História
É frequente vê-lo pela Mouraria, mas parte da sua história anterior acontece circunscrita nas avenidas mais familiares de Lisboa. Leopoldo Calhau cresceu no Bairro de São Miguel, estudou na escola secundária Rainha Dona Leonor, já “bateu as ruas todas de Alvalade”. Talvez porque tendemos a regressar aos sítios que puxam as boas memórias, décadas corridas, foi aqui que acabou por encontrar a casa para o projeto que andava a ser pensado já desde os tempos da pandemia: “Este espaço é, sobretudo, uma garrafeira — uma garrafeira que serve comida”, explica ao Observador.
Taberna do Calhau. O Alentejo de Leopoldo aterrou no coração de Lisboa
O caminho que nos leva ao novíssimo Chez Chouette dura, aproximadamente, três minutos — o espaço é vizinho da redação do jornal. Foi, aliás, o programa “Mesa para Quatro”, que tem na Rádio Observador, que o fez dar de caras com a então disponível sala e cave no número 20A da Rua Acácio Paiva. Assim, das encostas do Castelo de São Jorge, onde mantém a Taberna do Calhau e Bla Bla Glu Glu, desce até Alvalade, para, com gosto e entusiasmo, estabelecer esta nova “loja de bairro”, que quer criar sinergias com os vizinhos.
Em breve, na porta ao lado, abrirá a mercearia, onde será possível encontrar muitos dos produtos utilizados na garrafeira — desde enchidos, a queijo, azeite ou mel. “Vamos ter, maioritariamente, produtos portugueses e franceses, apesar de algumas exceções”.
A relação com a cultura francófona, presente em todas as vertentes deste seu novo projeto, já lhe era conhecida (a namorada é belga, e o filho é metade belga, metade português), mas torna-se aqui mais evidente. Desde logo através do nome: “Chouette em francês significa algo como ‘coisa porreira’”, explica o chef. “A ideia é trazermos essa boa disposição.”
Espaço
Nas paredes azuis destacam-se os quadros de Joana Ramalho (aqui, à venda para o consumidor), que a partir da caligrafia, faz nascer “trabalhos exaustivos e bonitos”. É uma das artistas que fazem parte da Manicómio, associação admirada por Leopoldo Calhau.
Balcão de frente para a porta, garrafas de um lado, mesas e cadeiras do outro. Estamos num espaço de linhas retas, de pé direito alto: “É de um período que adoro, que é o modernismo”, explica o chef, que antes de se atirar ao mundo da gastronomia (começou com o Sociedade, na Parede, seguindo depois para o Café Garret), se dedicava à arquitetura.
Não é que tenha cortado absolutamente com a profissão: é ele que tem projetado os espaços que tem vindo a abrir. Aqui não foi exceção: “A ideia é, de facto, parecer que estamos em construção”, explica, apontando para as prateleiras feitas de andaimes. Altas, tal como os bancos, as mesas têm rodas e podem facilmente ver a sua disposição alterada. “É uma coisa em que acredito, desde os tempos da faculdade: haver espaço de manobra para irmos evoluindo, que aqui se reflete neste lado industrial, métrico e modular, tal como no modernismo”.
Esta versatilidade estende-se a todos aos serviços e programação: depois da abertura da garrafeira e da mercearia, a ideia passa por levar o espaço para o digital, através de uma garrafeira online com entrega. O passo seguinte é lançar oficialmente um serviço de curadoria e consultoria de vinhos, com aconselhamento de compra para clientes privados (e, quem sabe, para restaurantes). Além disso, a garrafeira, na sua cave, será palco para eventos corporativos e para provas de vinho. Antes disso, um inusitado “torneio de ténis e vinho de mesa”, que está a ser planeado já para este mês.
Bebida
Porque aqui o essencial é beber e só depois comer, comecemos pelos vinhos. “Devemos ter por volta de 160 ou 180 referências, no momento”, explica Leopoldo Calhau, acrescentando que, por volta de 60% são francesas. “No bairro consome-se sobretudo vinho nacional. É bom, mas o francês também é. Temos muito que aprender com eles”.
A primazia é dada a pequenos produtores, com boas práticas. “No que toca aos portugueses, gosto muito das pessoas que fazem os vinhos que temos aqui. Já provei todos os vinhos e conheço pessoalmente todos os produtores.”
Rosados, brancos, tintos, espumantes ou champanhe, naturais, biodinâmicos ou de pouca filtragem, os produtos de baixa intervenção e provenientes da viticultura são também prioridade, não fosse esta a “tendência atual” num país que ainda “está no processo de transição”. Os convencionais também estão lá, porque a ideia não é impor. Conte também com duas cervejas artesanais, “uma de Lisboa e duas do Alentejo.”
Comida
Para comer, basta olhar para os azulejos por cima do balcão. Com um menu sempre a mudar, conte com uma proposta de carne, assim como saladas, sandes, queijos nacionais e franceses, enchidos e ainda uma ou duas sobremesas, muitos deles preparados com os utensílios mais elementares, considerando que aqui não existe cozinha — apenas um pequeno forno. Quando é necessário, explica, preparam-se estes petiscos na Taberna, mas essa não será a regra.
“Vamos servir o pâté en croûte [terrine de carne de porco ou de aves, assada em massa e servida fria], uma entrada muito conhecida em França”, detalha. “Vamos ter também uma componente vegetariana”, acrescenta. O pão será sempre “um elemento muito importante”, não fosse Leopoldo Calhau um “filho do Alentejo.” Os preços dos pratos rondam os 8€ e os 16€.
E porque a vontade de se ligar ao bairro é muita, grande parte das propostas são compostas por produtos oriundos do comércio local: “Queremos que o bairro seja o nosso maior abastecedor”, explica. No que toca aos vegetais, será uma horta da Associação Manicómio a fornecer grande parte do que nasce na terra.
Na futura mercearia, haverá queijos, enchidos, compotas, mel, café, chocolate, cerveja, vinhos e, a abrir a exceção aos produtos portugueses e franceses, umas batatas galegas, que já são típicas dos espaços de Leopoldo Calhau: “Descobri-as há muitos anos em Madrid e as pessoas foram conhecendo no Bla Bla Glu Glu — e quando não tenho, pedem-me para ter”.
Acompanhar o “Bla Bla” com bom “Glu Glu” é o que Leopoldo Calhau quer no seu novo restaurante
Para já, são as prateleiras da garrafeira que deixam antever o tipo de produto que poderá ser adquirido na mercearia. Além do vinho, pode encontrar já uma pequena amostra de azeite de Trás-os-Montes, Alentejo e Algarve, bem como mel e as populares batatas, alinhadas no topo das prateleiras. Para já, o Chez Chouette só funciona durante a semana, do meio-dia às 19 horas. Vamos esperar que o bairro nos diga para abrir mais.”
O que interessa saber:
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Nome: Chez Chouette
Abriu: final de outubro
Onde fica: R. Acácio de Paiva 20A
O que é: uma garrafeira, que também serve comida
Quem manda: o chef Leopoldo Calhau
Uma dica: não tenha medo de provar vinhos diferentes
Contacto: 21 409 88 17
Horário: de segunda a sexta-feira, do meio-dia às 19h