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Eleições Diretas PSD: Rui Rio, atual líder e recandidato à liderança do Partido Social Democrata - PSD - em entrevista para o Observador durante o voo de regresso para Lisboa, após ter concluído o seu programa oficial de 2 dias na Região Autónoma da Madeira. 24 de Novembro de 2021 Funchal, Lisboa - TAP TOMÁS SILVA/OBSERVADOR
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TOMÁS SILVA/OBSERVADOR

TOMÁS SILVA/OBSERVADOR

Os bastidores da campanha de Rio: o combate irracional, a fé e o champanhe para o que der e vier

As duas garrafas de champanhe, a quase desistência e as mágoas de um homem cada vez mais só no partido e cada vez mais convicto de que o país o deseja. Os três dias do Observador na campanha de Rio.

As primeiras notas do “Paz, Pão, Povo e Liberdade” anunciam a chegada de Rui Rio. O líder social-democrata atravessa o corredor entre as colunas de cadeiras em passo rápido. Não há speakers a pedir “deem as boas-vindas ao próximo primeiro-ministro de Portugal”, não há gritos de “PSD”, não há festa, nem carnaval partidário. Tudo naquele ambiente é contido — Rio, a equipa que o acompanha, os militantes que o aguardam, ninguém está exatamente esfuziante. Pedro Coelho, presidente de Câmara de Lobos e mandatário regional da candidatura, segue ao lado do líder. Os dois acercam-se do palco, Alberto João Jardim junta-se. Rio senta-se e afunda-se no cadeirão do meio. Tem pela frente uma hora com militantes.

Passam 31 minutos das sete da tarde. Os cerca de 140 apoiantes de Rui Rio que preenchem o Museu da Imprensa, em Câmara de Lobos, aguardaram com expectativa comedida a chegada do presidente do partido. Na fila da frente, contam-se pelos dedos os rostos conhecidos. O que resta do jardinismo, capitaneado pelo próprio, fez questão de marcar presença. José Silvano, secretário-geral, e Florbela Guedes, a influente assessora e uma das pessoas em que o líder mais confia, compõem o braço do rioísmo que se fez representar na Madeira. Um braço que foi ficando cada vez mais curto ao longo dos últimos quatro anos e sobretudo nos últimos meses. Mas que permaneceu fiel até ao fim.

Autoexcluído da campanha interna sob o argumento de que tinha de preparar o partido para as legislativas, Rio abriu uma exceção para a Madeira com um sentido estratégico claro: com quase três mil militantes em condições de votar nas próximas diretas, com o apoio de Alberto João Jardim e de Pedro Coelho, com trabalho de campo feito, com um resultado expressivo no arquipélago, as contas podem ficar baralhadas e o líder social-democrata pode muito bem minimizar o favoritismo assumido que Rangel tem junto de outras estruturas do PSD.

Encontro entre Rui Rio, atual líder do PSD, e Miguel Albuquerque, Presidente do Governo Regional da Madeira, no âmbito das eleições diretas do partido (PSD). 22 de Novembro de 2021 Quinta da Vigia, Funchal, Madeira TOMÁS SILVA/OBSERVADOR

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Rio, de resto, fez quase tudo o que os dois dias na Madeira permitiam fazer. Reuniu a tal centena e meia de militantes, encontrou-se com autarcas e presidentes de junta, falou sobre as questões que mais importam à região (a construção do novo hospital ou a questão da TAP, por exemplo) e esteve com os operacionais no terreno num jantar longe do olhar indiscreto da comunicação social.

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Não houve carne assada, nem foguetório. Mas a aposta foi feita. Rio disse e repetiu o que vinha dizendo nos últimos dias: Rangel é “fanfarrão”, Rangel depende do aparelho, Rangel quer o poder pelo poder, Rangel é ziguezagueante, Rangel não está preparado para ser primeiro-ministro, votar em Rangel é votar na continuidade de António Costa. Na terça-feira, quando apareceu no Museu da Imprensa, discursou durante 40 minutos, uma das mais longas intervenções de Rui Rio numa disputa interna. E já lá vão três. A aposta foi feita.

No voo de regresso ao continente, permitiu-se fotografar pelo Observador. Dali a poucas horas, reunir-se-á com António Costa para ouvir o que primeiro-ministro tem a dizer sobre o combate à pandemia. Parece cansado, mas não inacessível. Tem uma mala castanha de couro, algo gasta, ora no colo, ora na mesa de apoio do assento, e vai brincando com fecho dourado enquanto é fotografo. A viagem à Madeira tinha corrido bem. Se dará ou não frutos, isso é outra conversa.

A matemática dos operacionais de Rio tem tanto de simples como de imprevisível: se ao apoio da Madeira e de outras estruturas mais modestas que estão com Rio se juntar o chamado voto livre, o líder e recandidato pode inverter a sorte que lhe parece estar reservada. Se esta operação de charme tiver tido sucesso, ajudará a mudar o curso de uma história que para muitos já está escrita: Rangel ganha, Rio perde. Seja como for, o líder social-democrata está preparado para tudo.

A quase desistência

Rui Rio chega a esta fase da sua liderança em clara e assumida quebra do ponto de vista interno. Depois de umas diretas difíceis com Luís Montenegro, que quase partiram o partido a meio, Rio viu a sua base de apoio ficar ainda mais reduzida. Perdeu estruturas importantes, como as distritais do Porto ou da Guarda, teve gente que sempre esteve do seu lado a mudar de trincheira, perdeu a confiança de um dos seus vices politicamente mais relevantes, Nuno Morais Sarmento, e viu esfumar-se a onda vitoriosa que parecia estar a criar depois das autárquicas.

Quem o conhece bem garante que não ficou desiludido com o que viu na exata medida em que estava preparado para isso. De Rio diz-se que não perdoa traições porque já assistiu a muitas. E não é por acaso que sempre se rodeou de equipas pequenas, com gente da sua mais estreita confiança. Os adversários internos viram sempre nisso o reflexo de um líder fechado em si mesmo, que gosta de se rodear de apoiantes acríticos. O que aconteceu a antes e durante esta campanha interna só fez com que Rio reforçasse as suas convicções: a dimensão humana da política nunca deixa de o desiludir.

Eleições Diretas PSD: Rui Rio, atual líder e recandidato à liderança do Partido Social Democrata - PSD - completa o seu programa oficial na Madeira com uma sessão de esclarecimentos com os militantes do partido. Nesta sessão fez-se acompanhar por Pedro Coelho, Presidente da Câmara de Lobos e Alberto João Jardim, ex-presidente do Governo Regional da Madeira. 23 de Novembro de 2021 Câmara de Lobos, Madeira TOMÁS SILVA/OBSERVADOR Eleições Diretas PSD: Rui Rio, atual líder e recandidato à liderança do Partido Social Democrata - PSD - completa o seu programa oficial na Madeira com uma sessão de esclarecimentos com os militantes do partido. Nesta sessão fez-se acompanhar por Pedro Coelho, Presidente da Câmara de Lobos e Alberto João Jardim, ex-presidente do Governo Regional da Madeira. 23 de Novembro de 2021 Câmara de Lobos, Madeira TOMÁS SILVA/OBSERVADOR

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Paradoxalmente, Rio chega esta fase da sua liderança na sua melhor sequência de resultados: manteve o controlo do Governo da Madeira, recuperou os Açores, conquistou as importantes autarquias de Lisboa, Funchal, Coimbra e Barcelos, tem 11 capitais de distrito e o fosso para o PS em número de câmaras é agora bem mais modesto do que era em 2017.

Numa ideia: as autárquicas de 2021, o grande desígnio de Rio, foram superadas para lá de todas as aspirações. Mesmo as mais irrealistaspor muito que a história possa ser contada e recontada, a poucos dias das eleições em Lisboa, a grande conquista de Rio nestas autárquicas, ninguém no núcleo duro do líder social-demorata acreditava que Carlos Moedas fosse conseguir.

Mais: Rio chega até aqui depois de António Costa ter caído às mãos da esquerda na aprovação do Orçamento do Estado para 2022, tal como tinha previsto desde o minuto zero da sua liderança. Com as devidas distâncias, o pântano por que esperavam os homens de Rio, o tal que há 20 anos derrubou António Guterres, chegou mesmo. Mas o partido (ou uma parte relevante dele) não parece querer que seja Rio a apanhar o próximo voo com destino às legislativas.

Tudo isto é incompreensível para Rio. E, embora ninguém o assuma publicamente, é hoje um dado inequívoco e indesmentível que o líder social-democrata chegou mesmo a ponderar não avançar com esta recandidatura.

Na ressaca do Conselho Nacional que impôs a marcação das diretas mesmo quando já se perspetiva a crise política, o líder social-democrata esteve perto de bater com a porta. Nesse fim de semana, nos idos de outubro, muitos dos seus apoiantes mais próximos estavam convencidos de que tinha acabado, que tinha chegado ao fim. Rio estava farto e disposto a entregar o partido aos que nunca partilharam o seu entendimento de interesse nacional, como contava então o Observador. Acabaria por mudar de ideias.

As duas garrafas de champanhe

A sensação de missão inacabada acabou por ser mais forte e Rio calçou de novo as luvas de boxe. Fê-lo, em grande medida, por acreditar que não podia deixar órfãos todos os que, genuinamente, o tinham apoiado desde o primeiro minuto. E fê-lo mesmo contra a opinião de alguns dos seus conselheiros mais próximos, como Morais Sarmento, que o aconselhou a deixar o partido pela porta grande depois das autárquicas. Premonitório do que Morais Sarmento viria a fazer a seguir, ironiza-se agora no núcleo duro de Rio.

Este paradoxo fez crescer em Rui Rio um misto de sensações, entre a frustração de estar a ver o partido a desbaratar uma oportunidade de ouro para apear António Costa e a desilusão com a forma como tudo se desenrolou desde que a candidatura de Paulo Rangel começou a ser pensada e desenhada.

As críticas dos adversários internos, a mercearia partidária, a lavagem de roupa suja, a visível perda de apoio interno, a insistência em eleições diretas na véspera das legislativas contra a vontade do próprio, as derrotas no Conselho Nacional, tudo isto fez crescer uma certeza no líder social-democrata: o aparelho partidário nunca o compreendeu ou ele nunca compreendeu o aparelho partidário. O mais provável, aliás, é que as duas ideias estejam corretas.

No mesmo núcleo duro do líder social-democrata diz-se outra coisa: Rui Rio tem duas garrafas de champanhe prontas para qualquer pretexto. Se perder contra Rangel, abre a garrafa de champanhe que tem guardada em casa para assinalar o fim de um ciclo doloroso a todos os níveis; se ganhar e derrotar Rangel, abrirá uma garrafa de champanha na sede nacional. Num e noutro caso, vai-se jurando entre os mais próximos de Rio, terá motivos para celebrar.

Na ressaca do Conselho Nacional que impôs a marcação das diretas mesmo quando já se perspetiva a crise política, o líder social-democrata esteve perto de bater com a porta. Nesse fim de semana, nos idos de outubro, muitos dos seus apoiantes mais próximos estavam convencidos de que tinha acabado, que tinha chegado ao fim. Rio estava farto e disposto a entregar o partido aos que nunca partilharam o seu entendimento de interesse nacional, como contava então o Observador. Acabaria por mudar de ideias.

Nogueira era exemplo; Rangel frustrou os planos

Este sábado, logo se verá que garrafa vai abrir Rui Rio. Aconteça o que acontecer, há algo que o líder social-democrata nunca vai aceitar ou compreender: o avanço de Rangel num contexto tão particular como este e mesmo sabendo que as próximas eleições legislativas lhe reservam uma derrota quase certa.

Rio tinha um plano caso perdesse para António Costa nas legislativas. O líder social-democrata imaginara-se a fazer o mesmo que Fernando Nogueira fizera em 1995, depois de perder para António Guterres. Ficava à frente do partido o tempo suficiente para que se consolidasse uma alternativa e todos sabiam que o senhor que se seguia era Paulo Rangel. Seria uma sucessão natural, sem a pressão dos resultados eleitorais e sem um desgaste de um embate muito difícil com António Costa.

Aconteceu tudo ao contrário. Rangel recusou o convite para ser candidato à Câmara do Porto, fez saber disso pela comunicação social, começou a preparar sua candidatura à liderança do PSD bem cedo, apostou num resultado poucochinho de Rio nas autárquicas, aproveitou a campanha eleitoral para se catapultar política e mediaticamente, e avançou com uma candidatura mesmo depois de perceber que havia um risco sério de o país ir a votos poucos meses depois.

Rui Rio visita a câmara municipal do funchal, acompanhado de Pedro Calado, presidente da Câmara Municipal do Funchal e Alberto João Jardim, ex-presidente do Governo Regional da Madeira. Eleições diretas PSD. 23 de Novembro de 2021 Funchal, Madeira TOMÁS SILVA/OBSERVADOR Eleições Diretas PSD: Rui Rio, atual líder e recandidato à liderança do Partido Social Democrata - PSD - completa o seu programa oficial na Madeira com uma sessão de esclarecimentos com os militantes do partido. Nesta sessão fez-se acompanhar por Pedro Coelho, Presidente da Câmara de Lobos e Alberto João Jardim, ex-presidente do Governo Regional da Madeira. 23 de Novembro de 2021 Câmara de Lobos, Madeira TOMÁS SILVA/OBSERVADOR

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Todos estes passos — cuja intenção política sempre foi negada por Rangel — deixaram em Rio a convicção de que estas diretas podem ser um momento de viragem no PSD, a prova de algodão de algodão que faltava, a resposta à pergunta capital: que partido quer ser o PSD?

O que dispensa um líder com hipóteses razoáveis de derrotar o adversário externo para promover um líder sem provas dadas? O que deixa cair um líder a dois meses das legislativas e premeia um candidato a presidente que fragilizou duplamente o PSD em eleições (autárquicas e legislativas)? O que varre um líder que, gostando-se ou não, tem quatro anos de reconhecimento público para lançar uma incógnita?

Rio sabe que esta sua leitura é minoritária no interior do PSD e que muitos dirão que nunca teve reais oportunidades de derrotar António Costa porque nunca se conseguiu afirmar, que a contestação interna é fruto da forma como tratou o partido e gorou as expectativas, e que, incógnita ou não, Rangel ao menos quer ser mais do que “vice-primeiro-ministro” de um governo socialista, como tantas vezes foi repetido ao longo desta campanha interna. Que seja: aos olhos do líder social-democrata, se o partido escolher Rangel significa que o PSD é hoje um corpo estranho para si. Rio sairá com a certeza de que, mesmo tendo cometido erros ao longo do caminho, tentou reescrever o ADN do partido. E que, embora tendo falhado, fez tudo ao seu alcance.

Rui Rio tem duas garrafas de champanhe prontas para qualquer pretexto. Se perder contra Rangel, abre a garrafa de champanhe que tem guardada em casa para assinalar o fim de um ciclo doloroso a todos os níveis; se ganhar e derrotar Rangel, abrirá uma garrafa de champanha na sede nacional. Num e noutro caso, vai-se jurando entre os mais próximos de Rio, terá motivos para celebrar.

Listas trancadas à chave

Uma coisa é certa: se Rui Rio perder as diretas, não vai abdicar de exercer o seu mandato até ao fim. Até 17 de dezembro, dia em que começa o Congresso do PSD que vai entronizar o próximo presidente social-democrata, será ele o líder em funções. Não é, nem nunca foi, uma questão de somenos: no que depender de Rio, será ele e a atual Comissão Política Nacional a propor a lista de candidatos a deputados para ser aprovada em Conselho Nacional, órgão máximo do partido entre Congressos.

O líder social-democrata não admite outro cenário que não o de coordenar o processo. As concelhias devem enviar os nomes para as distritais, as distritais devem reunir-se com a direção de Rio e apresentar as escolhas que fizeram. Se as estruturas resistirem e boicotarem o processo, pois que seja: o líder social-democrata avança na mesma e escolhe ele próprio os candidatos. Depois o Conselho Nacional, onde é minoritário, que faça o que entender. Rio rejeitará sempre o ónus de ter deixado o partido sem o trabalho de casa feito.

De todo o modo, o presidente do PSD entende que já deu o sinal de boa-fé ao permitir que fosse o líder eleito a escolher os cabeças de lista às próximas legislativas. E não vai ceder nem mais um milímetro — Rangel não está acima do partido, vai-se comentando na entourage do presidente social-democrata. A confirmar-se, o challenger de Rio arrisca-se a ter um arranque de liderança em turbulência máxima, numa guerra tanto política com jurídica, tão ou mais suja do que aquela que foi travada até aqui. Foi o jogo que quis jogar, sintetiza-se na direção social-democrata.

Rio tinha um plano caso perdesse para António Costa nas legislativas. O líder social-democrata imaginara-se a fazer o mesmo que Fernando Nogueira fizera em 1995, depois de perder para António Guterres. Ficava à frente do partido o tempo suficiente para que se consolidasse uma alternativa e todos sabiam que o senhor que se seguia era Paulo Rangel. Seria uma sucessão natural, sem a pressão dos resultados eleitorais e sem um desgaste de um embate muito difícil com António Costa. Aconteceu tudo ao contrário.

As últimas legislativas

Mesmo assumindo que perdeu uma grande parte do apoio do aparelho social-democrata, Rui Rio ainda acredita que pode vencer as diretas deste sábado. Tudo dependerá, mais uma vez, da vontade daqueles militantes que vivem para lá das lógicas das estruturas partidárias e do caciquismo local — que, nesta e em todas as outras eleições, mesmo aquelas que elegeram e reelegeram Rui Rio, desempenhou sempre um papel instrumental.

Mas se bater Paulo Rangel é, com os dados que existem em cima da mesa, uma missão difícil, derrotar António Costa em janeiro será tudo menos um passeio no parque. Pior: se antes das cotoveladas internas no PSD era um desafio exigente, agora é uma missão quase impossível.

Rui Rio está consciente disso mesmo e já firmou uma convicção: se perder as próximas legislativas, não irá mais a votos. Fim, finito, the end, das ende, fecha-se o ciclo. O que não significa que se demita automaticamente da liderança do PSD. Antes pelo contrário.

O líder do PSD entende que, mesmo perdendo as próximas legislativas, ainda pode desempenhar um papel importante na governação do país. Para Rio, aliás, se batesse com a porta e deixasse o partido entrar numa nova guerra fratricida pouco depois destas diretas, seriam o PSD e o regime a ficar em causa. Os tempos que se avizinham exigem estabilidade política e construção de pontes. Só assim, entende o social-democrata, será possível reerguer o partido e derrotar, finalmente, os socialistas.

De resto, no núcleo duro de Rio aponta-se a ironia: se os adversários internos tivessem esperado dois meses, e em caso de derrota do PSD nas legislativas, teriam livre trânsito para tomarem conta do partido e arrumar a casa até às próximas legislativas. Rio não seria nunca um obstáculo. Mas os adversários preferiram o sprint à maratona.

Assim, se Rangel ganhar as próximas diretas e perder as legislativas, terá um destino igual ao de Rio: o tempo político do eurodeputado acaba. E Luís Montenegro, que desta vez ficou de fora do combate, será, muito provavelmente, o senhor que se segue. Rangel, provocam os homens de Rio, nem sabe onde se meteu.

Se perder as próximas legislativas, Rui Rio não irá mais a votos. Fim, finito, the end, das ende, fecha-se o ciclo. O que não significa que se demita automaticamente da liderança do PSD. Antes pelo contrário.

Pedro Nuno anulado

Há, ainda assim, uma equação que une e dá esperança quer a Rio e quer a Rangel: se um dos dois vencer as próximas legislativas, os socialistas não terão outra alternativa a não ser deixar passar, pelo menos, o próximo Orçamento do Estado de um eventual governo de direita.

E se a lógica serve aos dois, na equipa de Rui Rio já se faz contas a esse cenário: conseguindo sobreviver às diretas e batendo António Costa, o atual primeiro-ministro não terá margem política para reeditar uma geringonça nos mesmos termos em que o fez em 2015, sendo o segundo mais votado. Consequência natural: Costa sai de cena e o PS entra em reflexão (e talvez convulsão) interna.

Nesse cenário, improvável mas não impossível, os socialistas não terão outra hipótese que não deixar o PSD governar. Pelo menos, até arrumarem em casa e entregarem a chave a Pedro Nuno Santos, o nome teoricamente mais bem posicionado para suceder a António Costa, o filho pródigo da ala mais à esquerda do partido, que não hesitará em desfazer qualquer tipo de indício de acordo tácito com o PSD para relançar as pontes com Bloco de Esquerda e PCP.

Mas até Pedro Nuno precisará de tempo para reorganizar a estratégia. Rui Rio sabe disso e é por isso que não desespera com cálculos e cenários de governabilidade pós-eleitoral. O facto de assumir com uma franqueza tantas vezes criticada de que está disponível para dar a mão ao PS se disso depender a estabilidade do país é mais do que uma mensagem para consumo interno ou para se distinguir de Rangel: Rio sabe que, no dia em que precisasse que o PS não levantasse obstáculos à governação, a opinião pública estaria do lado dele — afinal, Rio tinha prometido que faria o mesmo caso perdesse as legislativas.

No entender de Rui Rio, se vencer as legislativas terá todas as condições para tomar posse como primeiro-ministro. Só precisa de estar no sítio certo à hora certa. Os astros estão quase todos alinhados. Todos menos um: os do próprio partido. Rio já leva quatro anos de milhas acumuladas na liderança do PSD, sempre com muita turbulência. Mas está a poucas horas do seu voo mais difícil. É desta que se despenha?

Eleições Diretas PSD: Rui Rio, atual líder e recandidato à liderança do Partido Social Democrata - PSD - em entrevista para o Observador durante o voo de regresso para Lisboa, após ter concluído o seu programa oficial de 2 dias na Região Autónoma da Madeira. 24 de Novembro de 2021 Funchal, Lisboa - TAP TOMÁS SILVA/OBSERVADOR

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