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Moção de censura ao Governo promovida pelo partido Chega na Assembleia da República. Ministro das Infraestruturas e da Habitação Pedro Nuno Santos Lisboa, 06 de Julho de 2022. FILIPE AMORIM/OBSERVADOR
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Pedro Nuno Santos, ministro das Infraestruturas, foi ouvido no Parlamento

FILIPE AMORIM/OBSERVADOR

Pedro Nuno Santos, ministro das Infraestruturas, foi ouvido no Parlamento

FILIPE AMORIM/OBSERVADOR

Aeroporto. Com meias respostas e um elefante na sala, Pedro Nuno Santos atira consenso com espinhas para PSD

Foi um Pedro Nuno Santos com meias respostas e suavizado que voltou a assumir o erro por causa da crise política e escusou-se a defender opções para o aeroporto. O próximo passo é do PSD.

Um ranking da AirHelp que classifica o aeroporto Humberto Delgado como o pior do mundo era o mote para a audição que levou esta quarta-feira o ministro Pedro Nuno Santos ao parlamento. Mas, à luz dos acontecimentos das últimas semanas, o tema acabou por ser secundário. Os deputados da comissão de Economia, Obras Públicas, Planeamento e Habitação queriam respostas sobre a crise política provocada pelo caso do despacho do seu ministério publicado e revogado umas horas depois, a mando do primeiro-ministro. O “elefante na sala”, como classificou o PSD. Pedro Nuno Santos sabia-o. Mas não veio disposto a alongar-se muito sobre a polémica que, durante algumas horas, deixou Lisboa não com um ou dois, mas três aeroportos. “Não vou discutir uma coisa que não existe”, chegou a afirmar, num tom resignado que deixou até os deputados da oposição desiludidos. “Esta audição não vai ficar na história porque está a ser confrangedora. Tem sido feita de meias respostas, e o senhor ministro tem demasiada qualidade para isso”, atirou a certa altura Paulo Rios Oliveira, do PSD.

Comecemos, então, pelo fim. Com as justificações do ministro, e do primeiro-ministro, ainda frescas na memória, sobre aquilo que não terá passado de um “erro de comunicação” que chegou a colocar em causa a continuidade de Pedro Nuno Santos no Governo, os deputados não pouparam o ministro, questionando o seu efetivo peso, a partir de agora, no dossier do aeroporto, após a “estrondosa” desautorização de António Costa. Na bancada, assistia um antigo colega de Governo, agora deputado. João Pedro Matos Fernandes, ex-ministro do Ambiente, cumprimentou efusivamente o ex-colega de Governo no início e no fim da sessão.

Parecia ser o passo decisivo para o novo aeroporto, mas foram cinco passos atrás. Costa diz que está tudo em aberto

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“Achei que Costa já não era primeiro-ministro. O ministro vestiu a capa, assinou em nome do Governo e deu-nos por horas essa satisfação”, ironizou Filipe Melo, do Chega. Perante esta “trapalhada”, perguntou ao ministro, “tem condições necessárias para continuar com a tutela de uma pasta tão importante e decisiva?”. “Sente-se ou não fragilizado? Tem ou não a confiança para exercer as suas funções na plenitude? Sente-se de alguma forma condicionado pelo primeiro-ministro?”, disparou o parlamentar.

Não seria o único a questionar a legitimidade do ministro em continuar com a pasta. “O despacho foi revogado, mas toda a gente sabe que tem um pai e uma mãe. Se a solução final não for da sua visão, o que é que o ministro faz em consequência disso?”, questionou o PSD, que voltou a estranhar a postura de Pedro Nuno Santos.

“Na primeira ronda as respostas não pareciam suas, que habitualmente é bastante frontal.”
Paulo Rios Oliveira, PSD

Mas Pedro Nuno Santos levou a lição estudada. Contido, voltou a assumir o “erro”, que desta vez não foi de comunicação, mas de conteúdo. “O erro foi meu”. E esse erro foi, concretamente, incluir uma solução no despacho, a Portela mais Montijo e depois Alcochete. O “erro”, explicou, deve-se ao facto de o despacho mencionar a necessidade de se fazer uma avaliação ambiental estratégica que, na prática, poderia vir a deitar a solução por terra, porque além das questões ambientais, avaliaria outros temas como a viabilidade económica do projeto. “O erro é que estava lá uma solução combinada. Aconteceu”.

Além do erro assumido, Pedro Nuno levou outra lição na algibeira. Aprendida, porventura, em 40 minutos em São Bento no passado dia 30 de junho. Isto é, se o primeiro-ministro diz que é necessário um consenso com o PSD, então é isso que o ministro vai defender, sem se desviar um milímetro da rota traçada pelo chefe do Governo. “Consenso” terá sido, aliás, a palavra mais repetida por Pedro Nuno Santos ao longo das três horas de debate.

Costa queria, mas Pedro Nuno recusou sair. As horas quentes da primeira crise da maioria

“A conversação com os senhores mantém-se, é um assunto que está absolutamente arrumado internamente”, começou por dizer, defendendo que o PSD tem “o caminho aberto para poder participar numa decisão importante sobre a decisão do aeroporto — o despacho só determinava a existência da avaliação ambiental estratégia — a própria decisão pode ser tomada com o PSD”. Por isso, acrescentou, “as opiniões que o PSD tiver sobre o aeroporto propriamente dito e sobre a avaliação serão bem vindas pelo Governo e estamos disponíveis para vos ouvir”.

O consenso e a discussão que dura desde que o homem foi à lua

O repto seria repetido várias vezes ao longo da manhã. Ainda que tenha sublinhado que quando fala em consenso alargado não se refere apenas ao maior partido da oposição, apesar de este ser “importante” pela dimensão que tem. “Queremos procurar o maior consenso possível na sociedade, fazer isso com todos, todos os partidos têm papel importante na definição do futuro. Não podemos ignorar a dimensão particular do PSD. O plano é, com cautela, ouvir e ver se conseguimos dessas reuniões chegar a uma solução com apoio mais alargado possível”, disse em resposta ao BE.

O ministro Pedro Nuno Santos, a 30 de junho, quando assumiu que a publicação do despacho sobre o futuro do aeroporto de Lisboa deveu-se a um "erro de comunicação".

TOMÁS SILVA/OBSERVADOR

Mas não foi só o Governo que esteve na berlinda. O PSD também não foi poupado pelos deputados dos restantes partidos, que, face à afirmação e reafirmação de que terá mesmo de haver um consenso para que haja novo aeroporto, começam a querer saber qual a posição dos sociais-democratas. Começou pelo PS. “O que é que o PSD tem andado a fazer sobre estas questões do aeroporto?”, questionou Carlos Pereira, lembrando que o PSD decidiu, em 2015, que o aeroporto seria no Montijo, e que com Rui Rio o partido apoiou a mesma solução. Mas em janeiro de 2020, com uma declaração de impacte ambiental sobre o Montijo aprovada, o PSD “começou a patinar sobre o que gostaria de fazer”. Agora, continuou, é hora de o partido contribuir “para a reflexão sobre o novo aeroporto”.

“Sublinhamos a importância do consenso. Em 1969 tivemos o festival Woodstock, o homem foi à lua e estamos desde essa altura a discutir o aeroporto”, acrescentou Hugo Costa do PS. Também Mariana Mortágua, do Bloco de Esquerda, virou-se para a bancada do PSD e pediu uma tomada de posição do partido agora liderado por Luís Montenegro.

Já o prémio de ausente mais presente do debate vai para Sérgio Monteiro, secretário de Estado dos Transportes de Passos Coelho e “privatizador mor do regime”, nas palavras do socialista André Pinotes Batista, que negociou a privatização da ANA e tinha tudo pronto para avançar para a construção do aeroporto no Montijo. “No dia 31 de julho de 2015, temos uma notícia no Observador, que diz que Sérgio Monteiro, do Governo do PSD/ CDS, queria assinar um memorando com todas as partes envolvidas até ao fim do mandato para avançar com a solução Portela mais Montijo”, lembrou Pedro Nuno Santos. “Há pontos sobre os quais temos de ser claros se queremos ter um debate sério”, atirou em resposta às críticas do PSD sobre a inércia do Governo.

Governo quer acordar solução Portela mais Montijo com partes envolvidas até fim do mandato

É que, apesar da busca pelo consenso, por vontade própria ou imposta, Pedro Nuno Santos não resistiu ao pingue-pongue com o PSD, sobre quem é que tem mais culpas pelo atraso do aeroporto. “Não foi o Governo do PS que inventou a localização do aeroporto, havia um trabalho que vinha de trás”, afirmou, relembrando que a opção do Montijo era defendida pelo Governo de Pedro Passos Coelho. “Há dois partidos que mantiveram a sua posição e dois que a alteraram”, ao longo dos anos. O BE e o PCP mantiveram a defesa por Alcochete e o PSD e o PS mudaram de Alcochete para o Montijo.

“O PS mudou porque a solução era aquela que garantia, uma vez que vinha do governo PSD/CDS, um maior consenso. O que acontece é que, com a mudança de liderança, o PSD deixou de concordar com uma solução defendida pelo anterior Governo do PSD”, acusou o ministro. “Querem pôr-se de fora de uma fotografia onde estão”, atirou. A troca de palavras levou Rui Tavares, do Livre, a classificar o passa culpas como “bizarro”.

O kamasutra e o sonho de Guimarães Pinto

Pelo PCP, Paula Santos manteve a convicção de que o campo de tiro de Alcochete — de forma faseada — é a solução a seguir. A deputada destacou que a opção por Alcochete só deixou de ser consensual após a privatização da ANA. “A decisão estava tomada, com pareceres, com DIA (declaração de impacte ambientel) aprovada, com todas as condições para avançar e não avançou”, afirmou, considerando PS e PSD como os responsáveis. O PSD pela privatização da ANA e o PS por ter “alinhado” com a opção do Montijo, “que não é solução”.

A posição do Bloco de Esquerda não diferiu muito. Mariana Mortágua, que também defende Alcochete, atacou o país que “anda a reboque dos interesses privados da ANA” — uma acusação também referida pelo PCP –, uma “empresa internacional que se está marimbando para os interesses do país”.

Apesar de ter sido menos aguerrido do que em disputas parlamentares passadas, Pedro Nuno Santos ainda deu uma amostra do ímpeto por que é conhecido (e que rejeita ser arrogância), nomeadamente com Carlos Guimarães Pinto, da Iniciativa Liberal, que não resistiu a provocar o ministro. “Saúdo, sem ironia, que se tenha mantido no cargo. É mais estimulante discutir com quem tem ideias coerentes, mesmo que sejam todas más”.

Espero que fique na política o tempo suficiente para termos este debate com os papéis invertidos.”
Carlos Guimarães Pinto, IL

E voltou a atacar. “O PS teve mais posições sobre o aeroporto do que o kamasutra. E uma é particularmente acrobática”, afirmou, referindo-se à solução Portela mais Montijo e depois Alcochete, vertida no despacho revogado. Pedro Nuno Santos não demorou na resposta.

“Espero que esse sonho (dos papéis invertidos) nunca venha a acontecer. Acho que a sua curta passagem pela política lhe está a fazer muito mal”, atirou Pedro Nuno contra o deputado liberal. “Dificilmente não saio daqui sem dizer que o Chega teve uma intervenção mais responsável e consistente do que a IL. Espero que Filipe Melo, do Chega, não fique com inveja de não se ter lembrado destas suspeições que a IL lançou”, ironizou, referindo-se a duas questões da IL uma sobre o que vai acontecer aos terrenos da Portela e outra sobre um ajuste direto à ASA Consulting, para a aquisição de serviços de consultoria relativos ao caderno de encargos para o Concurso Público Internacional para a realização da Avaliação Ambiental Estratégica da ampliação da capacidade aeroportuária de Lisboa. “Com todo o respeito que tenho por si, vai ter de pensar na linha de intervenção que escolheu fazer”.

No final, o ministro não chegou a defender qualquer uma das soluções para o aeroporto. Assumiu apenas que “nem sempre o resultado final é o que desejamos” e que “temos de estar disponíveis para a solução não ser exatamente aquela que achávamos”. Deixou, no entanto, claro que há pelo menos uma que está fora de questão. Chama-se Beja. “O teste de mercado está feito. Já pode ser uma opção hoje, não obrigamos nem impedimos de voarem a partir de Beja”, afirmou, referindo-se à Ryanair, que não voa de Beja porque, alegadamente, não quer. “Não é, infelizmente, uma infraestrutura que permita corresponder à necessidade da região de Lisboa”, concluiu.

Certo para o ministro, e para todos os partidos, é que, seja ela qual for, não haverá “uma solução sem espinhas”, que agrade a todos. O ministro lembrou que já foram estudadas 17 localizações, e assumiu ter consciência de que pode não haver nenhuma solução que seja apoiada sequer por 20% dos políticos.

Porque é tão difícil decidir o aeroporto? Volta a Lisboa em 17 localizações e 53 anos de debate

Infelizmente, a solução sobre o aeroporto que vá ter um consenso muito alargado vai ser sempre difícil, o que não quer dizer que não tentemos estabilizar alguns factos”. Falando sobre as preocupações ambientais, ainda ironizou com o PAN, dizendo que o partido “provavelmente” estará contra qualquer solução que se encontre.

Sobre o tema que justificou a chamada de Pedro Nuno Santos ao parlamento, o tal ranking da AirHelp que classifica o aeroporto Humberto Delgado como o pior do mundo, ficou arrumado no início do debate com meia dúzia de frases do ministro.

Aeroporto de Lisboa é o pior do mundo? Há um ranking que diz que sim

Pedro Nuno Santos destacou que a empresa que fez o ranking esclareceu, a 7 de julho, que essa lista está desatualizada e é referente a 2019. “Não quer dizer que não seja relevante, mas é importante sabermos isto”, sublinhou, notando ainda que a ANAC “faz uma avaliação muito crítica da nota metodológica” usada pela AirHelp. “O relevante aqui era tentar colocar em perspetiva um ranking que tem várias falhas”, afirmou lembrando que houve outro ranking que, recentemente, deu ao Aeroporto Francisco Sá Carneiro a distinção de melhor aeroporto — e no ano anterior tinha feito o mesmo com o aeroporto Humberto Delgado. “Resolvido isto, é óbvio para todos que temos problemas no Humberto Delgado”. E estão para durar.

Pedro Nuno Santos acreditando que situação que levou a crise política “está resolvida” diz que não há soluções sem espinhas

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