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O banco de investimento Saxo Bank inclui um grande aumento do interesse geral pelo tema do rendimento básico incondicional (RBI) entre as suas 10 “previsões insólitas” para 2021 – um relatório anual que é dos mais lidos nos mercados financeiros e que, mais do que “apostas” sobre o que pode acontecer no ano seguinte, procura contribuir com motivos de reflexão sobre as grandes tendências económicas e geopolíticas no mundo. Outras das “outrageous predictions” do Saxo Bank para o próximo ano são o “dizimar” das grandes cidades como as conhecemos e uma “revolução” nas energias limpas que irá colocar as renováveis “tradicionais” a um canto.
A edição deste ano é ainda mais audaz do que o habitual. “À medida que 2021 se aproxima, encorajamos toda a gente a olhar para o espelho e a dar o seu melhor para quebrar hábitos antigos, parar de presumir que tendências do passado vão sempre manter-se e perceber quão rapidamente os paradigmas estão a mudar”, afirma o Saxo Bank, lembrando que “tecnologias como a Inteligência Artificial, a automação e o blockchain estão a provocar disrupção em todo o lado, desde categorias profissionais até à própria estrutura das nossas sociedades e às nossas ideias sobre o que é que, verdadeiramente, constitui o capitalismo“.
Num ano em que a pandemia de Covid-19 “tornou difícil para as previsões competirem com a realidade”, o Saxo Bank lembra que, apesar de todas as atenções terem estado concentradas no novo coronavírus, “a evolução tecnológica continuou, sempre, a progredir por detrás das cortinas” e a pandemia só veio acelerar uma série de “super-tendências” que já estavam em curso, mas que deram “saltos quânticos” neste ano de 2020. E será em 2021 que algumas destas “super-tendências” se irão tornar mais óbvias e prementes – e é nesse contexto que se enquadram algumas das 10 previsões insólitas do Saxo Bank para o próximo ano.
O rendimento básico incondicional pode “dizimar” as grandes cidades
Já era, para muitos, “inevitável”. E, na ótica do Saxo Bank, 2021 poderá ser o ano da afirmação plena do rendimento básico incondicional (RBI) como uma proposta séria e realista – um rendimento mínimo garantido a todos os cidadãos, sem qualquer condição. Isto porque “a pandemia de Covid-19 apenas acelerou a recuperação económica em forma de K que estava a fazer disparar os índices de desigualdade e a rebentar com o tecido social, mesmo antes do vírus”.
Não tem nada de ideológico afirmar que esta tendência de crescente desigualdade não poderá continuar para sempre sem o risco de que, a dada altura, sociedades inteiras possam despedaçar-se. E a evolução tecnológica torna exponencial as forças deflacionistas que limitam os salários e tornam cada vez mais difícil a vida da chamada “classe média”, mesmo quando consegue um “lugar ao sol” num mercado de trabalho que já está sob disrupção e que torna cada vez mais difícil o acesso a bens básicos como habitação e educação.
“O risco de que as sociedades possam colapsar por completo fará com que nos apercebamos de que as medidas de apoio pandémico, para compensar rendimentos perdidos (devido à pandemia), não foram meras medidas de emergência mas, sim, o início de uma nova realidade permanente de rendimento básico universal“, diz Kay Van-Petersen, um dos analistas do Saxo Bank que elaboraram este relatório anual de “previsões insólitas”.
O tema do rendimento básico incondicional tem sido amplamente discutido nos últimos anos – nos seus vários modelos que, com algumas variações entre si, têm vindo a ser propostos (e testados). Mas basta pensar nos “cheques” que todos os norte-americanos receberam no correio, quando a pandemia eclodiu, para perceber que esta já não é uma ideia limitada ao meio académico e poderá ser um conceito adaptado não apenas a um choque (súbito mas temporário) como a crise causada pela Covid-19 mas, também, ao incontornável impacto da evolução tecnológica – esse poderá ser menos súbito mas será tudo menos temporário.
Um rendimento para todos, incondicional. (Agora) faz sentido?
Na opinião do Saxo Bank, cada vez mais governos mundiais vão olhar para propostas deste género – não terão alternativa. E, numa “era marcada por perda de postos de trabalho provocada pela tecnologia e por trabalho cada vez mais feito remotamente, as grandes cidades vão ver-se a braços com um excesso de capacidade em escritórios de 50% ou mais”.
Em 2021 vai tornar-se óbvio que acabou o tempo em que as grandes cidades eram vistas como locais para onde centenas de milhares (ou, mesmo, milhões) de pessoas se dirigiam todos os dias para ir trabalhar, diz o Saxo Bank. Isso fará com que “os valores do imobiliário de escritórios sejam esmagados, bem como o valor do imobiliário comercial como restaurantes e lojas que servem as abelhinhas que todos os dias vão de casa para a cidade, trabalhar” e vão deixar de o fazer, em grande medida, acredita o Saxo Bank.
“O novo RBI vai levar a grandes mudanças em relação ao equilíbrio entre trabalho e vida pessoal, permitindo que muito mais jovens permaneçam nas comunidades onde nasceram e cresceram. Ao mesmo tempo, os profissionais que continuarem nas grandes cidades também não vão querer viver lá porque as oportunidades de trabalho vão escassear e a qualidade de vida em pequenos apartamentos, muito caros, em zonas com mais crime, vai tornar-se cada vez menos atrativa”, diz o Saxo Bank, aconselhando aos investidores – seus clientes – que fujam ao investimento em fundos imobiliários que apostem em ativos imobiliários nas grandes cidades mundiais.
Além de um rendimento básico, pede-se um “Dividendo da Disrupção” pago aos cidadãos
Na sequência do ponto anterior, o Saxo Bank aposta, também, que no próximo ano poderá subir de tom a proposta de criação de um Fundo Tecnológico dos Cidadãos, que seria o veículo ideal para compensar as pessoas que vão perder rendimentos devido aos ganhos de produtividade que vão ser obtidos não à custa do seu trabalho mas, sim, graças à inovação tecnológica. Em termos simples, cada cidadão seria um acionista do veículo para onde recairia uma parte substancial dos despojos obtidos através da valorização do capital (e não do trabalho). E esses seriam, depois, distribuídos como se fossem dividendos.
A Universidade de Oxford projetou recentemente que a evolução tecnológica irá, até 2030, tornar obsoletos cerca de metade dos postos de trabalho nos EUA, uma realidade fácil de extrapolar para o resto dos países do Ocidente. “Esta dinâmica vai agravar a desigualdade e a crescente polarização dos mercados de trabalho modernos”, diz a analista Eleanor Creagh, acrescentando que “a marcha da tecnologia, combinada com a lealdade aos princípios da economia de mercados abertos, já está a minar o contrato social e a destruir o tecido das nossas sociedades – e a Covid-19 só veio acelerar estas tendências”.
“Juros baixos são maus para os jovens que não têm pais ricos”
“A partir de 2021, as nossas sociedades vão ter de encontrar um novo rumo político se quisermos evitar um enraizamento cada vez maior da injustiça social mas, também, tumultos políticos e sociais e risco sistémico”, diz o Saxo Bank, defendendo que isto não vai ser conseguido com pequenas alterações nos códigos fiscais mas, sim, com propostas audazes como a criação de soluções que evitem que se concentrem num grupo cada vez mais ínfimo de pessoas os despojos do novo mundo digital.
“O Dividendo da Disrupção irá libertar uma enorme quantidade de energia empreendedora à escala individual e social, já que milhões de pessoas vão ter mais tempo e energia quando forem libertadas do stress dos seus empregos repetitivos”, antecipa Eleanor Creagh, antecipando uma “explosão da popularidade” de trabalhos na área da beneficiação das comunidades, artesanato e produção alimentar. “Setores ligados ao lazer também irão crescer, desde hobbies relacionados com desporto até atividades de tempos livres, reais e virtuais”, acrescenta – e é nessas empresas que os investidores devem apostar em 2021, com olho no longo prazo.
A tecnologia Blockchain “mata”, finalmente, as fake news
Não importa o que pensamos sobre isso – porque é uma inevitabilidade como fazer chuva ou fazer sol – mas a evolução tecnológica não aparece no relatório do Saxo Bank apenas como um “papão” que nos obriga a agir rapidamente se quisermos evitar o colapso das nossas sociedades. Na verdade, uma outra “previsão insólita” do Saxo Bank para 2021 é que serão as novas tecnologias – em particular, o blockchain – a salvar-nos de um outro grande perigo emergente e que, também ele, coloca em causa a estabilidade social e política: as fake news.
Esta é uma indústria – a das fake news – que está em “enorme crescimento, mais do que nunca, contaminando as fontes noticiosas nas quais confiámos ao longo de décadas”, diz o analista Anders Nysteen. “O espalhar de desinformação é acelerado por algoritmos que favorecem o engagement e que fazem desaguar os leitores em novos media que são tanto mais bem sucedidos quanto mais extremistas for o seu conteúdo”, nota o banco, acrescentando o perigo da tecnologia de deep learning, que permite facilmente criar imagens e vídeos realistas de pessoas a dizerem coisas que nunca disseram.
O Saxo Bank acredita que, “em 2021, a ameaça crescente da desinformação e a erosão da confiança em meios de comunicação social estabelecidos atingirá um ponto crítico, exigindo uma resposta por parte das empresas do setor” das telecomunicações, imprensa e redes sociais. Empresas como a Verizon e a IBM estão a desenvolver tecnologias para combater as fake news e também os “impérios” do Facebook e Twitter estão a investir fortemente em tecnologias que possam ser eficazes no combate a este risco extraordinário – em comum, assinala o Saxo Bank, está a aposta na tecnologia blockchain.
Em termos simples, o blockchain é uma tecnologia de registo distribuído que visa a descentralização como medida de segurança – isto é, em vez de haver uma central de validação, cada terminal que acede a um dado serviço funciona simultaneamente de ponto de verificação daquilo que existe. “Com uma estrutura partilhada de verificação (ledger), qualquer alteração de conteúdo será imediatamente visível por todos e cada conteúdo será sempre rastreável até à sua fonte original, o que bastará para suprimir a desinformação que não é verificada por outras fontes”, explica o Saxo.
O que podem as “mãos erradas” fazer com a Inteligência Artificial?
Gigantes como o Facebook e o Twitter vão “investir grandes somas nesta tecnologia blockchain, motivadas desde logo pelo seu instinto de auto-preservação, já que as ameaças regulatórias que já se abateram sobre elas nos últimos anos vão tornar-se tórridas“, diz Anders Nysteen, um analista do Saxo Bank que está confiante de que “a realidade vai vencer e as câmaras de eco vão perder“. Por isso, faz sentido investir em empresas como as grandes telecoms Verizon, IBM e nas empresas de redes sociais e Internet.
A Amazon e Jeff Bezos “compram” um país: Chipre
Se a previsão insólita anterior dá alguma confiança de que faz sentido investir nas grandes empresas tecnológicas, o Saxo Bank avisa que é preciso ser um pouco seletivo: e no caso da Amazon, a retalhista online que deu um enorme “salto” nesta pandemia, é preciso ter algum cuidado porque “os EUA e outros países vão tomar medidas contra os monopólios em 2021 e algumas destas empresas são ser castigadas pelo seu hubris“. Sabendo que estão a ser “perseguidas”, estas empresas irão recorrer a expedientes cada vez mais engenhosos para tentarem manter as taxas de crescimento: e o Saxo Bank acredita que a Amazon poderá “comprar” um país: Chipre.
2020 foi um ano excelente para a Amazon, com a pandemia a estimular o e-commerce um pouco por todo o mundo e com inúmeras empresas a recorrerem aos serviços de cloud da Amazon Web Services para albergar a estrutura que permitiu a substituição do trabalho presencial, no escritório, pelo trabalho remoto. Mas, diz a analista Althea Spinozzi, “em 2021 a Amazon e outros monopólios online vão estar cada vez mais preocupadas com aquilo que os governos podem fazer para combater o seu crescente poder, incluindo para evitar que estas empresas suportem cargas fiscais mais baixas passando a receber as suas receitas em jurisdições com taxas de imposto menores”, como a Irlanda, no caso da União Europeia.
Para se manter sempre um passo à frente dos reguladores, além da imensidão de dinheiro gasto em lóbi, estas empresas vão ter de se mexer e, no caso da Amazon, o Saxo Bank especula que a gigante liderada por Jeff Bezos poderá relocalizar a sua sede europeia para um país como Chipre. Trata-se de um país, lembra a analista, que continua a ressacar da crise da dívida soberana e cujo Produto Interno Bruto (PIB) anual ronda os 24 mil milhões de dólares (menos de 20 mil milhões de euros) – o equivalente a menos de três de faturação da Amazon apenas nas suas operações não-EUA.
A confirmar-se esta “previsão insólita”, “os consultores da Amazon iriam ajudar Chipre a reescrever o seu código fiscal à imagem do que há na Irlanda mas com taxas de imposto ainda menores – e tanto os responsáveis políticos como a população de Chipre vão ficar satisfeitíssimos” como o encaixe fiscal que seria obtido. A Amazon seria recebida “de braços abertos” em Chipre, diz o Saxo. Porém, em última análise, um acontecimento como este poderia ser a gota de água que levaria a União Europeia, no rescaldo de uma pandemia, a mover-se no sentido de eliminar a arbitragem fiscal que existe no seio da UE (e, até, da Zona Euro) e forçar uma crescente harmonização dos códigos fiscais.
Uma vacina (eficaz) contra a Covid-19 deixa as empresas em apuros
Pode parecer paradoxal, mas não é. A confirmar-se a eficácia (e segurança) das vacinas contra a Covid-19 que vão começar a ser distribuídas nas próximas semanas, em várias regiões do globo, este pode ser um desenvolvimento paradoxalmente penalizador para muitas empresas mundiais, sobretudo aquelas cuja viabilidade pode ficar em causa se a subida das taxas de juro (que surgirá como reflexo de uma solução para a pandemia) vier mais rapidamente do que a recuperação económica no terreno.
“A pandemia de Covid-19 acelerou o endividamento crescente e perigoso da economia global – os bancos centrais imprimiram dinheiro como nunca e levaram as taxas de juro para níveis mínimos em todas as economias desenvolvidas”, assinala a analista Althea Spinozzi, acrescentando que “esta política de estímulo monetário a todo o custo empurrou as taxas de rentabilidade oferecidas pelos estados e pelas empresas de qualidade para valores historicamente baixos, o que forçou os investidores a tomarem posições em ativos mais arriscados“.
Ora, neste contexto, se as taxas de juro subirem, mesmo que ligeiramente, poderá haver um refluxo em direção a ativos mais seguros, potencialmente provocando uma desvalorização súbita dos instrumentos financeiros mais arriscados em que os investidores entraram em 2020, incluindo títulos de dívida emitidos por “empresas ‘zombie’ inviáveis e que só sobreviveram à falência nesta pandemia graças aos apoios públicos de emergência e aos baixos custos do crédito”.
“A distribuição da vacina e a retirada das restrições à atividade económica podem fazer disparar a inflação subitamente”, diz o Saxo Bank, sobretudo se tudo correr relativamente bem e se concluirmos, nessa altura, que as economias foram “demasiadamente estimuladas durante a pandemia”. Aí, as taxas de juro podem subir rapidamente, demasiado rapidamente para muitas empresas – incluindo muitas cuja viabilidade já era questionável. “Pela primeira vez na História económica, uma recuperação rápida poderá ser marcada por um aumento das insolvências“, admite o banco de investimento.
A Alemanha vê-se obrigada a “resgatar” a França
“França é um dos países europeus que enfrentam uma ‘parede de dívida’ maior nos próximos anos” e, mesmo antes da pandemia, a dívida pública já estava próxima dos 100% do PIB e “a dívida privada estava a subir em flecha, para perto de 140% do PIB, muito mais do que em Itália (106%) e Espanha (119%)”. O analista Christopher Dembik, do Saxo Bank, acrescenta que “a resposta de emergência à pandemia só veio acelerar o acumular de dívida, com a dívida pública a subir, provavelmente, para mais de 120% do PIB em 2021” e, num cenário gravoso, a dívida privada pode subir mais 20 pontos percentuais – “subindo ao ritmo mais rápido entre todos os países da Europa“.
Os riscos são mais do que muitos. Apesar de um pacote de estímulos massivos, a valer cerca de 100 mil milhões de euros e garantias públicas de crédito até 90% dos créditos das empresas, “França pode não conseguir evitar uma vaga de falências, já que muitas empresas do setor dos serviços podem não sobreviver à sucessão de períodos de confinamento alternados com períodos de desconfinamento”, avisa o banco multinacional sediado na Dinamarca.
A crise pode chegar aos bancos franceses, que já sofrem com as taxas de juro baixas e com a ameaça da digitalização, e estes podem chegar a uma situação em que a ajuda pública é necessária. E, aí, “tendo em conta o estado frágil das contas públicas e o nível de dívida já extraordinariamente elevado, França pode não ter alternativa que não dirigir-se à Alemanha, de chapéu na mão”, diz o Saxo Bank – sim, porque sendo França a segunda maior economia da zona euro, falar num “resgate” europeu a França é o mesmo que falar num “resgate” alemão a França, mesmo que estejamos apenas a falar de um resgate apenas “monetário”, isto é, feito através do Banco Central Europeu (BCE).
Revolução na energia pode estar iminente, mais do que imaginamos
“O mundo necessita urgentemente de uma disrupção na tecnologia energética“, resume o Saxo Bank. Uma inovação verdadeiramente disruptiva na área energética, que coloque a Humanidade numa situação de verdadeira abundância energética é o elemento fulcral para permitir que as economias e os índices de produtividade cresçam a níveis próximos do que cresceram nos últimos séculos. O Saxo Bank lamenta que, na sua leitura, “as novas alternativas de energias renováveis não são, globalmente falando, a resposta que procuramos” e a verdadeira “revolução” poderá estar iminente.
“Em 2021, os algoritmos avançados de inteligência artificial podem fazer progressos na solução das complexidades super-não-lineares da física de plasmas, o que abrirá caminho à energia de fusão [nuclear] para uso comercial“, afirma Peter Garnry, responsável máximo do Saxo para a estratégia de investimento em ações. O analista refere o reator desenhado pelo MIT – o SPARC – que foi validado neste ano de 2020 e que se apoia num modelo de inteligência artificial. Como recentemente escreveu o The New York Times, poderá ser possível, finalmente, replicar a forma como o Sol produz a energia que liberta. Foram boas notícias que passaram despercebidas, este ano, devido à pandemia.
Caso esta tecnologia “funcione mesmo”, como dizem os especialistas citados pelo The New York Times, o Saxo Bank acredita que haverá “investimentos massivos dos setores público e privado” que podem viabilizar esta aposta energética “em poucos anos”. “O domínio da energia de fusão [nuclear] abre a possibilidade de um mundo que deixa de ser limitado por escassez de água ou alimentos, graças à dessalinização e à agricultura vertical. É um mundo com transporte barato, robótica plenamente aproveitada e tecnologia de automação, fazendo desta a última geração que tem de trabalhar por necessidade“, acredita o banco de investimento.
Além de ajudar a resolver o problema das alterações climáticas e das emissões de CO2, a energia de fusão nuclear “permitirá que quase todos os países se tornem autossuficientes do ponto de visa alimentar e energético, o que dará lugar à maior e mais rápida melhoria dos padrões de vida que algum dia foi testemunhada“, acredita o Saxo Bank. Até lá, os investidores devem ajustar as suas carteiras a uma perspetiva de que “deixem de soprar os ventos” que têm suportado os investimentos em energias renováveis, como a energia eólica.
Até à “revolução” energética, porém, a prata pode ser uma “hot commodity“
Por muito promissoras que sejam as notícias em torno da potencial “revolução” da energia de fusão nuclear, os próximos anos vão ser ainda marcados por fortes investimentos nas energias renováveis mais tradicionais – é uma prioridade dos investimentos europeus para relançar as economias após a pandemia e é, também, uma prioridade do Presidente-eleito nos EUA, Joe Biden. E, na opinião dos estrategas do Saxo Bank, o investimento em prata, nos mercados de commodities, pode ser uma aposta certeira em 2021.
Caso se confirme o cenário antecipado pelo Saxo, de que se tudo correr bem com a vacina poderá registar-se uma subida abrupta das taxas de inflação, “os responsáveis políticos podem demorar a reagir a isso, querendo garantir que é dado o maior apoio possível às economias”. O que é que isso tenderá a provocar? Uma corrida dos investidores em direção aos investimentos em ativos reais, como as mercadorias (commodities).
Se cada onça de prata vale, atualmente, cerca de 24 dólares (eram menos de 13 dólares em março), o Saxo acredita que este valor irá mais do que duplicar em 2021, para um máximo histórico de 50 dólares por onça. O movimento positivo poderá não ser exclusivo da prata, entre as commodities e os metais preciosos, mas é na prata que o Saxo Bank vê maior potencial porque tem não só o uso como metal precioso mas, também, uma forte valência na utilização industrial – desde logo, na produção das células fotovoltaicas que são usadas na produção de painéis solares.
É nesse ponto que a prata pode emergir como a grande aposta nos mercados de ativos reais em 2021, já que se pode gerar uma escassez de oferta perante uma procura associada ao facto de vários grandes blocos económicos mundiais estarem empenhados em cumprir as metas ambientais que traçaram.
O ano em que os “mercados-fronteira” e “emergentes” podem dar o “salto”
O principal analista do Saxo Bank para a estratégia no mercado cambial, John Hardy, tem um palpite: “Em 2021, os economistas vão descobrir que o potencial de crescimento económico em muitos mercados-fronteira e mercados emergentes foi escandalosamente subestimado nos últimos anos”. “Mercados-fronteira” são, na gíria dos mercados financeiros, as economias que estão um nível abaixo dos “mercados emergentes”: países como Bahrein, Bangladesh, Burkina Faso, Guiné-Bissau, Costa do Marfim, Quénia, Kuweit, Marrocos, Roménia, Eslovénia e Vietname, entre muitos outros.
É nestes países que, com o apoio de algumas inovações importantes como a distribuição de Internet de banda larga por satélite, se poderá testemunhar “uma aceleração na produtividade em setor privado que será algo como nunca vimos nos países desenvolvidos nas últimas décadas“. Recorde-se que a SpaceX, empresa de Elon Musk, conta ter 1.500 satélites Starlink operacionais até ao final de 2021 e essa generalização do acesso à Internet sem necessidade de cabos de fibra ótica irá beneficiar estes mercados-fronteira (e os emergentes), nas áreas da educação e da produtividade empresarial.
E não serão apenas estes os setores à beira uma “explosão”. Nesses países, o crescimento económico será dinamizado pela “revolução em curso” dos pagamentos digitais e do dinheiro eletrónico, “que já deram a milhares de milhões de pessoas acesso à economia digital através dos seus dispositivos móveis. E uma terceira inovação decisiva para estes mercados, diz o Saxo Bank, é a tecnologia dos drones, que vão mesmo “revolucionar os sistemas de entregas” mas, também, terá aplicações na agricultura, beneficiando as práticas em muitas zonas rurais sub-desenvolvidas – é aí que se podem ver gigantes ganhos de produtividade em que vale a pena os investidores tentarem aproveitar.
Nova moeda digital da China provoca “mudança tectónica” nos fluxos de capitais mundiais
Outra notícia que passou praticamente despercebida em 2020: o PBOC, o banco público da China, criou nos últimos meses uma moeda digital baseada na tecnologia blockchain, que será complemento (e, possivelmente, um dia, um substituto) do yuan/renminbi que é usado na segunda maior economia do mundo. Esse foi um anúncio que levou a que também o Banco Central Europeu (BCE) abrisse consulta pública a ideias sobre como a Europa pode criar um instrumento semelhante.
Vem aí o euro digital. O vírus vai matar as moedas e notas (e ameaçar os bancos)?
Segundo dados citados por Steen Jakobsen, o chief investment officer do Saxo, que coordena anualmente estas “Outrageous Predictions”, em 2019 80% de todos os pagamentos feitos na China foram feitos através das plataformas WeChat Pay e AliPay. “O PBOC quer dar um novo passo em frente, a este nível, e beneficiar a eficiência da política monetária e orçamental através de uma sociedade cada vez mais cashless [sem dinheiro físico] que ajude também a inclusão financeira”, escreve Steen Jakobsen.
E qual pode ser o passo seguinte? “O próximo passo natural será que a China utilize a sua moeda digital no processo de abrir a conta de capital do país ao exterior, que atualmente é fortemente restringida”, diz o Saxo Bank – o que pode ser uma evolução tão mais marcante quanto mais os outros bancos centrais, como a Reserva Federal dos EUA ou o BCE, demorarem a tomar iniciativas equivalentes.
Através da moeda digital, poderá estar mais próxima a “permissão de um acesso pleno, por parte de estrangeiros, aos mercados de capitais chineses” já que retiraria a “barreira” que é a necessidade de recorrer aos yuan/renminbi comuns para fazer investimento e comércio na China. No limite, o Saxo Bank acredita que esta é uma evolução que acabará por tornar o yuan chinês (neste caso, o digital) uma “alternativa atrativa ao dólar norte-americano” nas transações globais, o que poderá causar uma “mudança tectónica” nos fluxos de capitais mundiais e impossibilitará aos EUA usar o “dólar como uma arma”, como o Saxo acredita que acontece nos dias de hoje.
Conselho de investimento? Apostar na queda do valor do dólar, a longo prazo e comprar ações e obrigações chinesas.