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Este artigo foi inicialmente publicado a 23 de setembro do ano passado por causa do furacão Maria, mas foi atualizado a propósito do furacão Florence.
É o quarto ano consecutivo em que a época das tempestades tropicais começa mais cedo do que o normal. Os meteorologistas assumem que a temporada dos furacões no Atlântico arranca a 1 de junho e termina a 30 de novembro. Este ano, no entanto, a tempestade Alberto veio mais ou menos uma semana mais cedo do que era expectável (a 25 de maio) com ventos a soprar a 105 quilómetros por hora. Só um mês depois é que outra tempestade, a Beryl, se haveria de formar. Mas mesmo assim 2018 já voltou a bater recordes: Beryl tornou-se no primeiro furacão a nascer no mês de julho no Atlântico desde o Bertha em 2008. Chris, que veio depois, foi o segundo maior da temporada desde 2005. E desde 1974 que não havia uma época com mais de três tempestades subtropicais.
No ano passado, em abril, os alertas dos meteorologistas também começaram imediatamente a preocupar os especialistas: o ciclone tropical Arlene crescia a olhos vistos e fazia prever uma época de furacões pior do que estávamos habituados. A partir de junho até final de setembro, as desconfianças confirmaram-se: das catorze depressões tropicais verificadas no Atlântico, treze transformaram-se em tempestades e quatro passaram a furacões de grande dimensão, com categoria igual ou superior a 3.
Ainda a época ia a meio e estas que são as tempestades mais perigosas da Terra, já tinha feito 234 mortes e causado estragos na ordem dos 133 mil milhões de dólares. Tudo isto ainda sem contar com o rasto de devastação que o furacão Maria haveria depois de deixar pelo caminho: nas contas finais, o Maria matou 3.057 pessoas e causou prejuízos de mais de 91 mil milhões de dólares. Alguns números, nomeadamente os da devastação deixada em Porto Rico, só há semanas foram conhecidos.
Governo de Porto Rico reconhece que o número de mortos do furacão supera os 1.400
Este ano, já em setembro, o Gordon começou por fazer estragos. Mas foi agora, quando o Florence começou a ganhar proporções de “besta” e colocou em risco zonas com mais de de milhões de pessoas, que todos os alarmes e alertas voltam a a ser acionados. Com um percurso raro e difícil que o poderia tornar no maior furacão a chegar mais a norte dos EUA e o mais “devastador das últimas décadas”, já deixou cerca de dois milhões de pessoas deslocadas num êxodo contra “cheias catastróficas e a colocar vidas em risco” na Carolina do Norte e do Sul e também na Virginia, e até na própria capital, Washington. Depois de ter diminuído de intensidade e mudado várias vezes de direção nas últimas horas, o Florence aparece esta quinta-feira a descer a costa leste do Estados Unidos e já com categoria 2.
Furacão Florence pode atingir zonas onde vivem mais de 10 milhões de pessoas
Nada disto era normal antes, mas também nem mesmo os cientistas acreditam que estes fenómenos se possam justificar apenas pelas alterações climáticas em curso. E isso é ainda mais assustador: porque ninguém sabe de facto o que está a acontecer.
Há, no entanto, respostas que os especialistas já conseguiram obter nos últimos 166 anos de observação de furacões. Já compreenderam como se formam, porque é que são tão devastadores, que percursos costumam fazer e quando podem ser mais perigosos. Ainda assim, nos próximos anos, avizinham-se mais interrogações do que soluções, como provam os estudos.
O que é um furacão?
E como é que se chamam os seus manos mais novos
Os furacões são as tempestades mais perigosas e devastadoras que podem ocorrer no planeta Terra. De acordo com o Centro Nacional de Furacões, a entidade da Administração Oceânica e Atmosférica norte-americana especialista neste tipo de fenómenos, os furacões são “ciclones tropicais com ventos que viajam a uma velocidade mínima de 119 km/h“, isto é, movimentos rotativos da atmosfera em torno de um centro que ocorrem em águas tropicais e subtropicais. Ciclones desta natureza extraem energia térmica da água do mar quando esta se encontra a uma temperatura igual ou superior a 27 ºC; e depois transportam-na para as regiões mais altas da troposfera — a mais interna de todas as camadas da atmosfera –, onde a temperatura é muito mais baixa.
Essa extração e transporte de energia térmica ocorre nas regiões com baixa pressão atmosférica, como explica a Corporação Universitária para a Investigação Climatérica. Quando a pressão atmosférica num determinado local é mais baixa do que nos arredores, o ar começa a mover-se para as regiões de menor pressão e depois sobe formando uma coluna ascendente de ventos. À medida que sobe, o ar em movimento arrasta consigo vapor de água que condensa e dá origem a nuvens, que giram em torno do centro de baixa pressão atmosférica.
Para que saibam se um ciclone tropical é ou não um furacão, os cientistas medem as velocidades dos ventos que se verificam nesses locais, explica o Instituto Português do Mar e da Atmosfera:
Quando ar em movimento não sopra a mais de 63 km/h estamos perante uma depressão tropical.
Se a pressão atmosférica no centro do ciclone tropical continuar a diminuir, o ar vai movimentar-se cada vez mais rápido: se o vento começar a soprar a uma velocidade de entre 64 km/h e 118 km/h forma-se uma tempestade tropical.
Se a tempestade tropical evoluir, com a pressão atmosférica a tornar-se cada vez mais baixa no centro, os ventos podem ultrapassar os 119 km/h. Nessas condições, estamos perante um furacão.
Como é que eles se formam?
São 5 as condições para que um furacão nasça
Para que os furacões se formem é necessário que estejam a acontecer, em simultâneo, cinco fenómenos, descreve o Instituto Português do Mar e da Atmosfera:
Um ciclone tropical (uma região de pressão atmosférica mais baixa e temperatura à superfície mais alta do que nas vizinhanças) a perturbar a atmosfera.
Que esse ciclone tropical ocorra num oceano quente em que as águas estejam a uma temperatura igual ou superior a 27 ºC.
Que isso aconteça numa extensão de pelo menos 50 metros de profundidade.
Que o ciclone tropical se mantenha durante um longo período de tempo.
Que os níveis de humidade sejam muito altos nas regiões mais inferiores da troposfera e que o vento sopre a baixa velocidade e sem muitas variações de intensidade e direção nas camadas mais altas da troposfera.
Tudo começa quando há uma grande diferença de temperaturas entre duas massas de ar na atmosfera, explica a ferramenta NASA SpacePlace, da agência espacial norte-americana: aquela que está mais próxima às águas quentes oceânicas e aquela que está em níveis mais superiores da troposfera, significativamente mais fria. Quando isso acontece, forma-se uma corrente de convecção: o ar mais quente junto à superfície oceânica sobe por ser mais denso, enquanto o ar mais frio das camadas superiores da troposfera desce por ser menos denso.
Sempre que uma massa de ar quente sobe dá origem a uma região de baixa pressão atmosférica, em que o peso exercido pelas moléculas de ar na superfície diminui porque elas são arrastadas para outro lado. Como a pressão atmosférica nessa região é muito mais baixa do que nas regiões em seu redor, o ar começa a movimentar-se em direção ao centro de baixa pressão para compensar a falta de moléculas atmosféricas naquele local. No entanto, ao chegar a essa região, o vento vindo das vizinhanças aquece e também ele sobe ao longo de uma coluna de ar, intensificando o fenómeno.
Enquanto tudo isto acontece, a água do mar começa a evaporar e a subir pela coluna de ar por estar muito quente. Ao encontrar-se com a massa de ar mais frio que compõe as camadas mais altas da troposfera, o vapor de água começa a condensar e a originar nuvens densas que, arrastadas pelas correntes de ar em convecção, começam a girar em torno do centro de baixa pressão atmosférica. Entretanto, o fenómeno de condensação — a passagem do estado gasoso para o estado líquido — leva à libertação de muita energia térmica que “alimenta” o ciclone tropical e diminui ainda mais a pressão atmosférica nesse local.
Quanto mais diminuir a pressão atmosférica no centro do ciclone tropical, mais velozes se tornam os ventos que o compõem porque vai sugar o ar que está nas vizinhanças com pressão atmosférica mais alta. Se esses ventos ultrapassarem os 118 km/h, o ciclone tropical passa a chamar-se furacão.
Porque é que os furacões giram em sentidos contrários nos dois hemisférios?
A rotação da Terra e uma coisa chamada efeito Coriolis
No hemisfério norte, os furacões giram no sentido contrário ao dos ponteiros do relógio. No hemisfério sul, no entanto, ocorre exatamente o contrário: os furacões giram no mesmo sentido que os ponteiros do relógios. Esse comportamento é em parte motivado pelo efeito Coriolis, uma “força aparente que que desvia as partículas de ar para a direita no hemisfério norte e para a esquerda no hemisfério sul”, como define o Instituto Português do Mar e da Atmosfera.
O seu efeito está relacionado com o movimento de rotação da Terra em torno do próprio eixo, da velocidade do ar ao deslocar-se de regiões de maior pressão atmosférica para outras de menor pressão atmosférica e da latitude. O vento nasce sempre que uma massa de ar sai de uma região de maior pressão atmosférica para entrar numa região de menor pressão atmosférica. Esse movimento do ar não ocorre, no entanto, em linha reta e ninguém conseguia explicar porquê. No século XIX, o matemático francês Gustave Coriolis afirmou que o segredo estava exatamente na rotação da Terra.
Para entender este efeito, imagine que um avião parte do polo norte para uma viagem de 12 horas até Quito, no Equador. Ao longo dessa viagem de 12 horas já a Terra terá completado metade do movimento de rotação em torno do próprio eixo. Isso significaria que, se o avião rumasse em direção ao Equador sempre em linha reta e sem qualquer desvio, no final da viagem ele não iria aterrar em Quito, mas antes em Sumatra, na Indonésia. Qualquer pessoa que visse o avião a passar concluiria que o avião estava a rumar a sul, mas o movimento de rotação da Terra criaria a ilusão de que o avião estaria a viajar para sudoeste para quem estivesse dentro do aparelho. Essa ilusão é o efeito Coriolis.
É precisamente isto que ocorre no caso dos ventos, explica a Divisão de Investigação de Furacões da Administração Oceânica e Atmosférica dos Estados Unidos. Embora os ventos tentem mover-se em linha reta das áreas de maior pressão atmosférica para entrar numa região de menor pressão atmosférica, eles serão sempre desviados pelo efeito Coriolis: no hemisfério norte os ventos são desviados para a direita, enquanto no hemisfério sul eles são desviados para a esquerda.
Quando uma zona de baixa pressão atmosférica começa a formar-se a norte do Equador, o ar vai movimentar-se para dentro dessa zona para tentar compensar a falta de partículas atmosféricas mas será desviado para a direita, começando a girar no sentido contrário ao dos ponteiros do relógio. Mas se uma zona de baixa pressão atmosférica começar a formar-se a sul do Equador, o ar será desviado para a esquerda e começará a girar no sentido dos ponteiros do relógio.
Como é a estrutura de um furacão?
Do olho às bandas de precipitação
O olho é a parte central do ciclone tropical em torno do qual giram as nuvens que compõem o furacão e onde se verificam as pressões atmosféricas mais baixas e as temperaturas mais altas de todo o fenómeno meteorológico. A uma altitude de 12 quilómetros podem registar-se temperaturas até 10 ºC mais quentes do que nas regiões vizinhas, embora na superfície essa diferença esteja entre os dois e os 3 ºC. O clima é tão pacífico lá dentro que pode ser possível observar o céu e, durante a noite, ver estrelas. O olho do furacão pode ter ter entre oito e 200 quilómetros de diâmetro, mas a maior parte não ultrapassa os entre 30 e 60 quilómetros de comprimento, explica o Laboratório Meteorológico e Oceanográfico do Atlântico.
Em torno do olho do furacão está a parede do olho, descreve a mesma fonte. É nessa região que ocorrem os movimentos de convecção em que as massas de ar mais quente ascendem por serem menos densas, enquanto as massas de ar mais frias descem por serem mais densas. A parede do olho é, portanto, onde se verificam os ventos mais velozes e devastadores. E é o resultado da acumulações de nuvens do tipo cumolonimbus que se formam quando o vapor de água vindo do mar condensa ao encontrar as massas de ar frio nas regiões mais altas da troposfera.
A terceira e última parte de um furacão são as bandas de precipitação, que são como braços de nuvens em espiral que saem da parede do olho e giram em torno do centro da tempestade, explica o Instituto Português do Mar e da Atmosfera. Essas nuvens giram no sentido contrário ao ponteiro dos relógios no hemisfério norte e no sentido dos ponteiros do relógio no hemisfério sul porque a direção do movimento está à mercê dos ventos, que por sua vez são influenciados pelo efeito Coriolis. São regiões onde costuma chover muito.
Qual é a altura do ano mais propícia à formação de furacões e porquê?
A época só termina em novembro
Chama-se época dos furacões à altura do ano em que é mais provável o desenvolvimento de furacões. Segundo a Administração Oceânica e Atmosférica dos Estados Unidos, a época dos furacões no oceano Atlântico começa oficialmente a 1 de junho e termina a 30 de novembro. Este período foi estabelecido porque, embora os furacões se possam desenvolver fora destas datas, estima-se que 97% deles nasce, evolui e morre nesse intervalo de tempo.
No entanto, o período só está em vigor desde 1965. Antes disso, e desde 1935 quando o Serviço Nacional de Meteorologia renovou os sistemas de alerta de furacões, a época dos furacões estava estabelecida entre 15 de junho e 15 de novembro. Durante todo este tempo, os cientistas já conseguiram olhar mais pormenorizadamente para o fenómeno dos furacões. Descobriram que 78% das tempestades tropicais, 87% dos furacões mais fracos (categorias 1 e 2) e 96% dos furacões mais fortes (categorias 3, 4 e 5) ocorrem durante os meses de agosto, setembro e outubro. O pico de atividade mais alto foi encontrado em meados de setembro. Ou seja, aquele em que ocorreu o Harvey, o Irma e a Maria em 2017; e agora o Florence em 2018.
Estas alturas são as mais propícias ao desenvolvimento de furacões porque ocorre a maior a diferença entre a temperatura do ar junto à superfície dos oceanos e a temperatura do ar nas camadas mais superiores da troposfera. A época dos furacões no Atlântico não coincide, no entanto, com o pico de maior atividade de ciclones tropicais nos outros oceanos. A este do Pacífico, por exemplo, a altura mais propícia para a formação de furacões começa em finais de maio e início de junho e arrasta-se até ao final de outubro e início de novembro. Oficialmente, as autoridades estabeleceram que a época dos furacões no Pacífico Este começa a 15 de maio e termina a 30 de novembro. Mas a maior parte dos ciclones tropicais nascem e desenvolvem-se no final de agosto e início de setembro.
No Pacífico Oeste, a época dos furacões não existe oficialmente porque os ciclones tropicais podem ocorrer em qualquer altura do ano. Sabe-se, ainda assim, que a quantidade de ciclones tropicais diminui em fevereiro e nas duas primeiras semanas de março e que são mais prováveis de julho a novembro, com especial incidência em finais de agosto e início de setembro.
Em média, quantos furacões existem por ano?
Do ano terrível de 1950 até agora
No Atlântico Norte, estima-se que haja em média 12 tempestades tropicais batizadas, seis furacões de categoria 1 ou 2 e dois furacões de categorias igual ou superior a 5 por ano. Estes dados foram publicados pelo Laboratório Meteorológico e Oceanográfico do Atlântico depois de terem quantificado as tempestades tropicais e furacões desde 1851 até 2017.
Julga-se que em 1950 se registou o maior número de furacões de categorias superior (3, 4 ou 5): terão sido oito. O ano com a época de furacões mais ativa terá sido 1886, com sete furacões a chegar aos Estados Unidos. Estes dados, no entanto, podem não corresponder totalmente à realidade porque só a partir dos finais do século XIX e início do século XX é que os cientistas começaram a monitorizar as tempestades tropicais que se formam no oceano e nunca chegam a terra. Informações mais precisas só começaram a ser registadas a partir de 1944, quando um sistema aeronáutico começou a identificar ciclones tropicais e perturbações com potencial para evoluírem para tempestades tropicais e furacões. O sistema foi melhorado em 1966 porque o National Hurricane Center começou a seguir perturbações atmosféricas com recurso a enxames de satélites, tornando os dados estatísticos muito mais certeiros.
Onde é que eles se formam e porquê?
É em Cabo Verde que quase todos nascem
Conforme explica a Corporação Universitária para Pesquisa Atmosférica, os furacões formam-se em latitudes mais baixas, isto é, nas regiões imediatamente mais a norte ou mais a sul do Equador. Há dois motivos para que isso aconteça: em primeiro lugar porque é nos trópicos que as águas oceânicas são mais quentes, uma das condições obrigatórias para a formação de ciclones tropicais; e em segundo lugar porque esta é uma das regiões mais ventosas do mundo, algo que está relacionado com o facto de, no Equador, a Terra girar em torno do próprio eixo muito mais depressa do que nos polos.
A maior parte dos furacões mais intensos que nascem no Atlântico têm origem perto das ilhas de Cabo Verde, a 600 quilómetros do oeste do Senegal. Isso acontece quando uma onda tropical — uma região de baixa pressão atmosférica — se forma na savana africana durante a estação das chuvas e se dirige para o Oceano Atlântico, onde se encontra com as águas quentes ao largo do continente africano e se transforma em ciclone tropical. De acordo com o Gabinete de Resposta e Restauração da Administração Oceânica e Atmosférica Nacional, o deserto do Saara tem um importante papel neste processo, que é necessário para distribuir a energia térmica das zonas mais quentes para as mais frias, em latitudes maiores.
Esse papel está relacionado com os ventos do leste criados pela diferença de temperaturas entre o ar quente e seco do norte de África e o ar mais frio e húmido vindo do Golfo de Guiné no oeste da África. Quando o ar quente sobe e o ar frio desce por causa dessa diferença de temperatura cria-se uma corrente de ar em movimento que se chama “African Easterly Jet”: quanto mais constante ele for, menos furacões vão ser criados no oceano.
No entanto, essa corrente de ar raramente é constante e estável. Se o ar em movimento também for húmido, as partículas de água suspensas nas massas de ar mais quentes vão condensar quando chocam com as massas de ar mais fria, formando nuvens tempestuosas e que podem originar um ciclone tropical caso se encontrem com as águas quentes do Atlântico.
Quais são as regiões mais fustigadas por furacões e porquê?
Há sete berços de ciclones tropicais na Terra e o muro dos Açores
Segundo contas da Administração Oceânica e Atmosférica norte-americana, feitas por uma ferramenta chamada International Best Track Archive for Climate Stewardship, os países mais fustigados por ciclones tropicais são os Estados Unidos, a China, as Filipinas, o México, o Japão, Cuba, Austrália, Bahamas, Vietname e Madagáscar.
São estes os países que costumam estar no percurso dos furacões que se formam num dos sete berços de ciclones tropicais do planeta — a bacia do Atlântico, a bacia do Nordeste do Pacífico, a bacia do Noroeste do Pacífico, a bacia do Norte do Índico, a bacia do Sudoeste do Índico, a bacia do Sudeste do Índico, a bacia Australiana e a bacia do Sudoeste do Pacífico, enumera a Administração Oceânica e Atmosférica Nacional.
O percurso dos furacões é determinado pelos padrões globais do vento e principalmente pelas seis correntes que sopram pela atmosfera fora (três em cada hemisfério): durante o verão do hemisfério norte eles sopram para norte e durante o verão do hemisfério durante eles sopram para sul. É como se os furacões fossem a folha de uma árvore à mercê do vento. De acordo com a Divisão de Investigação de Furacões, nas latitudes tropicais os ciclones tropicais geralmente movem-se para o oeste por causa de um eixo de alta pressão atmosférica (crista subtropical) junto ao paralelo 30º que se chama Alta dos Açores, uma espécie de muro. É por isso que os furacões raramente sobem em direção ao polo e chegam à Europa e costumam chegar até ao outro lado do Atlântico.
Como é que os furacões são batizados?
Seis listas, com 21 nomes cada e os proscritos
Até ao início dos anos 50, os furacões não recebiam nomes: eles tinham uma espécie de nome de código com o ano em que nasciam e a ordem para a qual evoluíam. Esse mecanismo provou-se pouco prático, conta a Administração Oceânica e Atmosférica Nacional, por isso a partir de 1953 os Estados Unidos começaram a batizar tempestades tropicais com nomes femininos. Em 1978, as tempestades tropicais no Pacífico também passaram a ser batizados com nomes tanto masculinos como femininos, algo que um ano depois também se começou a praticar para o Atlântico.
Agora, as tempestades tropicais do Atlântico são batizadas com nomes que constam em seis listas de nomes criadas pelo National Hurricane Center. Essas listas são organizadas, mantidas e atualizadas através de um comité internacional da Organização Meteorológica Mundial através de regras muito apertadas. Essas seis listas são recicláveis e usadas num regime de rotação, de tal modo que os nomes que constam na lista de 2018 vão ser os mesmos que serão usadas daqui a seis anos, em 2024. Cada uma das listas tem 21 nomes. Se houver mais do que 21 tempestades tropicais, qualquer uma que ocorra depois de todas essas recebem o nome de uma letra do alfabeto grego — Alfa, Beta, Gamma, Delta e por aí adiante.
Essas listas podem, no entanto, ser modificadas. Sempre que uma tempestade tropical se torna muito mortífera ou destruidora, o seu nome é retirado por “razões de sensibilidade”. Essa decisão cabe à Organização Meteorológica Mundial, que escolhe outro nome para o substituir a partir do ano seguinte. Alguns dos nomes de furacões que foram retirados ao longo dos anos foram Andrew (1992), Mitch (1998), Dennis (2005), Katrina (2005), Irene (2011), Sandy (2012) ou Matthew (2016). Em 2017, por causa da gravidade que os furacões tiveram, saíram da lista os nomes Harvey, Irma, Maria e Nate.
Para este ano foi estabelecida a seguinte lista de nomes: Alberto, Beryl, Chris, Debby, Ernesto, Florence, Gordon, Helene, Isaac, Joyce, Kirk, Leslie, Michael, Nadine, Oscar, Patty, Rafael, Sara, Tony, Valerie e William. Veja a lista completa neste link da Administração Oceânica e Atmosférica Nacional.
O que são as categorias dos furacões e que destruição causam?
Dos simples ventos fortes à destruição catastrófica
As categorias dos furacões são as escalas que medem a intensidade de uma tempestade tropical quando ela passa a ter ventos com velocidade igual ou superior a 119 km/h. Essa escala foi desenvolvida pelo engenheiro civil Herbert Saffir e pelo meteorologista Robert Simpson, conta o Instituto Português do Mar e da Atmosfera: estudando a velocidade dos ventos, os valores da pressão atmosférica e a elevação da nível médio da água do mar, a Escala Saffir-Simpson permite avaliar também o potencial de devastação de furacões colocando-os numa escala de cinco categorias.
Mas a Escala Saffir-Simpson vai mais longe: ela também prevê os estragos que se podem esperar dos furacões incluídos em cada uma das categorias. Essa descrição foi resumida pelo The COMET Program, uma ferramenta desenvolvida pela Corporação Universtiária para a Investigação Climatérica. Veja-a em completo aqui em baixo.
Em furacões de categoria 1, “ventos muito perigosos vão produzir alguns danos”: “Casas bem construídas e mais sólidas podem sofrer estragos nos tectos, telhados, revestimentos de vinil e calhas. Grandes galhos de árvores podem ser arrancadas e as árvores com raízes mais superficiais podem ser derrubadas. Danos extensos nas linhas elétricas podem resultar em cortes de energia que podem durar dias.
Em furacões de categoria 2, “ventos extremamente perigosos vão provocar danos profundos”: “Casas bem construídas e mais sólidas podem sofrer estragos significativos no telhado e revestimento. Muitas árvores com raízes mais superficiais vão ser arrancadas e atiradas para as estragadas, bloqueando várias estradas. O fornecimento de energia vai ser impossibilitado quase totalmente, provavelmente durante semanas”.
Em furacões de categoria 3, “vão ocorrer danos devastadores”: “Casas bem construídas e mais sólidas vão sofrer danos devastadores ou remoção total dos telhados e estragos nas arestas das paredes. Muitas árvores, mesmo com raízes mais profundas, vão ser arrancadas e atiradas para a estrada, bloqueando o trânsito. O fornecimento de energia e água pode ser impossibilitada durante várias dias ou semanas”.
Em furacões de categoria 4, “vão ocorrer danos catastróficos”: “Casas bem construídas e mais sólidas podem sofrer danos severos, com perda da maior parte da estrutura do telhado e de paredes exteriores. A maioria das árvores de raízes profundas será arrancada e os postes de eletricidade serão derrubados. Algumas áreas residenciais podem ficar inacessíveis e inabitáveis. A falta de energia e de fornecimento de água pode durante várias semanas ou meses”.
Em furacões de categoria 5, também se esperam “danos catastróficos”: “Uma grande percentagem de casas vai ser severamente destruída, com perda total do telhado e das paredes exteriores. A esmagadora maioria das árvores será arrancada e os postes de eletricidade vão ser varridos. As áreas residenciais vão ficar completamente isoladas pelos escombros. Quase todas elas podem tornar-se inabitáveis.
Qual é a diferença entre um furacão, um tufão, um ciclone e um tornado?
Uns são maiores, os outros muito mais rápidos
Os termos “furacão”, “tufão” e “ciclone” denominam todos o mesmo fenómeno meteorológico — o ciclone tropical –, mas a palavra que se aplica depende da região do planeta em que ele ocorre, explica o Instituto Português do Mar e da Atmosfera. Embora tenham algumas semelhanças, um furacão e um tornado não são a mesma coisa.
De acordo com o Instituto Português do Mar e Atmosfera, o termo “furacão” utiliza-se para tempestades tropicais no Oceano Atlântico Norte, Golfo do México, Caraíbas e região leste dos Estados Unidos. Diz-se “tufão” quando o fenómeno meteorológico ocorre no Oceano Pacífico Norte, na região Oeste dos Estados Unidos, Japão e China. O termo também pode ser utilizado nas Filipinas, embora aí também se chame “baguios”. Sempre que uma tempestade tropical evolui na região sudoeste do Oceano Pacífico, Austrália, Nova Zelândia ou Indonésia ela passa a chamar-se “ciclone”. Há, no entanto, outros termos equiparados a “furacão”, “tufão” e “ciclone”. Chama-se “tempestade ciclónica severa” se o fenómeno acontecer na região norte do Oceano Índico, Índia, Bangladesh e Paquistão. Caso a tempestade se desenvolva na região sudoeste do Oceano Índico, Madagáscar, Moçambique ou Quénia, ela é simplesmente batizada de “ciclone tropical”.
Segundo o Goddard Space Flight Center, o primeiro centro espacial laboratorial da NASA, as únicas duas semelhanças entre um furacão e um tornado são a estrutura e o facto de serem vórtices atmosféricos de ventos e nuvens em rotação. Mas ambos têm escalas diferentes, formam-se perante circunstâncias diferentes e têm impactos diferentes na natureza. Os tornados formam-se em terra quando, durante uma tempestade, uma massa de ar frio e uma massa de ar quente e húmido se encontram, fazendo com que a primeira desça por ser mais densa e a segunda suba por ser menos densa. Se esse ar quente for húmido, as partículas de água podem condensar, dando origem a nuvens.
Outra diferença fundamental entre um furacão e um tornado é a dimensão de um e de outro. Os centros dos furacões podem atingir centenas de quilómetros de diâmetro, enquanto os tornados não têm diâmetros que ultrapassem as centenas de metros. Apesar desta diferença de tamanho, os tornados são muito mais rápidos: enquanto a maioria dos furacões tem ventos sustentados na ordem dos 290 km/h, os tornados podem atingir os 500 km/h.
Quais foram os furacões mais devastadores e os mais mortíferos de que há registo?
O Bhola matou 350 mil, o Patricia chegou a ventos de 345km/h, mas o maior foi o Tip
O ciclone tropical mais mortífero de que há registo é o Ciclone de Bhola, que a 13 de novembro de 1970 matou estimadamente 350 mil pessoas em Bangladesh, afirma o Laboratório Meteorológico e Oceanográfico do Atlântico. O ciclone formou-se cinco dias antes no Golfo de Bengala e foi ganhando força à medida que avançava para norte. Na noite de 12 de novembro, poucas horas antes de entrar em Bangladesh, Bhola já tinha ventos sustentados de 185 km/h . A maior parte dos mortos foi provocada pelas inundações provocadas pela aproximação da tempestade tropical às ilhas do delta do rio Ganges.
Apesar de ter sido o fenómeno ciclónico mais mortífero de todos os tempos, ele não foi o mais intenso: na Escala Saffir-Simpson, Bhola equivale a furacão de categoria 3 — a mais baixa categoria de entre os furacões de grandes dimensões. Em termos de velocidade dos ventos, o furacão Patricia foi o mais veloz ciclone tropical do mundo, com ventos sustentados de 345 km/h. Teve origem na região este do Oceano Pacífico a partir de uma perturbação atmosférica, perto do Golfo de Tehuantepec, junto ao México. Formou-se a 20 de outubro de 2015 e dissipou-se quatro dias mais tarde, afetando o México, o estado do Texas e a América Central.
No entanto, o tufão Tip é considerado pela comunidade científica o maior e mais intenso ciclone tropical de que há registo. O fenómeno formou-se a 4 de outubro de 1979 e durou 20 dias. Ao longo desse período de tempo, e depois de ter passado Guam, Tip alcançou um diâmetro de 2.200 quilómetros, alcançou ventos a 305 km/h e provocou uma pressão de atmosférica de apenas 870 milibares, a mais baixo alguma vez encontrada. Afetou as Ilhas Carolinas, as Filipinas, a Península da Coreia, o Japão, o nordeste da China, a Rússia e o estado norte-americano do Alasca. Matou 99 pessoas.
Em termos de estragos, e olhando apenas para os ciclones tropicais registados no Atlântico, o furacão mais devastador em termos materiais foi o Katrina. Entre 23 e 31 de agosto de 2005, o furacão Katrina varreu as Bahamas, o sul e centro da Flórida, Cuba, Louisiana, Mississipi, Alabama e grande parte do este da América do Norte. Desde que se formou até se ter dissipado, o Katrina provocou estragos no valor estimado de 108 mil milhões de dólares e matou pouco menos de duas mil pessoas.
As alterações climáticas têm alguma influência na severidade dos furacões?
Intensidade pode aumentar 11%, mas ainda é cedo para conclusões
De acordo com o Laboratório de Dinâmicas de Fluidos Geofísicos, “é prematuro concluir que as atividades humanas – e particularmente as emissões de gases de efeito estufa que causam o aquecimento global – já têm um impacto detetável nos furacões do Atlântico ou na atividade de ciclones tropicais a nível global”. Isto não significa que as alterações climáticas não tenham influência na intensidade ou quantidade de tempestades tropicais no mundo, mas que, se existirem, essa influência “ainda não é observável devido à pequena magnitude dessas mudanças ou a limitações de observação”.
O futuro, no entanto, adivinha-se mais complicado: o mesmo estudo estima que as tempestades tropicais vão tornar-se entre 2 e 11% mais intensos até ao final do século XXI por causa do aquecimento global. Sem contar com o tamanho dessas tempestades — que o laboratório não conseguiu prever — isso significa uma percentagem ainda maior de furacões destruidores. O aquecimento global, que tem tornado a água do mar mais quentes do que devia, pode ainda traduzir-se no aumento do número médio de tempestades tropicais por cada época de furacões.
O que sabemos sobre o Florence?
O furacão que ainda não parou de ser intensificar
Os cientistas sabiam que o furacão Florence podia estar a caminho desde dia 28 de agosto, quando o Centro Nacional de Furacões disse que havia uma forte possibilidade de formação de ciclones tropicais por causa de uma onda tropical com origem na África Ocidental. A 30 de agosto, essa onda tropical — uma região alongada de pressão atmosférica baixa orientada de norte para sul mas que se mexe de este para oeste — deslocou-se pela costa do Senegal criando várias tempestades. A 1 de setembro, a depressão tropical fortaleceu-se e isso continuou a acontecer à medida que Florence avançava de oeste para noroeste no meio do Atlântico. A 4 de setembro já era o terceiro furacão da época.
Um dia depois, a 5 de setembro, Florence já era um furacão de categoria 3. E prometia tornar-se progressivamente mais forte: no próprio dia evoluiu para um furacão de categoria 4. Nunca antes se tinha observado um furacão com uma categoria tão alta tão a nordeste. Como a tempestade estava a tornar-se cada vez mais forte, o rumo do furacão moveu-se mais para norte e encontrou correntes de ar que o fortaleceram ainda mais. E embora depois tenha enfraquecido, em 30 horas voltou a evoluir e de uma mera tempestade passou novamente a furacão de categoria 4.
As últimas atualizações do furacão Florence dizem que ele pode chegar a terra, algures entre os estados norte-americanos de Carolina do Norte e Carolina no Sul já esta madrugada de quinta-feira, 13. Está ao sudeste das Bermudas e de Cabo Fear, Carolina do Norte. Florence tem ventos sustentados de 220 quilómetros mas com rajadas de 270 quilómetros por hora. Os efeitos da tempestade fazem-se sentir num raio de 280 quilómetros a partir do olho do furacão (curiosamente, a sua zona mais calma).