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A destruição da barragem provocou inundações.

Anadolu Agency via Getty Images

A destruição da barragem provocou inundações.

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Agora é que é? Contraofensiva terá começado antes de destruição de barragem da qual Ucrânia culpa Rússia (mas que lhe pode dar vantagem)

Depois de meses de especulação e falsos alarmes, a contraofensiva ucraniana arrancou. Assim avança o Instituto para o Estudo da Guerra, numa altura em que os combates aquecem em Zaporíjia.

“A contraofensiva ucraniana começou”. Depois de meses de especulação sobre o “quando”, com falsas partidas pelo meio, o Instituto para o Estudo da Guerra (ISW) — think tank norte-americano que acompanha há mais de um ano a evolução dos combates — dá por iniciada a nova fase da guerra, em que as forças ucranianas passam ao ataque na esperança de restaurar a integridade territorial e expulsar os russos do país. Sem surpresa, Kiev não confirma e, para já, remete-se ao secretismo. Afinal, “os planos gostam de silêncio”, avisava há poucos dias o ministro da Defesa.

Numa altura em que os olhares se concentram na região de Kherson, após a explosão da barragem de Nova Kakhovka ter provocado inundações que submergiram cerca de 600 quilómetros quadrados de território e levaram à retirada de mais de 4000 residentes, o ISW anunciou, sem rodeios, que os planos de ataque de Kiev já estão em marcha. “A atividade registada por toda a Ucrânia é consistente com uma variedade de indicadores de que as operações ucranianas da contraofensiva estão a decorrer”, refere o instituto norte-americano numa publicação divulgada na conta oficial de Twitter, onde partilha atualizações diárias sobre a guerra. E aponta uma data: “A contraofensiva alargada tem vindo a desenrolar-se desde domingo”, ainda antes da destruição da infraestrutura.

A declaração do ISW não chegou sozinha. Ainda antes de ter anunciado o começo da nova fase da guerra, vários jornais internacionais de referência avançavam notícias no mesmo sentido. Do Washington Post ao Financial Times multiplicavam-se relatos, na condição de anonimato, de vários oficiais ucranianos a dar conta das novidades, numa fase em que os combates parecem estar a aquecer na região de Zaporíjia.

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O silêncio (quase) total

“As palavras são muito desnecessárias/Elas só podem causar danos”. Os versos da música dos Depeche Mode serviram de mote ao ministro da Defesa ucraniano para sugerir, há alguns dias, que a Ucrânia nada tinha a acrescentar à especulação sobre o início da contraofensiva. “Não haverá anúncios sobre o começo”, garantia.

[Já saiu: pode ouvir aqui o terceiro episódio da série em podcast “Piratinha do Ar”. É a história do adolescente de 16 anos que em 1980 desviou um avião da TAP. E aqui tem o primeiro e o segundo episódios]

A postura mantém-se inalterada. No entanto, nem todos são tão contidos na informação que partilham. Esta quinta-feira quatro membros das Forças Armadas ucranianas, alguns dos quais oficiais, confirmaram ao Washginton Post que Kiev já se lançou ao ataque. As mesmas fontes adiantaram, sob condição de anonimato, que as tropas ucranianas, incluindo unidades de ataque especializadas treinadas com táticas da NATO e equipadas com armamento ocidental, intensificaram os ataques nas posições da linha da frente no sudeste do país durante a noite de quarta-feira.

Avisos de Zelensky, anúncios da Rússia e versos dos Depeche Mode. Os sinais de que a contraofensiva pode já ter começado

De facto, ao início do dia o ministro da Defesa russo revelou que os militares ucranianos tentaram romper as defesas russas na região de Zaporíjia por quatro vezes, num ofensiva que se prolongou durante duas horas. Sergei Shoigu garantiu, porém, que os soldados de Moscovo conseguiram repelir com sucesso os ataque durante a noite, onde Kiev terá investido 1500 combatentes e 150 veículos. Do lado da Ucrânia não se ouviu qualquer confirmação, embora haja alguma informação que aponte para ações ofensivas na região. De forma velada, a vice-ministra da Defesa, Hanna Maliar, disse que na região de Orikhiv, em Zaporíjia, a Rússia está a agir “ativamente na defensiva”.

Ao longo de todo o dia foram chegando mais relatos de que a contraofensiva já avançou — a informação foi confirmada à ABC por dois oficiais ucranianos, incluindo uma fonte próxima do Presidente Volodymyr Zelensky, e à NBC News por um oficial e um soldado que estão a combater perto da linha da frente. A observar à distância, também alguns analistas militares apontam no mesmo sentido. “Com base nas ações de ontem [quarta-feira], e nos sistemas ocidentais usados, parece que a ofensiva ucraniana já está a decorrer”, afirmou Michael Kofman, do Center for Naval Analyses, em declarações ao Financial Times.

O analista apontou que os combates parecem estar a concentrar-se ao longo do eixo da cidade de Tokmak, uma cidade estratégica em Zaporíjia, a montante da barragem de Nova Kakhovka. Mas porquê nesta região? As tropas ucranianas esperam conseguir avanços no sul do país ao cortar a ponte terrestre que liga a Rússia às regiões de Zaporíjia e Kherson, cortando as linhas de abastecimento russas para a península da Crimeia — território anexado pela Rússia em 2014.

Operações “mais lentas e difíceis” e uma fase de maiores baixas: o que esperar do arranque da contraofensiva

Se o Instituto para o Estudo da Guerra não tem dúvidas de que se iniciou uma nova fase na guerra, não tece, para já, considerações sobre o impacto que as operações poderão ter no campo de batalha. Os especialistas do ISW preveem que a contraofensiva não deverá desenrolar-se como uma única grande operação, mas “deverá consistir em várias investidas em diversos locais, com proporções e intensidade variados ao longo de muitas semanas”.

Nos primeiros tempos espera-se que as operações sejam “mais lentas e difíceis”, dado o desafio de conseguir romper as posições de defesa que têm vindo a ser preparadas, e que os contratempos se façam sentir. “É nesta fase que pode registar-se o maior número de baixas”, reconhece o ISW, acrescentando que o sucesso ou fracasso desta fase “pode não ser aparente durante algum tempo”.

"As operações iniciais da contraofensiva deverão ser as mais lentas e difíceis, uma vez que envolvem romper as posições de defesa. São esperados contratempos iniciais. Nesta fase pode registar-se o maior número de baixas ucranianas."
Instituto para o Estudo da Guerra

Sabendo-se o “quando”, resta conhecer onde é que a contraofensiva vai decorrer. Como destaca o instituto norte-americano, as forças ucranianas continuam a tentar surpreender os russos sobre o local onde vão concentrar o esforço principal. Por isso as autoridades remetem-se ao silêncio, uma tática bem diferente da que usaram em setembro do ano passado, altura em que se fez bandeira de uma ofensiva musculada em Kherson para vencer os russos em Kharkiv. De recordar que durante vários dias a liderança da Ucrânia difundiu informações falsas — algumas disseminadas pelos próprios órgãos de comunicação social — para apanhar de surpresa as forças de Moscovo no ponto oposto do mapa. Na operação foi possível recuperar mais de um terço da região ocupada em Kharkiv em apenas três dias.

Funcionou uma vez, mas Kiev não parece inclinado em voltar a arriscar a mesma estratégia. Apesar do secretismo, fazem-se apostas sobre os locais mais prováveis para a contraofensiva. Como o Observador já tinha noticiado há algumas semanas, três cenários parecem reunir um maior consenso dos especialistas internacionais. Uma primeira teoria é a de que a Ucrânia poderá tentar cortar o corredor terrestre que liga a Rússia à Crimeia. Isto é possível uma vez que os ucranianos estão perto de Zaporíjia, como explicava na altura o politólogo russo Oleg Ignatov. Uma outra hipótese é que os ucranianos levem a cabo algum tipo de ação no Donbass, um território composto pelas regiões de Donetsk e Lugansk, que a Rússia proclamou como suas no ano passado.

Primavera, verão, outono ou inverno? Zelensky travou a fundo e a contraofensiva ucraniana ficou sem data marcada

Há ainda uma terceira possibilidade que tem sido avançada: um eventual ataque na cidade de Bakhmut. No mês passado o líder do grupo Wagner, Yevgeny Prigozhin, disse que os seus combatentes tinham tomado completamente este território — informação que a Ucrânia nunca confirmou — e iniciado o processo para ceder as posições conquistadas às forças regulares russas. Desde então Kiev tem vindo a anunciar progressos no terreno, avanços reconhecidos pelo próprio Prigozhin.

Numa altura em que tudo está em aberto, o ISW tem observado um aumento geral da atividade militar em toda a linha da frente, apesar de nem todas as ações fazerem parte do esforço da contraofensiva ucraniana. Aponta que as forças russas estão a atacar e as ucranianas a contra-atacar em setores limitadas da linha da frente de Kharkiv-Lugansk. Na área fronteiriça das regiões de Donetsk-Zaporíjia também vão sendo registados ataques dos militares de Kiev ao longo dos últimos dias. “As forças ucranianas parecem estar a conduzir ataques terrestres na região de Zaporíjia, na área Orikhiv entre 7 e 8 de junho”.

Sobre Bakhmut, os ucranianos alegam apenas ter passado ao modo de ataque e anunciaram na quarta-feira ter avançado entre 200 metros e um quilómetro em setores não especificados.

O avanço de uma contraofensiva no meio de uma crise, que pode trazer vantagens no terreno

Se, como o Instituto para o Estudo da Guerra avançou, a contraofensiva já começou, decorre numa altura em que a Ucrânia está a lidar com os efeitos devastadores da explosão da barragem e da central termoelétrica de Nova Kakhovka, na margem oriental do rio Dnipro. Kiev e Moscovo trocam acusações sobre a autoria do ataque que destruiu aquela infraestrutura e está a gerar consequências graves para o meio ambiente e para as populações locais. Neste momento já há registo de nove mortos devido às inundações.

A principal região afetada é Kherson, mas a destruição da barragem também originou impactos em Zaporíjia, onde está localizada a maior central nuclear da Europa e que utiliza a água armazenada na infraestrutura de Nova Kakhovka para arrefecer os reatores.

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    AFP via Getty Images
  • epa10680412 A flooded street in Sadove village, Kherson region, Ukraine, 08 June 2023. Ukraine has accused Russian forces of destroying a critical dam and hydroelectric power plant on the Dnipro River in the Kherson region along the front line in southern Ukraine on 06 June, leading to the flooding of a number of settlements.  EPA/MYKOLA TYMCHENKO
    MYKOLA TYMCHENKO/EPA
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    Global Images Ukraine via Getty
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    AFP via Getty Images

As inundações já obrigaram mais de 17 mil pessoas a sair de suas casas e, apesar de o nível da água estar já a baixar, só nos próximos dias é que será possível perceber o verdadeiro impacto da destruição da estrutura. Esta quinta-feira o Presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky, visitou algumas das zonas inundadas na região de Kherson e revelou que esteve na mesa de discussão com as autoridades locais a “compensação” financeira das pessoas afetadas.

Em outubro do ano passado já tinham soado alarmes para a possibilidade de um ataque à barragem. Na altura Zelensky alertou que a Rússia estava a preparar um “desastre de larga escala” na região, acusando as forças russas de terem minado a infraestrutura. Do outro lado, a acusação era semelhante. O comandante Sergei Surovikin garantia que Kiev estava a preparar-se para recorrer a “métodos ilegais” de guerra na região de Kherson, apontando a barragem como um dos possíveis alvos. Feitos os avisos, o ataque acabou por se concretizar mesmo esta terça-feira, ainda que se desconheça quem é o responsável.

Se parece ser a Rússia quem mais tem a ganhar com a explosão da barragem, alguns especialistas internacionais apontam que as inundações podem criar condições favoráveis para um avanço ucraniano. Isso mesmo explicou Mikhail Barabanov, do Centre for Analysis of Strategies, ao Financial Times. “As posições russas na margem inferior russa do Dnipro estão inundadas, mas as cheias não devem durar muito – em sete a 10 dias a água vai baixar e o Dnipro pode ficar mais raso do que antes da explosão. Isso vai ajudar os ucranianos a atravessá-lo”, antecipa.

Quem mais ganha com explosão da barragem? Tudo aponta para a Rússia, que rejeita e fala em “sabotagem” de Kiev

Ao The Guardian Michael Kofman faz uma avaliação semelhante: “Se o plano ucraniano é romper as linhas [russas] em Zaporíjia e avançar para as linhas terrestres de comunicação da Crimeia, ou cortar a ponte terrestre, é improvável que a inundação impeça tal operação”.

Tanques Leopard avistados no campo de batalha

Os rumores vão se acumulando. Os tanques de batalha Leopard, fornecidos por vários aliados à Ucrânia, parecem estar a encontrar o seu caminho para a linha de combate. Nos últimos dias os bloggers russos têm relatado ataques ucranianos com recurso a estes modelos, de fabrico alemão, juntamente com os Bradleys norte-americanos. Se confirmado, esta seria a primeira vez que estão a ser utilizados para fazer frente às forças russas, mais um indicador que dá força à hipótese de a contraofensiva já ter começado.

Há relatos do uso destes equipamentos em várias zonas, particularmente em Tokmak (Zaporíjia), algo que Kiev também não está disposta a confirmar. “Não temos informação sobre isso. E não comentamos fontes anónimas”, afirmou esta semana um porta-voz do Estado-maior da Ucrânia ao ser questionado sobres os relatos dos média sobre a contraofensiva.

Tank driving training of Slovak servicemen and women

dpa/picture alliance via Getty I

Na segunda-feira o líder do batalhão Vostok na região do Donbass revelou que foram avistados tanques Leopard na região de Donetsk. “Pela primeira vez vimos Leopards na nossa área tática. Como já antecipava ontem: ao sentir o cheiro do nosso sucesso, o inimigo vai lançar forças adicionais na batalha”, escreveu Alexander Khodakovsky na conta de Telegram. Mais cuidadoso, o líder instalado por Moscovo na região de Zaporíjia pediu no mesmo dia que não se espalhassem rumores sobre os avistamentos. “Amigos, peço-vos que não se apressem a publicar notícias sobre o uso em massa de Leopards na frente de Zaporíjia. Esperem pelas informações oficiais ou confirmação em vídeo“, apelou Vladimir Rogov.

Uma das grandes conquistas ucranianas dos últimos meses foi conseguir assegurar, pela primeira vez, o envio de tanques modernos. “São capazes de mudar o jogo”, chegaram a sublinhar vários analistas ocidentais. Apesar da resistência inicial dos aliados — particularmente da Alemanha –, a Ucrânia viu chegar Leopards de vários países da NATO, Challengers do Reino Unido e os AMX-10 RC da França. Encomendas que pediu especialmente para dar força à contraofensiva.

[Nota: artigo atualizado às 12h50 de 9 de junho com novas informações do Instituto para o Estudo da Guerra (ISW) que apontam o início da contraofensiva ucraniana para os dias anteriores à explosão da barragem de Nova Kakhovk.]

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