771kWh poupados com a
i

A opção Dark Mode permite-lhe poupar até 30% de bateria.

Reduza a sua pegada ecológica.
Saiba mais

i

CAROLINA BRANCO/OBSERVADOR

CAROLINA BRANCO/OBSERVADOR

O triciclo de Julen ainda está à porta de casa. Os vizinhos rezam para que o venha buscar

Está ali, parado, há demasiado tempo. Ninguém quis tirá-lo do sítio onde Julen o deixou. É um símbolo da esperança. O Observador esteve no bairro da família do menino que caiu num poço em Málaga.

É à Virgen del Carmen que os vizinhos do pequeno Julen pedem que “tire o menino dali”, nas palavras de um deles. É a padroeira dos marinheiros, conhecida como a “estrela dos mares” — embora El Palo, o bairro onde vive a família de Julen, seja padroado por Nuestra Señora del Rosario. Talvez seja pelas fortes tradições piscatórias daquele bairro. Talvez seja porque muitos deles são netos e filhos de pescadores. Não conseguem bem explicar porquê, mas é à Virgen del Carmen que imploram que o menino de dois anos que caiu num poço de 100 metros no passado domingo saia de lá são e salvo.

Sabem que seria preciso um “milagre”. “Peço à Virgen que olhe por ele. Deus queira que haja um milagre!”, diz uma das vizinhas, Vitória, ao Observador. Cabelos curtos e brancos, rugas vincadas, olhos azuis e chorosos, pousa a vassoura com que varre o quintal para levar as mãos ao alto. Pede à padroeira e a Deus e novamente à padroeira por esse milagre. Os moradores querem que as suas preces sejam ouvidas, seja por quem for. Ainda esta quarta-feira, juntaram-se na igreja de Nuestra Señora de las Angustias, ali perto, para rezarem por Julen. 

El Palo é um bairro no extremo este da cidade de Málaga, com fortes tradições piscatórias (Foto: OBSERVADOR)

Numa altura em que são cada vez mais as evidências de que tudo pode acabar da pior forma, os vizinhos repetem insistentemente a palavra esperança. Não lhes é roubada nem pelo pano de fundo daquele bairro: a serra onde se encontra Totalán, onde pequeno Julen está desaparecido, num poço, há quatro dias. “Todos, aqui no bairro, temos esperança. Nós sentimos que ele está vivo. Julen está vivo e está a lutar com toda força que tem“, conta María, a vizinha da porta ao lado da de José e Vicky, pais de Julen.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

"Todos, aqui no bairro, temos esperança. Nós sentimos que ele está vivo. Julen está vivo e está a lutar com toda força que tem"
Vizinha de Julen

Logo nos primeiros minutos de conversa, María convida o Observador a entrar na casa. Explica que ali é mesmo assim. O bairro é cheio de vida, garantem os moradores, embora agora reconheçam que não é o mesmo. “Pela manhã, passamos pelo bairro e as pessoas estão todas apagadas“, conta Lleliam, a nora de María. Julen, descrito como um menino “encantador”, era um dos que mais contribuía para essa vida. No verão, com o calor, “estava sempre na rua, a brincar com os primos, a brincar com a bola” — conta María que o pequeno Julen é um fanático pelo futebol — “ou com o triciclo, aquele verde“, acrescenta Lleliam.

[Veja no vídeo como são complexas as três vias para resgatar Julen]

Esse triciclo ainda continua à porta do número 44 da rua Almagro y Cardenas: a casa de José e Vicky — que também cresceram e se conheceram naquele bairro. É ali que Julen costuma guardar o seu triciclo ou a sua mota, como o apelida. Fica sempre ali parado. Agora, está parado há demasiado tempo. Continua ali. Ninguém o quis retirar. Os vizinhos olham para o triciclo e sorriem, como se Julen lá estivesse empoleirado. Apontam para o brinquedo e fazem questão de dizer que é dele. O triciclo quase se tornou um símbolo de esperança. “Em El Palo, está tudo cabisbaixo, mas há tanta esperança”, diz Lleiliam ao Observador.

Dezenas de pessoas juntaram-se no centro de Totalán, para fazer uma vigília de apoio à família (Foto: JORGE GUERRERO/AFP/Getty Images)

JORGE GUERRERO/AFP/Getty Images

Foi daquele bairro que, esta quarta-feira, partiram juntos vários moradores rumo a Totalán, onde decorrem as operações de busca e resgate de Julen, para fazer uma vigília de apoio à família e aos profissionais envolvidos. Dezenas de pessoas juntaram-se no centro da localidade — algumas impulsionadas com a ajuda das redes sociais — para depois caminharem para perto do local das buscas. De crianças a idosos, várias pessoas seguravam cartazes com mensagens de força, que foram depois entregues ao pai de Julen.

A padroeira, o anjo e o irmão de Julen que “está presente”

A proteger Julen não está só a padroeira, mas também Óliver, o irmão que morreu aos três anos, quando Julen ainda tinha poucos meses de vida, com um enfarte fulminante. É pelo menos nisso que acredita o pai de ambos, José. “Tem calma, o pai está aqui e o teu irmãozinho vai ajudar-nos”, gritou para Julien no dia do acidente, quando ainda conseguia ouvi-lo a chorar do poço, segundo contou numa entrevista ao Diario Sur.

No bairro, ninguém estranha — porque Óliver era um “protetor” de Julen. “Quando uma criança se aproximava do irmão, ia logo a correr ver o que se passava”, conta María, ao Observador. “Julien não se lembra de Óliver, mas Óliver está presente”, acredita Lleiliam.

As operações de resgate e busca decorrem desde domingo para retirar Julen do poço (Foto: AFP/Getty Images)

AFP/Getty Images

O irmão de Julen morreu na primavera de 2017. A família tinha ido dar um passeio à praia e Óliver, que estava a brincar com a prima, começou a abrandar o ritmo. “Mamã, ajuda-me que estou cansado”, pediu. Sentou-se no chão. A mãe viu os olhos do filho a fecharem-se, julgando ela, de sono. A criança acabou por cair, por completo, no chão. Não era a primeira vez que algo deste género tinha acontecido: Óliver já tinha caído algumas vezes, chegando até a bater com a cabeça, mas os médicos nunca diagnosticaram qualquer problema. “Pensava que estava vivo. Chamaram a ambulância, assistiram Óliver, mas ele já estava morto”, recorda Lleliam ao Observador.

A trágica história de como José e “Vicky” perderam Óliver, o irmão mais velho do pequeno Julen

A maioria dos vizinhos não acredita que os pais alguma vez tenham ultrapassado — ou que alguma vez irão conseguir fazê-lo — a morte daquele filho. Lleiliam, porém, acredita que possam ter conseguido por uma razão: “Pelo Julen”. Estavam agora a “aprender a viver com isso”, resume María. O casal estava, segundo revelou José, a “tentar dar um irmãozinho ao Julen porque a vida lhe tirou o outro”.“Tinha o meu coração partido em mil pedaços pela perda do Óliver. E agora tenho-o partido em três mil porque dentro de um dia ou dois posso ficar sem ele”, acrescentou. Alguns jornais começaram a apelidá-los de “família amaldiçoada”. Os vizinhos não gostam da expressão e preferem chamar-lhes “família destroçada”.

Tinha o meu coração partido em mil pedaços pela perda do Óliver. E agora tenho-o partido em três mil porque dentro de um dia ou dois posso ficar sem ele"
José Roselló, pai de Julen

O pai e a mãe não perdem a “esperança de que [Julen] não está morto”. Esta manhã de quarta-feira, em declarações aos jornalistas, José disse acreditar que um anjo os iria ajudar a que o pequeno Julen “saia daqui o mais rápido possível”. Vitória continua no quintal — onde tantas vezes Julen passava algum tempo — a pedir um milagre. Sabe que só mesmo um milagre o pode trazer de volta. “Se estiver morto, o que era um enorme azar, que o tirem de lá. Só tem dois aninhos“, lamenta.

Julen pode mesmo sobreviver tantos dias no poço? E o plano de resgate pode funcionar?

Assine o Observador a partir de 0,18€/ dia

Não é só para chegar ao fim deste artigo:

  • Leitura sem limites, em qualquer dispositivo
  • Menos publicidade
  • Desconto na Academia Observador
  • Desconto na revista best-of
  • Newsletter exclusiva
  • Conversas com jornalistas exclusivas
  • Oferta de artigos
  • Participação nos comentários

Apoie agora o jornalismo independente

Ver oferta

Oferta limitada

Apoio ao cliente | Já é assinante? Faça logout e inicie sessão na conta com a qual tem uma assinatura

Ofereça este artigo a um amigo

Enquanto assinante, tem para partilhar este mês.

A enviar artigo...

Artigo oferecido com sucesso

Ainda tem para partilhar este mês.

O seu amigo vai receber, nos próximos minutos, um e-mail com uma ligação para ler este artigo gratuitamente.

Ofereça artigos por mês ao ser assinante do Observador

Partilhe os seus artigos preferidos com os seus amigos.
Quem recebe só precisa de iniciar a sessão na conta Observador e poderá ler o artigo, mesmo que não seja assinante.

Este artigo foi-lhe oferecido pelo nosso assinante . Assine o Observador hoje, e tenha acesso ilimitado a todo o nosso conteúdo. Veja aqui as suas opções.

Atingiu o limite de artigos que pode oferecer

Já ofereceu artigos este mês.
A partir de 1 de poderá oferecer mais artigos aos seus amigos.

Aconteceu um erro

Por favor tente mais tarde.

Atenção

Para ler este artigo grátis, registe-se gratuitamente no Observador com o mesmo email com o qual recebeu esta oferta.

Caso já tenha uma conta, faça login aqui.

Vivemos tempos interessantes e importantes

Se 1% dos nossos leitores assinasse o Observador, conseguiríamos aumentar ainda mais nosso investimento no escrutínio dos poderes públicos e na capacidade de explicarmos todas as crises – as nacionais e as internacionais. Hoje como nunca é essencial apoiar o jornalismo independente para estar bem informado. Torne-se assinante a partir de 0,18€/ dia.
Torne-se assinante a partir de 0,18€/ dia.

Ver planos