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Onde estão os ex-ministros e como mudam as suas vidas quando o telefone deixa de tocar ao minuto

De um minuto para o outro passam do meio campo para a bancada. Uma transição "violenta", descrevem os ex-ministros que contam como foi e como já se preparam outros voos (autárquicos incluídos).

Durante uma das visitas nas Jornadas Parlamentares do PS há três semanas, Mariana Vieira da Silva ouviu a sirene dos bombeiros em Castelo Branco e imediatamente pegou no telemóvel à procura de um dos grupos de WhatsApp de coordenação dos incêndios. Foi uma fração de segundo onde ainda agiu como ministra da Presidência em funções, até perceber que isso é agora passado. Não é caso único entre quem saiu do Governo — mesmo com metade dos ex-ministros a manterem-se na atividade política — qualquer que tenha sido a pasta ou a intensidade da mesma. A ligação demora a desaparecer, mas também há alívio, necessidade de cortes radicais e ponderações sobre a próxima vida (há três que não descartam candidaturas autárquicas).

João Gomes Cravinho pegou no carro, pouco depois de sair de funções, e seguiu com a família até à Albânia para voltar a conhecer os países “para lá das capitais, hotéis e aeroportos”. Há duas semanas, João Costa fez 120 quilómetros de um dos caminhos até Santiago de Compostela. Fernando Medina saiu das Finanças para o Parlamento, mas também passou a explicador de matemática de um dos seus filhos e dedicou-se a perder o peso ganho com a vida desregulada de ministro. Pedro Adão e Silva isolou-se no Alentejo e cortou de forma tão radical que nem os debates das legislativas o antigo comentador viu. Ana Abrunhosa deixou de “dormir com um caderninho ao lado” para tirar notas a meio do sono, mas já anda em “profunda reflexão” para as autárquicas. Mariana Vieira da Silva já consegue chegar ao fim do dia com 30% de bateria no telemóvel sem carregar — como pouco toca, às vezes até vai ver se não avariou. E José Luís Carneiro passou a andar de transportes e a pé — no dia do debate dos polícias, na caminhada até ao Parlamento, até seguiu ao lado de alguns.

São algumas das experiências dos treze governantes que falaram com o Observador sobre o que aconteceu na passagem “brusca”, “brutal”, “radical” do centro do furacão para o silêncio súbito.

Do “vazio” das quartas-feiras, ao alívio de outros dias

“Trabalhávamos tanto que agora sobra tempo“, comenta a ex-ministra da Coesão com o Observador. E conta que o pior foi mesmo o mês que se seguiu à demissão do primeiro-ministro: “Custou-me muito novembro e dezembro e nessa altura decidi que, mesmo que o PS ganhasse as eleições, não seria Governo”. Tal como Ana Abrunhosa, Mariana Vieira da Silva também diz que foram os piores meses, até que no Natal decidiu que tinha de sair desse estado.

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Hoje está no Parlamento, a ver pela primeira vez de frente a bancada do Governo onde se sentou durante os últimos oito anos — estava sempre na cadeira mais próxima de António Costa, sendo o seu braço direito desde o início. Diz que “há uma quebra abrupta de adrenalina” e que nos primeiros tempos até é difícil dormir, porque não há a exaustão normal quando se chega a casa. E fala na “sensação de vazio nas quartas-feiras à tarde” que sentiu “durante todo o mês de abril”. Era nesse dia da semana que, enquanto ministra da Presidência, preparava o Conselho de Ministros do dia seguinte: “E custava ver na televisão os mesmo sítios, os carros a chegarem para a reunião e não estar lá”.

No dia da tomada de posse do novo Governo, Mariana da Silva foi das últimas a despedir-se de Costa antes de o ex-PM entrar para o carro.

DIOGO VENTURA/OBSERVADOR

Fernando Medina já trazia a experiência de 2011, quando saiu do Governo e a transição foi tão difícil que, desta vez, acabou por se preparar para o que aí vinha depois de dois anos à frente do Ministério das Finanças. “Passamos do nível de alerta e stress máximos para níveis mais baixos e isso tem consequências no corpo”, descreve. “Para quem não passou por isso é muito violento. O organismo está sempre em modo alerta. A alteração é também química e muito exigente, porque o organismo habitua-se à adrenalina e quando desaparece há consequências” , garante, explicando que o que fez foi concentrar-se no que queria fazer e não tinha tido tempo nos últimos anos — até porque antes do Governo tinha estado oito anos na Câmara de Lisboa — e organizar esses tempos.

Já para Pedro Adão e Silva, o impacto do 7 de novembro foi tão grande que decidiu logo aí que ia cortar com a política. Já não participou na campanha eleitoral, nem viu os debates. Só voltou a acompanhar a atualidade quando começou a escrever para o Público. “Foi mesmo um corte epistemológico“, diz ao Observador. No dia seguinte à tomada de posse do novo Governo, quando terminou funções como ministro da Cultura, mudou-se para o Alentejo e por lá ficou. Já recusou até propostas para regressar ao comentário político: “Não é coisa que queira fazer”.

“É uma travagem a fundo, passamos de uma grande velocidade para ir a uma velocidade normal“, resume Maria do Céu Antunes, que saiu da Agricultura e diz que a mudança “não foi propriamente fácil mas também dá liberdade”.

“É difícil fazer o corte, mas vai-se fazendo”, descreve a ex-ministra da Habitação que revela ao Observador que não consegue “olhar da mesma maneira para as notícias do Governo no telemóvel e na televisão”.

"É possível chegar às seis da tarde e não tocar o telemóvel", comenta agora Mariana Vieira da Silva, que diz que estranha tanto que chega a pegar no aparelho "para ver se não se desligou"

“A pressão diária sai, mas fica a frustração do trabalho deixado a meio”, acrescenta, no entanto, Marina Gonçalves, que estava nos gabinetes do Governo desde 2015, com um pequeno intervalo em 2019, quando foi deputada mesmo antes de ser convidada por Pedro Nuno Santos para secretária de Estado da pasta que mais tarde passou a Ministério. “Estava numa área muito central das políticas públicas e de discussão pública também. É muito radical passar para funções não executivas”. Hoje é deputada em exclusividade, mas anda a pensar voltar à universidade para uma pós-graduação (tem mestrado em Direito Administrativo).

No fim, garante Manuel Pizarro, “sente-se uma certa libertação”. “Vem muito alívio“, acrescenta Mariana Vieira da Silva sobre o segundo momento do processo. “É possível chegar às seis da tarde e não tocar o telemóvel“, comenta, garantindo que lhe acontece nestes novos tempos e que estranha tanto que chega a “pegar no telemóvel para ver se não se desligou“.

Agora tem de ser ela própria a ir ver as notícias, já não lhe chegam alertas da equipa a todo o momento com o que acontece em todo o lado. Mas isso também tem vantagens: já consegue estar longe do telemóvel, faz caminhadas sem o aparelho e já não o tem nas imediações da piscina de natação para estar sincronizado com o Apple watch — não lhe passaria pela cabeça noutros tempos, como o Observador contava aqui. É deputada pela primeira vez — tal como Ana Mendes Godinho, ex da Segurança Social — e garante “não ter nenhuma ambição de sair” do cargo.

"Somos bichos estranhos, quando estamos no Governo não fazemos as coisas do cidadão comum". Ana Abrunhosa já ouve música no carro e vai às compras ao supermercado

O ex-ministro da Administração Interna, José Luís Carneiro, não garante não ter sofrido com as mudanças de rotinas e foca-se na parte do alívio. “Sente-se grande descompressão“, diz ao Observador, lembrando que antes de ser o responsável pela Administração Interna — “um Ministério de alta tensão e permanente alerta” — já tinha estado na Secretaria de Estado das Comunidades, pelo que estava habituado às ausências prolongadas e a uma agenda agitada: “Houve uma descompressão, uma qualidade de vida superior, mas não deixo de estar atento”.

Ana Catarina Mendes, que esteve como ministra Adjunta e dos Assuntos Parlamentares, comenta ao Observador que nem teve tempo para sentir angústias: “Fui logo para a campanha eleitoral e agora para o Parlamento Europeu”. Entretanto já tomou posse.

Cerimónia de tomada de posse do XXIII Governo Constitucional, no Palácio da Ajuda. O Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, deu posse ao Governo liderado pelo Primeiro-Ministro, António Costa. O Governo é composto por 17 ministros e 38 Secretários de Estado. Lisboa, 30 de Março de 2022. FILIPE AMORIM/OBSERVADOR

Na tomada de posse, em 2022, ainda havia vestígios da pandemia

FILIPE AMORIM/OBSERVADOR

Projetos autárquicos e não só

Quando se aproximava o fim do Governo, Ana Abrunhosa chegou a ter receio de vir a “sentir falta de uma vida muito amparada, com secretária e motorista” — os que tinha no seu gabinete até passaram os dois para o seu sucessor Manuel Castro Almeida. Mas garante que o que sentiu foi “grande liberdade”: “Ando muito de transportes públicos”. No seu caso assegura que sente “mais alívio e liberdade do que angústia: “Sinto que estava sempre em dívida, os presidentes de câmara tinham o meu telefone e eu sentia que estava sempre em falta e já nem conseguia saborear vitórias. Era tudo tão duro e pesado que as vitórias deixaram de ter sabor”, diz, sobre algumas negociações mais intensas em que esteve envolvida na transferência de competências da descentralização.

Sobre o futuro, Ana Abrunhosa está a ponderar a Câmara de Coimbra. Mariana Vieira da Silva e Manuel Pizarro também não rejeitam a ideia de uma candidatura autárquica

A vida abrandou, mas não totalmente. Abrunhosa, que é deputada e presidente da comissão parlamentar de Saúde, tem planos para voltar à Universidade de Coimbra, onde deu aulas desde 1995, na Faculdade de Economia, e também tem propostas do privado. Mas por agora, o campeonato parece poder vir a ser outro. Ao Observador conta que tem o desafio da direção do PS para se candidatar à Câmara de Coimbra, nas autárquicas do próximo ano. “Tenho o desafio que a direção do partido vê com bons olhos. Estou em profunda reflexão. Mas a saborear esta fase da vida e se volto, volta a ser tudo igual. Ainda é muito cedo, porque quando tomar a decisão sei que já não paro”, diz, atirando o assunto para outubro deste ano.

A questão autárquica também se coloca a outros dois ex-governantes. Um deles é Manuel Pizarro que, na conversa com o Observador sobre esta nova fase pós-Governo, começa por contar como não foi dos mais sofredores na saída do Governo. “Fui ministro pouco tempo. No contexto de uma vida é o que é: um período temporal muito curto”, relativiza. Mas também assume que “é uma mudança de vida, sobretudo numa pasta exigente: mobilizou toda a minha vida, que estava completamente concentrado na minha função pública”.

E agora? Declara-se “deputado, médico e político”. E autarca? “Pode acontecer. Depende sobretudo do povo do Porto. Eu sou português, mas sou portuense”, responde e quase já soa a campanha eleitoral. O assunto autárquico também povoa a cabeça de Mariana Vieira da Silva, que tem sido falada como um nome possível para Lisboa. Mesmo que diga que não quer sair do Parlamento, quando foi questionada pelo Observador se nem em outubro (provável altura para decisões de candidaturas autárquicas), é esquiva, mas não fecha a porta: “Vamos ver”.

Costa e Silva diz que tem várias propostas do privado mas anda a estudar o regime de incompatibilidades: "Não quero pôr em risco a reputação"

O caminho estreito do regresso ao privado…

Dos 17 ministros do anterior Governo, oito mantêm atividade política: sete são deputados e uma, Ana Catarina Mendes, é eurodeputada. De resto, o destino mais repetido é a academia (seja como professores ou alunos). Há também alguns regressos ao lugar de origem e outros em pousio, a ponderar propostas e também a acautelar o cumprimento da lei das incompatibilidades. “Se tiver a mínima hipótese de levantar dúvidas, não avanço“. António Costa e Silva, ex-ministro da Economia, é o mais desiludido com a experiência que teve nestes dois anos de onde saiu “frustrado” com a “inércia da Administração Pública”. Quer voltar ao privado, mas há regras a cumprir nos próximos três anos.

Desde que saiu do Governo diz ter recebido “múltiplos contactos” de trabalho do meio empresarial mas está “a estudar muito bem por causa da lei das incompatibilidades”, afirma ao Observador. Aos 71 anos, Costa e Silva (que foi presidente do conselho de administração da petrolífera Partex) diz que não quer “pôr em risco a reputação” e o caminho é estreito porque tutelou uma área “muito transversal” com contactos permanentes com o mundo empresarial.

O regime jurídico de incompatibilidades e impedimentos de titulares de cargos políticos e altos cargos públicos impõe um período de nojo de três anos a quem sai do Governo e queira ir para o privado, caso tenha decidido, durante o período do mandato, sobre privatizações ou benefícios ou incentivos (financeiros ou fiscais) dessas empresas.

… e mais largo para regressar à academia

No regime há, no entanto, uma exceção para quem regressa “à empresa ou atividade exercida à data da investidura”, mas neste grupo de ex-governantes são poucos os que seguiram esse caminho.

Três casos de regresso à origem. Elvira Fortunato, que foi ministra da Ciência (Ministério extinto pelo novo Governo), voltou à Universidade Nova de Lisboa. Catarina Sarmento e Castro, da Justiça, que volta ao lugar de origem na Universidade de Coimbra. Maria do Céu Antunes, ex-ministra da Agricultura, voltou ao Tagus Valley, o parque de Ciência e Tecnologia em Abrantes que se dedica à incubação de empresas, inserção profissional, literacia digital, mas também ao desenvolvimento de novos produtos alimentares. Foi diretora executiva até 2006, altura em que foi para vereadora da Câmara de Abrantes. Dezoito anos depois regressa ao local de origem, numa função de “suporte à direção, mais ligada ao controlo de qualidade, financiamento e licenciamentos”.

Alguns ministros voltaram à Universidade, mas não às aulas. Pediram licença sabática a que têm direito pelo exercício de funções públicas.

São muitos os ex-ministros que mantinham atividade académica antes de irem para o Governo e esse regresso é o mais frequente. Além de Elvira Fortunato, também João Costa voltou ao departamento de linguística da mesma Universidade Nova (embora só até ao final do ano). Ainda assim, neste grupo alguns ministros pediram licença sabática (a que têm direito pelo exercício de funções públicas), caso de João Gomes Cravinho, que tem em suspenso o regresso à Universidade de Coimbra. Ao Observador revela que nesta altura está a ponderar dois convites (um académico e outro diplomático) que lhe chegaram depois de ter saído do Governo.

Pedro Adão e Silva, ex-ministro da Cultura, também recorreu à dispensa temporária da atividade docente no ISCTE, bem como Helena Carreiras, da Defesa, que conta ao Observador que vai aproveitar este período para “uma reciclagem”, como lhe chama: “Ler tudo o que não li e participar nas conferências em que não participei”. É professora catedrática no ISCTE, nas áreas da Sociologia, Políticas Públicas e Metodologia de Pesquisa Social, e investigadora do Centro de Investigação e Estudos de Sociologia.

Outro dos ex-ministros que segue para a academia mas para lecionar é José Luís Carneiro. Neste momento é deputado, onde faz parte da Comissão de Assuntos Europeus e na semana passada assinou contrato com o Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas para professor convidado — “sem remuneração porque não posso acumular” dois salários do público. Vai dar aulas num seminário que está enquadrado nas licenciatura, mestrados e doutoramentos da faculdade e em duas áreas: Relações Internacionais e Administração Pública. Às segundas-feiras, antes de vir para Lisboa, para o comentário na CNN Portugal, ainda dá duas horas de aulas sobre política externa portuguesa na Universidade Lusíada.

Há também quem ainda não tenha revelado o que pretende fazer no futuro, caso de Duarte Cordeiro. O ex-ministro do Ambiente foi alvo de buscas no âmbito da Operação Influencer — a que fez cair o Governo — e desde então tem recusado assumir cargos políticos, mantendo-se apenas como um dos secretários-nacionais do PS. Contactado pelo Observador, não quis falar sobre o futuro.

Viagens, consultas, surf, dietas e Taylor Swift

“Já viu? Eu que sou coxo a fazer os Caminhos de Santiago. É um desafio brutal”. Quando João Costa falou com o Observador estava já na última etapa de 120 quilómetros, tendo partido de Tui. Depois de deixar o Ministério da Educação, onde esteve desde o início (primeiro como secretário de Estado), voltou à universidade, mas em janeiro de 2025 vai assumir a direção da Agência Europeia para as necessidades especiais e educação inclusiva.

O Governo é um passado que ficou lá atrás e garante que não sofreu com esta passagem depois de tantos anos: “Sou muito bom a fazer transições“. Fala da “vida mais calma” que tem, de “poder escrever, ler, estar com a família e amigos com tranquilidade”. Mas longe de se afastar da política: não só escreve artigos para o Expresso, como publicou um livro com o título “Manifesto pelas Identidades e Famílias. Portugal Plural” — uma espécie de resposta ao que esteve no centro da recente polémica com Pedro Passos Coelho. Também diz que fala diariamente com a líder parlamentar do PS, Alexandra Leitão, uma amiga que diz ter feito nos primeiros tempos do Ministério da Educação, em que ambos eram secretários de Estado, e com quem mantém relação “de quase irmãos”.

Depois de sair do Governo, João Gomes Cravinho pegou no carro e foi até a Albânia: "Foi excelente para desanuviar e ver coisas além de capitais, hotéis e aeroportos"

João Gomes Cravinho também garante que desligou com facilidade e que há dias estava na praia quando recebeu uma chamada a dar-lhe conta da notícia do navio com bandeira portuguesa capturado pelo Irão: “Pensei: menos uma coisa com que tenho de me preocupar”.

Mal saiu dos Negócios Estrangeiros — antes disso já tinha estado na Defesa — Gomes Cravinho fez uma viagem de cinco semanas com a família até a Albânia de carro. “Foi excelente para desanuviar e ver coisas além de capitais, hotéis e aeroportos”. Voltou de barco por Bari e ainda subiu pela Itália. Foram mais de 9 mil quilómetros e separá-lo de uma experiência política conturbada desde que estava na Defesa, mas sobretudo a partir do momento em que o seu nome foi referido por um dos arguidos no caso Tempestade Perfeita.

Pedro Adão e Silva não precisou de fazer um caminho tão grande para desligar e ficou-se pela costa alentejana onde diz que o tempo que ganhou lhe tem permitido fazer o que gosta: “Ler, ouvir música e fazer surf”. Já Ana Abrunhosa está a apreciar o tempo em que já consegue estar a ver televisão no sofá sem ter trabalho no colo, de ir ao ginásio mais tarde e não às seis e meia da manhã, como ia nos tempos em que era ministra.

Ao mesmo tempo garante que continua a ser “das que gosta de trabalhar das nove às nove” e fala quase com admiração própria e nostalgia do dia em que tiveram de chamar os técnicos informáticos ao gabinete do Ministério para perceber o que se passava com o Outlook. “Não aceitava mais inserções de agendamentos. Ultrapassei os limites“, conta com orgulho, lembrando a média de 20 mil quilómetros por mês que fazia pelo país.

No dia seguinte à tomada de posse do novo Governo, Adão e Silva foi para o Alentejo e está lá desde então

DIOGO VENTURA/OBSERVADOR

Agora voltou a conduzir: “Pela primeira vez em muitos anos oiço música a conduzir. É uma alegria.” E só agora teve noção de que é reconhecida pelas pessoas, quando voltou a fazer as tarefas mais simples, como ir às compras. “Somos bichos estranhos, quando estamos no Governo não fazemos as coisas do cidadão comum”, diz, para justificar o alheamento.

Essa parte de ser notado na rua, Fernando Medina já conhecia bem, sobretudo desde que foi autarca em Lisboa. Nesta nova vida pós-Governo dedicou-se a estar mais com a família. Com três filhos pequenos e o do meio a precisar de se preparar para os testes do final do ano, acabou por ser o ex-ministro das Finanças a ser o explicador de Matemática. “Aproveitei para recuperar tempo com a família”, diz ao Observador.

É deputado, mas o ritmo é mais lento do que aquele que levou nos últimos anos. Aproveitou também para voltar ao comentário televisivo, agora no canal televisivo Now: “A preparação do programa televisivo é muito exigente”. Não mais do que a dieta a que também se tem dedicado: “Já perdi muito peso. Quando se está no Governo é impossível, o stress inibe a perda de peso e uma pessoa está condenada ao cansaço permanente”.

Carneiro passou a andar transportes e a pé pela cidade e no outro dia acabou a descer a rua de São Bento, até ao Parlamento, ao lado de polícias (que tutelou) que iam para o debate. 

No caso de Mariana Vieira da Silva,  vai-se refugiando na leitura e nos concertos para os quais já pode comprar bilhete sem correr o risco de depois passar o tempo fora da sala ao telefone. Mas ainda estava no Governo (sem demissão à vista) quando arriscou comprar bilhete para ir ver o concerto de Taylor Swift, longe de saber que para maio de 2024 não haveria grande risco. Também voltou à tese de doutoramento que deixou pendurada nestes oito anos e que tem o plano de terminar até ao final do verão.

Manuel Pizarro também voltou a ler mais, a ir mais ao teatro e ao cinema. Mas diz que aquilo de que sente mesmo falta “é de poder ver doentes”: “Custa-me muito deixar de ser médico”. O especialista em medicina interna diz que foi o que mais lhe custou deixar de ser enquanto foi ministro. “Agora tenho sido com alguns conhecidos e antigos doentes. E um dia voltarei ao exercício mais organizado” da profissão, diz o ex-ministro da Saúde.

José Luís Carneiro tem estado sempre ocupado e começou mesmo antes de sair do Governo, quando disputou com Pedro Nuno Santos a liderança do PS. Não ganhou, mas mantém o ritmo elevado na presença política, partilha religiosamente nas redes sociais os seus comentários televisivos (na CNN) e anda a sistematizar esses mesmos comentários para mais tarde publicar em livro. Anda mais a pé e de transportes públicos. Há dias estava a descer a Rua de São Bento, em direção ao Parlamento, e deu-se conta de que ao seu lado, na caminhada, havia polícias que iam assistir ao debate (depois de desafiados por André Ventura). Tutelou-os no Ministério e os seus últimos dias como ministro ficaram precisamente marcados pelas críticas à gestão das reivindicações sobre o suplemento de risco, mas naquele dia, a descerem a rua de São Bento lado a lado, não houve problemas.

"A Administração Pública é napoleónica, muito mal organizada". António Costa e Silva saiu desiludido com o Governo

O ex-ministro que menos saudades manifesta sobre o passado é mesmo António Costa e Silva, que não poupa nas palavras quando critica a Administração Pública que encontrou quando entrou no Governo.

“A Administração Pública é napoleónica, muito mal organizada” e vive “na inércia”, o “que é muito frustrante. Podíamos ter feito muito mais”, lamenta ao mesmo tempo que diz estar bem consigo mesmo e que tem tido “muita atividade” desde que deixou o Ministério da Economia. Participou em conferências do setor de material elétrico, de ciência energética, da Apetro (Associação Portuguesa De Empresas Petroliferas), sobre inteligência artificial e outra ainda com a Associação de Empresários da Madeira. “Estava a pensar que ia descansar um bocado e não”.

Nada parecido com o que foi ouvido por Mariana Vieira da Silva, Fernando Medina e Pedro Siza Vieira quando estavam sentados numa esplanada, há duas semanas, no segundo jantar de antigos governantes desde que o Governo de Costa acabou — há vários grupos de Whatsapp ativos e com quem saiu para combinar estas reuniões. Os três ex-ministros estavam à conversa quando passou alguém na rua que reconheceu aquelas caras e atirou: “Olha, têm tempo livre”. Alguns deles, por agora.

 
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