O académico subiu ao palco, frente a uma plateia onde estavam uma mão-cheia de banqueiros, os líderes das principais instituições financeiras do país. O académico, professor de Economia na London School of Economics (LSE), começou a discursar sobre um tema em relação ao qual, “de um modo geral, a banca portuguesa parecia estar um pouco a leste…”, recorda em conversa com o Observador. Isso foi surpreendente, diz, porque aquilo de que se falava era algo com potencial para abalar todo o modelo de negócio dos bancos – dos seus bancos. E, agora, está prestes a tornar-se realidade: o BCE prepara-se para lançar um euro digital que, além de ser uma ameaça existencial para os bancos, irá acelerar a morte do dinheiro físico (e anónimo), transformando as notas e moedas em pouco mais do que peças de museu.

Este professor chama-se Ricardo Reis e o episódio passou-se no final de janeiro, na Fundação Champalimaud em Lisboa, num evento organizado pela Associação Portuguesa de Bancos (APB) para falar sobre o futuro da banca. Foi em janeiro, antes de a pandemia tomar de assalto toda a atenção política e mediática – mas as tendências de que falava Ricardo Reis e a palestra que deu até acabaram por ser um prenúncio de um algo que o próprio vírus acabaria por acelerar: o fim do dinheiro físico. Será um dos temas em discussão, estas quarta e quinta-feira, no Fórum anual do Banco Central Europeu que costuma acontecer em Sintra mas que este ano será online.

“É expectável que, na próxima década, seja possível que o dinheiro em espécie venha mesmo a desaparecer”, concorda a gestora de ativos lisboeta Sixty Degrees, que em agosto fez um relatório aprofundado sobre este tema. Mas a questão das notas e moedas é apenas uma pequena parte daquilo que está em causa: conforme aquilo que acabar por ser decidido, o lançamento de uma moeda digital pode ameaçar o papel de intermediário que os bancos há vários séculos desempenham na sociedade, fazendo a ponte entre o banco central (emissor de moeda) e o cidadão. Para uns é uma inevitabilidade, para outros é um gigantesco risco para a estabilidade financeira que tem de ser gerido com pinças.

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