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74.999. Este podia ser só o número de pessoas vacinadas contra a Covid-19, até à passada sexta-feira, em Portugal. Mas é também o número que coloca Portugal entre os 30 países que mais doses administraram por cada 100 habitantes — mais precisamente, em 25.º lugar, com 0,69 doses administradas por 100 habitantes, segundo os dados do site Our World in Data, criado por investigadores da Universidade de Oxford. Se, por um lado, Portugal está em 4.º lugar dos países com mais novos casos diários por milhão de habitantes nos últimos sete dias, por outro está bem à frente de países como França ou Bélgica no que diz respeito às doses de vacina — cujos valores são, respetivamente, 0,29 e 0,07. E bastante distanciado da média mundial de 0,31 doses por cada 100 pessoas.
Ainda assim, os valores registados por cá distanciam-se e muito do país com mais doses administradas: Israel. Com cerca de 8,884 milhões de habitantes, este país do Médio Oriente regista, até ao momento, o surpreendente número de 22,07 doses administradas por cada 100 habitantes, segundo o site Our World in Data, que reúne dados de todos os países que os disponibilizam e cuja última atualização foi feita às 19h10 de dia 12 de janeiro de 2021.
Israel está, assim, bastante afastado do segundo e terceiro lugares, ocupados pelos Emirados Árabes Unidos, com 12,9 doses por 100 pessoas, e pelo Bahrein, com 5,44 doses por cada 100 pessoas. Depois de um pódio ocupado apenas por países do Médio Oriente, à exceção da Irlanda do Norte, nenhum dos outros que se seguem ultrapassa a barreira das 5 doses por 100 habitantes.
Os quatro HMO’s, o passaporte verde e a campanha contra as notícias falsas. O segredo de Israel para vacinar 2% da população ao dia
Ainda o processo não tinha começado e já o ministro da Saúde israelita estimava que a vacinação dos grupos prioritários — profissionais de saúde, pessoas com mais de 60 anos e trabalhadores de lares de idosos — podia ser feita em duas semanas. Essa estimativa falhou, mas, a esta velocidade, Israel pode mesmo tornar-se o primeiro país do mundo a vacinar toda a sua população de alto risco até ao final de janeiro. “É muito surpreendente”, diz Ran Balicer, presidente da equipa de especialistas que está a aconselhar o governo israelita no combate à pandemia da Covid-19, em declarações ao The New York Times.
Cerca de 150.000 israelitas estão ser vacinados por dia — o que equivale a quase 2% da população —, ao mesmo tempo que o país enfrenta o seu terceiro confinamento. No dia 1 de janeiro de 2021, 11 dias depois de ter arrancado a campanha de vacinação, já mais de 10% da população tinha recebido a primeira dose da vacina da Pfizer, a mesma recebida por Portugal — um valor que ultrapassava em muito o resto do mundo. Por essa altura, menos de 1% da população dos Estados Unidos e apenas pequenas frações da população em muitos países europeus tinham recebido uma dose de vacina, de acordo com o Our World in Data.
Atualmente, já mais de 20% da população de Israel recebeu a primeira dose da vacina — o que equivale a mais de 1,5 milhões de pessoas. Entre os que têm mais de 60 anos, cerca de 70% já foram vacinados. Com uma população de menos de nove milhões, o tamanho relativamente pequeno de Israel também serviu de vantagem, notou Ran Balicer. Ainda assim, muitos outros países com dimensões semelhantes não estão a ter tanto sucesso. Qual é, então, o segredo de um país que há bem poucos meses estava entre os piores no mundo no que dizia respeito às mortes e aos casos de Covid-19?
Antes de mais, é preciso ter em conta que o primeiro-ministro de Israel fez desta campanha de vacinação aquilo que o The New York Times apelida de “missão pessoal”. O facto de estar a cerca de três meses das eleições é um grande incentivo para fazer Israel reerguer-se rapidamente. Benjamin Netanyahu foi o primeiro a ser vacinado no país — um momento que fez questão de partilhar nas suas redes sociais, com a descrição: “Uma pequena dose por pessoa, um grande passo para a saúde de todos nós”. E este domingo, Netanyahu já recebeu também a segunda dose, prevendo que toda a população esteja vacinada até março.
זריקה קטנה לאדם, צעד ענק לבריאות של כולנו.
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בדרך לחיסון הערב חשבתי הערב על הילדים שדואגים להורים שלהם.על הנכדים שרוצים לחבק את סבא וסבתא בחיבוק אמיתי.
על בעלי העסקים שיוכלו לפתוח את העסקים שלהם.
על כך שנוכל לפתוח מחדש את המדינה שלנו ולהחזיר אותה למה שהיא הייתה. pic.twitter.com/5QGoG7HZnn
— Benjamin Netanyahu – בנימין נתניהו (@netanyahu) December 19, 2020
Dias antes do arranque da vacinação, o ministro da saúde israelita disse que Israel se tinha adiantado a entrar em negociações com os fabricantes da vacina e que as empresas estavam interessadas em fornecê-las a Israel por causa da reputação de seus HMO’s [Health Maintenance Providers] — um sistema que obriga todos os cidadãos residentes em Israel a aderir a uma das quatro seguradoras de saúde oficiais, que, por sua vez, estão proibidas por lei de negar a adesão de algum cidadão.
Um sistema de saúde altamente digitalizado e o facto de os médicos do exército terem sido chamados para ajudar também contribuíram para estes resultados, escreve o The Guardian. Mais: os serviços de vacinação estão a funcionar 24 horas por dia, sete dias por semana, com uma estrutura que inclui vacinas em jeito de “drive-through” em estádios, parques de estacionamento, escolas e ainda uma espécie de clínica móvel que se desloca a locais remotos.
Ainda assim, o governo também fez questão de incentivar a população a tomar a vacina e evitar que uma parte das pessoas recuse tomá-la. Segundo anunciou o ministro da Saúde ainda em dezembro, será concedido um “passaporte verde” a quem tiver sido vacinado. Trata-se de um documento que dará acesso a restaurantes, eventos culturais, viajar livremente, permitindo que quem o tiver fique livre de fazer quarentena se tiver tido contacto com um infetado.
Por outro lado, o governo lançou uma grande campanha contra as notícias falsas relacionadas com os movimentos anti-vacinação. Estudos realizados em dezembro mostravam que entre 50% e 75% dos israelitas diziam que iam recusar a vacina contra o novo coronavírus, escreve o The Times of Israel. Uma das medidas tomadas foi um pedido ao Facebook para que removesse quatro grupos que publicaram conteúdos falsos sobre as vacinas — o que foi feito com sucesso.
As autoridades de saúde israelitas não divulgaram, até ao momento, o número exato de doses da vacina que receberam até agora ou quanto pagaram por elas, alegando que esses dados são confidenciais. Uma fonte anónima disse à agência Reuters que o pagamento foi de uma quantia duas vezes superior ao que os outros países têm pago. Mas o ministro da Saúde defendeu que, se o país tiver pago mais em comparação com outros, esse custo valerá a pena, mesmo que não permita reabrir a economia uma semana que seja antes do que aconteceria se não tivesse havido esse investimento. “Estamos a liderar a corrida mundial graças aos nossos preparativos iniciais”, disse.
Apesar do sucesso de Israel ser notícia em todo o mundo, as acusações de negligência com a população palestiniana também o são. A Amnistia Internacional acusou o governo israelita de “discriminação institucionalizada” por não estar a fornecer a vacina aos palestinianos em territórios ocupados por Israel. “O governo israelita deve parar de ignorar as suas obrigações internacionais e garantir imediatamente que as vacinas da Covid-19 sejam oferecidas de forma igualitária e justa aos palestinianos que vivem sob sua ocupação na Cisjordânia e na Faixa de Gaza”, lê-se num comunicado emitido na passada quarta-feira.
Irlanda do Norte é a nação europeia com mais doses administradas. Portugal é a 20.ª e supera a China
Apesar de fazer parte do Reino Unido, a Irlanda do Norte, tal como a Escócia e o País de Gales, tem autonomia sobre matérias relacionadas com a saúde e, por isso, o Our World in Data faz uma distinção entre eles. Assim, a Irlanda do Norte aparece logo em quarto lugar, com 5,25 doses por 100 habitantes — e em primeiro no que diz respeito à Europa.
Segue-se depois a Inglaterra, com 4,4 doses por cada 100 pessoas, e o Reino Unido como um todo — agregando, assim, os valores de todas as nações que o formam — com 4,19 doses. A seguir, a Escócia com 3,27 e o País de Gales, com 2,9. Só depois, em nono lugar, aparecem os Estados Unidos da América, que registam um valor de 2,72 doses por 100 habitantes.
Portugal surge em 25.º lugar global, mas em 20.º se olharmos apenas para o continente europeu. Com 0,69 doses por 100 habitantes, regista o mesmo valor que a Alemanha e a Croácia. Portugal está ainda oito posições acima da média mundial, que é de 0,37, e surge primeiro que alguns países nórdicos, como a Noruega ou a Finlândia e mesmo a China.
Finlândia abaixo da médica mundial, Bélgica com valores iguais ao México. Os maiores fracassos
No fim da lista do Our World in Data aparecem dois países — Chile e Kuwait — com os mesmos valores: 0,06 doses por 100 habitantes. Com apenas 0,01 de diferença, surge a Bélgica (0,07), a par com o México. E não muito afastada está França, com 0,29 doses administradas por cada 100 pessoas. Estes países estão muito abaixo da média mundial.
Da Bélgica à Rússia. O plano de vacinação da Covid-19 na Europa
O primeiro-ministro francês, Jean Castex, já veio admitir que França ficou para trás em relação a outros países na implementação de seu plano de vacinação. O governo tem enfrentado duras críticas depois de ter sido divulgado que apenas 500 pessoas tinham sido vacinadas na primeira semana, noticiou a BBC. O atraso deve-se, em parte, ao facto de as primeiras vacinas serem exclusivas para residentes de lares de idosos, a quem era exigido um termo de responsabilidade e uma consulta médica prévia. A demora já fez com que o governo mudasse os planos: a partir de 18 de janeiro, todas as pessoas com mais de 75 anos poderão receber a vacina, numa tentativa de acelerar as vacinações.
O mesmo fará a Bélgica, que tem abaixo de si apenas três países: México, Chile e Kuwait. Depois de ter enfrentado duras críticas, o governo belga também decidiu acelerar o seu plano de vacinação. No início do ano, apenas tinham sido administradas 700 das mais de 10 mil doses de vacinas entregues à Bélgica, no âmbito do programa coordenado pela União Europeia, através do qual Portugal recebeu as doses que lhe cabiam. Numa altura em que todos os países já tinham os seus planos de vacinação desenhados, a Bélgica ainda não tinha uma estratégia bem definida — não havia, por exemplo, uma indicação concreta sobre quem seriam os primeiros vacinados.
Numa estratégia renovada, o país tem agora metas estipuladas, ainda que as indicações continuem vagas: no final de janeiro, a Bélgica espera ter todos os profissionais de saúde vacinados; no final de março, todas as pessoas com mais de 65 anos e com doenças de risco; no final de abril, todas as pessoas de “profissões essenciais”, sem indicação concreta sobre que profissões exatamente; e, a partir de junho, a restante população, escreve o The Brussels Times. O governo espera, assim, que pelo menos 70% da população esteja vacinada no final de Setembro.