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Rui Oliveira/Observador

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Marega, pataniscas, "opá..." e "como é que ele chega ali": vimos o Sporting x FC Porto com Tiago Mayan

O candidato da Iniciativa Liberal só conseguiu ver parte do jogo. Acompanhámo-lo a recordar memórias de infância, a falar de Ventura e Ana Gomes e a comentar as faltas: "Uii... esta é durinha".

Aos 89 minutos o prognóstico apontava para o resultado mais evidente: o 1-1 não se desfazia e as duas equipas, Sporting e Futebol Clube de Porto, pareciam condenadas a resolver a meia-final da Taça da Liga nos pontapés de onze metros. “Vai a penalties, estou a ver…”, dizia o portuense Tiago Mayan Gonçalves, a trazer da cozinha para o sofá um tabuleiro com o jantar encomendado na UberEats a um restaurante ali à beira: pataniscas de bacalhau, “uma sopinha” e uns croquetes de alheira.

Cinco minutos depois, o uruguaio Sebastián Coates esperou que o espanhol Toni Martínez recebesse de peito, deu-lhe a impressão que tinha o lance controlado para no momento certo se meter à frente e roubar a bola. Dominou rapidamente, depois, e serviu Pedro Gonçalves entrelinhas.

O pequenito Pote rodou, virou-se de frente para os defesas, viu Jovane esgueirar-se pela esquerda para as costas do central e meteu-lhe a bola na desmarcação. O luso-caboverdiano não foi de modas: deu dois toques na bola, que adiantou na direção da baliza, e quando Pepe já esticava a perna para lhe tirar o bombom atirou-a, com a ponta do pé, para o poste mais distante do guarda-redes do FCP. Tiago Mayan reagiu a contragosto, muito civilizadamente: “Opá… mas isto… como é que ele chega ali…” Teria perdido o apetite? “Não, isso nunca perco”.

Tiago Mayan Gonçalves é portista: plain and simple. Dissera-o o seu barbeiro, Tozé Veloso, que quando lhe perguntámos se o candidato presidencial era do Futebol Clube do Porto arregalou os olhos, fez um ar estupefacto, perguntou-nos: “Então havia de ser do quê?” Mayan não o esconde, brinca até logo ao início e diz que se o FC Porto marcasse vê-lo-íamos festejar. “Não sou sempre impávido e sereno…”. Mas também haveria de garantir que não tem má impressão de outros clubes, não tem repulsa por nenhum, “são adversários” e são para respeitar.

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Rui Oliveira/Observador

O portismo foi-lhe passado por via familiar — e contagiou toda a família. “Eu já tinha com o meu pai e o meu irmão lugar cativo — lugar anual — nas Antas, no estádio anterior ao Estádio do Dragão”, contava, puxando pela memória para dizer que ainda se recordava “vagamente da noite da primeira Liga dos Campeões ganha, em 1987. Tinha 10 anos. Aquilo seria tardio para uma criança mas ainda pude acompanhar. A minha professora da primária até tem um desenho meu feito no dia a seguir. Era um desenho do golo do Madjer, o do calcanhar”.

Confiante? “Estou, estou”. E o amarelo a Conceição: “Já começa assim?”

Quando se sentou e ligou a televisão, o jogo já começara há quase 40 minutos. Tiago Mayan Gonçalves tinha tido duas sessões por Zoom durante a tarde, nas quais conversou com representantes da Associação de Dinamização da Baixa Pombalina e da Associação Empresarial de Sintra, e era preciso depois alinhavar e estruturar ideias, discutir o andamento da campanha, perceber como seria o dia seguinte e se alguma coisa mudaria numa agenda que se tem alterado regularmente por culpa da Covid-19.

É isto que explica que depois de já ter reagido à dureza da falta de Filipe Anderson, que valeu um cartão amarelo ao portista aos 43 minutos — “elá!” —, tivesse dito isto sobre o cartão amarelo mostrado a Sérgio Conceição logo a seguir, sobre a tensão e os protestos: “Já começa assim?”

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O jogo já começara muito antes, ele é que só se conseguira sentar no sofá naquele momento. Culpa de uma campanha para as presidenciais, a sua primeira grande campanha como protagonista, que agora o levou de volta à sua cidade, à sua casa e ao contacto familiar: “É bom também por isso, para os meus pais perceberem que afinal existo”, diria sorridente.

Assumindo que tem “dependido muito de UberEats”, o candidato apoiado pela Iniciativa Liberal aproveitava o intervalo para ir à cata de promoções para o jantar, “também me convenço por isso”, procurar as opções disponíveis de que ainda não se fartara. E respondia que estava confiante: “Estou, estou. Apesar de haver algumas baixas, por causa da pandemia…”. Para o adversário, só respeito. Mas sem piedade no relvado: “É para ganhar todos os jogos. Não é para se jogar, é para se ganhar”.

À boleia do pedido da UberEats, com os jogadores no balneário, Mayan deixava a primeira nota política da noite quando lhe falávamos da nova regulação sobre estas plataformas permitida pelo decreto do estado de emergência: “É não ter noção nenhuma do modelo de negócio destas plataformas. O que daí vai resultar é o esmagamento da margem de quem trabalha, do estafeta”.

No ecrã, Pinto da Costa era filmado nas bancadas à espera dos jogadores e aproveitávamos para perguntar a Mayan se ainda veríamos o seu amigo Rui Moreira, com quem tivera uma audiência há dias na Câmara do Porto e que o candidato presidencial apoiou no passado, como sucessor: “Não sei, não sei. Se calhar já houve tempo… penso que não está a pensar nisso. Está muito bem onde está [Câmara do Porto], vamos ver se continua ou não”. Ele, Tiago Mayan, juntar-se-á novamente à comitiva de apoio a Rui Moreira? “Não faço ideia, mesmo dentro do partido ainda nem tomámos uma decisão. Estou obviamente focado numa campanha distinta. Depois de dia 25 começarei a pensar, nisso e noutras coisas”.

Como faz quanto ao seu resultado nas eleições presidenciais de dia 24 de janeiro, também aqui Mayan não arriscava um resultado: prognósticos numéricos só no fim do jogo, na política e no futebol não faz estimativas quantitativas ao intervalo, quando o jogo vai a meio. “Mas alguma vitória vai ter de sair disto, terá de ser porque o resultado é decidido agora, alguém tem de ganhar para passar à final”.

As fugas ao futebol, o futuro do país e os planos “hidrogénio, Costa e Silva…”

A conversa ia fugindo por vezes ao futebol e a dado ponto chegou à confusão com o nome, ele que já foi por diversas vezes tratado por Tiago Mayan Rodrigues. De onde virá o Rodrigues? “Já ouvi dizer que pode ser confusão com o ministro da Educação, Tiago Brandão Rodrigues. Mas só mesmo de nome, porque de resto não há nenhuma associação possível entre mim e o ministro da Educação”, gracejava.

O intervalo ainda seria aproveitado para comentar o futuro do país: dizia o candidato presidencial que lhe parece “que estamos a assistir a uma destruição económica que traz destruição social, isso já está a acontecer. Mas vai ser avassalador em 2021 se não começarmos a tomar outro rumo, a deixar de conceber o Estado como supostamente o grande dinamizador e agente que intervém na economia”.

Insistia: os fundos europeus que aí vêm, a famosa bazuca a que ele chama “o único balão de oxigénio” que o país terá, não podem ir para “o plano Costa e Silva, planos de hidrogénio, grandes obras públicas”. É preciso acorrer aos aflitos, fazer uma “injeção direta e imediata na economia” e deixar de estrangular as pessoas com impostos. E o mercado, acredita, regenerar-se-á e progredirá. “Neste exato momento, em setores em que não há faturação o Estado podia deixar de cobrar. Já era uma grande ajuda. Mas o Estado continua a cobrar o IVA, a TSU…”

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Os ídolos Madjer, Deco, Lucho e Kostadinov. E Marega, “às vezes um pouco irritante”

Como a primeira parte fora extraordinariamente curta — só pôde ver uma mão cheia de minutos —, o regresso das equipas do balneário era a forma de finalmente reconhecer os jogadores, perceber que disposição poderia a equipa ter em campo, que atletas lá estavam. “Vamos lá ver quem é… o Marega, o Pepe, claro…”

O jogo era disputado no Estádio Dr. Magalhães Pessoa, em Leiria — como aliás toda a final four da Taça da Liga — e Tiago Mayan lembrava que não foi só este estádio que foi construído para o Euro 2004 (implicando um grande investimento) e depois de pouco serviu: “Temos o de Aveiro, o do Algarve… elefantes brancos”, sintetizava.

Um falhanço erroneamente atribuído a Marega pelo repórter levava a uma conversa sobre o avançado maliano, daqueles que tanto põe os portistas a sorrir como os deixa de cabelos em pé. E Mayan resumia o amor-ódio: “Vai cumprindo, mas de forma às vezes um pouco irritante”.

A atenção ao jogo não era muita. Na mão direita o candidato da Iniciativa Liberal empunhava muitas vezes o telemóvel, que não parava de apitar. Perguntávamos se eram grupos privados de trabalho, de campanha, ele respondia: “Agora por acaso estava a cair a encomenda [do jantar]. Mas são muitas notificações, nas redes sociais, nas mensagens…”

No filme de Mayan, os protagonistas continuam a ser os lesados da pandemia — como João, Noélia e Nuno

O jogo já retomara e Tiago Mayan Gonçalves, ainda confiante, punha água na fervura do otimismo, lembrando que “nesta Taça não temos um bom historial”. E aos 52 minutos, a uma falta mais dura do médio do Sporting João Palhinha, reagia como se o calmeirão verde e branco o tivesse abalroado a ele: “Uiiiii. É um amarelo um bocadinho laranja…”

O jogo, “algo frouxo”, ia-se desenrolando e permitindo a conversa rumar a outras paragens. Por exemplo, os jogadores que mais gostou de ver com a camisola do FC Porto vestida: “Do Madjer gostava muito. O João Pinto — o nosso, claro. O Deco, o mágico Deco. Gostei muito do Kostadinov, era um artista. Do Lucho Gonzalez também gostava muito, era um excelente jogador mas gostava dele também pelo posicionamento de balneário, pelo estilo de liderança sóbrio mas poderoso que tinha”. Ou os jogos mais emotivos: “O jogo do minuto 92 [golo do Kelvin] foi esfuziante, deu-nos um campeonato. Foi um jogo com uma carga emocional tremenda, o jogo talvez com mais emoção. Tanto que fiz uma coisa que raramente faço: chorei sentado, estava só lá sentado a chorar”.

A atenção pouco se prendia na televisão, porque entre telemóvel e política o FC Porto ficava ligeiramente ofuscado. Falava-se da rapidez do crescimento da Iniciativa Liberal e de se Tiago Mayan Gonçalves imaginava há três anos, quando ajudou a fundar o partido, que estaria a concorrer à Presidência da República. Garante que não, mas conta uma história curiosa: “Há um grupo de Facebook criado, por brincadeira: ‘Tiago Mayan presidente’. Foi uma brincadeira de uns amigos meus, para as últimas eleições presidenciais. Para eles já deveria ter enfrentado Marcelo Rebelo de Sousa há cinco anos. O grupo cresceu de uma forma não esperado e agora reavivou-se, com a profecia da candidatura realizada”.

Na estante, as revistas da National Geographic destacavam-se — “gosto muito, desde miúdo”. E à meia hora de jogo da segunda parte, segundos antes da campainha tocar com a chegada do jantar, voltava a lembrar que “alguém tem de ganhar”, que o jogo “não vai a prolongamento, passa logo para penalties e penalties é sempre um problema”. Para os adeptos de coração fraco em geral e para os portistas em particular, pois claro.

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De repente a conversa chegava ao Olímpico do Montijo, o clube que serviu ao humorista Ricardo Araújo Pereira (RAP) para fazer uma piada sobre a diferença entre a notoriedade e popularidade de Mayan e Marcelo. O candidato dizia que Marcelo era o seu adversário, RAP chegou a fazer um gracejo sobre se não era como se o Olímpico de Montijo dissesse que o seu adversário era o Barcelona e Mayan queria embalar o humor com mais humor e “ir ao Olímpico do Montijo, era uma coisa que gostava de ter feito mas com a reformulação toda não foi possível”.

Outra coisa que o candidato gostava: que a sua candidatura seja um sinal para as pessoas de que “não é pelos obstáculos de falta de notoriedade e de poder mediático que deixam de poder ter uma intervenção e ação. Espero que signifique que mais gente surja. Na Iniciativa Liberal estamos a fazer esse trabalho. As pessoas existem, os valores existem, as ideias existem. Portanto, não há que ter medo”.

Nas eleições autárquicas que se seguirão às presidenciais, o modelo de campanha será possivelmente outro, devido a um alívio das medidas de contenção da pandemia da Covid-19. Mayan Gonçalves lembrava que já estivera em campanhas “com Rui Moreira e também nas europeias e legislativas com a Iniciativa Liberal” e que gostou de fazer uma campanha com mais ações de rua e contacto com eleitores no terreno, que agora a Covid-19 não permite: “Gostei disso quando fiz, gostei de o fazer. E gostava de ter feito dessa forma, mas não é possível dentro do padrão de comportamento que quero ter”. Mas se queria “passar pelo meio das pessoas, estar com elas”, já não lhe apetecia muito “estar num palanque trazido por seguranças” — como André Ventura, que não nomeia, tem feito. “Nesse estilo de campanha não me revejo”.

Uma bicada a Ventura, outra para contrapor a Ana Gomes sobre a alegada ilegalidade do Chega enquanto partido político — “não é preciso ser Presidente da República para denunciar isso, qualquer razão que sinta que tenha para ilegalizar um partido, nada a impede; se é a sua convicção, que o faça já” — e o clima político aquecia. O futebolístico é que nem por isso. Só mesmo quando, já com uma hora e 19 minutos de partida disputada, Marega pareceu embrulhar-se e pôr a bola dentro da baliza do Sporting, fazendo o 1-0 para o FC Porto. “É assim, uma coisa assim meio trapalhona… mas depois acaba lá dentro”.

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O jogo continuava trôpego e a sopa e os croquetes de alheira pareciam mais merecedores de entusiasmo. Mas foi quando, findas as entradas, Tiago Mayan Gonçalves voltou para a cozinha para pôr as pataniscas no prato que ouviu a notícia de um 1-1 que voltava a deixar tudo em molho de brócolos. Ouvia a notícia, reagia com surpresa — “Não…” —, voltava para jantar, vaticinava os penalties à beira dos 90 minutos (“Vai a penalties, estou a ver”) e via Jovane Cabral levar o Sporting para a final. Esta quarta-feira, foi o sportinguista João Ferreira quem terminou a noite a sorrir. No dia 24 de janeiro, Mayan gostaria de ser ele a superiorizar-se nos votos contados. Não será fácil.

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