Ana Rita Cavaco, bastonária da Ordem dos Enfermeiros, nunca foi convidada para ser candidata à Câmara Municipal de Lisboa. Diogo Pacheco Amorim, afinal, não é certo como candidato a Cascais. E o tabu sobre os candidatos do Chega às autarquias vai manter-se até 6 de março.

Em entrevista ao Observador, no programa “Vichyssoise”, Nuno Afonso, vice-presidente do Chega e coordenador autárquico do partido, garante que as notícias sobre as candidaturas do Chega são falsas e esconde o jogo para o arranque do próximo mês.

Quanto a metas, e depois de ter dito que o Chega tinha ambição de ser a terceira força política destas autárquicas, Nuno Afonso retira agora a pressão e assegura que André Ventura não será penalizado por um eventual mau resultado.

Certezas existem três: a implementação autárquica é “fundamental” para as ambições nacionais do Chega; o PSD será obrigado a falar com o partido em várias autarquias do país; e o Chega vai ganhar muita influência em concelhos dominados tradicionalmente pelo PCP.

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O Chega fará o seu caminho, sempre atento ao que se passa logo ali ao lado, no PSD. “Antes das, legislativas Rui Rio vai ter de ganhar as eleições internas do PSD, em 2022”. O atual presidente do PSD não convence? Seria “mais provável” conversar melhor com Pedro Passos Coelho, desabafa.

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Assumiu que o objetivo do partido é ser a terceira força política mais votada. Quer dizer que se o Chega falhar essa meta, André Ventura deve demitir-se outra vez?
Não, até porque quem falou fui eu. Sempre assumi que o nosso objetivo é conseguirmos concorrer a todas as autarquias.

Mas também disse que quer que o Chega seja a terceira força mais votada nessas eleições.
Esse é um dos objetivos, mas o primeiro é conseguir ir a todas autarquias.

Então não é um objetivo verdadeiro? Disseram por dizer?
Não, temos consciência que isso é possível e, neste momento, nas sondagens, somos a terceira força política. E acredito que seja reforçado nas autárquicas.

Imaginemos que não consegue, até porque são as primeiras autárquicas a que o Chega concorre, isso seria uma derrota para André Ventura?
Não, exatamente por serem as primeiras. Uma derrota seria não conseguirmos ir a grande parte das concelhias.

O partido está agora a começar a procurar e a selecionar candidatos. Sublinhou recentemente que um dos três critérios a cumprir é não ter “cadastro”. Porquê esta preocupação agora?
Sim, André Ventura deu indicações para que se pedisse o registo criminal a todos os candidatos. Isto é importante para nós, porque somos um partido antissistema que quer lutar contra os interesses instalados e contra os crimes cometidos. Não podemos permitir candidatos que tenham lesado o Estado de alguma forma. Até porque sabemos a pressão que a comunicação social tem sobre nós. Uma coisa é o Bloco de Esquerda ter um candidato preso por tráfico de droga, outra coisa é nós. Connosco ia toda a gente cair-nos em cima e ia abrir jornais durante semanas.

Mas em 2019, há dois anos, portanto, Hugo Ernano, foi condenado a uma pena suspensa de quatro anos de prisão por homicídio simples por negligência grosseira, foi cabeça de lista ao Porto. O que mudou?
A realidade não mudou nada. Analisando bem a questão do Hugo Ernano, toda a gente sabe o que aconteceu e a injustiça que foi cometida com ele.

Ainda assim, tem cadastro. Afinal este não é um critério objetivo mas vão avaliar caso a caso?
Ainda não confirmei se ele era candidato ou não…

Não foi isso que perguntámos.
É um critério objetivo mas o que falámos é que seria a partir das autárquicas e vamos fazer esse trabalho nas autárquicas. No caso do Hugo Ernano é uma situação completamente diferente.

Outras questões diferentes podem entrar na lista de candidatos do Chega?
Se tiveram cadastro, não.

Falou em medo e até vergonha em alguns possíveis candidatos aceitarem convites do Chega. Tem levado muitas negas?
Não, não temos levado muitas negas, felizmente não. Aliás, há pessoas que já nos disseram ter algum receio e aceitaram na mesma. A questão é que em situações como em algumas zonas do Alentejo, há pessoas que não têm aceitado dar a cara, porque têm negócios abertos e têm receio de retaliações.

Sondaram Ana Rita Cavaco, bastonária da Ordem dos Enfermeiros, para ser candidata à CML, mas recusou. Ao Observador, disse que tinha dois nomes, sobra um, portanto. Já tem alternativa?
Eu, que sou coordenador autárquico nacional, nunca falei com Ana Rita Cavaco sobre isso. O André Ventura também não.

Então a bastonária mentiu?
O que estou a dizer é que nunca falei com Ana Rita Cavaco sobre isso. Temos dois nomes para Lisboa, ainda não foram contactados, porque estamos em processo de eleições internas. Até este processo estar terminado não vai haver contactos.

A bastonária confirmou e disse que tinha havido um contacto feito pelo Chega. Se não foi o Nuno nem o André Ventura, houve alguém que fez o convite em nome do Chega?
Isso tem de perguntar a ela.

O concelho de Lisboa continua a ser um dos grandes objetivos do Chega. Acredita que é possível derrotar Fernando Medina e fazer uma coligação pós-eleitoral à direita? 
Acredito que sim. Que seja possível. Até a nível nacional, mais ou cedo ou mais tarde, a direita chegará a poder. E Fernando Medina, obviamente, está muito ligado a este Governo.

Se é esse o objetivo do partido, o Chega já não devia ter um candidato para concorre a Lisboa?
Temos as coisas bem estruturadas. Não acredito que seja tarde. Somos um partido muito novo ainda, temos de fazer as coisas com estabilidade.

O Chega sinalizou três alvos na Área Metropolitana de Lisboa: Sintra, Loures e Amadora. Porque é que acreditam que a agenda do Chega terá mais sucesso nestes concelhos?
É olhar para o que foram os resultados nas legislativas e nas presidenciais, e depois ter em conta as autárquicas anteriores, para perceber quais são os votos de direita, de esquerda e de centro. Nesses concelhos teremos mais hipóteses.

Já foi revelado que Diogo Pacheco Amorim será candidato em Cascais. O Nuno Afonso vai avançar para Sintra?
Não sei se Diogo Pacheco Amorim assumiu alguma coisa. Vi uma notícia, mas não me parece que tenha sido o Diogo a falar sobre isso.

Então é mentira? Já vamos com muitas confusões em relação aos candidatos do Chega.
Há muita especulação, já viu? Já disse uma coisa muito simples que se manterá: não vamos anunciar candidatos até ao dia 6 de março. Tudo o que aparecer na comunicação social não tenham como certo.

Mas é um pouco estranho. Esta notícia foi dada com base numa fonte do Chega.
Comigo não falaram e eu sou coordenador autárquico.

É uma notícia dada pela Agência Lusa, citando fonte do partido e está-nos dizer que é mais uma mentira. O Chega está a tentar travar aquilo que vai ser verdade daqui a uns dias? O que é que está a acontecer afinal?
Essa notícia cita fonte da distrital de Lisboa. Eu falei com o presidente da distrital e ele não sabia de nada. Eu não falei com a comunicação social… Não sei quem será essa fonte, mas que se chegue à frente.

Portanto, Diogo Pacheco Amorim não será candidato a Cascais?
Não sei se vai ou não. Não está nada assumido ainda, nem vai ser assumido antes do dia 6.

Então isto que nos está a dizer é apenas a gestão interna do calendário do partido. As notícias que está a dizer que são falsas podem não ser totalmente falsas.
Em relação ao Diogo pode ser uma questão de calendário ou não, não sei. Já disseram também que eu poderia ser candidato à Amadora. Não faz grande sentido. Uma das nossas prerrogativas é que os candidatos sejam preferencialmente das zonas onde se candidatam. Nunca vivi na Amadora, sequer.

Mas já viveu em Sintra.
Sim e em Lisboa também. Até já vivi noutros países.

Certo, mas há aqui uma questão de vontade pessoal. E nós estamos a perguntar de forma muito concreta: tem vontade de ser candidato autárquico a Sintra ou não? Se disser que não, não será candidato. Ninguém no partido o vai obrigar. 
O que posso dizer é que não serão anunciados candidatos até 6 de março. Já disse. Não vou mesmo anunciar.

Prometeu vergar — ou, nas suas palavras, “dobrar” — o PSD em várias autarquias do país para forçar várias coligações pós-eleitorais com o Chega. O que vai exigir ao PSD para governar localmente?
Em primeiro lugar, a palavra “dobrar” não foi minha. [Na entrevista ao “Público”], devia estar fora de aspas e não estava.

É mais um equívoco.
Não é propriamente vergar o PSD. Mas obviamente terão de ser feitos acordos pós-eleitorais para haver alguma estabilidade em algumas autarquias.

Disputar territórios do PCP será um objetivo do Chega?
O nosso objetivo é disputar todos os territórios, sejam de quem for.

Mas tem sido muito discutida a questão do PCP e do Chega, se o Chega tem ou não capacidade de se intrometer em certos bastiões do PCP. Vão apostar nisso? É parte da estratégia do partido?
Analisando bem os números, não acredito que nós tenhamos roubado tanto eleitorado ao PCP. O que aconteceu é que nessas zonas onde o PCP é mais forte roubámos eleitorado à abstenção. Vamos querer disputar essas zonas também, claro. O eleitorado do PCP é conservador em muitos aspetos, há alguma proximidade ideológica, sim.

Há quem defenda que enquanto o Chega depender de André Ventura e não tiver implantação nacional estará sempre condenado a ser um epifenómeno. Estas autárquicas são fundamentais para o futuro do partido?
É fundamental a implantação nacional, sendo nós um partido antissistema e um partido que quer ser representante do povo e das vontades do povo, que é um bocado aquele conceito de populismo, aquela palavra que às vezes nos usam para definir. É um facto que queremos representar o povo e ser a sua voz e para isso temos de ter alguma implantação nacional, temos de crescer em todo o lado, por todo o país, não podemos focar-nos apenas em Lisboa, Porto, Setúbal, Faro, nos grandes distritos, temos de ter uma abrangência nacional.

Olhando para um futuro mais longínquo e para uma possível maioria de direita, tem sido um tema muito discutido nos últimos meses, Rui Rio tem dito que não cederá em nada que fira os princípios do PSD, o Chega tem objetivamente exigências que o PSD rejeita à partida. Se chegarmos a esse impasse, o Chega prefere ir novamente a votos ou vai abdicar das suas bandeiras?
Creio que André Ventura jamais abdicaria de certas bandeiras, mas estamos a falar de um cenário de legislativas e antes das legislativas Rui Rio vai ter de ganhar as eleições internas do PSD, que são já para o ano, se não me engano.

São em 2022, no arranque do próximo ano. Acha que Rui Rio não vai resistir às autárquicas?
Vamos ver. Isso é um problema deles.

Mas foi o Nuno Afonso que trouxe o tema.
Neste momento estou focado nas autárquicas e o partido está focado nas eleições internas e posteriormente nas autárquicas, as legislativas ainda falta algum tempo, vamos continuar a trabalhar até lá e depois negociaremos com quem tivermos de negociar.

Acha que outra liderança do PSD teria mais vontade de olhar para o Chega como um parceiro viável?
Não sei, depende de quem for o presidente. Não faço ideia de quem se vai candidatar ainda.

Há muita gente no Chega, incluindo André Ventura, que suspira por um regresso de Pedro Passos Coelho. No seu entender, Pedro Passos Coelho seria um líder com que o Chega conversaria melhor?
Conversar melhor é possível que sim porque sei que o André tem uma relação pessoal com o Pedro Passos Coelho, eu próprio também o conheço, fui aluno dele. Há uma relação pessoal se calhar conversava-se melhor. Mas não sei, depende de quem forem os candidatos.

Temos de avançar para a segunda parte da nossa refeição, o “Carne ou Peixe”. Recordo que só pode escolher uma opção desta ementa. Preferia ver o Chega num Governo liderado por Pedro Passos Coelho ou por Rui Rio?
Pedro Passos Coelho.

Preferia ser oposição durante mais 4 anos ou Chega no Governo mas sem André Ventura?
Prefiro ter sempre André Ventura connosco.

Preferia ir ao ginásio com António Costa ou Pedro Nuno Santos?
Acho que com António Costa. É um tipo divertido.