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32ª Cimeira Luso-Espanhola. A Cimeira de Trujillo permitirá aprofundar as discussões mantidas com o governo de Espanha sobre a interligação entre dois processos importantes: a implementação da Estratégia Comum de Desenvolvimento Transfronteiriço e a execução dos Planos de Recuperação e Resiliência. Terá também como um dos seus pontos altos a celebração do novo Tratado de Amizade e Cooperação, a assinar pelo Primeiro-Ministro português António Costa e pelo Presidente do Governo espanhol Pedro Sanchez. Trujillo, Espanha, 28 de outubro de 2021. JOÃO PORFÍRIO/OBSERVADOR
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António Costa e Pedro Sánchez conseguiram convencer os parceiros europeus da tese da ilha energética, mas falta o sim final da Comissão

JOÃO PORFÍRIO/OBSERVADOR

António Costa e Pedro Sánchez conseguiram convencer os parceiros europeus da tese da ilha energética, mas falta o sim final da Comissão

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Como Portugal e Espanha propõem baixar o preço da eletricidade "desligando" a França

Proposta de Portugal e Espanha para baixar preço da eletricidade implica isolar a Península do contágio francês. Bruxelas receia rompimento do mercado único europeu e tem dúvidas sobre financiamento.

A ilha ibérica de energia, conceito que os líderes de Portugal e Espanha (sobretudo esta) venderam na cimeira dos chefes de Estado da União Europeia, poderá implicar a separação do mercado europeu integrado de eletricidade. A proposta de impor um teto ao preço de gás que as centrais de ciclo combinado podem cobrar pela energia elétrica que produzem só funciona se o mercado ibérico ficar protegido do contágios dos preços que vêm de França. O modelo que está a ser discutido com a Comissão Europeia admite restrições às exportações de energia elétrica para lá dos Pirinéus e está a suscitar reservas em Bruxelas.

Apesar da limitada capacidade de interligação entre Espanha e França (e entre a Ibéria e a Europa além Pirinéus) — de menos de 3% da capacidade de produção face à recomendação europeia de 10% — as trocas elétricas por este canal têm estado a pressionar os preços ainda mais em alta.

França atravessou recentemente um período de paragem do seu parque nuclear, associada a uma onda de baixas temperaturas atirando os preços da eletricidade para 3.000 euros por MW hora. E quando isso acontece, a Espanha passa automaticamente a exportar eletricidade para França (porque a sua produção é muito mais competitiva, além de necessária para responder à procura). Ao vender eletricidade para lá dos Pirinéus, Espanha e Portugal — que têm mais produção de fontes renováveis — são contagiados pela escalada dos preços franceses. O contrário também acontece quando o nuclear está em pleno, mas não é isso que tem sucedido nas últimas semanas.

Valores máximos nas áreas em que se verificou casamento de preços na União Europeia

Preços máximos da eletricidade na UE

Preços máximos de eletricidade em março, segundo dados da Rede Elétrica Espanhola

Na hora em que o casamento entre preços europeus foi mínimo a ibéria pagou menos pela eletricidade do que a França

Preços de eletricidade na UE com o mínimo de acoplamento entre mercados

Mapa da Rede Elétrica Espanhola que mostra preços nacionais da eletricidade quando houve menor casamento entre preços

Os recordes franceses estão a dar gás à pretensão ibérica que conseguiu arrancar um difícil acordo no último Conselho Europeu extraordinário para discutir a resposta aos impostos da guerra e mau grado a oposição alemã que chegou a suscitar uma saída intempestiva da sala de Pedro Sánchez, como contou na altura a imprensa internacional. Foi uma vitória política, mas que ainda exige uma negociação técnica com a Comissão Europeia que no passado já torceu o nariz à pretensão espanhola de mexer nas regras do mercado.

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UE reconhece exceção ibérica. Portugal e Espanha podem travar preço do gás para produzir eletricidade

No entanto, a proposta técnica que está a ser debatida com os serviços técnicos da Comissão Europeia ainda não convenceu Bruxelas e uma das reservas tem precisamente que ver com a separação de preços entre os mercados de eletricidade que vai contra o objetivo de integração dos mercados elétricos, no limite, de acordo com o El Pais, pode romper com o mercado interno de energia.

Esta segunda-feira, o jornal espanhol cita documentos do Governo de Madrid que vão mais longe na separação entre os mercados ibérico e francês, admitindo a necessidade de estabelecer certas restrições à exportação em alguns segmentos de mercado, para além do duplo leilão de preços, de forma a evitar distorções no mercado e a subsidiação dos preços dos outro lado dos Pirinéus.

Fontes da Comissão Europeia citadas pelo jornal espanhol avisam que este passo poderá resultar numa restrição dos fluxos de eletricidade com França, rompendo a unidade do mercado europeu. E se reconhecem que a interconexão com Espanha é limitada, receiam que se o precedente for criado possa repetir-se em países mais interligados.

Como e quem vai compensar as centrais a gás

O esquema defendido pelos países ibéricos é complexo e pressupõe que para a mesma hora sejam realizados dois leilões de oferta e procura. Um deles seguindo o algoritmo europeu Euphemia que define as regras de acoplamento de ofertas no mercado único e em que o custo marginal da última oferta a entrar, a mais cara, fixa o preço de toda a energia vendida nessa hora. O outro utilizando o cap de 30 euros por MW hora para toda a produção térmica (sobretudo a que usa gás, mas também carvão) que conseguir entrar no mercado naquela hora. O resultado deste limite imposto à tecnologia mais cara é um preço da energia mais baixo do que se tem verificado nos últimos meses e que rondará os 110 a 130 euros por MW hora, de acordo com números já divulgados pela imprensa espanhola.

É o resultado do segundo leilão que vai fixar o preço da eletricidade transacionada no mercado ibérico, mas para evitar que este efeito salte para França subsidiando os preços do outro lado, as exportações para aquele país vão ser feitas ao preço que resultar do mecanismo europeu pelo qual tem sido o gás natural a definir o preço da eletricidade. Este segundo leilão interno para fixar os preços no mercado spot diário espanhol (com efeitos no mercado a prazo) permitiria, de acordo com os argumentos do lado ibérico, manter os contratos e o funcionamento em regime de mercado. Mas levanta outras dúvidas.

As centrais a gás teriam de ser compensadas por estarem a vender energia abaixo do preço custo — tem sido a escalada do gás natural (inflamada pela guerra na Ucrânia e as sanções à Rússia) a principal causa para os máximos atingidos no mercado de eletricidade. E no respeito pelas orientações já dadas pela Comissão Europeia, os dois países pretendem evitar a criação de um défice tarifário que resultaria de adiar o pagamento do sobrecusto que fica por cobrir para os anos seguintes.

É aqui que entra o conceito da internalização destes custos pelo próprio sistema elétrico que, ao mesmo tempo, vai mutualizar (nas palavras usadas pelos responsáveis políticos portugueses) os ganhos inesperados e aleatórios que alguns produtores estão a ter à boleia dos preços altos sem ter de suportar os encargos (com combustíveis e CO2) que os provocam.

A compensação às centrais térmicas será distribuída por todos os compradores de energia elétrica — e de forma indireta pelos seus clientes (os consumidores de eletricidade). Apesar disso, os primeiros e os segundos vão pagar menos pela eletricidade do que têm estado a pagar. Então quem perde nesta redistribuição de custos? Os produtores elétricos que estariam a encaixar os tais lucros extraordinários e inesperados e que em Portugal António Costa identificou com as centrais renováveis.

Costa diz que ganhos extraordinários das renováveis vão financiar controlo do preço da eletricidade

O power point divulgado pelo Governo a propósito da medida que está a ser discutida em Bruxelas indica que Portugal espera poder reduzir os custos com a fatura elétrica das famílias e empresas em 690 milhões de euros por mês “por via da limitação dos lucros inesperados e extraordinários das empresas geradoras de eletricidade”. Mas se o teto proposto pelo dois países for elevado por pressão dos serviços europeus da concorrência, como poderá resultar das negociações com a Comissão Europeia, então as poupanças podem ficar aquém das previstas na proposta inicial.

"Se vamos limitar os ganhos na eletricidade, não devíamos fazer o mesmo no petróleo e nos combustíveis?"
Pedro Amaral Jorge, presidente da APREN

Para o presidente da APREN (Associação dos Produtores de Energias Renováveis), o que Portugal e Espanha querem fazer ao mercado elétrico corresponde já a uma limitação dos ganhos das elétricas de fonte renovável. E, nesse cenário, considera que já não haveria lucros extraordinários e inesperados para taxar, daí que Pedro Amaral Jorge defenda que as duas opções não são acumuláveis. Mas deixa outra questão. “Se vamos limitar os ganhos na eletricidade, não devíamos fazer o mesmo no petróleo e nos combustíveis?”

O Governo português está a avaliar a possibilidade de avançar com um imposto sobre eventuais lucros aleatórios e inesperados, mas não há qualquer decisão tomada, esclareceu o ministro da Economia, António Costa Silva.

Costa Silva não afasta totalmente taxa sobre lucros excessivos, mas só em último caso

Para o porta-voz dos produtores renováveis em Portugal o mecanismo subjacente configura uma subsidiação dos combustíveis fósseis pelas empresas de produção renovável. Uma dúvida que Bruxelas também terá. De acordo com o El País, o facto de a margem que ultrapassa o teto imposto ao preço ser suportada pelo resto dos agentes do mercado grossista acaba por ser comparável a um subsídio, ainda que aguarde por mais explicações sobre o modelo de funcionamento da fórmula.

O presidente da APREN considera que o modelo proposto é uma “artificialização do mercado” e avisa que pode ter o mesmo efeito que “tirar o pé a uma cadeira e esperar que ela fique de pé”. Pedro Amaral Jorge refere potenciais efeitos desta fórmula defendida agora como excecional e extraordinária para responder a uma situação também ela excecional — as orientações dadas por Bruxelas apontam para o prazo limite de dois anos para medidas excecionais — mas que tal como outras no passado poderá perpetuar-se no tempo.

Presidente da APREN defende que poucos produtores em Portugal têm lucros inesperados

Uma das consequências mais previsíveis é o impacto negativo que terá no investimento em nova produção renovável que a Comissão Europeia e Portugal querem acelerar. As perspetivas para um promotor que aposte em vender energia ao preço de mercado ficam menos atrativas, quanto mais não seja por causa de mais um sinal de incerteza sobre as regras que vão estar em vigor. Pelas decisões políticas e regulatórias que adotou no passado, como o polémico imposto sobre o sol (sobre as solares) e a tentativa de aplicar uma taxa sobre os lucros extraordinários de alguns produtores no ano passado, Espanha já é apontada como um dos destinos de maior risco para investimentos em potência renovável, indica o presidente da APREN.

Em Portugal, defende Pedro Amaral Jorge, poucos produtores estarão a receber esses lucros ditos extraordinários. Os contratos de tarifas feed-in das eólicas já limitam as receitas que as eólicas podem receber e os ganhos de margem que estão a ser gerados por preços de mercado que estão muito acima da remuneração garantida nos contratos já estão a ser devolvidos comercializador de último recurso (e aos clientes finais) por via da sobrecompensação que permite baixar os custos do sistema elétrico.

No caso das barragens, há dúvidas sobre como seriam tratadas as centrais de bombagem, uma vez que estas têm custos de energia (compram eletricidade para transportar a água que é reaproveitada para gerar eletricidade), e são despacháveis. Ou seja, se não tiverem condições de remuneração para ligar as turbinas estas centrais não vão a jogo. Também há dúvidas sobre como funcionariam neste modelo os serviços de sistema que oferecem a disponibilidade para produzir ou desligar em função das necessidades do sistema.

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