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Com o Governo (agora) em maioria absoluta, o novo ministro das Finanças, Fernando Medina, apresentou uma proposta de Orçamento do Estado em (quase) tudo semelhante à que foi chumbada em outubro. Aliás, para os partidos da oposição, é exatamente esse o grande problema deste Orçamento, tendo em conta que entretanto surgiu uma guerra na Europa e a inflação acelerou para os níveis mais elevados em décadas.

Algumas das mudanças que vão avançar, agora sim, até vão ter menor impacto porque o seu efeito já foi refletido parcialmente – é o caso do desdobramento dos escalões, que já tinha orientado a revisão das tabelas de retenção na fonte atualizadas em fevereiro (depois de o PS conquistar maioria absoluta nas eleições).

Recusando aumentos (na função pública) maiores do que os 0,9% que estavam na anterior proposta, o Ministério das Finanças diz que se irá mitigar o aumento do custo de vida com outras medidas – saiba quais são e conheça a forma como o novo Orçamento do Estado vai mexer com o seu bolso.

Desdobramento de escalões? O que é que isso muda no meu IRS?

Vai passar a haver nove escalões de IRS, mais dois do que os sete que existiam até 2021. O desdobramento dos antigos terceiro e sexto escalões vai avançar nos exatos termos em que foi planeado em outubro, na proposta de Orçamento do Estado que acabou por ser chumbada no parlamento.

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Se o desdobramento dos antigos terceiro e sexto escalões era mais do que certo que iria, finalmente, avançar, não se sabia nas últimas semanas se os escalões iam ser exatamente iguais, isto é, se poderia haver pequenas mudanças nos valores de rendimento coletável em que começa e acaba cada escalão. Mas isso não aconteceu – a tabela é igual à apresentada em outubro.

Fonte: Proposta de Orçamento do Estado para 2022

As mudanças, na prática, no valor dos salários líquidos já foram aplicadas, já que após a vitória do PS nas eleições de 30 de janeiro (com maioria absoluta), o Governo decidiu não esperar pela aprovação do Orçamento do Estado para 2022 e antecipou uma parte do efeito da anunciada descida do IRS. Como? Através da atualização das tabelas de retenção na fonte.

Segundo explicou o Governo em fevereiro, a decisão foi tomada para antecipar o alívio de IRS que este ano é sentida pela generalidade dos contribuintes com rendimentos do trabalho dependente. E, também, o ajustamento foi feito a pensar naqueles que, tendo recebido aumento salarial, estavam a ser penalizados no rendimento líquido mensal pelas retenções do imposto.

Veja as simulações da Deloitte sobre as mudanças que vai sentir no seu orçamento.

Quanto vai pagar de IRS, com o novo orçamento para 2022? Veja as simulações

Avança o englobamento das mais-valias “especulativas” (mas só em 2023)

Se está no último escalão de IRS, ou se tiver mais-valias bolsistas (em investimentos detidos por menos de um ano) que somadas ao rendimento dependente o coloquem nesse último escalão, vai sentir um forte agravamento do imposto a pagar. Porém, devido à norma transitória que está na proposta, esta mudança só se aplica aos rendimentos obtidos a partir de 1 de janeiro de 2023.

O englobamento obrigatório dessas mais-valias vai avançar, apesar de o PS, agora em maioria absoluta, já não precisar do apoio parlamentar dos partidos à sua esquerda, que exigiram esta medida nas últimas negociações orçamentais – na verdade, queriam uma versão ainda mais abrangente da medida, englobando até outro tipo de mais-valias como rendas.

Na prática, esta medida vai representar um agravamento da tributação nesses casos porque, ao tornar-se obrigatório esse englobamento, em vez de ser paga uma taxa liberatória de 28% sobre as mais-valias, elas passam a ser tributadas à mesma taxa que paga o contribuinte pelos rendimentos do trabalho (ou seja, 48%, nesse último escalão).

Se é o seu caso, veja algumas simulações sobre quanto mais irá pagar.

Quanto pode pagar a mais, em IRS, com o englobamento obrigatório?

Se é pensionista (e ganha até 1.108 euros) vai receber mais 10 euros por mês

As pensões vão ter um aumento extraordinário de 10 euros para quem recebe menos de 1.108 euros, conforme já tinha sido anunciado, o que será o caso de 2,3 milhões de pensionistas.

“Em 2022, o Governo procede a uma atualização extraordinária das pensões, com efeitos a 1 de janeiro de 2022”, pode ler-se na proposta de Orçamento do Estado para 2022. Ou seja, este é um aumento que, como o Governo já tinha indicado, irá ter efeitos retroativos a janeiro.

Trata-se de um aumento extraordinário, que acresce à atualização automática que foi aplicada em janeiro, num cálculo feito a partir da taxa de inflação medida dois meses antes (em novembro) e da taxa de crescimento económico. Na prática, isso significou que no primeiro mês do ano o aumento foi de 1% para pensões até 886 euros, de 0,49% para as pensões entre 886 euros e 2.659 euros e de 0,24% para pensões acima de 2.659 euros.

Para os mais jovens, o IRS vai pesar menos nos primeiros anos a trabalhar

Os (novos) contribuintes que têm entre 18 e 26 anos (ou 28, caso tenham estado a fazer doutoramento) e qualificações de nível 4 (curso profissional) ou superior vão ter uma isenção parcial de IRS nos primeiros cinco anos a trabalhar.

A redução do imposto a pagar começa por ser de 30% de imposto nos dois primeiros anos, depois baixa para 20% no terceiro e quarto anos e desce para 10% no quinto ano. Aqueles que entrem no mercado de trabalho com salários acima da média não terão isenções tão elevadas, porque a medida tem como limites, respetivamente, 7,5 vezes o valor do Indexante de Apoios Sociais (IAS), que em 2022 é de 443,20 euros, 5 vezes o valor do IAS e 2,5 vezes o valor do IAS.

No caso dos doutoramentos o limite de idade, de 28 anos, pode ser prolongados até aos 35 anos se houver interrupção da carreira, retomada posteriormente. O primeiro-ministro, António Costa, já tinha prometido que o Governo iria assegurar o automatismo da aplicação do IRS Jovem, para simplificar o preenchimento da declaração anual de IRS, e a medida também vai incluir rendimentos do trabalho independente.

A pensar em voltar a Portugal? Programa Regressar prolongado até 2023

Vai ser prolongado até 2023 o Programa Regressar, que abrange aqueles que emigraram depois de 2015, tenham estado fora três anos e regressem a Portugal.

Se está a pensar voltar ao País, o Governo irá atribuir-lhe uma isenção de 50% no IRS durante cinco anos (o que abrange não só trabalho por conta de outrem mas, também, os rendimentos de trabalho independente).

A proposta de Orçamento do Estado estabelece, também, que os contribuintes que regressaram a Portugal em 2021 e reúnam requisitos para beneficiar do Programa Regressar têm até 31 de julho para substituir a declaração do IRS, e optar por ser abrangidos por este regime fiscal.

Deduções fiscais aumentam a partir do segundo filho

O documento orçamental entregue pelo ministro Fernando Medina mantém, também, a dedução fiscal alargada a partir do segundo filho, uma intenção expressa em outubro e reiterada no programa do Governo, que na semana passada foi discutido no Parlamento.

A dedução à coleta por cada dependente com idade até seis anos, aplicável a partir do segundo filho, aumenta de 600 para os 900 euros. No relatório do Orçamento do Estado pode ler-se, porém, que “este aumento ocorrerá de forma faseada, registando-se, em 2022, um aumento do valor da dedução de 600 para 750 euros e, em 2023, um novo aumento de 750 para 900 euros”.

Atualmente, por cada dependente há uma dedução de 600 euros, majorada em mais 126 euros por crianças até aos três anos. Nas famílias em que há mais do que um dependente, a majoração sobe para 300 euros (para um total de 900 euros) a partir do segundo filho até aos três anos.

Abono de família vai ser mais generoso, com o novo Orçamento

O que também vai aumentar de forma faseada, até 2023, é o abono de família. Os abonos do 1.º e 2.º escalões vão aumentar de forma faseada, até 2023, altura em que vão atingir 600 euros anuais (ou seja, 50 euros por mês) por criança ou jovem até aos 18 anos.

As crianças em risco de pobreza extrema vão também receber um complemento ao abono de família, que vai duplicar o valor a atribuir. Em 2022 o montante anual será de 840 euros para as crianças em risco de pobreza extrema, subindo, depois, para os 1.200 euros.

Relacionado com este ponto, o Governo vai, também, avançar com o que chama de Complemento Garantia para a Infância, que será pago pela Autoridade Tributária no ano de 2023. Em traços gerais, essa medida vai assegurar que quem recebe abono de família acima do segundo escalão, que não obtenham um valor total anual de 600 euros por criança ou jovem, entre o abono de família e a dedução à coleta de IRS, venham a receber a diferença para esse valor.

Isenção de IRS para mais famílias, e correção da penalização fiscal dos aumentos salariais em 2023

A proposta orçamental introduz um aumento extraordinário e temporário no valor anual do mínimo de existência, que vai subir 200 euros. Tal como foi feito no ano passado, o objetivo deste aumento é compensar as famílias com menos rendimentos devido ao efeito económico da pandemia. Graças a este aumento, mais 170 mil famílias de rendimentos baixos ficam isentas de pagar IRS.

O Governo vai ainda avaliar uma solução que permita corrigir os efeitos regressivos do imposto que retirem rendimento líquido em caso de aumentos salariais nos patamares mais baixos da tabela salarial. Esta solução, que ainda vai ser definida, será aplicada na liquidação do IRS de 2022, em 2023 vai beneficiar cerca de 250 mil famílias.

Função pública não terá aumentos como a inflação (e Governo recua nos técnicos superiores)

Tal como a proposta de Orçamento do Estado que foi chumbada em outubro de 2021, o documento entregue esta quarta-feira por Fernando Medina também aponta para um aumento de 0,9% nos funcionários públicos – mesmo que se admita, agora, que a inflação este ano deverá ascender aos 4%.

Na conferência de imprensa desta quarta-feira, Medina disse mesmo não sendo aumentados num valor mais próximo da inflação, os funcionários públicos, como toda a gente, vão beneficiar de outras medidas como o efeito do desdobramento dos escalões de IRS e, também, as medidas para mitigar o aumento dos preços dos combustíveis.

“Não conseguimos fazer tudo, naturalmente. Só por vontade do Governo não conseguimos que esse aumento não se repercuta. Posso, sim, dizer que seremos dos países nos quais é maior o esforço público para a mitigação dos preços dos combustíveis”, argumentou o ministro das Finanças.

Governo não dá mais do que 0,9% à função pública e recua na data para subir salário de entrada dos técnicos superiores

Mais surpreendente é que, na proposta de Orçamento do Estado, o Governo deixou cair uma promessa feita antes do chumbo do Orçamento, no final do ano passado: a de aumentar o salário de entrada dos técnicos superiores em 50 euros até 2023. Esse compromisso será, agora, posto em prática “ao longo da legislatura”, diz o Governo, sem se comprometer com datas.

Combustíveis mais baratos, mas temporariamente

Sem ser uma medida do Orçamento do Estado, vai ser aprovado em legislação autónoma, a descida do imposto petrolífero prevista promete ter um impacto significativo no preço final dos combustíveis já a partir de maio, e que aos valores de hoje, pode rondar os 16 cêntimos por litro. 

As contas do Governo apontam para uma redução total de 21 cêntimos por litro, mas esta inclui a diminuição temporária de até 4,7 cêntimos no imposto sobre o gasóleo. A descida do ISP para reproduzir o efeito que teria a redução do IVA para a taxa intermédia está prevista por dois meses, em maio e junho. O ministro das Finanças admite estender apoios ou avançar com outros, mas o Executivo tem avisado que será sempre uma medida temporária. A descida do imposto irá substituir o reembolso de 20 euros por mês do Autovoucher que termina no final de abril.

Apoios dirigidos ao impacto dos preços altos nas famílias mais carenciadas

A partir de abril começará a ser pago o subsídio de 60 euros para apoiar as famílias com rendimentos mais baixos. A medida será alargada em maio a todos os que recebam uma prestação social mínima e deverá chegar a 830 mil agregados. Para o mesmo universo foi aprovado uma subvenção de 10 euros para a compra de gás de botija e de garrafa (GPL).

Alívio na eletricidade no segundo semestre

A proposta orçamental aponta para uma descida das tarifas de acesso às redes no segundo semestre deste ano com a transferência de 150 milhões de euros do Fundo Ambiental. O documento indica que esta revisão extraordinária vai beneficiar todos os consumidores, famílias e empresas.

Impostos das bebidas e tabaco aumentam 1%

Certo é ainda o aumento dos Impostos Especiais de Consumo, nomeadamente o Imposto sobre o Tabaco (IT) e o Imposto sobre Álcool e Bebidas Alcoólicas (IABA), que sobem 1%.

“Considerando a evolução esperada para o consumo privado e a procura interna no próximo ano, prevê-se um aumento da receita em 2022, face a 2021, de 20 milhões de euros no IT (+1%) e 29 milhões de euros no IABA (+11%)”, refere o Orçamento.

O mesmo não acontece com o ISP, que terá uma redução, como já foi anunciado. Assim, as previsões apontam para um decréscimo da receita com este imposto de 54 milhões de euros (-2%). Esta descida resulta do “aumento previsto da procura combinado com a redução das taxas do ISP equivalentes à redução extraordinária e temporária do IVA para a taxa intermédia sobre a aquisição de combustíveis, bem como da suspensão da aplicação do aumento da taxa de carbono e a sua não reposição integral até final do ano”.

(Notícia atualizada com data de entrada em vigor do englobamento obrigatório das mais-valias bolsistas)