391,65 euros. Foi este o montante que a Fundação José Berardo recebeu por via de consignações dos IRS de 2019 e 2020. Os valores foram revelados ao Observador por fonte oficial da Autoridade Tributária (AT), que diz que vai pedir esses montantes de volta, uma vez que a entidade perdeu o estatuto de IPSS (Instituição Particular de Solidariedade Social).
“A Autoridade Tributária está a promover a correção e regularização das situações de consignações de IRS verificadas nesses anos”, garantiu a mesma fonte ao Observador. Na lista de entidades passíveis de receberem uma percentagem do IRS deste ano, a entidade foi retirada, depois do Observador ter questionado o Governo pela inclusão da Fundação José Berardo numa primeira versão.
Retirada da lista deste ano, referente ao imposto a declarar de 2021 (cujas declarações estão agora a ser apresentadas), faltou a regularização referente aos dois anos anteriores.
E, segundo revelou a AT, a entidade foi beneficiada:
Em 2019, de três consignações de IRS, no montante total de 219,43 euros;
Em 2020, de duas consignações de IRS no montante total de 172,22 euros.
Esse valor está agora a ser reclamado por parte da Autoridade Tributária à própria Fundação. Isto porque o Fisco acabou por confirmar a “declaração de cancelamento do registo da Fundação José Berardo como IPSS no âmbito da segurança social da RAM” e, como tal, “procedeu-se à retirada da mesma das lista [de consignações de IRS] de 2019, 2020 e 2021”. Paralelamente, acrescenta fonte oficial, “a AT está a promover a correção e regularização das situações de consignações de IRS verificadas nesses anos.”
O valor total foi, nesses dois anos, de 391,65 euros. Nas declarações deste ano já não foi possível consignar à Fundação do investidor madeirense.
219,43 €
Pelo ano de 2019, a Fundação José Berardo recebeu de consignações de IRS um total de 219,43 euros.
172,22 €
Pelo ano de 2020, a Fundação José Berardo recebeu de consignações de IRS um total de 172,22 euros.
Isto apesar de, num primeiro momento, o nome da Fundação ainda constar nas entidades elegíveis. A AT explicou ao Observador que “aquando da apresentação do pedido para integrar a lista das entidades beneficiárias para efeitos de consignação do IRS, a Fundação José Berardo demonstrou cumprir os respetivos requisitos, tendo à data o estatuto de IPSS”. Só que em 2019 a entidade perdeu esse estatuto e não informou a AT.
Segundo o Fisco, “as entidades são responsáveis por comunicarem à AT a perda dos requisitos para a inclusão naquela lista”.
Caso as entidades beneficiárias da consignação não reúnam em qualquer dos anos subsequentes ao requerimento inicial as condições exigidas para poderem beneficiar da consignação da coleta do IRS, devem comunicar esse facto à Autoridade Tributária e Aduaneira (AT) até 31 de dezembro do ano a que respeita a coleta a consignar”, determina a portaria (298/2013, de 4 de outubro) que regulamenta estas consignações.
A Autoridade Tributária informa o Observador que, “no presente caso, tal não se verificou, não tendo a AT recebido qualquer comunicação nesse sentido”, acrescentando por outro lado que “esta entidade, por ter sede na Região Autónoma da Madeira (RAM), não constava ab initio da lista atualizada das IPSS divulgada pela Segurança Social a nível nacional”. Esta já tinha sido a resposta dada pela entidade quando o Observador questionou, em março, a inclusão da Fundação José Berardo na lista inicial para as consignações a declarar este ano.
Valor residual para a Fundação José Berardo
Apesar da Fundação José Berardo já não poder pedir consignações em sede de IRS, certo é que no bolo total destas entregas pelos contribuintes a entidade com sede no Funchal é uma gota no oceano.
Segundo dados revelados ao Observador pela Autoridade Tributária, em 2019, foram consignados 23,1 milhões de euros em sede de IRS por mais de 897 mil agregados familiares, beneficiando 4.198 entidades. Já em 2o20, foram consignados 26,3 milhões de euros por cerca de um milhão de agregados, beneficiando 4.393 entidades.
Decorre agora o período de entrega das declarações de IRS referentes ao ano de 2021. Só depois de tratadas as declarações e feita a respetiva liquidação do imposto é que é feito “o apuramento dos montantes da consignação para cada uma das entidades beneficiárias”, explica o Fisco ao Observador, garantindo que “estes montantes da consignação serão pagos às entidades beneficiárias até 31 de março de 2023, o prazo estipulado por lei”.
Fundação José Berardo em extinção
A Fundação José Berardo perdeu o estatuto de IPSS em finais de 2019. O Instituto da Segurança Social da Madeira (ISSM) procedeu ao cancelamento do registo como IPSS, por “falta de exercício, durante um período de três anos, de atividades necessárias à realização dos fins de segurança social”. Numa auditoria realizada pela Inspeção-Geral das Finanças, concluia-se que, em 2017, o valor afeto aos fins estatutários equivalia apenas a 0,1% dos ativos, ou seja, 599 mil euros, tendo a IGF identificado “despesas sem conexão com as finalidades de cariz social da fundação/IPSS e/ou em benefício direto de familiares do fundador (250 mil euros), sem enquadramento nos estatutos e na lei”.
No âmbito dessa inspeção da IGF sugeria-se à Presidência do Conselho de Ministros que cancelasse o estatuto de utilidade pública de que a fundação beneficiava, o que também foi feito, segundo noticiou o Público.
Depois de todos estes procedimentos, o Governo, tal como o Observador noticiou no início do ano, avançou com o processo de extinção da Fundação José Berardo, o que aconteceu, pela primeira vez, em relação a uma fundação privada. O procedimento administrativo com vista à extinção foi iniciado oficiosamente a 5 de janeiro de 2022.
Governo vai extinguir Fundação Berardo. É a primeira vez que o Estado acaba com uma fundação privada
O advogado da Fundação José Berardo, Paulo Saragoça da Matta, afirmou ao Observador, depois da decisão do Governo, que esse é um procedimento ilegal e injusto.
Fundação Berardo notificada da intenção de extinção que diz ser injusta e ilegal