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Microsoft - Activision Blizzard
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Com a aquisição da Activision Blizzard, a Microsoft ganha maior relevância nos jogos de PC, consola e também no mobile

Anadolu Agency via Getty Images

Com a aquisição da Activision Blizzard, a Microsoft ganha maior relevância nos jogos de PC, consola e também no mobile

Anadolu Agency via Getty Images

Microsoft pode não conseguir concretizar a sua maior aquisição. Pode ser o início do travão ao poder das big tech?

O regulador norte-americano quer travar a compra da Activision, a maior aquisição da história dos videojogos, o que traz ao fim de 20 anos dores de cabeça à Microsoft na área da concorrência.

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Nas últimas duas décadas, a Microsoft tem deixado que as batalhas travadas com as autoridades da concorrência ficassem mais do lado das rivais de setor, como a Amazon ou o Facebook. Mas a calmia para este companhia parece estar a chegar ao fim. A FTC, o regulador norte-americano, adotou uma abordagem mais aguerrida nesta disputa com a Microsoft – que até rompe com o próprio historial da entidade, dizem os especialistas. E não é só a dona do Windows a ter de lidar com este novo ímpeto da FTC, coincidente com a chegada da administração Biden ao poder. Este ano, também a Meta, dona do Facebook, já teve de pôr uma aquisição em pausa devido a um bloqueio do regulador. Ambas as ações sugerem uma abordagem não só diferente por parte do regulador mas que também estará a tentar responder ao coro de vozes que pede mais controlo e escrutínio à dimensão das tecnológicas, que cresceram significativamente através de aquisições.

A 8 de dezembro, a FTC, ou Comissão Federal de Comércio dos EUA, avançou com um processo para tentar bloquear o maior negócio da história dos videojogos: a compra da Activision Blizzard pela Microsoft. Em janeiro de 2022, a Microsoft anunciou que estava disposta a dar 69 mil milhões de dólares pela dona dos jogos “Call of Duty”, “Overwatch” e do sucesso “Candy Crush”. Demorou pouco tempo até serem abertas investigações, com os reguladores da concorrência de vários países a demonstrarem apreensão devido à vantagem que controlar uma gigante de videojogos poderia dar à Microsoft. A tecnológica já tem a Xbox e, controlando a Activision, há a preocupação de que possa tornar alguns títulos da editora de jogos exclusivos para a sua consola, limitando o negócio de rivais como a Sony ou a Nintendo. A Microsoft tem feito a sua argumentação a favor do negócio junto da FTC, da britânica CMA e também da Comissão Europeia, cada uma com uma investigação em curso.

Concorrência dos EUA quer travar compra da Activision pela Microsoft

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Mas foi a FTC, liderada por Lina Khan, quem decidiu dar um passo em frente e avançar com um processo para impedir o negócio, adicionando mais uma pitada de incerteza ao negócio. A situação avança para a justiça e tudo terá de ser decidido em tribunal, um entrave que põe em causa as expectativas da Microsoft de fechar o negócio no ano fiscal de 2023, que vai de julho de 2022 a junho de 2023. A decisão da FTC prende-se com o facto de o maior negócio da indústria de videojogos, que também representa a maior compra da história da Microsoft, permitiria à empresa “suprimir os concorrentes das consolas Xbox no negócio de rápido crescimento das subscrições de conteúdo e no área do cloud gaming”, referindo-se a serviços em que é possível jogar através da cloud.

No anúncio, a agência norte-americana não deixava grande margem para dúvidas sobre as suas intenções. “A Microsoft já mostrou que pode e vai limitar conteúdos aos seus rivais no gaming”, dizia Holly Vedova, responsável pelo Bureau of Competition, a divisão da Comissão Federal de Comércio dedicada à concorrência. Eram lembradas as compras já feitas pela Microsoft nos jogos, como a aquisição da ZeniMax, a empresa-mãe do estúdio de jogos Bethesda Softworks. A FTC apontou o dedo à Microsoft, referindo que a dona da Xbox decidiu tornar vários dos títulos da Bethesda exclusivos da sua consola. “Queremos impedir a Microsoft de ganhar controlo de um estúdio de jogos líder e independente e de o usar para prejudicar a concorrência em vários mercados de jogos dinâmicos e de rápido crescimento.”

Rapidamente surgiram declarações da Microsoft e da Activision a propósito desta decisão da FTC. No Twitter, Brad Smith, o presidente da Microsoft continuava a mostrar, como seria de esperar, confiança num desfecho favorável nesta aquisição. “Continuamos a acreditar que a nossa operação para adquirir a Activision Blizzard vai aumentar a concorrência e criar mais oportunidades para os jogadores e para quem desenvolve jogos.”

“Estamos comprometidos desde o primeiro dia em responder às preocupações de concorrência, incluindo ao oferecer no início da semana uma proposta de concessões à FTC. Ao mesmo tempo em que acreditamos em dar uma hipótese à paz, temos total confiança no nosso caso e damos as boas-vindas à oportunidade de apresentá-lo em tribunal.”

Do lado da Activision, o CEO Bobby Kotick tornou pública a comunicação que enviou aos empregados. Reconhecia que a ação da FTC “podia soar alarmante”, mas reforçava “a confiança na conclusão do negócio”. “A alegação de que este negócio é anti-concorrência não está em linha com os factos e acreditamos que vamos ganhar este desafio.” E, à semelhança da Microsoft, também Kotick defendeu que, “com o panorama de concorrência em mudança”, uma “Microsoft-ABK seria boa para os jogadores, boa para os empregados, boa para a concorrência e boa para a indústria”. E, no final, deixou um recado à FTC: “Acreditamos que estes argumentos vão vencer apesar de um ambiente regulatório focado em ideologia e concepções erradas sobre a indústria tecnológica.”

“Call of Duty” gera preocupação mas também há dúvidas sobre o “cloud gaming”

A argumentação feita pela FTC para tentar bloquear o negócio dá um ênfase considerável a uma área concreta do mercado de jogos: as consolas. A agência norte-americana considera que tanto a Microsoft, dona da Xbox, como a rival Sony, a responsável pela consola PlayStation, controlam o mercado.

E, acredita a FTC, “ao controlar as franquias blockbuster da Activision, a Microsoft teria tanto os meios como o motivo para limitar a concorrência ao manipular os preços da Activision, degradar a qualidade dos jogos e experiência dos jogadores nas consolas rivais e serviços de jogo, mudar os termos e timing de acesso aos conteúdos da Activision ou a barrar inteiramente o conteúdo a outros concorrentes, resultado em danos para os consumidores”, disse a FTC na justificação da decisão.

Embora também sejam mencionadas franquias como “Diablo” ou “Overwatch”, uma boa parte da discussão centra-se no “Call of Duty”. Lançado pela primeira vez em 2003, a FTC destaca a enorme popularidade do título e a capacidade de até 2020 ter gerado 27 mil milhões de dólares em receitas. A agência norte-americana considera que os conteúdos da Activision “são extremamente importantes” para o mercado das consolas, vincando que também alimentam “a adoção” de equipamentos do género. Com receio de que vários títulos se tornem exclusivos, considera-se que a proposta de aquisição “vá provavelmente limitar a concorrência ou ter tendência a criar um monopólio em vários mercados”.

Mesmo com a Microsoft a fazer o compromisso público de, caso a aquisição seja fechada, manter o “Call of Duty” por dez anos na PlayStation, isso não será o suficiente para esclarecer as dúvidas do regulador norte-americano. “Uma parte vital das receitas do ‘Call of Duty’ da Activision Blizzard vem da venda de jogos da PlayStation. Dada a popularidade [do jogo], seria desastroso para a franquia e mesmo para a própria Xbox alienar milhões de jogadores”, argumentou Brad Smith num artigo de opinião publicado no Wall Street Journal, alguns dias antes de a FTC tentar impedir o negócio.

“Essas preocupações parecem um pouco problemáticas, porque sugerem que a Microsoft ainda não é líder”, reconhece. “Mas, de qualquer forma, essa preocupação pode provavelmente ser resolvida com remédios”, nomeadamente com a garantia de que alguns títulos continuassem disponíveis nas várias plataformas.
Dirk Auer, especialista na área de Concorrência do International Center for Law & Economics (ICLE) e professor adjunto na Universidade de Liège, na Bélgica

Nos documentos de argumentação após a movimentação da FTC, a Microsoft transmitiu, mais uma vez, que acredita que a compra pode beneficiar o ecossistema. “A aquisição de apenas um jogo pela terceira fabricante de consolas não pode penalizar uma indústria altamente competitiva. Particularmente quando essa fabricante já deixou claro que não pretende limitar o jogo”, era possível ler. Nos documentos de apoio, a tecnológica indica que em 2021 tinha uma quota de mercado de 16%, atrás dos 50% da Sony e 34% da Nintendo. Do lado da Activision, voltou a repetir-se a ideia de que tornar o “Call of Duty” exclusivo da Xbox “seria desastroso” para a própria plataforma.

Em conversa com o Observador, Dirk Auer, especialista na área de Concorrência do International Center for Law & Economics (ICLE) e professor adjunto na Universidade de Liège, na Bélgica, defende que esta movimentação da FTC não se prende apenas com a questão dos títulos exclusivos, dividindo a questão em preocupações de curto e longo prazo. “A curto prazo”, destaca a preocupação de que “uma avalanche” de títulos exclusivos possa dar vantagem à Microsoft. “Essas preocupações parecem um pouco problemáticas, porque sugerem que a Microsoft ainda não é líder”, reconhece. “Mas, de qualquer forma, essa preocupação pode provavelmente ser resolvida com remédios”, nomeadamente com a garantia de que alguns títulos continuem disponíveis nas várias plataformas.

Já a “longo prazo, há a preocupação do cloud gaming”. Ou seja, um serviço em que seja possível jogar sem depender de um equipamento como uma consola mas sim da ligação à internet. A questão, defende Dirk Auer, é que este “é um mercado muito emergente” para haver preocupação com o facto de a Microsoft sequer “poder vir a liderar”. “Essa preocupação tem duas fraquezas: a primeira é que é algo extremamente a longo prazo. Isto não é um mercado que está maduro, ninguém usa cloud gaming hoje em dia, porque a infraestrutura de internet não está à altura”, contextualiza Auer. “Há muitas empresas neste campo a tentar percebê-lo, mas o mercado ainda não parece estar maduro”, recordando o exemplo de empresas como a Google. A tecnológica lançou há alguns anos o Stadia, um serviço de streaming de jogos na cloud, em que apenas era preciso uma ligação à internet e um comando para jogar. A fraca adesão ditou o anúncio do fim do serviço, no final de setembro.

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O facto de a Microsoft ser um player relevante no segmento cloud pode ser, então, uma vantagem também neste mercado? “No cloud gaming o que queremos é ter uma empresa que torne isto num produto viável”, vinca Dirk Auer. E recorre a uma máxima bem conhecida. “Temos todas estas empresas a concorrer para ter um produto viável, nenhuma foi bem sucedida até agora, e vamos pôr correntes à Microsoft receando que possa ser a mais bem sucedida e que se isso acontecer pode ter vantagem. Acho que é essa a definição de pôr o carro à frente dos bois.”

Concretamente sobre a movimentação da FTC, este especialista que a ação possa ter deixado algumas pessoas “surpreendidas”. “Aquilo que deixou algumas pessoas surpreendidas nesta resposta da FTC é que, no processo, pareciam muito decididos em bloquear esta transação”, contextualiza, dizendo que uma “abordagem mais tradicional” passaria pelo reconhecimento de que se trata de “uma fusão vertical e que, havendo riscos de comportamento anti-concorrencial, seriam criados remédios que reduzam o risco”.

“É um pouco como pôr o carro à frente dos bois. Temos todas estas empresas a concorrer para ter um produto viável [no cloud gaming], nenhuma foi bem sucedida até agora, e vamos pôr correntes à Microsoft receando que possa ser a mais bem sucedida e que se isso acontecer pode ter vantagem. Acho que é essa a definição de pôr o carro à frente dos bois.”
Dirk Auer, ICLE e professor assistente na Universidade de Liège

O que seria então um comportamento expectável? Dirk Auer reconhece que seria de esperar “alguma cautela e abertura à negociação com a Microsoft”. A ausência e o cariz algo decisivo de tentar impedir a compra recorrendo à justiça é “a questão surpreendente neste caso da FTC”. Ainda assim, reconhece que “a liderança atual na FTC já fez uma série de coisas que sugerem que querem ser muito duros” com as big tech.

Com Lina Khan, de 33 anos, à cabeça, a pessoa mais jovem a liderar a FTC, o regulador norte-americano tem sido mais incisivo. “Reverteram as suas próprias diretrizes de fusões, porque querem ter uma abordagem mais dura. Levantaram uma série de casos contra fusões, como tentar bloquear a aquisição da Within pela Meta — mais uma vez, uma startup que está num mercado que ainda não é muito maduro”, enumera Dirk Auer. Por isso, este especialista acredita que este passo em frente contra a Microsoft “não é surpreendente para esta FTC” mas sim bastante diferente tendo em conta o “historial” da agência. Até aqui, o regulador tem tido tendência a aprovar fusões verticais, onde se unem empresas da mesma indústria, normalmente de diferentes etapas de um processo, e nem tanto entre companhias rivais.

Anat Alon-Beck, professora-assistente na Case Western Reserve University School of Law, de Ohio, nos EUA, reconhece que este “é um caso muito interessante e incerto”, que até coloca a Activision como uma aquisição “demasiado cara” nas atuais condições de mercado. E, mesmo reconhecendo que “pode alterar a concorrência no mercado norte-americano de jogos, daí a preocupação da FTC”, esta especialista mostra alguma “incerteza em que um juiz veja a questão da mesma forma que a FTC”, justamente pelo facto de se tratar de “uma integração vertical”.

Microsoft tem “jogado bem as cartas” para se afastar do radar da concorrência

A moda é cíclica, com tendências que regressam com o passar das décadas. E, aparentemente, também as movimentações na concorrência, acredita Dirk Auer. “Estas coisas surgem em ciclos e a Microsoft passou de startup porreira a grande vilã nos anos 90 e início dos anos 2000. Agora tem andado um pouco fora do radar, tem tido algum sucesso.”

Há 20 anos que a dona do Windows não tinha um contratempo tão significativo “em casa” com o regulador norte-americano. Nesse sentido, Auer não tem dúvidas: a Microsoft tem “jogado muito bem as cartas que tem” para garantir que se mantém afastada dos holofotes da concorrência. Lembra que a empresa até já se posicionou “como queixosa”, contestando as práticas de outras tecnológicas e que “tentaram criar uma boa reputação de práticas de concorrência.”

Nos anos 90, com Bill Gates ao leme, os comentários do co-fundador à FTC eram mais ácidos. O New York Times recorda uma frase do co-fundador da tecnológica , onde o escrutínio à companhia era algo desvalorizado. “O pior que pode sair disto é que eu posso cair nos degraus da FTC, bater com a cabeça e morrer”, afirmou em 1992 em entrevista à BusinessWeek, alguns anos antes da disputa em tribunal sobre o domínio do navegador Internet Explorer. Só em 2001, após um julgamento bastante mediático, é que a Microsoft conseguiu chegar a um acordo com a administração Bush, acalmando os ânimos.

Nos últimos anos, a tecnológica tem vindo a recorrer a uma estratégia mais “simpática” com o intuito de evitar julgamentos conturbados. Estar afastada dos holofotes das autoridades de concorrência não quer dizer que os últimos 20 anos tenham sido isentos de ocorrências nesse campo. A diferença é que a empresa tem conseguido levar as negociações a bom porto, evitando julgamentos que atraiam demasiada atenção. O único incidente mais relevante é a investigação da Comissão Europeia, terminada em 2009, devido às opções de escolha de navegadores.

Este período relativamente mais calmo para a Microsoft é coincidente com a chegada de Brad Smith à empresa. Atualmente, Smith é presidente da empresa (mas sem poderes executivos). Em 2001, chegou à dona do Windows na qualidade de advogado, com uma missão apaziguadora e disponível para falar não só com reguladores como com governos. No cargo de presidente, faz questão de passar uma mensagem de uma empresa não só disponível a colaborar, como também continua a fazer uso da experiência e dos contactos em Washington adquiridos enquanto advogado. O NYT nota que, dias antes de a FTC anunciar a intenção de bloquear o negócio da Activision, Smith tinha estado num jantar na Casa Branca, a propósito da visita do Presidente francês Emmanuel Macron aos EUA.

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As principais tecnológicas têm crescido através de movimentos de consolidação, comprando várias empresas por ano. No caso da Microsoft, até à data, esta proposta para comprar a Activision Blizzard por 69 mil milhões de dólares é a maior na história da empresa. Caso o negócio seja concluído, pode ultrapassar a compra da rede social profissional LinkedIn, em 2016, por 26,2 mil milhões de dólares.

Já para a Meta, a aquisição mais dispendiosa diz respeito ao serviço de mensagens WhatsApp, que em 2014 custou à empresa um total de 22 mil milhões de dólares, acima do valor inicialmente estimado de 19 mil milhões de dólares. Os 3 mil milhões a mais foram justificados pela valorização das ações do então Facebook. Já na altura foi necessário à empresa passar pelo crivo dos reguladores europeus e, oito anos mais tarde, a aquisição do WhatsApp continua a ser um motivo de discórdia sobre a dimensão da empresa de Mark Zuckerberg. Além do WhatsApp, também se destacam as compras do Instagram, em 2012, por mil milhões de dólares, ou da empresa de realidade virtual Oculus, em 2014, por dois mil milhões de dólares. Em 2020, a FTC decidiu avançar com um processo contra o Facebook para tentar levar a empresa a vender o Instagram e o WhatsApp – aquisições a que deu luz verde há alguns anos.

A maior aquisição da Google diz respeito à divisão Motorola Mobility, que comprou em 2011 por 12,5 mil milhões de dólares. Ao longo dos anos, a tecnológica consolidou-se em novos mercados através de compras – já este ano comprou a empresa de cibersegurança Mandiant por 5,4 mil milhões de dólares, em 2014 deu 3,2 mil milhões pelos dispositivos para casa inteligente da Nest e em 2006 arrecadou o YouTube por 1,65 mil milhões de dólares. Mais complicada foi a aquisição da Fitbit, em 2021, por 2,1 mil milhões, que também teve de passar pelo crivo da concorrência.

A Amazon também tem várias aquisições feitas: em 2017 expandiu-se nas cadeias de supermercados com a compra da Whole Foods, por 13,7 mil milhões, ou no ano passado com a aquisição dos estúdios MGM, por 8,45 mil milhões. Destaque também para as compras da Ring, que fabrica câmaras, por 839 milhões, ou as compras da OneMedical e da iRobot, anunciadas este ano, por 3,9 e 1,7 mil milhões de dólares, respetivamente.

A Apple é a tecnológica que faz compras com valores mais modestos: a maior aquisição feita até hoje é a dos auscultadores Beats, por 3 mil milhões de dólares, em 2014, e a compra do negócio de modems para smartphones da Intel, em 2019, por mil milhões de dólares.

Pouco provável que negócio avance se alguma das investigações terminar em parecer negativo

As várias investigações a este negócio por parte de reguladores têm diferentes prazos. A CMA, a autoridade da concorrência no Reino Unido, estabeleceu 1 de março de 2023 como limite para tomar uma decisão, enquanto a Comissão Europeia quer chegar a uma conclusão até 23 de março.

A Microsoft tem comunicado ao mercado que espera conseguir fechar o negócio até ao fim do ano fiscal de 2023, que vai até junho. O prazo para a conclusão termina em julho. No entanto, a audição nos tribunais no âmbito do processo da FTC está marcada para 2 de agosto de 2023. 

O que acontece às restantes investigações fora dos Estados Unidos? “Todas continuam”, explica Dirk Auer, que admite que “perder algum dos casos será provavelmente fatal para o negócio”. Este responsável acredita que, “se a FTC for bem sucedida no processo ou se a União Europeia bloquear o negócio é o fim da linha.” “Não há volta a dar. Também se o Reino Unido bloquear a aquisição, não acho que seja possível a Microsoft dizer ‘bem, vamos abandonar o mercado britânico’, acho que isso não vai acontecer.”

Brad Smith tem sido o principal rosto das declarações públicas da Microsoft após a decisão da FTC para bloquear a compra.

FILIPE AMORIM/OBSERVADOR

Auer acredita que todos estes processos em curso podem “vetar o negócio”. Do lado da Comissão Europeia, admite que o regulador esteja disponível para “negociação”. “A Comissão Europeia tem sido, pelos seus próprios standards, relativamente silenciosa, o que me leva a acreditar que pode haver alguma negociação em relação a um acordo.” Mas há algo em que Dirk Auer não tem dúvidas. “É importante lembrar que estas autoridades da concorrência vão estar a falar umas com as outras. O que estão a fazer não acontece num vácuo independente” e de certeza que “vão querer saber o que é que as outras estão a pensar.” Para a Microsoft, o melhor desfecho passaria por um cenário “em que as três autoridades da Concorrência basicamente deixem cair os processos ou que cheguem a acordo”, considera Dirk Auer.

Caso a compra da Activision Blizzard não chegue a bom porto, existe também uma cláusula a pagar. A comunicação apresentada à SEC, o regulador dos mercados nos EUA, sobre o negócio detalhou o pagamento de entre dois a três mil milhões de dólares por parte da Microsoft se o negócio terminasse por contratempos causados por entraves de concorrência. Já no cenário de serem os acionistas da Activision a chumbar a fusão, será a empresa de jogos a ter de pagar 2,27 mil milhões à Microsoft.

A Activision precisava de uma saída que agora parece mais “incerta”

A empresa que a Microsoft quer comprar é um porta-aviões do mundo dos jogos e resulta também de um movimento de consolidação, lembra Paulo Rosa, economista sénior do Banco Carregosa. “A Activision Blizzard é já por si uma empresa que surge da fusão de duas empresas de videojogos, a Activision e a Blizzard, corroborando a crescente perceção de concentração do poder neste setor.” A união foi anunciada em dezembro de 2007 e concluída já em julho de 2008, por um montante de 18,9 mil milhões de dólares, fazendo com que títulos como “Guitar Hero”, “World of Warcraft”, “Diablo” e “Call of Duty” ficassem sob a alçada de uma única empresa. Já nessa altura foi necessário que a Comissão Europeia se pronunciasse sobre o negócio – a conclusão foi a de que não representava problemas na área da concorrência.

Com o passar dos anos, o poder da Activision Blizzard continuou a crescer. Além das franquias de sucesso nas consolas e PC – incluindo vários títulos AAA, a classificação usada na indústria para descrever jogos com elevado orçamento e bastante antecipados pelo mercado – a empresa também se virou para os jogos mobile. Estávamos em fevereiro de 2016 quando foi concluída a aquisição da King por 5,9 mil milhões de dólares (5,6 mil milhões de euros).

O nome pode não ser o mais familiar, mas falando em “Candy Crush” a conversa poderá ser outra. A King, primeiro King.com, é a responsável pelo bem sucedido título, lançado em 2012, que se tornou num dos maiores exemplos dos jogos casuais, tão usados para matar tempo no telemóvel em momentos de espera. A King, sediada em Malta, já existia antes do Farmville, o fenómeno desenvolvido pela Zynga que marcou os primeiros anos do Facebook. O jogo que pôs muita gente a trocar vacas e a fazer colheitas ao computador deu um empurrão à empresa, que primeiro tinha jogos casuais só no computador, levando-a aos jogos que tivessem complementaridade entre a versão web e o smartphone.

Esta viragem começou com o “Miner Speed”, um jogo que já tinha muito da mecânica do Candy Crush com a lógica de juntar três ou mais elementos iguais. Mais tarde, surgiu o “Bubble Witch Saga”, em 2011, e só um ano depois é que foi apresentado o “Candy Crush Saga”, a versão para smartphone, que tirava partido da popularidade do “Candy Crush”, primeiro só na versão de site. Passados dez anos, o “Candy Crush Saga” continua a ser um fenómeno de popularidade, que ainda hoje tem 240 milhões de jogadores ativos.

Mas ter algumas das franquias de jogos mais conhecidas do mundo não basta para se ter uma empresa isenta de contratempos. Ao longo dos últimos anos a Activision tem sido notícia pelos processos que relatam uma cultura de assédio sexual e discriminação de género na empresa. O caso mais recente de um novo processo por assédio contra a Activision data de outubro deste ano. O CEO, Robert Kotick, alegadamente teria conhecimento desta situação na empresa e não terá agido.

O jogo "Call of Duty" é um dos vários pontos de dúvida dos reguladores.

Getty Images

Antes, a Activision já tinha sido processada pelas entidades laborais do estado da Califórnia, em julho de 2021, depois de serem conhecidos pormenores sobre a cultura empresarial da companhia. Nesse processo, o ambiente de trabalho era descrito como “um viveiro para assédio e discriminação contra as mulheres, que incluía ter de rejeitar de forma contínua comentários sexuais e avanços indesejados por parte de colegas e supervisores e de serem apalpadas nos ‘cube crawls’ [idas de empregados a bares] e outros eventos da companhia”, citou o NYT. Num dos casos mais gravosos mencionados neste processo, uma empregada da Activision ter-se-á suicidado durante uma viagem da empresa, após os colegas terem alegadamente partilhado fotografias íntimas da mulher.

Na altura, a Activision reagiu em comunicado ao processo movido pelo Estado da Califórnia, dizendo que o “quadro que era pintado não representava o ambiente de trabalho atual da Blizzard”. “Não há lugar na nossa companhia ou indústria, ou qualquer indústria, para uma conduta sexual imprópria ou assédio de qualquer tipo.” A resposta foi vista como “horrenda” pelos trabalhadores, gerando a organização de protestos ou abaixo-assinados por mais de dois mil empregados para condenar as afirmações. “Acreditamos que os nossos valores enquanto empregados não estão a ser adequadamente refletidos nas palavras e ações dos nossos líderes”, citava o Techcrunch. Já este ano, a Activision avançou com um processo de resposta contra o estado da Califórnia.

Dirk Auer, do ​​ICLE, descreve a Activision como uma empresa que “já estava numa posição frágil” antes da notícia da compra. “O problema destas fusões é que se pega em empresas que realmente precisam de uma saída e de repente essa saída começa a parecer muito fechada e incerta”, contextualiza este especialista. “Acho que é uma posição muito difícil para se estar, mas o que acontece quando a operação estiver bloqueada isso é uma incógnita.” A única certeza, aparentemente, é a de que no cenário de fusão concluída, Bobby Kotick abandonará o cargo de CEO. “Quando o negócio estiver fechado, o negócio da Activision Blizzard reportará a Phill Spencer”, o líder da divisão de jogos da Microsoft, era possível ler no comunicado de anúncio da compra. Neste cenário de incerteza, o diretor de operações, Daniel Alegre, anunciou que vai trocar a Activision por “outra oportunidade” na empresa de NFT Yuga Labs, onde será CEO. Alegre esteve dois anos na empresa, depois de ter liderado a área de retalho e compras da Google.

Paulo Rosa, do Banco Carregosa, recorre aos resultados por ação da companhia para contrapor esta ideia da fragilidade da Activision. “É certo que o lucro por ação da Activision desceu do máximo de 3,47 dólares alcançado no quarto trimestre do ano passado para 2,15 dólares no terceiro trimestre deste ano, mas não parece de todo ser uma empresa fragilizada.” A este cenário junta-se o facto de as ações da Activision estarem a valorizar 12,65% até este ponto do ano, enquanto os títulos da Microsoft recuam 28,68%. O economista do Banco Carregosa refere que isso poderá ser sinónimo de que “os investidores não acreditam numa reversão do potencial negócio”.

Não é só a Microsoft a estar na mira da FTC

A atividade da FTC não tem parado este ano e a vontade de lançar desafios ao negócio das big tech tem sido cada vez mais notória. Em julho, o regulador apontou a mira à Meta, a dona do Facebook, também com vontade de bloquear uma aquisição, desta vez na área da realidade virtual. A diferença é que neste caso a agência federal está a tentar bloquear uma aquisição num mercado emergente e que está longe de estar consolidado.

A FTC considerou que, ao comprar o estúdio de jogos de realidade virtual Within por 400 milhões, a Meta “já é um dos principais participantes em cada nível do setor da realidade virtual”, com a entidade a referir que o “império de realidade virtual da Meta já inclui um dispositivo que lidera as vendas, uma loja de aplicações líder, mais sete entidades bem-sucedidas no desenvolvimento [de aplicações para realidade virtual] e uma das aplicações mais vendidas de sempre”.

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Com este cenário, a FTC considerou que a tecnológica e Mark Zuckerberg estariam a “planear expandir o império de realidade virtual da Meta com mais uma tentativa para adquirir ilegalmente uma aplicação dedicada a fitness que prova o valor da realidade virtual para os utilizadores”. A Supernatural, a aplicação mais popular da Within, permite praticar exercício com realidade virtual. Através do headset Meta Quest, o treino pode ser feito em cenários paradisíacos, das Galápagos até às ruínas de Machu Picchu.

Em agosto, surgiram as primeiras notícias sobre como a empresa de Zuckerberg estaria disposta a pôr esta aquisição em pausa para responder à FTC. Este mês, o fundador e CEO da gigante de redes sociais, que fez em 2021 uma viragem para o metaverso, foi a tribunal defender a aquisição da Within. Defendeu que está a ajudar a construir uma indústria de realidade virtual emergente e não a querer dominá-la. Admitiu ainda que a Within não é “muito crucial” para as ambições da Meta, que se concentram principalmente na construção de redes sociais.

Zuckerberg admite querer moldar o futuro da tecnologia mas diz que compra da Within não é crucial para Meta

Desde que teve início este mandato da FTC, nomeada por Joe Biden, a agência e o Departamento de Justiça dos Estados Unidos já tentaram travar 22 fusões, de acordo com números compilados pela Reuters. Desse número, pelo menos 15 negócios caíram por terra. Um dos exemplos é o bloqueio à fusão da Penguin Random House, a maior editora do mundo, com a rival norte-americana de menores dimensões Simon & Schuster. O negócio rondava os 2,2 mil milhões de dólares.

O total de 22 tentativas de bloqueio a fusões nos primeiros dois anos da administração Biden já superam o primeiro mandato inteiro de Barack Obama. Em comparação com a atividade nos primeiros dois anos de Donald Trump na presidência, trata-se do dobro, refere a análise da Reuters.

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