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Descreve-se como “homem de esquerda” e não poupa críticas à direita. Polémico, chegou a chamar “gangster” a Cavaco Silva. Homem do aparelho socialista, começou no Bloco, mudou-se para o PS e tornou-se líder da concelhia do PS/Porto depois de ter feito todo o percurso na Jota. Esteve envolvido numa polémica sobre moradas falsas de militantes. Nega tudo.
Como dirigente socialista no Porto admite a hipótese de o PS vir a apoiar a recandidatura de Rui Moreira à câmara. Não se compromete mas, perante as críticas que se vão sentido no interior do PS, lamenta o “tribalismo” de alguns militantes. Tiago Barbosa Ribeiro, deputado socialista, coordenador do grupo parlamentar do PS para as áreas do Trabalho e da Segurança Social, em entrevista ao Observador, diz que o atual mandato autárquico é “positivo”.
O apoio do PS a Rui Moreira. Críticas? Um reflexo tribal
Como líder da concelhia, passará também por si o apoio ao futuro candidato à Câmara do Porto. Como analisa o primeiro mandato de Rui Moreira?
Tem sido um excelente mandato. Um mandato no qual a cidade denota uma clara viragem face aquilo que foram os 12 anos anteriores. Além disso, o PS tem vindo a deixar a sua marca nos pelouros que tutela e revê-se na globalidade no trabalho que está a ser feito pelo executivo e na visão que o presidente Rui Moreira tem tido para a cidade.
Manuel Pizarro disse não ter dúvidas de que haveria abertura dos socialistas para apoiar uma recandidatura de Rui Moreira. A concelhia do PS/Porto acompanha o líder da federação nesta matéria?
Eu também não tenho dúvidas de que há abertura dos socialistas para apoiar o candidato Rui Moreira. Mas essa decisão não está tomada.
Mas houve dentro do partido quem classificasse as declarações de Pizarro com um “erro”…
Essas declarações não foram atribuídas a ninguém. Eu lia-as, mas o PS ainda não combate fontes anónimas. Sei que algumas pessoas já se pronunciaram de forma contrária ao papel que está a ser desempenhado pelo PS. Em 2013, [também o fizeram]. É uma opção que lhes assiste.
A hipótese de referendar a opção “Rui Moreira” está a ser equacionada?
Já ouvi falar sobre o referendo, já ouvi falar sobre outras opções. Será o método com que o PS se sentir confortável. Mas por mais respeitáveis que sejam as opiniões que têm vindo a ser manifestadas não representam a generalidade daquilo que é o sentimento do PS/Porto.
A coligação na Câmara Municipal do Porto não é artificial e existe proximidade política e pessoal entre as pessoas que a constituem. Nos próximos meses, o PS, em articulação com todas as suas estruturas — e, se for o caso, com o próprio Rui Moreira — tomará uma decisão.
Não seria estranho se o PS não apresentasse um candidato próprio à Câmara do Porto?
O PS vai certamente apoiar um candidato à Câmara do Porto…
Mas Rui Moreira não é militante do PS.
O PS já apoiou candidatos que não eram militantes socialistas. Não vejo a vida política como um conjunto de fórmulas fechadas. Nós colocamos sempre a cidade à frente de outro tipo de interesses. Fazer bem o nosso trabalho não é fazê-lo em função da visão que algumas pessoas possam ter da vida partidária. Se a vida partidária não servir a sociedade, não serve para nada.
O PS tem condições para vencer estas eleições apresentando um candidato das suas fileiras? Tem sido dito que seria difícil para o PS travar Rui Moreira. Daí, este possível apoio…
Eu percebo a incapacidade que algumas pessoas têm de viver a vida partidária fora dos limites estritos do partido em que militam. As pessoas são muito tribais, são muito ciosas do seu espaço. Mas importa perceber se esse tribalismo serve a manutenção da força social dos partidos. Na minha opinião, não serve.
Se o atual mandato autárquico é positivo e se representa aquilo que é a expectativa do PS/Porto para a cidade, torna-se até caricato colocar as questões em termos de pequena disputa de aparelho entre o candidato A, B ou C, quando neste momento existe uma coligação que representa a visão que o PS tem para o Porto.
Sentiu-se de alguma forma condicionado pelas declarações de Manuel Pizarro?
Não há pressão. Isso é ficção. Manuel Pizarro disse uma coisa que é compreensível para todos os portuenses. E às vezes quem não consegue perceber aquilo que os portuenses percebem não consegue perceber qual o papel que o PS deve ter no Porto.
Apoiar um candidato como Rui Moreira, um candidato apoiado pelo CDS, não é algo contraditório para este PS?
Não me parece que haja nenhum tipo de contradição. Se existe uma visão que distingue aquilo que foram os últimos anos da coligação na Câmara, de que o CDS também faz parte, é porque neste momento existe uma dinâmica positiva. São opções com as quais o PS se sente confortável e portanto é em torno dessas opções que vamos continuar a trabalhar.
Em 2015, no entanto, o PS/Porto chegou mesmo a ensaiar um diálogo com Bloco, PCP e vários movimentos de esquerda. Não há condições para repetir no Porto a mesma fórmula que foi escolhida no Parlamento?
Essa discussão em torno de uma eventual fórmula de mercearia não foi realizada de forma alguma e seria até absurdo fazê-la neste momento. Ainda assim, este caminho que foi feito a nível nacional é um caminho que tem muita margem para ser reproduzido a nível local no futuro.
A direita “radicalizou-se” e entregou-se à “hipocrisia”
Foi um dos primeiros socialistas a defender um acordo alargado à esquerda. Acredita que este era um passo que faltava ser dado na democracia portuguesa?
Era um dos passos que faltava para desbloquear uma situação atípica. A esquerda vivia um bloqueio histórico que fazia uma coisa extraordinária: oferecia sempre as condições de governabilidade à direita, precisamente por não se entender.
O PS sempre foi um partido de eliminação de muros na sociedade portuguesa. Essa esquerda vivia no PREC. Quando todo o mundo avançou, quando o muro de Berlim caiu, nós mantivemo-nos presos a um atavismo que não servia nem a esquerda, nem o PS, nem o país.
Esteve na fundação do Bloco, descreve-se com um homem de esquerda, tem um discurso mais colado à esquerda. Porquê o PS e não o Bloco? Por ser um partido que tem mais ambição de poder e de ser poder?
Eu acompanhei a formação do Bloco de Esquerda na minha adolescência. Não é necessariamente ambição de poder. Sou um homem de esquerda, sou um social-democrata, no sentido do socialismo-democrático. E o PS é o partido que melhor representa aqueles que são os valores em que acredito.
Faz parte da ala mais à esquerda do PS e é um dos socialistas mais assertivos nas críticas à direita. Ainda acha que Cavaco Silva é um gangster?
Não. Essa situação na altura foi um excesso de linguagem escrita nas redes sociais que foi rapidamente clarificada. Esse episódio ficou sanado e pedi desculpa a quem de direito. No entanto, faço uma avaliação muito negativa dos seus mandatos como primeiro-ministro e Presidente da República.
Por outro lado, chegou a comparar a direita portuguesa à direita representada por Donald Trump, nos Estados Unidos. Acha que faz sentido pôr as coisas nos mesmos pratos?
Espero que não. Mas não deixo de registar que a direita portuguesa se radicalizou. A direita falsifica a realidade. Há uma dimensão de hipocrisia muito grande quando a direita vem falar de aumento do salário mínimo ou de problemas de Segurança Social. A direita é hipócrita quando vem falar de pobreza entre os idosos, quando vem falar de sustentabilidade da Segurança Social, quando fala em preocupações do código de trabalho. Acho que o debate político tinha muito a ganhar se a direita dissesse ao que vinha ao invés de se tentar esconder atrás de máscaras venezianas.
“Não existe um problema de sustentabilidade da Segurança Social”
Ainda recentemente PSD e CDS desafiaram o PS a conduzir uma verdadeira reforma da Segurança Social. Traçado este diagnóstico, o PS deve, ainda assim, estar disponível para essa negociação?
Essa reforma tem de partir de um diagnóstico e o diagnóstico que PSD e CDS fazem atualmente é errado. Se PSD e CDS, quando falam de reforma de Segurança Social, estão a falar de cortes na Segurança Social disfarçando-os de reformas, então não contam com o PS para isso.
Mas essa reforma não é indispensável para garantir a sustentabilidade da Segurança Social?
Não existe um problema de sustentabilidade da Segurança Social. Essa sustentabilidade está resolvida. É mais um papão que a direita quer alimentar.
O que não é possível é separar o problema da Segurança Social da quantidade e da qualidade de emprego que temos em Portugal. Não podemos garantir a sustentabilidade da Segurança Social portuguesa se tivermos uma geração a viver em casa dos pais até aos 30 anos, sem expectativa de futuro. Sem trabalho de qualidade e sem trabalho digno não é possível termos uma Segurança Social equilibrada.
Mas como é que se consegue isso respeitando ao mesmo tempo as regras orçamentais, por exemplo?
Nós fomos tecendo ao longo dos últimos anos a camisa-de-forças que agora nos querem vender. Nós cosemos essa camisa-de-forças. Os tratados têm de ser questionados. Os tratados são opções políticas, não existem por ordem natural. Não imagino Portugal fora do sonho europeu e do ideal europeu. Agora, o que nós não acompanhamos é o ideal do Excel. O Excel não é neutro.
E se essa Europa do Excel não mudar?
Não nos podem dizer que este caminho é “o” caminho. Aliás, o Governo português tem comprovado que existem alternativas. É possível compatibilizar o respeito por determinados compromissos, mesmo lutando pela sua mudança.
Ainda assim, mesmo dentro de portas, o Governo tem sido acusado de alguma falta de “realismo”. Como analisa as críticas do Conselho de Finanças Públicas (CFP) ao Programa de Estabilidade?
As opiniões do Conselho de Finanças Públicas são obviamente respeitáveis, mas não são ideologicamente isentas. Não espero que o CFP esteja de acordo com uma política orçamental que rompe com o ciclo a austeridade no país. O CFP elogiou a política orçamental de Passos Coelho, que falhou os seus objetivos, deixou um enorme défice para sanear e aumentou exponencialmente a dívida. O nosso caminho é o da consolidação com crescimento, mantendo intocáveis os compromissos do Estado e isso inclui salários e pensões.
A ascensão polémica e as acusações de caciquismo
Em 2010, quando era líder da concelhia do Porto da JS, vivia, alegadamente, com 20 militantes no mesmo apartamento. Essas duas dezenas ter-se-iam filiado quase todos ao mesmo tempo. Parecia ser mais um caso de caciquismo e fichas irregulares… Como justifica esta coincidência?
Conheço essa história e na altura foi devidamente desmentida. Não é nenhuma coincidência. É uma situação absolutamente falsa. São as consequências laterais de quem trabalha politicamente. Os aparelhos nem sempre são coisas saudáveis e existem, infelizmente, alguns ataques.
Ataques internos?
Com certeza.
Não há qualquer documentação que prove que essas vinte pessoas viviam naquela morada?
Não. Na altura foi solicitada inclusivamente uma listagem com essas moradas que nunca apareceu.
Ao longo dos últimos anos tem havido denúncias de chapeladas eleitorais, baseadas em esquemas de falsificação de moradas, fichas irregulares, pagamento de quotas, etc. Reconhece que esta realidade existe?
Existem más práticas em todas as organizações. Há sempre esse potencial. As organizações [partidos, incluídos] têm de ser completamente ferozes no combate a essas práticas. Mas combatê-las tem os seus custos. Quem tenta muitas vezes combater essas práticas fica sujeito ao que essas práticas implicam.
No PS/Porto havia este tipo de práticas? Tentou combatê-las?
Não havia, de forma alguma. Mas esses problemas existem e entendo que os partidos têm de encontrar formas de os resolver. Nenhum partido pode estar fechado sobre essas práticas.