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epa09848322 Spanish Prime Minister Pedro Sanchez (L) and Portugal’s Prime Minister Antonio Costa chat prior to a European Council Summit in Brussels, Belgium, 25 March 2022.  EPA/OLIVIER HOSLET
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Pedro Sánchez foi mais agressivo na defesa da proposta ibérica que Portugal apoiou com algumas salvaguardas

OLIVIER HOSLET/EPA

Pedro Sánchez foi mais agressivo na defesa da proposta ibérica que Portugal apoiou com algumas salvaguardas

OLIVIER HOSLET/EPA

Como vai o limite ao preço da energia proteger Portugal da escalada do gás? Dez respostas

Acordo ibérico para travar preço do gás não podia ser mais oportuno. Mas há dúvidas sobre quem ganha. 10 perguntas sobre como vai funcionar o mecanismo complexo que protege Portugal, até certo ponto.

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Portugal e Espanha acreditam ter conseguido esta terça-feira mais uma vitória política em Bruxelas que lhes vai permitir erguer um escudo temporário contra uma tempestade que se abate sobre a Europa — a escalada dos preços do gás — que voltou a ganhar força com a interrupção russa do fornecimento aos primeiros países europeus, Polónia e Bulgária, na sequência das sanções e contra-sanções impostas no contexto da guerra da Ucrânia.

Todas as fontes ouvidas concordam numa coisa. O modelo ibérico para travar o contágio do gás, cada vez mais caro, ao preço da eletricidade é uma das matérias mais complexas com a qual tiveram de lidar e está sujeita a muitas variáveis, o que torna mais difícil divulgar números para poupanças previsíveis. Depende sobretudo do preço do gás natural. Quanto mas alto este for, maior será o ganho conseguido para os consumidores ibéricos, mas também maior será a compensação que o sistema terá de entregar às centrais térmicas (quase todas a gás e poucas a carvão). A imprensa espanhola refere valores entre os 5.000 e os 6.000 milhões de euros para um preço de gás de 100 euros por MW hora.

O desenho da medida que foi aprovada esta semana procurou responder às reservas manifestadas pela Comissão Europeia e por atores do setor, mas não há certezas sobre o resultado final.

A única garantia que é, para já, possível obter junto dos responsáveis políticos é a de que todos os clientes de eletricidade ficam a ganhar em termos líquidos com a criação de um teto ao preço da eletricidade produzida a partir do gás natural. Uns mais do que outros. O objetivo é que ninguém fique a perder face às cotações médias verificadas nos últimos meses no mercado spot do Mibel (mercado ibérico de eletricidade). Nem sequer os clientes (como a maioria dos portugueses) que têm contratos de preços fixos e que não estão expostos a curto prazo às cotações recorde do Mibel.

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“Usamos os ganhos não esperados gerados no sistema (elétrico) para suportar os custos da compensação (às centrais que usam gás). Dessa forma não há nenhum consumidor que saia prejudicado e todos os que precisam de renovar os seus contratos, saem beneficiados”, afirmou aos jornalistas, o ministro do Ambiente e Ação Climática, Duarte Cordeiro esta quarta-feira em Aveiro.

"Usamos os ganhos não esperados gerados no sistema (elétrico) para suportar os custos da compensação (às centrais que usam gás). Dessa forma não há nenhum consumidor que saia prejudicado e todos os que precisam de renovar os seus contratos, saem beneficiados".
Ministro do Ambiente e Ação Climática, Duarte Cordeiro

Como vai funcionar este regime excecional de preços?

A solução estabelece um limite ao preço da eletricidade gerada a partir das centrais que usam o gás natural, porque têm sido estas unidades as principais responsáveis pela subida dos preços no mercado grossista. Dada a regra marginalista do mercado, é a tecnologia que tem o custo marginal mais elevado a fixar o preço de toda a energia vendida numa dada hora. É por causa desta regra que a escalada do gás está a contaminar os preços da eletricidade. Para o contrariar, é fixado um limite médio para o preço diário de 50 euros por MW hora (a começar nos 40 euros por MW hora), o que trava o preço da eletricidade a cerca de 140 euros por MW hora, incluindo custo do CO2, bastante abaixo das cotações médias do Mibel nos últimos meses, que se tem situado na casa dos 200 euros MW hora.

Bruxelas aprova proposta de Portugal e Espanha para limitar preços da eletricidade

Quando vai entrar em vigor e durante quanto tempo?

Segundo fonte oficial da Comissão Europeia a reunião com os ministros Duarte Cordeiro e Teresa Ribera resultou num acordo político de princípio que irá permitir aos dois países tomarem medidas temporárias e proporcionais para responder aos preços da eletricidade, manter incentivos para uma transição energética sustentável e preservar a integridade e os benefícios do mercado único. Os contactos vão continuar a toda velocidade e a um nível técnico. Os governos ibéricos esperam que este mecanismo possa ser operacionalizado em maio, mas ainda estão a ser fechado vários aspetos técnicos da proposta com a Comissão Europeia e avaliadas as implicações. Há também aspetos regulatórios e eventualmente legislativos que implicarão mexer nas regras de Portugal e Espanha. O mecanismo é temporário e vai estar em vigor 12 meses.

Isso vai baixar os preços da eletricidade? Quem vai beneficiar?

Mais do que baixar, este mecanismo funciona como um travão a subidas, que terá um efeito de moderação de aumentos que ainda não chegaram na sua dimensão total aos clientes que têm contratos fixos ou que estão na tarifa regulada, mas que estão no horizonte.

No imediato, os grande beneficiados são os clientes expostos diretamente ao preço do Mibel. Em Espanha, há uma fatia substancial de famílias (cerca de 25%) que tem uma componente da fatura indexada à evolução do mercado e que tem enfrentado aumentos de dois dígitos com impacto muito significativo na inflação. Estes consumidores eram uma grande preocupação para Espanha, que fez muita força para conseguir aprovar esta exceção. As indústrias e empresas expostas ao risco do preço de mercado também ganham. Em tese, todos os consumidores — empresariais ou domésticos, portugueses ou espanhóis — que tenham de renovar o contrato de fornecimento da eletricidade vão pagar menos do que teriam de pagar com os atuais preços do Mibel, ainda que tenham de enfrentar subidas face ao que pagavam até agora porque, mesmo com este teto, a eletricidade está mais cara do que há um ano.

Os portugueses ficam a perder face aos espanhóis, como avisaram as elétricas?

Essa terá sido uma linha vermelha imposta por Portugal na mesa de negociações e que terá ido ao encontro também das preocupações suscitadas pela Comissão Europeia. A proposta inicial que veio de Espanha estava focada nos preços spot (do mercado diário) e os efeitos positivos eram sentidos, acima de tudo, pelos consumidores que estavam a pagar estes preços, deixando de fora a maioria dos portugueses que têm contratos fixos — seja na tarifa regulada, seja por contratos de um ano ou mais (no caso de empresas). A solução final procura assegurar que ao longo deste ano todos os clientes venham a ser beneficiados em termos líquidos, porque todos os contratos estão também expostos ao preço de mercado quando têm de ser renovados.

Elétricas avisam Bruxelas. Proposta para baixar preços beneficia mais espanhóis do que portugueses

Outra linha vermelha do lado nacional foi conseguir que o preço final que resulta do teto ao gás fosse mais elevado do que o preço dos contratos de produção do regime especial (PRE) em Portugal. Estes contratos têm remuneração garantida com preços até 90 euros por MW hora. E se no passado o prémio face ao mercado gerou um sobrecusto para as tarifas elétricas, desde o ano passado o efeito passou a ser positivo permitindo baixar as tarifas e constituindo um seguro contra a escalada do mercado. Com o teto proposto inicialmente pelos espanhóis, de 30 euros por MW hora, havia o risco de esse efeito se perder na medida em que este valor para o gás, transposto para o preço da eletricidade, daria pouco mais de 100 euros por MW.Por cada MW de eletricidade são necessários cerca de 2,2 MW de gás a que é preciso somar o custo do CO2.

A solução ibérica protege Portugal da escalada do gás?

Para o ministro do Ambiente e Ação Climática, o agravamento do gás, na sequência do corte de abastecimentos da Rússia a alguns países europeus, torna ainda “mais importante este mecanismo porque corta a ligação entre o preço do gás e o preço de mercado da eletricidade”. Ao obter uma solução política para uma medida temporária que permite fixar um preço máximo do gás que, por sua vez, é utilizado para fixar o da eletricidade, “estamos a diminuir a exposição de todas as empresas e consumidores que neste momento estão expostos ao preço de mercado”. Mas a proteção de 12 meses só serve para a eletricidade. Os consumidores de gás, sobretudo os industriais, vão continuar expostos ao elevado preço internacional do gás e a única solução ao seu dispor é o programa do Ministério da Economia de subsídios a fundo perdido para as empresas mais expostas e linhas de crédito para reforçar a liquidez.

Encerramento do debate sobre o Programa do XXIII Governo Constitucional na Assembleia da República. Ministro da Economia e do Mar António Costa e Silva fala com o Ministro do Ambiente e da Ação Climática Duarte Cordeiro Lisboa, 08 de Abril de 2022. FILIPE AMORIM/OBSERVADOR

As medidas para a crise energética passam pelos ministros Costa Silva e Duarte Cordeiro

FILIPE AMORIM/OBSERVADOR

Se as centrais a gás vão receber menos, vão produzir?

O mecanismo acordado prevê que as centrais que tenham de vender a sua energia com prejuízo (por causa do teto imposto à eletricidade produzida a partir do gás) sejam compensadas. Logo, esta solução será neutra para estes produtores que irão continuar a receber o preço que inclui a totalidade dos custos com a compra de gás natural.

Se há uma compensação, quem a vai pagar?

Essa é uma das quadraturas do círculo deste esquema ibérico, já que foi necessário cumprir duas condições: o não financiamento por parte dos países e dos respetivos orçamentos do Estado e a não criação ou agravamento de um défice tarifário — em que um custo é atirado para mais tarde e depois tem de ser pago pelos clientes com juros — exigida pela Comissão Europeia. Os custos gerados por esta compensação serão internalizados no sistema.

Na prática, são distribuídos pelos compradores de energia — que por sua vez os terão de passar para os clientes finais. Mas há uma salvaguarda. Quem compra energia também vai ter um benefício porque pagará menos por cada MW hora — 140 euros face a mais de 200 (224 euros MW hora esta quarta-feira). E o mecanismo está concebido para que o saldo entre a compensação que vão suportar e o preço final da energia seja sempre positivo para o comprador, face ao que paga hoje. Ou seja, que haja sempre um benefício líquido para as comercializadoras quando vão a mercado e para os seus clientes.

Quanto podem ganhar os consumidores?

A conta muda todos os dias e depende sobretudo de quanto custa o gás no mercado internacional. Quanto mais alto estiver o preço, maior a poupança permitida por este teto face à cotação do mercado. Em sentido contrário, a compensação a garantir às centrais a gás será mais alta. Os governos ibéricos têm vários cenários para preços do gás e projeções de poupanças, mas só no final da aplicação do mecanismo é que se poderá conferir como acaba o filme. O valor de 690 milhões de poupança mensal para empresas e famílias divulgado pelo primeiro-ministro já não será o mais adequado porque refletia as contas feitas para a proposta inicial apresentada.

Esta quarta-feira, o ministro Duarte Cordeiro deu outro número. Comparando o preço corrente do Mibel de 220 euros por MW hora e do gás natural no Mibgas (mercado ibérico do gás) de 83 euros por MW hora, um teto de 50 euros por o gás natural iria resultar num preço médio mais baixo de 13%. “Todos os portugueses que têm de renovar os seus contratos e vão ao mercado em vez de encontrarem o preço de referência do Mibel passariam a encontrar um preço de referência mais baixo, que se fosse hoje seria 13% mais baixo. Este é um benefício muito concreto para todos os portugueses”.

A central de Lares da EDP é um dos ciclo combinados que usa gás para produzir eletricidade

A conta final dependerá também da frequência com que as centrais a gás natural sejam chamadas a produzir para responder à procura, fechando o preço de toda a eletricidade vendida nessa hora. Quanto mais horas o mercado ibérico conseguir casar a oferta e a procura sem necessidade de recorrer às centrais térmicas, menos necessidade haverá de recorrer a este limite e o preço da energia no mercado será em inferior e dispensar a aplicação do teto.

Mas se todos vamos pagar menos, quem vai receber (ganhar) menos?

É outra quadratura do círculo do complexo mecanismo ibérico que, apesar de compensar as centrais a gás, tenta evitar a armadilha de subsidiar as energias fósseis à custa das renováveis. Para as centrais térmicas, as receitas são as mesmas que resultariam da fixação normal do preço de mercado. O efeito será neutro. A conta vai cair no lado dos produtores que estão a ter ganhos inesperados com a alta dos preços sem ter de suportar os custos que fazem subir esses preços (combustível e CO2). Por outras palavras, os produtores de renováveis que vendem em regime de mercado — solar, eólicas sem tarifas feed-in, grandes hídricas sem bombagem e nuclear.

São os chamados lucros extraordinários que, em vez de serem taxados num novo imposto, ficam retidos no sistema para financiar as compensações às centrais a gás. O modelo está desenhado para serem os produtores que mais estão a beneficiar a pagar essa diferença. É a mutualização dos ganhos que, ainda assim, permite a estes produtores continuarem a receber receitas mais altas, em alguns casos muito mais altas, do que os valores que constam dos projeções e pressupostos que sustentaram as decisões de investimento.

É um argumento para contrariar as queixas destes produtores, mas há também quem considere que esta solução é mais favorável aos produtores do que a aplicação de um imposto sobre os tais lucros extraordinários. É o caso de Jorge Costa, ex-deputado do Bloco de Esquerda, partido que foi o primeiro a propor em Portugal este imposto.

E pode haver um problema se a produção renovável for curta devido à falta de vento e água e o sistema tiver de depender mais de energia térmica, as compensações serão mais elevadas e os ditos lucros extraordinários podem não chegar para cobrir essa diferença e garantir o preço limite previsto no mecanismo.

A Ibéria vai mesmo tornar-se numa ilha energética e separar-se da Europa?

Apesar de essa tese ter sido vendida com sucesso na negociação política ao mais alto nível entre os chefes de Estado europeus, a proposta de desligar os preços ibérico do francês e do europeu acabou por cair. Era uma das maiores objeções de Bruxelas à proposta de Portugal e Espanha que receava que dois processos autónomos de fixação de preços (um ibérico e um europeu) viesse a comprometer (romper) o mercado único de energia.

Como Portugal e Espanha propõem baixar o preço da eletricidade “desligando” a França

O mecanismo aprovado não diferencia o preço de venda da energia na Ibéria do preço da energia a ser exportada pela interligação a França. Esta cedência implica que os consumidores portugueses e espanhóis estejam a subsidiar a energia vendida aos franceses, apesar de esse impacto ser muito limitado por causa da restrita capacidade de interligação entre os dois países. Uma forma de compensar esse ganho passado para França é uma redistribuição das receitas de interligação entre os dois países, de forma a beneficiar mais a Espanha, reequilibrando os ganhos. Será ainda preciso assegurar que a procura francesa — que só importa de Espanha quando os preços estão mais baixos que os seus — não puxe para cima os preços do mercado ibérico como tem feito no passado. Era para evitar esse contágio que Espanha queria restringir as exportações, o que para Bruxelas foi uma linha vermelha.

Ainda assim, e para efeitos do mercado a prazo e dos valores que servem de referência às transações de energia neste segmento, vai ser mantido o cálculo do preço do mercado ibérico de eletricidade sem qualquer teto ao custo do gás. Isto para evitar que transações já fechadas, mas ainda por liquidar sejam afetadas pela distorção do preço, como alertaram os operadores dos mercados de energia numa carta citada pelos jornais Público e Expresso.

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