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TIAGO PETING/LUSA

TIAGO PETING/LUSA

Candidato "da TV" alinha com o líder no ataque ao PS, mas corrige-o na fasquia eleitoral

Cabeça de lista da AD foi para território traumático para a direita, mas não quis entrar em confronto direto com o Chega. Teve Montenegro a direcionar ataques ao PS e também a baixar fasquia.

Dona Teresa entra no mercado de Faro, levanta a cabeça, depara-se com a caravana da AD e aponta: “Eu conheço-o bem”. Parece voto certo na coligação e faz o cabeça de lista festejar a promessa de voto com braços no ar e palmas. Não é a primeira interlocutora que aborda desta forma Sebastião Bugalho na manhã de arranque de campanha oficial, e também não seria a última. O candidato que saltou da televisão para os mercados de campanha é reconhecido por esse mediatismo, mas se isso se transforma em votos ainda está por provar. E Luís Montenegro bem precisa deles, mesmo que vá garantindo (como garantiria ao fim do dia) que aconteça o que acontecer governará no dia seguinte.

A pressão é grande e a AD entrou na campanha diretamente pelo Algarve e Alentejo, onde as legislativas de março lhe doeram especialmente, com o crescimento do Chega. Bugalho foi à frente, mas passou o dia calado sobre o périplo curioso do primeiro dia oficial: Algarve, Évora e Beja com uma paragem particular em Moura, onde nas últimas autárquicas André Ventura se candidatou à Assembleia Municipal e o Chega quase empatou com o PS nas legislativas.

[Ouça aqui a reportagem da Rádio Observador]

Aliás, nessas eleições, o PSD ficou em terceiro, tal como aconteceu em todos os territórios que Bugalho pisou esta segunda-feira, à exceção de Évora. Mas o candidato fugiu sempre ao tema Chega e justificou essa paragem concreta com as suas “raízes familiares”. O ataque ao Chega acabou por ter o PS como alvo — evitando sempre que o Chega se torne no adversário direto — e só chegou ao final do dia, porque a manhã estava reservada para outra frente: o aproveitamento do mediatismo do candidato, mesmo quando não havia onde o aplicar.

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O candidato da TV que “não tem mãos de trabalhador”

“A praça ‘tá vazia”. A comitiva da Aliança Democrática não ouve o aviso que vem da mesa à porta do Mercado de Olhão, onde se trocam cromos do jogo de ontem, e segue caminho para um espaço onde àquela hora (já passa das 11h) e numa segunda-feira não há clientes. Mas Bugalho sabe como tem de ficar nas imagens e não perde tempo, em poucos minutos já passou para trás de três balcões, abraçou comerciantes, comeu uvas, quis cheirar o mel numa das bancas e rapidamente arranjou maneira de deixar ali uma tirada sobre o teste ao seu “mel eleitoral”.

LUÍS FORRA/LUSA

As investidas não surtiam grande saída no interlocutor que se queixava das dificuldades na produção onde já trabalha há nove anos. “Este ano está melhor…” Bugalho aproveita logo: “Sabe porque é que está melhor este ano?” O homem deu-lhe essa de borla: “Por a AD ter ganho, é?”.  Pouco interessa que seja uma pergunta, o candidato transforma-a logo num ponto a seu favor: “Isso é que é falar!” Dois minutos depois já está atrás de outra banca a comer azeitonas e após outro par de minutos está abraçado a outra vendedora. “Maria? Eu também sou Maria”.

[Já saiu o terceiro episódio de “Matar o Papa”, o novo podcast Plus do Observador que recua a 1982 para contar a história da tentativa de assassinato de João Paulo II em Fátima por um padre conservador espanhol. Ouça aqui o primeiro episódio e aqui o segundo episódio.]

A meio da volta Sebastião Maria já tira o blusão azul e comenta com mais um vendedor de fruta, de avental azul posto por cima de um polo de manga curta às riscas: “Vou seguir o seu exemplo e arregaçar as mangas”. Mas a camisa imaculadamente branca não engana ninguém por ali e muito menos as mãos do candidato que uma senhora cega, à porta do mercado, havia de pegar para concluir rapidamente: “Ah, não tem calos, não tem mão de trabalhador”.

LUSA

Há duas questões que a manhã no Algarve e a tarde no Alentejo vão deixando já perceber: o mediatismo do comentador televisivo existe, mas a sua juventude não convence todos. Sentado, de óculos escuros, num banco de jardim em Olhão, com vista para o ilhéu do Farol lá ao fundo, há um homem que o chama: “Olh’ó Bugalho”. O candidato fez logo uma curva para se sentar ao seu lado a seguir o rasto de um possível voto. Mas não recebeu essa garantia e ainda ouviu que “tu tens a teoria toda, mas nós temos a experiência de vida”.

“Eu vi-te na tv. És muito novo”. São duas considerações que apareceram de mão dada com quem se cruzou com o cabeça de lista da AD neste primeiro dia. “Sou tua fã“, soltou Isabel mal o viu sair do mercado, saltando da mesa onde tomava café com as amigas. Naquele pequeno grupo, o candidato fez o pleno, pelo menos do reconhecimento. “Se for tão bom político como foi comentador”, ouviu ainda Bugalho antes de chegar a senhora que lhe agarrou a cara entre as mãos: “És muito bonito”. “Não se esqueça de votar no dia 9, nem que seja porque sou bonito“, atirou logo na resposta.

Nas primeiras horas de campanha não há muito mais do que a forma para apresentar do candidato. Não quis falar do resultado nas eleições da Madeira, não quis falar neste périplo por território Chega. Deixou tudo isso para o final do dia, com o líder do PSD já na assistência.

Montenegro modera fasquia, Bugalho tenta corrigir

Encontraram-se junto ao Templo de Diana, em Évora, desceram até à praça do Giraldo que atravessaram para chegar ao comício ao ar livre. Pelo caminho, Luís Montenegro ainda deixou uma declaração que tem o efeito direto de baixar a fasquia eleitoral, ao dizer que nestas europeias encontra “um desafio difícil” já que venceu “quatro eleições seguidas e não é fácil vencer cinco”. Garantiu “estar confiante” nessa vitória, mas o cabeça de lista, que estava ao lado, percebeu o potencial nefasto da frase anterior e tentou corrigi-la na sua intervenção, ao dizer que “ganhar tudo é sempre difícil, mas não é impossível”.

Mas a preocupação de Montenegro nesta fase parece ser outra: acautelar já o dia 10 de junho. Depois de desfiar as medidas com que o Governo avançou — com especial enfoque nas medidas para os jovens, para os mais velhos e na habitação –, o líder do PSD e primeiro-ministro garantiu que “o espírito e dinâmica” do Governo “está para durar”. “Desengane-se quem acha que só existe por causa das eleições. No dia 10 e 11 estaremos com a mesma dinâmica qualquer que seja o resultado”, afirmou como quem afasta do caminho eventuais leituras nacionais destas Europeias.

A AD aparece nesta campanha a concentrar os ataques sobretudo no PS e, aí, Montenegro e Bugalho afinaram agulhas. Primeiro o líder, que se focou no que veio da Madeira na noite anterior para dizer que, ao contrário do Governo, que “está concentrado em governar”, “os derrotados estão interessados em geringonçar”.

“É isto que é o ar estranho que pulula um pouco por aí”, descreveu Montenegro: “Estão a geringonçar uns com os outros e às vezes com o espelho quase a perguntar ‘espelho meu espelho meu, quem é capaz de geringonçar melhor do que eu?”.

Para Bugalho ficou o ataque ao mesmo alvo mas por outra frente, a tal do Chega que tinha evitado de manhã. Mas a diferença do partido de Ventura face ao PSD ficou-se pelo uso que deu à palavra “moderação” e no posicionamento da coligação “ao centro”. “A AD terá essa marca de moderação por mais que nos tentem e testem todos os dias para que abdiquemos dessa moderação”, sintetizou sobre este assunto. E um desses “valores de moderação” é o da “estabilidade”, disse ainda garantindo que os contactos de rua lhe têm deixado “uma certeza e uma convicção: os portugueses não querem andar para trás, para isso já tivemos 9 anos de socialismo e não queremos mais”.

O Chega serviu, assim, sobretudo para atingir o PS, com a AD a tentar sacudir dos ombros esse peso, sobretudo depois de ter traçado uma linha vermelha nas últimas legislativas. “Não mudamos de ideia conforme o que nos favorece”, afirmou Bugalho, confrontando “os adversários com o facto de as linhas deles serem menos retas, terem mais curvas e serem até uma montanha russa”.

“Depois de nos terem dito que não podíamos governar com o Chega e de nos terem dito que tínhamos de governar com o Chega, querem estar eles no Parlamento a governar com o Chega”, acusou Bugalho. Afinal, concluiu, “quem não consegue governar sem a extrema-direita é o PS, quem nem consegue sequer fazer uma campanha para as Europeias sem a extrema-direita é o PS, quem nem consegue aprovar nada no Parlamento sem o Chega é o PS, quem não tem futuro na democracia sem o Chega é o PS”, atirou. A AD a tentar evitar fazer do Chega o adversário direto, ainda que ele tenha estado nas entrelinhas deste dia.

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