A Iniciativa Liberal não tem como objetivo ir a votos nas eleições antecipadas com dissidentes do CDS nas listas de deputados à Assembleia da República. É essa a convicção das fontes internas ouvidas pelo Observador no momento em que os núcleos locais estão a ser consultados e quando falta uma semana para a convenção do partido.
“Não acredito que a IL tenha de meter pessoas do CDS nestas eleições”, assegura um dirigente do partido, enquanto justifica que se as eleições fossem daqui a dois anos seria “natural que existissem aproximações” e “tempo para que o partido e a opinião pública entendessem essas movimentações”. Assim, com a recente crise no CDS (ainda por resolver) e com eleições à porta, seria “só ruído”. “Não acho que a IL ou os ex-CDS ganhassem com isso.”
Sem previsão da presença de antigos militantes do CDS nas listas de candidatos à Assembleia da República, é certo que haverá independentes, como tem sido tradição nas idas às urnas desde a criação do partido liberal. Os lugares são uma incógnita por enquanto, mas um dirigente da IL diz ser “pouco provável” que os independentes sejam cabeças de lista.
A menos de dois meses das eleições, o partido já demonstrou que a construção de um grupo parlamentar é o objetivo principal (menos do que isso seria uma clara derrota para os liberais) e as contas fazem-se a partir daí. “O mínimo dos mínimos é 3-2, três em Lisboa e dois no Porto ou vice-versa”, explicava fonte da IL ao Observador logo após o anúncio de eleições antecipadas. João Cotrim Figueiredo, sem arriscar números mais concretos, acredita que há possibilidade de eleger deputados em cinco distritos.
IL e Chega. Como os dois partidos podem beneficiar das eleições antecipadas
Independentemente do número de representantes eleitos, a Iniciativa Liberal não vai impor a sua presença no Governo. E já tem os limites há muito definidos: PSD e CDS são os parceiros preferenciais, Chega fica de fora.
Com este cenário, tanto um acordo parlamentar nos moldes dos Açores (sem o Chega) como a participação num executivo estão em cima da mesa, já que ambas se enquadram na ideia de o partido ser “a chave para uma solução governativa alternativa”.
A IL pretende ser o “garante de implementação de uma agenda de liberalização”, através de reformas efetivas como a “redução e simplificação fiscal, o combate à burocracia e em reformas na Saúde e na Educação”, com a conquista de “mais liberdade” para pessoas e empresas.
“Os cargos nunca serão o primeiro a debater. As ideias estão antes das funções. E, como se viu nos Açores, é possível garantir a implementação de propostas sem integrar o Governo”, exemplifica um dirigente do partido.
Porém, caso seja preciso integrar um Governo, a IL acredita ter pessoas “bastante válidas”, liberais que estejam dentro ou fora do partido, que permitam “garantir a capacidade de executar uma agenda liberal”.
O partido acredita que ainda está “imune” ao “eu quero muito ser deputado” e que o “espírito de missão e serviço” à IL estão à frente dos interesses individuais. Por isso, procura um “equilíbrio de competências técnicas e políticas” para tentar ter o máximo de deputados possíveis, conscientes de que irão “eleger sempre menos deputados do que a ambição para transformar Portugal”.
Quanto ao perfil que se procura para candidatos a deputados, não difere daquele que foi traçado para as autárquicas. “Pessoas coerentes, íntegras, astutas, generosas e resistentes.” Contudo, a IL está preocupada em construir um grupo “diverso e complementar” que permita um trabalho mais completo na Assembleia da República.
A crise no CDS é uma oportunidade para a IL?
João Cotrim Figueiredo, líder da Iniciativa Liberal, foi muito claro quando, numa entrevista ao Expresso, garantiu que o partido “não vai à caça” dos ex-CDS, mas deixou a porta aberta a quem se reconhece no liberalismo.
Francisco Mendes da Silva, um dos dissidentes do partido, diz ao Observador que este cenário dentro do CDS só seria uma “oportunidade” para a IL se as pessoas que saíram tivessem feito o caminho para os liberais — ou pelo menos mostrassem essa vontade — e não tem sido bem assim. Aliás, o antigo dirigente centrista nota que ainda ninguém conhecido no partido fez esse caminho.
Pelo contrário, Ribeiro e Castro, ex-líder do CDS, já tinha dito em entrevista ao Público que existia um “plano para destruir” o partido desde que Francisco Rodrigues dos Santos chegou à direção e volta a referir, em declarações ao Observador, que os acontecimentos dentro do CDS têm sido protagonizados por pessoas “próximas da IL”.
“Essas pessoas estão associadas a um esforço de ataque e crítica sistemática ao CDS, pessoas que atacam órgãos do partido e o seu funcionamento. E são todas pessoas ligadas ao setor liberal”, insiste, frisando que existe “uma intenção de criar dano ao CDS”. Já Francisco Mendes da Silva considera que a tese de Ribeiro e Castro é “completamente infundada”.
“Seria bastante trágico para os liberais e para as ideias liberais acharem que o seu caminho é ir para um partido pequeno e de nicho”, afirma Francisco Mendes da Silva em declarações ao Observador, enquanto aponta que o eleitorado liberal “já não está nem estava no CDS” antes das últimas saídas. Aliás, o ex-dirigente democrata-cristão refere mesmo que “muita gente sai do CDS porque o partido em que acreditavam já não está lá”.
Mendes da Silva admite que “um partido como a IL com uma figura como Adolfo Mesquita Nunes teria uma tração que não tem agora”. Por outro lado, também considera que não faz sentido que alguém que saiu do CDS “por ser um partido balcanizado e dogmático” vá para “outro partido balcanizado e dogmático”, como diz ser a IL.
Ainda sobre a fuga de militantes democrata-cristãos, o comentador explica que essas mudanças têm de ser vistas de baixo para cima. “Onde se está a ver a fuga de militância do CDS é por todo o país, no interior, onde as pessoas estão basicamente a passar para o PSD e até para o PS”, por ser uma parte do território onde “as pessoas não são tão ideológicas”.
“Em grande parte do país a IL não existe e em muitos distritos não vai contar para as ponderações das pessoas”, alerta Mendes da Silva, esclarecendo que “não se pode dizer que o eleitorado do CDS que se considera mais liberal vai para a IL”.
O antigo dirigente democrata-cristão está crente de que “a fuga é para o partido maior”. “Não acho que haja um movimento de fuga eleitoral para a IL, a haver uma fuga por razões ideológicas é para o Chega, claramente”, diz, ao arriscar contas sobre a fuga de eleitorado: 60% para o PSD, 30% para o Chega e 10% para a IL.
O comentador político lembra que o partido liderado por João Cotrim Figueiredo “está a crescer” e é altura de ver “quanto”. Perceber se vai “estabilizar como um partido que é para ficar” ou se é uma “coisa passageira e que resulta da fragilidade momentânea circunstancial do PSD”.
Mendes da Silva considera que estas eleições são ainda fundamentais para “dar sinais de que as placas tectónicas estão mesmo a mexer” e que o partido liberal consegue construir “uma multiplicação de caras que as pessoas reconheçam”.
E, com os olhos postos no cenário eleitoral, o PSD manter-se liderado por Rui Rio será, na visão do ex-dirigente do CDS, “mais útil” para a IL, tendo em conta que “as condições para o crescimento da IL continuam presentes”. Por outras palavras: com o atual líder social-democrata mantém-se “a ideia de que o PSD quis abandonar a direita liberal, de que Rio nunca chega lá e que não é preciso uma concentração no voto útil”. Todos estes condimentos facilitam o crescimento liberal.
Cenário diferente seria ter Rangel a vencer as eleições e a ir a votos nas próximas legislativas. “Paulo Rangel é mais combativo e ideologicamente mais abrangente e isso seria pior para a IL”, aponta Francisco Mendes da Silva, lembrando que “sempre que o PSD foi uma grande força motriz do espaço não-socialista e agregadora e incluiu de forma bastante acentuada ideias liberais” e não deixou espaço para o crescimento de um partido como a IL.