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A human neutrophil interacting with Klebsiella pneumoniae (pink), a multidrug?resistant bacterium that causes severe hospital infections. Credit: NIAID. (Photo by: IMAGE POINT FR/NIH/NIAID/BSIP/Universal Images Group via Getty Images)
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Uma célula do sistema imunitário (cinzento) envolve duas bactérias 'Klebsiella pneumoniae' (rosa)

IMAGE POINT FR/NIH/NIAID/BSIP/Universal Images Group via

Uma célula do sistema imunitário (cinzento) envolve duas bactérias 'Klebsiella pneumoniae' (rosa)

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"Nós temos sempre esta bactéria no hospital". 11 perguntas sobre a bactéria encontrada nos bebés no Hospital de Santa Maria

Quase todos os bebés da Neonatologia do Hospital de Santa Maria são portadores da bactéria resistente, comum nos hospitais. Isolar e desinfetar são as medidas principais. Mas os bebés podem ter alta.

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Tudo começou por causa da conjuntivite (uma inflamação da parte branca do olho) de um recém-nascido internado no serviço de Neonatologia do Hospital de Santa Maria. A análise do exsudado (vulgo ramela) indicou a presença da bactéria Klebsiella pneumoniae, mostrando ainda que a variante apresentava uma forma de resistência aos carbapenemos (um tipo de antibiótico potente).

A existência de um caso obrigou a estudar todos os outros bebés naquela unidade, com a descoberta de que estavam quase tinham a dita bactéria. No serviço de Neonatologia já não vão dar entrada mais recém-nascidos, uma situação que já estava prevista, e não é só por causa da bactéria. O encerramento do serviço e Obstetrícia e Ginecologia, que vai entrar em obras, seria acompanhado pelo encerramento do serviço de Neonatologia, este surto apenas antecipou a situação, esclarece ao Observador Álvaro Ayres Pereira, diretor do serviço de Infecciologia de adultos do hospital.

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Klebsiella pneumoniae. Que bactéria é esta?

Existem várias bactérias do género Klebsiella, sendo uma delas a Klebsiella pneumoniae. Estas bactérias, envolvidas por cápsula, estão presentes no ambiente e colonizam facilmente as nossas mucosas, incluindo das vias respiratórias e do sistema gastrointestinal.

Os hospitais são ambientes muito colonizados por bactérias, tanto a Klebsiella pneumoniae como outras, mas nem sempre se apresentam nas formas resistentes a antibióticos, explica ao Observador Luís Varandas, infecciologista pediátrico.

Álvaro Ayres Pereira, coordenador do Programa de Prevenção e Controlo de Infeções e de Resistências a Antimicrobianos (PPCIRA) do Centro Hospitalar Universitário Lisboa Norte (CHULN), explicou ao Observador porque é que não são admitidos mais bebés na Neonatologia e os procedimentos adotados por causa da bactéria detetada.

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Qual a diferença entre estar colonizado e estar infetado?

A bactéria (na forma normal ou multirresistente) pode estar presente no nosso organismo, durante muitos anos até, sem nunca provocar doença e sem desencadear uma resposta do sistema imunitário. Se viver num intestino saudável, por exemplo, o conjunto de todas as bactérias presentes ajudam a manter as populações dos diferentes tipos de bactérias controlados, ou seja, em equilíbrio.

Quando este equilíbrio é quebrado, pela toma de antibióticos ou de outros medicamentos, por causa de uma outra doença ou por outro motivo, a população de Klebsiella pneumoniae (ou de outra bactéria infecciosa) pode crescer descontroladamente e provocar uma infeção.

"Quando a análise identifica uma bactéria que tem um mecanismo de resistência (que implica maior dificuldade em ser tratada), essa criança é isolada e as crianças à volta — com os adultos é o mesmo — são testados de maneira a ver se estão ou não colonizados."
Álvaro Ayres Pereira, diretor do serviço de Infecciologia do Hospital de Santa Maria

Que doenças pode causar a infeção com Klebsiella?

Uma das infeções mais comuns (e mais fáceis de tratar) da Klebsiella pneumoniae é a infeção urinária, mas esta bactéria também pode provocar infeções oculares (como o primeiro recém-nascido testado), pulmonares — originando, por exemplo, pneumonias —, meningites ou infeções no sangue e originar uma infeção generalizada no organismo (septicemia). Nos casos em que a infeção é provocada por uma bactéria multirresistente, o doente pode correr risco de vida por falta de tratamentos adequados.

Como é que uma bactéria se torna multirresistente?

O uso incorreto de antibióticos, que servem precisamente para matar bactérias, é a principal causa do desenvolvimento de resistência. Este uso incorreto pode dever-se ao uso excessivo em animais (passando para os alimentos e para o ambiente), mas também pelas falhas no uso em humanos: quando o antibiótico não é o tratamento adequado, quando se usam antibióticos mais fortes ou por mais tempo do que necessário, quando os doentes não levam os tratamentos até ao fim.

O que acontece é que o pequeno número de bactérias de uma determinada espécie que não morre com o uso desse antibiótico vão conseguir multiplicar-se. Num novo contacto com o mesmo antibiótico, a maioria das bactérias em vez de morrer, sobrevive, e o tratamento do doente não é eficaz.

As bactérias — não só a Klebsiella, mas muitas outras — podem apresentar formas resistentes a um ou vários antibióticos. A resistência aos carbapenemos é preocupante porque estes representam um grupo de antibióticos usados quando outros já não se mostram eficazes e sobram poucas opções de antibióticos mais potentes.

Os colonizados têm de fazer tratamento?

Não. Quem não estiver doente não precisa de fazer qualquer tratamento. Aliás, usar antibióticos em pessoas que só estão colonizadas (só são portadoras da bactéria) pode causar o tal desequilíbrio — esse sim, potencial causador de uma infeção por esta ou outra bactéria. Se houver infeção, aí terá de haver tratamento.

O que se deve fazer no caso dos colonizados, nomeadamente em contexto hospitalar, é isolá-los dos restantes doentes até que tenham alta da doença que os levou ao internamento. Estes doentes colonizados, mesmo que não venham a desenvolver uma infeção, podem contaminar o ambiente ou contaminar outros doentes que sejam mais frágeis.

Jorge Amil Dias, presidente do Colégio de Pediatria da Ordem dos Médicos, disse à rádio Observador que o Hospital de Santa Maria estava a fazer o que era suposto no caso da bactéria que levou ao encerramento do serviço de Neonatologia.

“Estão a ser tomadas as medidas adequadas”

Todas as pessoas internadas são testadas para a presença de bactérias multirresistentes?

Não. “Só os doentes que são internados em unidades críticas”, explica ao Observador Álvaro Ayres Pereira, que também é coordenador do Programa de Prevenção e Controlo de Infeções e de Resistências a Antimicrobianos (PPCIRA) do Centro Hospitalar Universitário Lisboa Norte (CHULN), dando como exemplos doentes na dermatologia, que são todos testados, ou os que vêm de lares. Os doentes saudáveis, como as grávidas, não são testados, porque habitualmente não têm fatores de risco para estas bactérias.

Depois de detetada a colonização no recém-nascido com conjuntivite, todos os bebés que se encontravam na unidade foram também sendo testados e, ao longo do tempo, quase todos mostraram estar também colonizados — ou seja, eram portadores de uma forma resistente a carbapenemos da Klebsiella pneumoniae, mas não estavam infetados. Este é o procedimento que se segue em crianças e adultos: “Quando a análise identifica uma bactéria que tem um mecanismo de resistência (que implica maior dificuldade em ser tratada), essa criança é isolada e as crianças à volta — com os adultos é o mesmo — são testados de maneira a ver se estão ou não colonizados”, explica ao Observador Álvaro Ayres Pereira.

percentagem de casos de klebsiella pneumoniae resistente a carbapenemos nos países europeus

Os países da Europa de leste (a vermelho) e alguns do sul da Europa (a laranja) apresentou percentagens elevadas de bactérias Klebsiella pneumoniae com mecanismos de resistência aos carbapenemos — ECDC

Um bebé ou adulto colonizado pode ter alta e voltar para casa? E um infetado?

Um infetado não deve voltar para casa, especialmente quando se trata de uma bactéria multirresistente, porque o tratamento tem de ser feito em contexto hospitalar. Já uma pessoa colonizada pode voltar para casa desde que se verifiquem os cuidados de higiene necessários e se protejam as pessoas com um sistema imunitário mais frágil, como os doentes sujeitos a quimioterapia.

Como a bactéria pode estar presente nas vias respiratórias e no intestino, é preciso lavar bem as mãos antes e depois de fazer a limpeza, nomeadamente dos bebés, mas também dos adultos. As mães dos bebés que se encontram atualmente na Neonatologia serão informadas sobre os procedimentos a adotar e das precauções que devem ter em relação, por exemplo, aos avós ou outras pessoas com uma saúde debilitada que possam contactar com os bebés.

Depois, o que se espera é que os bebés deixem de estar colonizados por esta forma resistente, diz ao Observador Carlos Palos, coordenador do gabinete central PPCIRA do Grupo Luz Saúde. “Com o fim da pressão dos antibióticos, com a melhoria do seu desenvolvimento, com uma alimentação adequada, esta bactéria tem tendência a desaparecer, porque não consegue combater contra as outras bactérias que são mais fortes”, confirma Álvaro Ayres Pereira. De uma forma simplificada, as “bactérias boas” do organismo mantém as “bactérias más” sob controlo.

E se os antibióticos deixarem de tratar infeções?

Como se transmite? E como se evita a transmissão?

A transmissão da bactéria Klebsiella pneumoniae acontece, sobretudo, pelo contacto com superfícies contaminadas, sejam as mãos dos pais ou profissionais de saúde, tubos ou outros utensílios, ou outras superfícies em contexto hospitalar (paredes, cortinas, lavatórios, camas, etc.). Daí que seja tão importante cumprir as medidas básicas de controlo de infeção: a lavagem das mãos (antes e depois de tocar no doente), o uso único do fardamento do pessoal, a desinfeção dos locais e outras medidas de higiene.

“A bactéria permanece no ambiente, em particular em zonas húmidas e nos sistemas de drenagem dos lavatórios. Todo o ambiente pode ficar contaminado se não houver uma adequada higienização das instalações, dos equipamentos que são partilhados entre vários doentes, assim como uma adequada higienização das mãos por parte dos profissionais se saúde e dos cuidadores”, refere ao Observador Carlos Palos.

Outra das medidas que se tem implementado é a redução das intervenções invasivas (com seringas ou tubos ou nas cirurgias) porque as feridas abertas são ponto de entrada para as bactérias. As mucosas da boca, nariz e olhos também podem ser um ponto de entrada para a Klebsiella pneumoniae.

Nos recém-nascidos, esta bactéria (ou outras) também pode ser transmitida pela mãe, caso seja portadora, durante o parto. Não se sabe, no entanto, qual é a origem do surto na Neonatologia do Hospital de Santa Maria.

"Todo o ambiente pode ficar contaminado se não houver uma adequada higienização das instalações, dos equipamentos que são partilhados entre vários doentes, assim como uma adequada higienização das mãos por parte dos profissionais se saúde e dos cuidadores."
Carlos Palos, coordenador do gabinete central PPCIRA do Grupo Luz Saúde

Como se trava o contágio?

Se houver infeção, o doente tem de ser tratado adequadamente para eliminar a bactéria do organismo. Além disso, tanto os infetados como os colonizados devem ser isolados dos restantes doentes. Depois, é preciso desinfetar minuciosamente todas as superfícies, equipamentos e utensílios, para eliminar as bactérias que possam estar no ambiente circundante e que podem, potencialmente, ser transportadas para outros locais.

No Hospital de Santa Maria, uma das salas foi desinfetada com peróxido de hidrogénio e aí foram colocados os bebés que não estão colonizados. Claro que há sempre o risco de novo contágio, por isso o hospital optou por cancelar as novas admissões, explica Álvaro Ayres Pereira.

Novo método de desinfeção pode reduzir infeções hospitalares

Quem tem maior risco de colonização e infeção?

Há alguns fatores que aumentam o risco de colonização e infeção, sobretudo com bactérias multirresistentes, e estão muitas vezes associados a contextos hospitalares, de acordo com os Institutos Nacionais de Saúde dos Estados Unidos: internamento nos cuidados intensivos (incluindo a neonatologia), uso prolongado de dispositivos invasivos, imunocomprometidos (em especial alcoólicos e diabéticos), medicados há muito tempo com antibióticos de largo espetro e quando a bactéria entra no hospedeiro por inoculação direta ou pelas vias respiratórias.

O infecciologista Álvaro Ayres Pereira aponta que, de forma geral, são pessoas frágeis, seja por causa das doenças que têm (comorbilidades), devido aos múltiplos internamentos, por terem sido sujeitas a cirurgia, que fazem diálise ou por estarem a fazer quimioterapia. “Estes doentes são muito propensos a infeções, de modo geral, e como são muito propensos a infeções são medicados com antibioterapia. Muitas vezes até de uma forma excessiva, porque há uma cultura [nos médicos e na comunidade] — que está a combatida — de uma utilização excessiva de antibióticos, que faz com que as bactérias adquiram mecanismos de resistência.”

O que significa ser uma bactéria endógena?

Numa das conferências de imprensa, o infecciologista do Hospital de Santa Maria disse que a bactéria Klebsiella pneumoniae com o mecanismo de resistência aos carbapenemos era endógena. Ao Observador, explica: “Nós temos sempre esta bactéria no hospital, não lhe posso estar a mentir. O que nós não temos é evidência desta transmissão, que provoque doença ou não, [em todos os doentes de um sala, por exemplo]. Existe periodicamente, um doente aqui, um doente ali, que apresenta essa bactéria”.

Álvaro Ayres Pereira diz também: “Esta é uma situação que se repete — não na Neonatologia —, mas de vez em quando temos casos desses, embora não com um grupo tão grande de doentes simultaneamente”.

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