia”, disse ainda Carlos Moedas que se diz de “energia redobrada ao fim de um ano de trabalho para continuar a mudar Lisboa”.

Além do PSD, com quem volta a estar totalmente alinhado, Carlos Moedas contou também com a defesa do CDS. Isabel Galriça Neto garantiu que o partido “está do lado das soluções e comprometido em conseguir uma coisa melhor para Lisboa”.

“Estamos do lado das soluções, comprometidos com conseguir uma coisa melhor para Lisboa, alinhados com o programa Novos Tempos. O CDS está alinhado com soluções para problemas que existem”, afirmou Galriça Neto, que é também porta-voz do partido.

Embora tenha reconhecido que “o estado da cidade não é o melhor”, Galriça Neto defendeu: “É bem melhor que há um ano. Lisboa terá que ser uma cidade mais compassiva. O que não nos destrói, torna-nos mais fortes”.

“Neo-liberal”, “demagógico”, “populista” e “fantoche”

Mas o tom animado e amistoso de Carlos Moedas para com a oposição não foi suficiente para adoçar a boca das restantes bancadas. No barómetro da oposição houve críticas bloquistas para a “demagogia e populismo sobre qualquer posição que não seja do executivo”, o tom áspero do PS, a Iniciativa Liberal a dizer que Lisboa “é um fantoche no que diz respeito às decisões nacionais”, e o PCP a exigir mais respostas na área da habitação, descarbonização e transportes públicos.

Com o presidente da Junta de Freguesia de Santa Maria Maior, Miguel Coelho, a ser a voz do PS, os socialistas avivaram a memória de Carlos Moedas.”Deve sempre ter em conta que houve mais lisboetas que não o quiseram para governar do que aqueles que efetivamente o desejavam. É um neoliberal, mais que um centrista. Neste aspeto está a cumprir o programa eleitoral.”

E quando não o é, limita-se a cumprir o legado de Medina, continuaram os socialistas. Na área da habitação, apontou Miguel Coelho, o executivo de Carlos Moedas apenas está a “dar seguimento às apostas do executivo anterior”. “Mesmo se quisesse não tinha conseguido no espaço de um ano”.

A recolha do lixo, que tantas dores de cabeça tem dado a Carlos Moedas, “está muito mais difícil” desde que Moedas chegou à presidência. “O principal problema foi ter julgado que podia fazer isto sem as freguesias. Foram nove meses que ficámos todos à espera para saber o que queria fazer, ainda não sabemos bem”, apontou o deputado municipal do PS.

Já a deputada bloquista Isabel Pires acusou Carlos Moedas de ter “uma má reação à crítica“. “Opta pela demagogia e populismo sobre qualquer posição que não seja a do executivo. Há arrogância do executivo e dificuldade em lidar com propostas da oposição.”

Para o Bloco de Esquerda há um “problema no tipo de projeto para a mobilidade“, na “retirada de faixas BUS”, e no facto de a rede GIRA estar “estagnada”. Noutra das áreas caras na cidade, a habitação, a deputada bloquista apelou à criação de soluções, numa altura em que quer o mercado de arrendamento quer as subidas nas taxas de juro penalizam as famílias com habitação própria.

Críticas aliás, repetidas também pelo Livre. A deputada Isabel Mendes Lopes questionou o porquê de “não avançarem os projetos de renda acessível” e lembrou que “contra a vontade dos Novos Tempos de Carlos Moedas” a suspensão de novos registos de alojamento local foi aprovada.

“Não resolve o problema de fundo, mas ajuda a arrefecer o aumento do preço das casas. E obriga à reflexão sobre o equilíbrio entre os vários usos na cidade. Para o Livre é claro: o direito à habitação é um direito humano e sobrepõe-se sempre ao direito a empreender, defendido por Carlos Moedas”, afirmou a deputada que voltou a defender o programa Casa, Conforto e Clima para melhorar as condições nas casas dos lisboetas.

Pelo PCP, a deputada Natacha Amaro disse que se “vive um momento particularmente mau na área da higiene urbana” e que é necessário “investir na frota, fazer uma melhor gestão dos circuitos de recolha, melhorar as infraestruturas e aumentar o número de funcionários”. Também cos comunistas desmontaram alguns dos argumentos de Carlos Moedas, na área da habitação, contrariando a ideia do atual executivo de que fará o maior investimento de sempre na reabilitação de bairros municipais.

“O segundo contrato programa é o mais elevado num só contrato, mas são valores abaixo do valor executado no mandato passado. Agora são 42 milhões, anteriormente foram gastos 45,9 milhões entre 2018 e 2021, segundo os relatórios e contas da Gebalis”, apontou a deputada alertando: “Se não houver reforço de verba poderá haver mais habitação municipal por reparar no final do mandato do que já há neste momento”.

A deputada da Iniciativa Liberal Angelique da Teresa aproveitou a presença de Carlos Moedas na Assembleia Municipal para lhe exigir que se “sentasse à mesa do Metro de Lisboa”: “Porque é que não é vocal no Metro como foi no aeroporto? Pedimos que se sente à mesa do Metro de Lisboa. Mostre-nos que o estado deste nosso país não faz da nossa querida cidade uma marioneta do centralismo”.

Início do segundo ano e o (re)nascimento de Luís Newton

Depois dos tropeções no primeiro ano de mandato autárquico, Luís Newton apresentou-se no debate sobre o estado da cidade esta tarde a defender em toda a linha a governação de Carlos Moedas. Ele que tinha falhado as últimas sessões onde estaria frente a frente com Carlos Moedas naquele fórum, já depois de ter renovado a liderança do PSD-Lisboa no último fim de semana, parece ter ganhado novo fôlego e unidade no PSD na autarquia e na Assembleia Municipal.

E nem fugiu ao tema que maiores problemas gerou a Carlos Moedas, através da vereadora Filipa Roseta: “Dizer à vereadora Filipa Roseta que conta com todo o apoio do PSD“. “Uma das prioridades que queremos realizar é a inversão do fracasso das políticas de esquerda na habitação. Em 2017 prometeu 6 mil casas, no final do mandato nem 10% tinham sido atribuídas. Quero dizer a Filipa Roseta que conta com todo o apoio do PSD”, afirmou Luís Newton colocando definitivamente uma pedra sobre o assunto.

Depois da intervenção de Miguel Coelho, Luís Newton disse que o momento que a cidade atravessa “não se compadece com intervenções à Manuel João Vieira” e que o momento socialista foi apenas “um piscar de olho a uma candidatura às autárquicas de 2025”.

Focando-se na governação de Carlos Moedas, Newton disse que “passado um ano se constata que a cidade cumpre os compromissos eleitorais”: “realização do conselho de cidadãos; um unicórnio na fábrica de unicórnios; passe de transportes gratuitos”.

E se o tema da ciclovia da Almirante Reis já parece longe da memória, Luís Newton garantiu que não “vai cair”. “Não vamos deixar cair o combate às ciclovias pop-up que prejudicam a segurança”, asseverou o deputado municipal do PSD, que acusou depois o PS de “hipocrisia” na questão das trotinetas: “O PS hoje está preocupado, mas quando licenciou mais de 15 mil trotinetas para Lisboa não se preocupou com o enorme impacto”.

E antes de descer do púlpito diretamente para cumprimentar Carlos Moedas, Luís Newton ainda afirmou que “Lisboa passou de uma mão cheia de nada para uma mão cheia de concretizações”. Estava cumprido o papel do recém-eleito líder da concelhia do PSD/Lisboa.

Minuto oposição ao Governo

Cerca de uma semana depois de ter discursado pela primeira vez como presidente da Câmara nas cerimónias do 5 de Outubro, Carlos Moedas voltou a aproveitar o discurso para deixar recados ao Governo e aos socialistas.

Com o deputado socialista a acusar Moedas de ser neoliberal, Carlos Moedas respondeu de volta: “Ser neoliberal é tentar que já este mês os lisboetas tenham acesso a médico? Imagine-se que o Governo tentava dizer que aumentava as pensões, reduzindo-as. Isso era neoliberal?”, ironizou Moedas continuando: “O Governo desde 2009 não faz nada e não atualiza as contrapartidas do regime especial. Isso é neoliberal?”.

E nem a degradação do SNS escapou na resposta de Moedas à acusação de neoliberalismo: “Ter hospitais em Lisboa no limite [do funcionamento] é neoliberal?”, insistiu o presidente da Câmara Municipal de Lisboa.

Mas já na primeira intervenção da tarde Carlos Moedas tinha dedicado uns minutos para críticas ao Governo. “Lisboa precisa que o governo faça também a sua parte. Lisboa não se pode resignar perante um certo desânimo que vemos no Governo central“.

“O futuro de Lisboa exige também ação do Governo. Exige a capacidade de tomar decisões. Tal como nós tomámos decisões ao longo deste último ano”, mas Moedas tem áreas específicas onde quer ver o Governo avançar e não são segredo: Aeroporto; Hospitais em Lisboa; transferência de competências na educação.

“Na decisão de localização e de construção de um novo Aeroporto Internacional que satisfaça os interesses do país e da Área Metropolitana de Lisboa, que esteja próximo, e queremos uma decisão em 2023. Na saúde, o funcionamento do Serviço Nacional de Saúde em Lisboa atingiu um ponto crítico e preocupante. Não podemos passar nem mais um verão como o que passámos na nossa cidade, com maternidades em rutura, com hospitais esgotados”, disse Moedas.

Com a transferência de competências para as autarquias, Moedas diz ainda que “o Estado central tem a obrigação de transferir os recursos devidos pela assunção da responsabilidade”: “Não temos medo de assumir mais responsabilidade na educação, saúde ou social. Queremos essas responsabilidades, mas com os recursos que nos devem”.

“Não podemos fazer com o dinheiro que não temos. Esses recursos têm que vir do Estado e nós estaremos aí para lutar todos os dias para que o Estado nos pague o que custa uma verdadeira descentralização e que essa descentralização seja verdadeira, não é descentralizar os problemas, é descentralizar os recursos que tanto precisamos”, rematou Moedas.

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