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O muro não acabou de cair

25 anos depois da queda do Muro, a Alemanha é o poder dominante na Europa. Esta afirmação sofre pouca contestação fora e dentro do continente.

25 anos depois da queda do Muro, a Alemanha é o poder dominante na Europa. Esta afirmação sofre pouca contestação fora e dentro do continente.

Não foi sempre assim. Se nos limitarmos à economia, por volta de 1995 crescia a ideia de que a reunificação alemã falhara. Entre 1995 e 1999, o crescimento do produto do país foi em média de 1,6%, contra 2,3% da União Europeia como um todo. No final do século, a Alemanha era o homem doente da Europa, uma sociedade bloqueada-  “a blockierte Gesellschaft” – como  escreveu em Junho de 1999 o  Economist, expressão que repetiu em 2003.   O declínio parecia inevitável. A grande Alemanha reunificada falhara.

Wirtschaftswunder”: o milagre económico aconteceu. Em menos de dez anos a economia revitalizou-se, com reformas sociais e laborais, a desigualdade cresceu, o país tornou-se tão poderoso e prestigiado que o destino da União Europeia se tornou dependente de um modo umbilical da vontade germânica e dos seus líderes, como se tornou claro na crise da zona euro.

Em 2014 assinalaram-se 100 anos do início da 1ª guerra mundial. Há 95 anos foi assinado o Tratado de Versalhes, causa (assim não tão) longínqua da 2ª guerra, que começou … há 75 anos. O seu resquício maior, o Muro de Berlim, caiu há 25 anos. A Alemanha, dividida em 1945, reunificou-se, transformando a Europa de forma marcante. Mais do que fazer a história da queda do Muro – brilhantemente descrita noutros artigos deste jornal -, este artigo pretende avaliar essa transformação e as suas consequências.

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Alemães festejam a passagem do ano de 189 no que restava do Muro de Berlim

Em 1997, Philip Zelikow e Condoleezza Rice escreveram um livro em que explicam como foi “cozinhada” a reunificação alemã – com grande influência da diplomacia americana, na sua perspetiva. Nesse livro abordam a aparente inevitabilidade da reunificação, concluindo que, para muitos europeus, ela era justamente isso, aparente: mais de metade da população da então República Federal Alemã, por exemplo, tinha dúvidas.
O que se passou então? Para resumir como resumir se deve num texto desta natureza, a reunificação alemã pôde acontecer quando e como aconteceu por 3 ordens de razão:

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Porque o chanceler Kohl acreditou ser esse o sentimento profundo do povo alemão, do de oeste como do de leste; porque os parceiros europeus a aceitaram, embora com relutância, e os americanos fizeram o mesmo, com menor relutância; porque a União Soviética, que então ainda era isso mesmo, cedeu. Esta é uma história de histórias (ou estórias, como às vezes se usa), protagonistas e figurantes, mas é na relação entre um Kohl determinado, uma Margaret Thatcher ferozmente oposta à ideia, um Bush agarrado à oportunidade de expandir o espaço ocidental de segurança até às fronteiras da (ainda) União Soviética, e sobretudo um Gorbachev protagonista acidental ultrapassado pelos acontecimentos, que tudo se joga e determina. Sem esquecer, claro, Mitterrand, cujo papel acaba por ser determinante do devir da própria União.

As negociações realizaram-se a partir de certa altura num modelo que ficou conhecido como 4+2 (EUA, RU, França, URSS e as 2 Alemanhas). Mas tudo se jogou nas frentes que acima refiro, interna, ocidental e soviética – e no posicionamento dos diferentes atores. Dessas histórias – perdão, estórias -, do seu desenrolar e culminar, decorrem 3 ordens de consequências:

Resumindo, da ordem da política, o regresso da Alemanha à condição de potência mundial e àquilo a que chamo o conflito de fronteira com a Rússia; da ordem da União Europeia, uma profunda modificação do equilíbrio da integração e dos eixos que o fizeram e fazem mover; da ordem económica, com a afirmação definitiva da Alemanha como a grande potência europeia.

BERLIN, GERMANY - SEPTEMBER 27:  German Chancellor Angela Merkel (L) presents a commemorative postal stamp showing former German Chancellor Helmut Kohl as the former Chancellor (R) looks on at a gala evening in Kohl's honour at the Deutsches Museum on September 27, 2012 in Berlin, Germany. Guests from politics, church and society attended the event to honour Kohl on the 30th anniversary of Kohl becoming chancellor. During his chancellorship Kohl facillitated the end of the Cold War, the fall of the Berlin Wall and German reunification.  (Photo by Christian Marquardt - Pool / Getty Images)

Angela Merkerl homenageia o seu antecessor em 2012 numa cerimónia que assinalou os 30 anos desde o mandato de Helmut Kohl. 

De regresso ao processo de reunificação, o principal enigma é a União Soviética (um segredo embrulhado num mistério dentro de um enigma, ter-lhe-á chamado Churchill, que gostava de frases fortes). Gorbachev não queria a reunificação. Khol apresentara em 28 de novembro de 1989 o plano em 10 pontos para a reunificação alemã, que despertou de imediato a oposição russa (e europeia, como veremos). No meio da turbulência do estertor do Estado soviético, as suas posições não tinham o peso das dos interlocutores ocidentais. Gorbachev viria a levantar a maior parte das objeções à unificação em finais de julho de 1990, aceitando mesmo a participação da “nova” Alemanha na NATO.

Fundamentalmente, os ocidentais queriam a retirada das tropas soviéticas da Alemanha Oriental. Os soviéticos exigiam que a NATO não se expandisse para leste, sendo o seu pesadelo que a aliança chegasse às suas fronteiras. Para Washington o essencial era que a Alemanha unificada integrasse as estruturas da NATO; o objetivo, provavelmente, nem era a expansão da aliança, que acabou por ser a consequência de uma negociação que correu bem demais, como se verá de seguida. O apoio à reunificação, que os americanos aliás também referiam como “inevitável” (Kissinger, por exemplo), foi como que instrumental desse objetivo.

Quando se realizou a cimeira entre Gorbachev e Bush em junho de 1990, primeiro em Washington e depois no refúgio presidencial de Camp David, nas Catoctin Mountains de Maryland, a posição alinhada dos americanos e europeus era a de oferecer ao líder soviético ajuda financeira em troca da aceitação pura e simples da reunificação. Nada mais. 

A controvérsia sobre a existência de uma promessa relativa à não expansão da NATO continua por resolver e prolongou-se até aos nossos dias, com americanos e europeus a insistir que nunca existiu e os russos a assegurar que sim. A história está contada com brilho num artigo de Mary Elise Sarotte publicado na Foreign Affairs de outubro deste ano. Para a autora, que usa documentação coeva já disponível, não restam dúvidas de que houve, pelo menos, uma discussão continuada sobre o papel da Nato no futuro; que os líderes ocidentais conheciam e procuraram contornar o ceticismo e a oposição soviética à expansão da Nato; mas também – conclusão de Sarotte – que Gorbachev nunca chegou a obter uma promessa formal de congelamento dessa expansão.

Porque terá sido assim, se o assunto era tão importante para os russos? Podemos imaginar que o tempo vivido então na União Soviética, de desagregação e confusão política, contribuiu largamente para esse desfecho. Certo é, como explica Sarotte, que quando se realizou a cimeira entre Gorbachev e Bush em junho de 1990, primeiro em Washington e depois no refúgio presidencial de Camp David, nas Catoctin Mountains de Maryland, a posição alinhada dos americanos e europeus era a de oferecer ao líder soviético ajuda financeira em troca da aceitação pura e simples da reunificação. Nada mais. Vitória em toda a linha.

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Encontro entre Gorbatchov e Bush na Rússia

Os Estados Unidos (o Ocidente, para sermos bondosos) venceram assim a batalha, felizmente pacífica, do pós-guerra fria. Mas como em Versalhes, semearam os ventos perigosos que hoje sopram de leste. A presença da Nato – e da União Europeia – nas fronteiras russas é o principal argumento utilizado, publicamente e em privado, por Putin e a generalidade dos responsáveis russos, para as intervenções nas suas fronteiras imediatas – como sucedeu na Geórgia, e sucede agora na Ucrânia.

Concluída a reunificação, a Alemanha voltou a sentir-se uma potência autónoma, livre de tutelas e com lugar à mesa dos grandes. Isso ficou logo claro na forma de gerir a relação com os países do antigo bloco soviético, como aconteceu no caso da ex-Jugoslávia. A Alemanha do pós-queda do Muro começou a recuperar um pouco do orgulho perdido na segunda guerra mundial e, pela sua demografia, pela economia, pela história, a sentir-se igual aos grandes poderes do Mundo. Uma potência relutante, ainda assim.

François Mitterrand, presidente do país que, tradicionalmente, constituía com a Alemanha o grande eixo da integração europeia desde a sua criação, há muito afirmara não ter medo de uma eventual unificação alemã, que dizia ser historicamente inevitável.

No que respeita à integração europeia, a perspetiva alemã foi sempre de apoio incondicional – pelo menos foi-a a de Kohl -, considerando uma íntima ligação entre essa integração e a reunificação alemã. “Duas faces da mesma moeda”, diz recorrentemente Kohl. E do lado dos seus parceiros europeus? François Mitterrand, presidente do país que, tradicionalmente, constituía com a Alemanha o grande eixo da integração europeia desde a sua criação, há muito afirmara não ter medo de uma eventual unificação alemã, que dizia ser historicamente inevitável.

Quando os acontecimentos se precipitaram, como veremos e ao contrário do que por vezes se pretende, o Quai d’Orsay e toda a política externa francesa alinharam com os desígnios alemães e, pelo menos, não se opuseram à reunificação. Já Margaret Thatcher foi ferozmente contra: “Vencemos os alemães duas vezes e ei-los de regresso”, é a sua mais conhecida frase sobre o assunto. Mas Thatcher fazia já, como Gorbachev, a via-sacra do correr do pano sobre a sua vida política ativa, e eram mais os que resistiam à sua visão sempre belicosa das relações internacionais do que os que verdadeiramente a apoiavam.

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Gorbatchev recebe Miterrand em Moscovo

Em geral, no rescaldo da queda do Muro e dos 10 pontos de Kohl, os europeus estavam céticos: o 1º ministro italiano Giulio Andreotti terá dito “gostar tanto da Alemanha que preferia ver duas”. Em janeiro de 1990, uma sondagem refletia a preocupação popular com a possibilidade de uma nova hegemonia alemã em países como a França, a Polónia e sobretudo o Reino Unido. Face a essa oposição, consciente da dificuldade em obter o indispensável apoio dos seus parceiros para uma reunificação que teria necessariamente de passar outros exigentes testes como o soviético, Kohl enviou uma carta pessoal a François Mitterrand antes de partir para o Conselho Europeu de Estrasburgo de 8 de Dezembro de 1990; nela apoiava a aceleração da união monetária e até uma união política europeia.

Na Europa dos inícios de 90, a arma alemã mais temida não eram (naturalmente) as suas forças armadas mas a força da moeda (e o poder do seu exército – o Bundesbank). Ao obter de Kohl a promessa de criação de uma moeda única, Mitterrand sentiu a guerra ganha. 

Embora Mitterrand tenha sido aborrecidamente ambíguo nas suas declarações de novembro de 1989, o seu apoio nunca esteve em causa. A consciência da inevitabilidade da unificação alemão – como o Presidente francês preferia chamar-lhe – não apagava os receios de uma Alemanha unida, forte economicamente, e do que isso poderia fazer ao projeto europeu e ao papel nele desempenhado pela França. E o que a França fez foi impor condições e tentar influenciar o molde em que a nova Alemanha reunificada se iria construir. Não logrou fazê-lo, e concentrou-se na aceleração da união económica e monetária e na criação da moeda única – o que levaria ao fim do poderoso marco.

Na Europa dos inícios de 90, a arma alemã mais temida não eram (naturalmente) as suas forças armadas mas a força da moeda (e o poder do seu exército – o Bundesbank). Ao obter de Kohl a promessa de criação de uma moeda única, Mitterrand sentiu a guerra ganha. São recorrentes as declarações de responsáveis alemães, como as do antigo Presidente Richard von Weizsäcker, ou de Hans-Dietrich Genscher, ex- ministro dos negócios estrangeiros, afirmando que a introdução do euro foi parte dos sacrifícios que permitiram a unificação alemã. Não farei aqui a história, chegando dizer que a forma como as coisas se passaram teve profundas repercussões na integração europeia.

WASHINGTON, DC - SEPTEMBER 19:  German Finance Minister Theo Waigel (L) and President of Germany's Bundesbank Helmut Schlesinger (R) shown in a photo dated 19 September 1992 leaving Dumbarton House in Washington following the Group of Seven economic ministers meeting..  (Photo credit should read JENNIFER LAW/AFP/Getty Images)

1992: Theo Waigel, ministro das Finanças alemão e Helmut Schlesinger a sair da reunião dos G7

Os franceses e os restantes parceiros europeus concordaram relutantemente com a reunificação alemã, que viria a ser ratificada no Conselho Europeu especial de Dublin já em 90. Se a França obteve o que queria – uma moeda partilhada com os alemães –, o que sucedeu nesses anos levou a um perigoso desequilíbrio da União Europeia e por 2 ordens de razão:

Por um lado, porque a moeda única não foi criada em condições ideais, já não digo de zona monetária ótima, o que seria sempre difícil, mas de previsão dos mecanismos adequados à gestão de uma união monetária entre economias marcadamente distintas e por vezes assimétricas (nas reações a crises económicas, por exemplo). E bastaria que os critérios e condições enunciados no relatório Werner de 1970 tivessem sido aplicados, para não estarmos hoje a viver a crise continuada da zona euro e das dívidas soberanas dos Estados mais frágeis. Para percebermos que soluções seriam, pensemos nas reformas já realizadas – ou ainda por realizar, todas indispensáveis – da zona euro, como a união bancária em curso; é um exemplo.

Em ambiente de moeda única, que passou a ser realidade a partir de 1 de dezembro de 1999, e numa zona monetária tão desequilibrada como a europeia, isso teria de ter, como teve, consequências graves. A prazo, e num prazo curto, a Alemanha fez as suas reformas e atingiu níveis de crescimento consideráveis.

A segunda consequência da forma como as coisas se passaram foi a dos futuros alargamentos a leste. Cedendo na partilha da moeda, a Alemanha impôs várias coisas: Desde logo, o fundamental nihil obstat europeu, a aceitação da reunificação; uma união interna feita nos seus termos (criação do d-mark ao câmbio de 1 para 1 entre o ocidental e o de leste); e, talvez com mais impacto, a aceitação do princípio do alargamento da União ao leste europeu. Este foi concluído apenas (até ver) com a adesão de 12 países entre 2004 e 2007 (depois já entrou a Croácia), mas as consequências para a União foram grandes e continuam sem dúvida a fazer-se sentir. Resumidamente, uma adesão dessa natureza pôs em causa de forma profunda a capacidade de absorção da União e desequilibrou o seu funcionamento.

Croatians wave an EU flag as they celebrate the accession of Croatia to the European Union at Ban Jelesic square in Zagreb on June 30, 2013. Tens of thousands of Croatians cheered the country's entry into the European Union at midnight Sunday (2200 GMT), almost two decades after the former Yugoslav republic's bloody independence war ended.  AFP PHOTO / STRINGER        (Photo credit should read STR/AFP/Getty Images)

Croatas festejam adesão à União Europeia

Economicamente, as consequências da reunificação decorrem em partes mais ou menos desiguais dos termos dessa reunificação e do rumo que tomou a União Europeia, acima referido. Desde logo, a criação do euro e os termos em que se realizou condicionaram de forma clara o devir europeu. Entre essas condições contam-se nomeadamente os critérios estabelecidos para a adesão dos vários países à zona euro – em particular a célebre meta do défice público de 3% – e até o valor final definido para a taxa de conversão das várias moedas para o euro (nomeadamente a do escudo, obviamente sobrevalorizado, com todas as consequências que bem conhecemos).

Igualmente importante é o facto da Alemanha, por causa da sua própria reunificação com moeda forte, ter estabelecido como prioridade máxima o aumento da sua competitividade em detrimento da produtividade europeia. Em ambiente de moeda única, que passou a ser realidade a partir de 1 de dezembro de 1999, e numa zona monetária tão desequilibrada como a europeia, isso teria de ter, como teve, consequências graves. A prazo, e num prazo curto, a Alemanha fez as suas reformas, atingiu níveis de crescimento consideráveis, prosseguiu uma visão estratégica de desenvolvimento com considerações próprias, sem ter em conta o equilíbrio do conjunto do mercado interno e da zona euro, contribuindo assim para aprofundar os problemas europeus.

Em conclusão, a queda do Muro de Berlim teve consequências na Alemanha e na Europa que ainda hoje se sentem e provavelmente vão continuar a repercutir-se nos próximos anos.

Politicamente, a Alemanha reunificada tornou-se, ou voltou a ser, uma grande potência mundial. Foi a Merkel que Obama mais ligou no advento e no decorrer da grande crise financeira de 2008. Politicamente, ainda, o Ocidente – EUA e Europa considerados – determinou os termos das relações internacionais da nova era pós-guerra fria, estendendo a sua influência a leste através da União Europeia e da NATO e desencadeando objetivamente o atual conflito de fronteira com a Rússia.

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Chanceler Alemã, Angela Merkel

Relativamente à União Europeia foram profundíssimas as consequências. Acelerou-se a integração de políticas, com a criação de uma zona de moeda única; começou a degradar-se o eixo franco-alemão e desapareceu uma espécie de diretório alargado que parecia estar a formar-se, incluindo Reino Unido, Itália e Espanha; a Alemanha tornou-se mais autónoma na formulação da sua política externa, chegando a ignorar a política externa europeia; irrompeu uma crise de grandes proporções causada a um ou dois tempos pelo desenho da união monetária e pela adesão massiva de países muito mais pobres e que, demográfica e economicamente, representam um desafio para a capacidade de absorção da União.

Economicamente, a Alemanha tornou-se definitivamente e de longe o motor europeu, embora prosseguindo sobretudo os seus próprios interesses e objetivos estratégicos e, com isso, não logrando contribuir para a obtenção de novos equilíbrios – de desenvolvimento, produtividade, crescimento e distribuição de riqueza – na União Europeia.

A Alemanha vive um receio existencial: à implosão gaulesa – ou o que se queira chamar à imensa crise, económica, política, social e até cultural vivida pelos franceses – soma-se a ameaça do britexit. E se os ingleses saírem de facto da União Europeia, aos relutantes germânicos restarão duas saídas.

A terminar importa salientar que a consciência de potência que a Alemanha tem hoje de si própria não invalida a permanência de uma relutância considerável a assumir-se como o poder dominante no continente. Não lhe cumpriu organizar a ordem mundial ou mesmo europeia na sequência da queda do Muro, pois esse foi o papel maior dos EUA, coadjuvados pela França e pelo Reino Unido. Não é, como sublinhou Patrícia Daehnhardt num artigo publicado no jornal Público em 2012, um líder reconhecido pelos seus parceiros europeus, acusada por estes de continuar a prosseguir uma estratégia autónoma e a impor o seu modelo económico. Receia, continua a recear, os seus próprios fantasmas.

A Alemanha vive um receio existencial: à implosão gaulesa – ou o que se queira chamar à imensa crise, económica, política, social e até cultural vivida pelos franceses – soma-se a ameaça do britexit. E se os ingleses saírem de facto da União Europeia, aos relutantes germânicos  restarão 2 saídas:

Ou assumir de vez e de facto o seu papel de potência dominante, de motor único da integração europeia, pondo ironicamente termo à especulação de quem os acusa disso mesmo, de quererem dominar a Europa. Se o fizer, a Alemanha terá depois de optar por ser solidária, permitindo à sua economia expandir-se em benefício das economias mais frágeis e do todo europeu, ou pelo contrário pela continuidade das suas atuais políticas, com profundíssimas consequências em termos de ressentimentos, de quebra acrescida da coesão, quiçá do fim do projeto europeu como o conhecemos.

Ou retrair-se, negar-se ao papel de motor e de locomotiva europeia, recolhendo a penates e deixando a outros a tarefa de resolver um problema que eles – esses outros – não têm nem vontade nem condições para resolver. Neste caso também, o risco de implosão da integração europeia é manifesto.

Disse-me há algum tempo um responsável alemão, em conversa informal: “Os europeus (a frase talvez começasse por “os portugueses”) preocupam-se muito com a intervenção e o peso alemão nas suas vidas; eu preocupo-me sinceramente com o dia em que, e espero que nunca surja, a Alemanha, nós, deixemos de nos preocupar com a Europa e os outros europeus”.

Assim vai a Europa, e o Mundo, vinte e cinco anos depois da queda do Muro.

Professor da Universidade Católica, Instituto de Estudos Políticos

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