A entrevista de Miguel Pinto Luz à Rádio Observador foi combinada quando ainda não se sabia que seria escolhido por Luís Montenegro para ser vice do PSD — e foi concedida minutos depois de o anúncio ter sido feito. O recém-anunciado vice aproveitou, assim, para elogiar a nova equipa e os que fizeram “sacrifícios” e abdicaram das suas “ambições pessoais” — tudo em nome da coesão do partido e de deixar para trás os tempos “quase das trevas” (leia-se, de Rui Rio) em que era promovido o culto do “pensamento único”.
O convite, revela Pinto Luz nesta entrevista, foi feito neste mesmo sábado, enquanto decorria o congresso, que servirá para preparar o que deve ser um “ciclo longo”, de quatro anos. Aviso a quem tiver a tentação de fazer oposição interna: “Quem estiver numa atitude taticista à espera de uma escorregadela ou que isto corra mal está a prestar um mau serviço ao partido”. Para já, é preciso dar “tempo” ao PSD de Montenegro — o mesmo que chegou a enfrentar em eleições internas — para se organizar e conseguir fazer “abanar as pernas” de António Costa.
Ouça aqui a entrevista a Miguel Pinto Luz na íntegra.
Quando o convidámos para esta entrevista ainda não tínhamos a informação de que seria vice-presidente. Agora queríamos pedir-lhe uma primeira análise a estes nomes.
Sentimos claramente que se iniciou um novo ciclo no PSD. Esta abordagem de abertura, de agregar, não fica só na palavra: fica nos atos. É uma equipa absolutamente eclética que vai buscar todos. Houve convites, como percebemos, que foram recusados, se não ainda tinha sido mais abrangente. Penso que o PSD sai mobilizado. Os que tinham ambições para outros voos tiveram de dar passos ao lado, passos atrás, porque há algo que os militantes não podem esquecer: o país está primeiro, sempre. Todos temos de fazer sacrifícios. E hoje saem daqui equipas reforçadas: o presidente da Câmara de Lisboa estar a liderar o Conselho Nacional é muito relevante; o Paulo Rangel ter aceitado ser primeiro vice; o Miguel Albuquerque ser o presidente da Mesa do congresso; todos os outros nomes mais jovens; a Maria Luís Albuquerque — que bom tê-la outra vez disponível depois de ter sido quase maltratada por este PSD! É bom hoje podermos dizer que se respira um ar mais oxigenado no PSD e que estamos absolutamente motivados para a batalha que temos de fazer.
É uma junta de salvação nacional que era indispensável para combater o PS em eleições futuras?
O PSD hoje lidera as regiões autónomas, tem seis eurodeputados, mais de cem câmaras, mais de um terço dos deputados… O PSD não deixou de ser grande, não alinho nessa narrativa.
Mas precisa de poder.
O PSD precisa, de uma vez por todas, de permitir que vozes diferentes possam estar no mesmo espaço. O PS faz isso há muitos anos, e bem. Nós desaprendemos isso.
É a fórmula Durão Barroso.
Era a grande vantagem do PSD, lembro-me da capacidade que tínhamos de as várias tendências estarem representadas. Não estamos a falar de unanimismo, mas de capacidade de juntar. E Luís Montenegro teve essa capacidade, e cada um dos protagonistas teve a capacidade de dizer que agora é o momento de Portugal falar mais alto, e para isso o PSD tem de falar primeiro.
Perguntava se era o regresso da fórmula Barroso, que chamou Santana Lopes para primeiro vice, e se é uma forma de eficazmente evitar a guerrilha interna e de mostrar humildade democrática.
Durão Barroso não foi só buscar Santana Lopes, faça-se justiça: foi buscar para o governo Marques Mendes, que tinha sido seu opositor. Pedro Passos Coelho fez algo similar com Aguiar Branco, com o próprio Paulo Rangel… Essa é a cultura democrática saudável. Não temos de ter um pensamento único e somos maiores quando temos a capacidade de juntar vários.
Como foi o convite? Montenegro ligou-lhe há pouco tempo, têm vindo a conversar?
Foi hoje, durante o congresso. Temos vindo a conversar muito, claro… Sou amigo de Luís Montenegro há muitos anos. Tivemos divergências, mas somos feitos da mesma massa.
Impôs alguma condição?
Nenhuma, nem quis saber qual era a equipa. Quis saber qual era o projeto e porque é que ele me queria.
Vai ter algum pelouro específico?
Isso é algo que Montenegro dirá a seu tempo. Os órgãos só são eleitos amanhã.
A Comissão Política é muito grande, existe a comissão permanente para ser mais executiva e eficaz. Mas além de todos os vices juntar-se-ão os presidentes do Movimento Acreditar, do Conselho Estratégico Nacional, etc. Não criará uma grande cacofonia, sem um órgão diretivo coeso e sem fugas de informação?
A comissão permanente do doutor Passos Coelho, de que me lembro bem, também tinha o coordenador autárquico, vários outros elementos… É uma decisão que coube sempre aos líderes. Parece-me razoável que assim seja. Quanto a fugas de informação, vocês poderão dizer se Montenegro não teve capacidade de deixar alguma surpresa, com este anúncio. Eu acho que sim.
Isto não é também uma forma de Montenegro condicionar a oposição interna? Estão aqui alguns dos que poderiam ser seus opositores naturais no futuro.
Esse não é o tema que nos preocupa. Estou absolutamente imbuído desta vontade incontornável de o PSD voltar a governar o país e penso que isto é um ciclo longo, não é curto. Quem estiver numa atitude taticista à espera de uma escorregadela ou que isto corra mal está a prestar um mau serviço ao partido. Hoje é preciso olhar o partido a quatro anos e não a ciclos curtos. Ciclos longos garantem que temos a capacidade de explicar ao eleitorado as nossas medidas e diferenças — o que Rui Rio não foi capaz de fazer. Montenegro foi claro ao dizer que o nosso programa eleitoral era bom, mas ficou concluído a dias de umas eleições legislativas. Como é que se consegue preparar a mensagem ao ritmo absolutamente alucinante que hoje vivemos nos media? Não é possível. Temos de ter tempo, pela primeira vez, no PSD. É preciso alguma humildade. É preciso que os que tinham outras ambições pessoais as coloquem de lado por um valor maior, que é Portugal.
Com Rangel na vice-presidência não é possível encontrar outro candidato às europeias, certo?
Isso é tudo extemporâneo. Vamos aguardar pelo dia de amanhã, entrar em funções, e teremos tempo para discutir todos esses temas. Hoje, o PSD mostrou a sua força e o doutor António Costa abanou as pernas na semana passada. O PS percebeu que terá um PSD forte pela frente.
Gostava de o ouvir sobre o discurso que fez antes de se saber que será vice, atacando Rui Rio. Disse que não estava ali para um ajuste de contas, mas foi o que acabou por fazer, ou não?
O que fiz é algo que é preciso fazer: uma instituição, uma família, um ser humano que não aprende com os seus erros denota um sinal de pouca inteligência e sabedoria. Passar um pano por aquilo que se passou seria um erro para o PSD. Fui ali dizer que não podemos passar por um período quase das trevas, em que há os bons e os maus, divisionista, sectário. Costas voltadas, não.
[Veja a entrevista de Miguel Pinto Luz à Rádio Observador, durante o 40º Congresso do PSD:]