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Dois mil e quatrocentos milhões de euros. É essa a dimensão do plano de medidas anti-inflação preparado pelo Governo de António Costa para atacar a escalada dos preços dos últimos meses. Além de algumas medidas “soltas” tomadas nos últimos meses, como a redução da carga fiscal sobre combustíveis, a atenuação do impacto da subida do preço do gás na produção de eletricidade, através do teto ibérico e o apoio alimentar de 60 euros para os mais vulneráveis, faltava a António Costa um número redondo que pudesse exibir. Que sobe para quatro mil milhões de euros se juntarmos os 1600 milhões das medidas que entraram em vigor no primeiro semestre. Um verdadeiro pacote, assinado, embrulhado e entregue, à semelhança do que têm vindo a fazer outros países da União Europeia. Alguns vão já na segunda ou na terceira volta.
Cortes no IVA, descontos nos transportes ou travões a uma possível subida desenfreada das rendas têm sido algumas das opções dos congéneres europeus. Os estados-membros da UE têm sido “mãos largas” na distribuição de apoios, que totalizam largas dezenas de milhões de euros. O plano português, mais modesto em valor face à maior parte dos pacotes já apresentados, mimetiza algumas das medidas já adotadas por toda a Europa. Setor a setor, veja como os países europeus têm estado a tentar travar a “bomba social prestes a explodir”. E como fica Portugal em comparação.
Energia e combustíveis
É o setor que mais preocupa a Europa, por motivos óbvios. A guerra na Ucrânia fez disparar os preços da energia, e fez com que os estados-membros percebessem que têm um sério problema entre mãos, devido à falta de independência energética. E obrigou os países a tomar medidas.
Na Alemanha foi aplicado um corte de 30 cêntimos por litro na gasolina e de 14 cêntimos no gasóleo. O país também avançou para a redução do IVA do gás, de 19% para 7%, que vai entrar em vigor em outubro e vigorará até março de 2024.
Em Espanha não têm faltado medidas neste setor. O país vizinho foi o que mais recentemente avançou para o corte do IVA do gás, de 21% para 5%, ao abrigo da diretiva europeia que permite que os estados-membros o façam sem autorização prévia de Bruxelas, desde que seja cumprido o limite de categorias de bens com taxa reduzida de IVA. A medida arranca em outubro e vai estender-se até ao final do ano e deverá custar aos cofres espanhóis 200 milhões de euros. De acordo com a imprensa espanhola, deverá traduzir-se numa poupança de 19 euros na fatura mensal dos consumidores.
Além do IVA do gás, Espanha já tinha decidido reduzir, primeiro de 21% para 10% e, em junho, para 5%, o IVA da eletricidade. Segundo os cálculos do Governo espanhol, a medida mais recente significa uma poupança de cerca de seis euros nas faturas dos espanhóis.
Nos combustíveis, mais apoios em França. Depois de ter decidido prolongar desconto aplicado ao preço final dos combustíveis desde abril, o governo francês optou por aumentá-lo, de 18 para 30 cêntimos por litro, em setembro e outubro. A partir desse mês, será reduzido progressivamente. Na fatura energética das famílias, o governo francês vai manter, pelo menos durante 2023, o chamado “escudo tarifário” sobre os preços do gás e da eletricidade. Sem esta medida, os franceses pagariam mais 120 euros de eletricidade a partir de janeiro, segundo avançou este fim de semana o ministro do Orçamento, Gabriel Attal.
Em Itália, entre as medidas já decididas e em vigor está o corte do IVA do gás para 5% e a eliminação dos custos do sistema elétrico para todos os consumidores com potência contratada inferior a 16,5 kWh.
Segundo a Reuters, o novo plano italiano também poderá impedir as empresas de energia de avançar para mudanças unilaterais aos contratos até abril de 2023.
Nos combustíveis, o governo de Draghi reduziu o preço da gasolina em 25 cêntimos e foi criado um fundo de 800 milhões de euros de apoio ao setor automóvel, bem como apoios à instalação de renováveis. No início do ano, foi concedido um crédito fiscal de 20% aos eletrointensivos que tivessem tido um aumento de 30% nos custos com energia em comparação com 2019.
Na Bélgica, o corte do IVA do gás e da eletricidade para 6% foi decidido logo em fevereiro e março. Deveria vigorar até ao final do ano mas, entretanto, já foi decidido prolongar a medida até ao final do primeiro trimestre de 2023.
O governo belga deu ainda às famílias mais vulneráveis um cheque mensal para descontar na fatura da luz, primeiro de 80 euros e, mais tarde, de 100 euros. Também protegeu as famílias ao proibir as alterações unilaterais aos contratos de energia. Foi também atribuído às famílias um cheque extra, de 200 euros, para lares aquecidos a combustível. Já os impostos sobre os combustíveis foram reduzidos em 17,5 cêntimos por litro.
Desde o início da crise, a Grécia já criou vários subsídios para ajudar as famílias e pequenas empresas a arcar com a subida dos custos com eletricidade. Começou nos nove euros, passando depois para 18 e mais tarde para 42. No total, os subsídios absorvem cerca de 89% do valor dos aumentos. O governo estima que o apoio reduza em cerca de 600 euros a fatura anual das famílias com eletricidade. Desde o início do ano que as famílias recebem ainda 20 euros mensais para compensar o aumento do preço do gás. Também foram tomadas medidas relativas aos combustíveis, nomeadamente a atribuição de vouchers de 100 euros.
O que fez Portugal?
Tal como outros países, o Governo decidiu baixar o IVA da eletricidade para 5%. Mas, ao contrário dos outros países, para quem a descida é geral, em Portugal será apenas para quando estiver em causa a taxa intermédia de 13%, ou seja, quando o consumo de eletricidade que não exceda 100 kWh, num período de 30 dias, para consumidores com potência contratada até 6,9 kVA. Deverá estar em vigor entre outubro e dezembro.
Além desta medida, as restantes já eram conhecidas, por já terem sido apresentadas ou por serem um prolongamento de medidas já em vigor. É o caso da aprovação do diploma que permite aos consumidores de gás natural regressar à tarifa regulada e do relançamento do programa da “bilha solidária”, que dá 10 euros às famílias de baixos rendimentos para subsidiar a compra de garrafas de gás. E nos combustíveis, mantém-se o congelamento da taxa de carbono até ao final do ano e o desconto em sede de ISP, assim como a devolução do IVA nestes produtos.
Apoios Sociais
O governo alemão decidiu que o subsídio para famílias com filhos vai aumentar, em 18 euros, para quem recebe 219 euros mensais pelo primeiro e segundo filhos. Será pago a partir de 01 de janeiro de 2023 por um período de dois anos.
Em Espanha, os estudantes também foram beneficiados com um aumento das bolsas em 100 euros, para os que já recebem apoios.
Em França, foi determinado um aumento antecipado de 4% das pensões e outras prestações sociais, bem como das bolsas de estudo para estudantes com mais dificuldades. As medidas sociais incluem ainda um “cheque alimentação” de 100 euros, destinado às famílias mais vulneráveis, que aumenta em 50 euros por cada filho. Em França, os estudantes de famílias mais vulneráveis vão ainda continuar a ter refeições um euro no ano letivo 2022-2023.
Nos apoios sociais, as famílias carenciadas em Itália têm recebido cheques para ajudar ao pagamento dos crescentes custos com energia. A mais recente revisão do plano prevê que um cheque de 200 euros, que até agora era pago às famílias com rendimentos anuais inferiores a 35 mil euros, passará a abranger as restantes famílias.
O que fez Portugal?
Foram as medidas mais sonantes das apresentadas por António Costa. Tal como os cidadãos de outros países, também os portugueses vão receber transferências diretas de dinheiro para ajudar a suportar os aumentos. Serão 125 euros para cada contribuinte, não pensionista, que ganhe até 2700 euros brutos mensais. A este apoio, acrescem, para quem tem filhos, 50 euros por cada dependente.
Que medidas pode adotar para poupar energia (e dinheiro) em cada uma das divisões da casa?
Transportes
Na Alemanha, o apoio aos transportes é um dos mais volumosos. O plano alemão inclui a manutenção dos passes locais e regionais por nove euros, que esteve em vigor no verão e vai manter-se, e terá um custo de 1,5 mil milhões de euros. Deverá ser ainda criado um bilhete que permitirá deslocações a nível nacional por um valor que oscilará entre 49 e 69 euros.
Os transportes também foram visados em Espanha, com a criação de bilhetes gratuitos da Renfe para curtas e médias distâncias, até ao fim do ano, e de descontos para os restantes transportes públicos, entre 30% e 60%.
No capítulo dos transportes, os franceses passaram a receber uma “indemnização carburante”, entre os 100 e os 300 euros, atribuída aos trabalhadores que não tenham alternativa ao carro para chegar ao local de trabalho.
O que fez Portugal?
Não haverá transportes grátis nem mais baratos. O Governo limitou-se a congelar o valor do passe social urbano e dos bilhetes da CP para 2023.
Habitação
A Alemanha vai ainda alargar o número de pessoas elegíveis para receber subsídios à habitação, de 700 mil para cerca de 2 milhões de pessoas.
Na habitação em Espanha, está prevista a construção de 12 mil casas em Madrid, 60% das quais serão habitação pública. Além de estar limitada, até ao fim do ano, a subida das rendas, a 2%.
Em França também há medidas na habitação, com o governo a impor um teto à subidas das rendas, de 3,5%, abaixo da inflação, até outubro de 2023.
O que fez Portugal?
António Costa adotou exatamente a mesma medida que Espanha no que toca às rendas. O Governo decidiu aprovar uma norma travão, que congela o aumento das rendas a 2% em 2023. Os senhorios terão compensações em sede de IRC e IRS.
Pensões
A Alemanha vai ainda atribuir uma prestação única de 300 euros aos pensionistas e uma de 200 euros aos estudantes.
Em Itália, o próximo plano de ajudas deverá incluir um aumento das pensões mais baixas.
Na Grécia, os pensionistas que receberam, em abril, um cheque de 200 euros, pago de uma só vez.
O que fez Portugal?
Aqui, Portugal tomou decisões já a pensar em 2023. Os pensionistas vão receber, em outubro, o pagamento direto, de uma só vez, de um valor correspondente a metade da sua reforma mensal. Esta transferência será, na prática, um adiantamento daquilo que deveriam receber em 2023 se fosse aplicada a fórmula em vigor. Mas a proposta para 2023 vai prever uma atualização mais baixa do que a indexada à inflação, entre 3,53% e 4,43%.
Custos e financiamento
Depois de já ter apresentado dois pacotes de apoios, o mais recente no início de agosto, a Alemanha voltou à carga este fim de semana, com um programa verdadeiramente ambicioso, em volume e dimensão. Avaliado em 65 mil milhões de euros, inclui medidas emblemáticas, como uma taxa sobre os lucros extraordinários das empresas de energia. Será esse montante que servirá, em parte, para financiar os restantes apoios. Este pacote de 65 mil milhões junta-se a medidas de 30 mil milhões de euros adotadas desde o início da crise inflacionista.
Em Espanha, no total, as medidas fiscais aplicadas ao setor energético, que incluem ainda a suspensão do imposto sobre a geração elétrica, custam dois mil milhões de euros a cada três meses. Numa entrevista publicada esta segunda-feira pelo jornal Expansion, a ministra espanhola da Transição Ecológica, Teresa Ribera, diz que o Governo tem 20 mil milhões de euros destinados a baixa a fatura da luz.
No total, as medidas anti-inflação apresentadas pelo Executivo de Pedro Sanchéz ascendem a cerca de 30 mil milhões de euros. Uma parte destes apoios são financiados pelo pelos impostos extraordinários, e temporários, aplicados aos setores financeiro e energético. Será aplicada uma taxa aos juros e comissões dos bancos, que deverá render 800 milhões de euros anuais até 2024, aos quais acrescem 1,5 mil milhões a arrecadar via taxa que será aplicada sobre as receitas das energéticas.
A batalha de França contra o aumento dos preços também tem um número redondo: 20 mil milhões de euros. O país liderado por Emmanuel Macron adotou, no início de agosto, um plano de medidas de alívio que incide em aumentos dos salários e pensões e em descontos na energia. Mais recentemente, o Governo admitiu não excluir a criação de uma taxa sobre os lucros excessivos das empresas de energia. Só o “escudo tarifário” custou já ao Estado francês 24 mil milhões de euros, que ascendem aos 20 mil milhões do pacote de ajudas.
Itália é um dos países que mais despendeu, até ao momento, para minimizar o impacto da inflação no bolso das famílias. No total, Itália já desembolsou mais de 50 mil milhões de euros. Em cima da mesa está um novo plano, de 10 mil milhões de euros, que está preso pelos arames devido às eleições antecipadas em Itália, marcadas para 25 de setembro. O montante tem vindo a subir, essencialmente, pela constante ampliação temporal de medidas já tomadas.
Para ajudar a financiar os apoios, Itália adotou a taxa sobre os chamados “lucros caídos do céu”, aplicável às empresas produtoras de eletricidade, que passou de 10% para 25%. No entanto, várias empresas não pagaram a parcela da taxa devida em junho, de 40%, pelo que ficaram em atraso cerca de nove mil milhões de euros, dos 10 a 11 mil que deveriam ter sido recebidos. Na resposta, Mario Draghi disse que esse adiantamento seria agravado em 30% se fosse pago até 31 de agosto, e de 60% depois dessa data.
A Bélgica é um dos mais recentes estados-membros a admitir taxar os “lucros caídos do céu” das empresas de energia. A hipótese foi levantada pelo primeiro-ministro, Alexander de Croo, na apresentação de medidas de poupança de energia. A proposta deverá ser entregue no final de setembro. As medidas para aliviar o aumento das energia custaram, até ao momento, cerca de 1,3 mil milhões.
Oito mil milhões de euros é, para já, o número mágico da Grécia, no que toca ao valor gasto para travar o impacto da inflação nas famílias. Mas poderá crescer, já que no próximo dia 10 são esperadas novas medidas.
O que fez Portugal?
No total, são 2400 mil milhões de euros em ajudas às famílias, que se juntam a 1600 milhões em medidas já adotadas ao longo do ano. Portanto, quatro mil milhões de euros em 2022. Segundo o primeiro-ministro, o valor não será suportado pelo orçamento da Segurança Social mas pelas receitas do Orçamento do Estado.