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Padres casados, mulheres mais presentes — e uma estátua roubada. O que fica da reunião que pode mudar a Igreja Católica?

O objetivo central era a defesa da Amazónia e a consciência ecológica da Igreja. Mas o Sínodo deste mês ficou marcado pela proposta para permitir padres casados. Tudo depende agora do Papa Francisco.

Após três semanas reunidos no Vaticano, os quase 200 líderes católicos chamados para integrar a edição especial do Sínodo dos Bispos dedicada à Amazónia fizeram aprovar um documento com recomendações ao Papa que já ficará para a história, independentemente do que aconteça a partir daqui. Pela primeira vez em mil anos, a Igreja Católica pode estar à beira de rever a regra do celibato dos padres, com a primeira exceção a ser aplicada naquela região do mundo: para responder à escassez de sacerdotes, o sínodo recomendou à Igreja que permita a ordenação presbiteral de homens casados.

Cabe agora ao Papa Francisco analisar o documento votado no último sábado e produzir ele próprio um documento papal — provavelmente uma exortação apostólica sobre o tema e, no caso de decidir alterar alguma regra do direito canónico, também um motu proprio com a decisão. Espera-se que haja novidades sobre esta matéria até ao final do ano.

Na Amazónia, onde escasseiam os padres, o Vaticano poderá autorizar a ordenação sacerdotal de homens casados

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Neste momento, a expectativa na Igreja Católica é de que o Papa faça mesmo aprovar uma norma que permita ordenar sacerdotes “homens idóneos e reconhecidos da comunidade, que tenham um diaconado permanente fecundo e recebam uma formação adequada para o presbiterado, podendo ter família legitimamente constituída e estável, para sustentar a vida da comunidade cristã através da pregação da Palavra e da celebração dos Sacramentos nas zonas mais remotas da região amazónica”, como descreve o ponto 111 do documento final do Sínodo. Ou seja, permitir padres casados.

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Esta foi a principal conclusão de uma assembleia extraordinária do Sínodo que, embora inicialmente destinada a debater os problemas da Igreja na Amazónia e a necessidade de aproximação entre fé e ecologia para defender aquela região essencial do planeta, se tornou num dos momentos fundamentais do pontificado de Francisco ao assumir o papel de ponto de viragem na reversão do paradigma do celibato obrigatório.

Do encontro, que reuniu bispos e cardeais sul-americanos (dos países que abrangem a floresta amazónica) com a Cúria Romana, resultaram ainda apelos à consciência ecológica da Igreja Católica e a um caminho de integração dos rituais indígenas nas celebrações católicas. De fora do documento final ficou contudo a possibilidade de ordenação diaconal de mulheres — que tinha sido levantada com expectativa após os documentos preparatórios da reunião produzidos pelo Vaticano reconhecerem o papel especial das mulheres nas comunidades amazónicas.

A divisão na Igreja e os votos contra factos

O caminho até ao Sínodo já permitia antever que seria difícil haver unanimidade nas decisões. Quando o Instrumentum Laboris (documento preparatório feito pela secretaria-geral do sínodo) foi publicado com referências à possibilidade de ordenar homens casados e atribuir funções formais a mulheres, multiplicaram-se as críticas e até acusações de heresia contra os bispos e o Papa, com origem na ala mais conservadora e tradicionalista da Igreja Católica.

Os tiros vieram até de alguns cardeais. O alemão Walter Brandmüller falou em “auto-destruição da Igreja”; o norte-americano Raymond Burke (rosto da oposição ao Papa Francisco) denunciou as “heresias e erros teológicos” e apelou até a uma “cruzada de oração” para impedir a sua aprovação no sínodo. Durante as três semanas de reunião, sucederam-se iniciativas levadas a cabo por fóruns conservadores em Roma contra as decisões que se previa que viriam a ser tomadas no sínodo.

Como a Amazónia pode desencadear a revolução na Igreja Católica (de que já se fala há seis anos)

Em tudo isto, nem os chamados “padres sinodais” (os clérigos participantes do sínodo com direito de voto) ficaram imunes à discórdia — e isso é visível no documento final, cujos 120 pontos foram votados de forma individual. De acordo com a contagem dos votos disponibilizada pelo Vaticano, só o ponto 21 é que não obteve nenhum voto contra, embora perto de duas dezenas de clérigos se tenham abstido.

O ponto aparentemente menos polémico do documento é apenas o parágrafo de enquadramento à natureza missionária da Igreja Católica, que inclui um apelo a “uma conversão pastoral” e à promoção de “comunidades vivas que trabalhem em equipa e em rede ao serviço da evangelização”.

Todos os outros pontos receberam pelo menos um voto contra. Até o parágrafo introdutório, que se limita a apresentar uma citação bíblica e a descrever a reunião que aconteceu nas três semanas anteriores mereceu dois votos contra. O segundo parágrafo, que constata a “dramática situação de destruição que afeta a Amazónia”, lamenta o desaparecimento de povos indígenas, sublinha que são necessárias mudanças urgentes para “salvar a Amazónia” e explica que “está comprovado cientificamente que o desaparecimento do bioma amazónico terá um impacto catastrófico para o conjunto do planeta”, também recebeu dois votos contra.

A divisão entre os participantes do sínodo foi tal que até mesmo em pontos aparentemente óbvios houve votos contra. É o caso, por exemplo, do ponto 36, no qual se reconhece que as comunidades católicas da Amazónia têm desaparecido devido à falta de sacerdotes e em que se lê que a Igreja deve “lutar para que as ‘favelas’ e as ‘vilas-miséria’ tenham assegurados os direitos básicos fundamentais”, como “água, energia, habitação e promover a cidadania ecológica integral”. Dez clérigos votaram contra.

O Sínodo sobre a Amazónia terminou este domingo no Vaticano com uma missa na Praça de São Pedro

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Os pontos que reuniram mais votos contra foram, sem surpresa, os que se referem às tais potenciais mudanças de doutrina. O ponto 111, referente à possibilidade de ordenar como padres homens casados para fazer face à falta de sacerdotes, recebeu 41 votos contra, sendo aprovado com 128 a favor.

Outro assunto problemático foi a proposta de estudo de um “rito amazónico” — uma eventual nova forma litúrgica que integre elementos dos rituais indígenas das comunidades amazónicas. Este ponto, que tinha recebido fortes críticas da ala mais conservadora, que defende a proteção da liturgia tradicional, foi aprovado com 140 votos a favor e 29 votos contra. Um parágrafo anterior, que apenas constata o facto de na Igreja Católica existirem vinte e três ritos diferentes em várias partes do mundo, recebeu 27 votos contra.

Já o parágrafo no qual se reconhece “o papel fundamental das mulheres religiosas e leigas na Igreja da Amazónia”, se lembra que há quem defenda a ordenação de mulheres e se pede para que o sínodo possa partilhar experiências sobre este assunto com a comissão instituída pelo Papa Francisco para estudar o papel das mulheres nos primeiros tempos da Igreja recebeu 30 votos contra.

O fim de uma tradição de mil anos

No fim de contas, o principal tema lançado por este sínodo é mesmo o do celibato dos padres. Se o Papa Francisco decidir seguir na íntegra a recomendação deixada pelos padres sinodais, poderá abrir a mais significativa exceção em mil anos à regra católica de apenas admitir ao sacerdócio homens celibatários. É uma decisão que poderá agradar a muitos fiéis habitualmente conotados com a ala mais progressista da Igreja Católica.

Se o Papa Francisco decidir seguir na íntegra a recomendação deixada pelos padres sinodais, poderá abrir a mais significativa exceção em mil anos à regra católica de apenas admitir ao sacerdócio homens celibatários.

O argumento, porém, não será o mesmo. Enquanto a maioria dos opositores ao celibato consideram que a obrigatoriedade não faz sentido na essência, o sínodo defende que a exceção pode ser uma forma de assegurar a celebração dos sacramentos nas zonas mais remotas onde o clero é mais escasso.

“Muitas das comunidades eclesiais do território amazónico têm enormes dificuldades para aceder à Eucaristia. Em algumas ocasiões passam não apenas meses, mas às vezes vários anos até um sacerdote poder regressar a uma comunidade para celebrar a Eucaristia, oferecer o sacramento da reconciliação ou ungir os enfermos da comunidade”, começa por explicar o documento final do sínodo, antes de defender, em geral, os méritos da regra do celibato.

“Apreciamos o celibato como um dom de Deus, na medida que este dom permite ao discípulo missionário, ordenado ao presbiterado, dedicar-se plenamente ao serviço do Povo Santo de Deus. Estimula a caridade pastoral e rezamos para que haja muitas vocações que vivam o sacerdócio celibatário”, sublinha o documento, acrescentando todavia que o celibato não é exigido “pela natureza própria do sacerdócio, ainda que tenha muitas razões de conveniência com o mesmo”.

Ou seja: a obrigatoriedade do celibato faz parte da lei da Igreja, mas nada indica que tal não possa mudar, uma vez que não é entendido como uma inevitabilidade com origem divina. “Na sua encíclica sobre o celibato sacerdotal, São Paulo VI manteve esta lei e expôs motivações teológicas, espirituais e pastorais que a sustentam”, recordam os padres sinodais. Em 1992, acrescenta o documento, a regra foi confirmada por João Paulo II.

Vários fiéis católicos de tribos amazónicas deslocaram-se a Roma para participar no Sínodo

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Mas — e é aqui que chega a novidade — o documento acrescenta: “Considerando que a legítima diversidade não causa danos à comunhão e à unidade da Igreja, mas manifesta-a e serve-a, o que dá testemunho da pluralidade de ritos e disciplinas existentes, propomos estabelecer critérios e disposições da parte da autoridade competente, ao abrigo da Lumen Gentium 26 [n.d.r.: Constituição Dogmática, texto central do Concílio Vaticano II sobre a natureza da Igreja Católica], para ordenar como sacerdotes homens idóneos e reconhecidos da comunidade, que tenham um diaconado permanente fecundo e recebam uma formação adequada para o presbiterado, podendo ter família legitimamente constituída e estável, para sustentar a vida da comunidade cristã através da pregação da Palavra e da celebração dos Sacramentos nas zonas mais remotas da região amazónica”.

O parágrafo acaba com uma afirmação sugestiva: “A este propósito, alguns pronunciaram-se por uma abordagem universal do tema”.

A recomendação concreta do Sínodo não tem ainda valor de lei. Agora, terá de acontecer o que ocorre habitualmente após todos os Sínodos: o Papa vai analisar o documento e publicar a sua própria mensagem. Se aceitar a recomendação do Sínodo, poderá publicar um motu proprio para alterar as normas relativas à ordenação dos padres e abrir uma porta que dificilmente se fechará daqui para a frente. A frase que encerra o parágrafo tem sido interpretada como uma forma de os bispos afirmarem que uma decisão sobre esta matéria a nível universal não pode ser tomada por um sínodo regional — apelando a que o tema continue a ser discutido noutro fórum, como o sínodo ordinário ou o colégio cardinalício.

Apoiantes e oponentes desta medida concordam num ponto: abrir a exceção será um primeiro passo para uma discussão global sobre a abolição do celibato. E é por esse mesmo motivo que os apoiantes se alegram com esta medida em que os oponentes temem que a abertura do precedente acabe com uma tradição de um milénio.

"Propomos estabelecer critérios (...) para ordenar como sacerdotes homens idóneos e reconhecidos da comunidade, que (...) recebam uma formação adequada para o presbiterado, podendo ter família legitimamente constituída e estável, para sustentar a vida da comunidade cristã"

Com efeito, olhando aos argumentos expostos pelo cardeal Raymond Burke e pelo bispo Athanasius Schneider na carta que se tornou o documento central da contestação ao Sínodo, verifica-se que o argumento central é o do Magistério da Igreja. Ou seja: os documentos produzidos pelos Papas ao longo do último milénio têm consagrado o celibato como regra — mesmo que nada na doutrina original da Igreja Católica (nem na Bíblia) mencione a obrigação.

Na verdade, durante o primeiro milénio da Igreja Católica, a regra do celibato não existiu. Muitos padres, bispos e até papas tiveram famílias. Só na Idade Média é que a regra do celibato entrou oficialmente na Igreja Católica, através do primeiro e do segundo concílios de Latrão, no início do século XII. Existem algumas referências anteriores a regras locais que proibiam os padres e os bispos de terem relações sexuais e de terem filhos — embora o casamento não fosse proibido.

Durante o primeiro milénio da Igreja Católica, a regra do celibato não existiu. Muitos padres, bispos e até papas tiveram famílias. Só na Idade Média é que a regra do celibato entrou oficialmente na Igreja Católica

Proibindo os padres de ter filhos, a Igreja ganhava vantagens económicas — já que toda a riqueza acumulada por um padre podia ser retida pela instituição, em vez de ser herdada pelos filhos. Na Idade Média, grande parte dos clérigos eram homens de famílias abastadas que contribuíram, graças ao celibato imposto a partir do século XII, para o enriquecimento da própria Igreja Católica. Sempre justificada com a disponibilidade para a entrega total ao serviço da Igreja, a regra do celibato manteve-se enquanto regra (mas não como dogma ou realidade inerente à natureza do sacerdócio) até aos dias de hoje.

Uma eventual reversão da regra iniciada na Amazónia poderá ser, na verdade, mais um regresso ao passado do que propriamente uma quebra com a doutrina.

Mulheres. Não é para já, mas Papa insiste no tema

Menos consensual é a questão da possível ordenação de mulheres. O documento final do Sínodo dedica uma secção inteira ao papel da mulher na Igreja Católica no contexto da Amazónia e deixa a recomendação para que seja criada uma função nova na hierarquia especificamente para mulheres — já que a possibilidade de ordenar mulheres como diaconisas e sacerdotisas parece longe de surgir no horizonte.

Durante o sínodo, só estiveram presentes 35 mulheres — face a 185 padres sinodais, os únicos com poder de voto

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Expressões como “ampliar os espaços para uma presença feminina mais incisiva na Igreja”, “lugar de protagonista que a mulher ocupa”, “valorizar a sua presença em organizações e em papéis de liderança” ou “reforçar a sua participação” nas estruturas eclesiásticas repetem-se ao longo do documento. Mas, se abrir uma exceção na regra do celibato é difícil e moroso, permitir a ordenação de mulheres será ainda mais complexo — porque a regra está ancorada na própria Bíblia (Jesus só escolheu homens como discípulos) e, historicamente, a Igreja Católica tem argumentado que não tem poder para permitir a ordenação de mulheres.

De facto, foi o Papa João Paulo II que, em 1994, ditou a sentença definitiva sobre o tema, sublinhando que as mulheres não podem receber o sacramento da ordem e que “esta sentença deve ser considerada como definitiva por todos os fiéis da Igreja”. Dentro e fora da Igreja, muitos têm sido os apelos para que as mulheres possam assumir as mesmas funções eclesiásticas que os homens — mas essa expectativa tem sempre esbarrado em impossibilidades teológicas.

O documento votado agora é cauteloso nas recomendações, para não espantar logo à partida os mais conservadores — e mesmo assim esta foi uma das secções que reuniram mais votos contra.

“A sabedoria dos povos ancestrais afirma que a mãe terra tem rosto feminino. No mundo indígena e ocidental, a mulher é quem trabalha em múltiplas facetas, na instrução dos filhos, na transmissão da fé e do Evangelho, são presença testemunhal e responsável na promoção humano. Por isso, pede-se que a voz das mulheres seja ouvida, que elas sejam consultadas e participem nas tomadas de decisão e, deste modo, possam contribuir com a sua sensibilidade para a sinodalidade eclesial”, apela o documento, sem especificar de que forma concreta será dado esse contributo, num parágrafo que mereceu o voto contra de cinco bispos.

"Pede-se que a voz das mulheres seja ouvida, que elas sejam consultadas e participem nas tomadas de decisão e, deste modo, possam contribuir com a sua sensibilidade para a sinodalidade eclesial"
Documento final do Sínodo

Valorizamos a função da mulher, reconhecendo o seu papel fundamental na formação e continuidade das culturas, na espiritualidade, nas comunidades e nas famílias. É necessário que ela assuma com maior força a sua liderança no seio da Igreja, e que esta o reconheça e promova reforçando a sua participação nos conselhos pastorais de paróquias e dioceses, ou inclusivamente em instâncias de governo”, acrescentam os bispos.

Mais à frente, o documento recomenda que a Igreja fomente a possibilidade de as mulheres estudarem teologia e direito canónico, se posicione em defesa dos direitos das mulheres e reconheça que, na Amazónia, “a maioria das comunidades católicas são lideradas por mulheres”. É aqui que surge a muito cautelosa novidade: a recomendação da criação do ministério instituído de “mulher dirigente da comunidade”. Não é uma diaconisa nem uma sacerdotisa, mas um novo ministério sacramentalmente reconhecido pela Igreja que permita à mulher assumir um papel efetivo de liderança em comunidades católicas. Onze bispos votaram contra este ponto, que foi aprovado com 16o votos a favor.

De fora acabou por ficar a possibilidade de ordenação para as mulheres. Os bispos ainda reconhecem que, nos inquéritos preparatórios que antecederam o sínodo, foram muitos os fiéis que pediram a abertura do diaconado permanente às mulheres. Por agora, os bispos limitaram-se a pedir ao Papa Francisco a possibilidade de partilhar ideias com a comissão instituída em 2016 para estudar esta realidade.

Mais longe foi o próprio Papa Francisco, que logo no sábado, no discurso de encerramento do Sínodo, anunciou que irá reativar esta comissãoque após dois anos de estudo havia chegado a um impasse. Desta vez, a comissão terá mais recursos para prosseguir os recursos. Francisco fê-lo após ter sido interpelado durante o Sínodo pelas 35 mulheres presentes (na sua maioria freiras, apenas na qualidade de especialistas, sem direito de voto) para que reforçasse a voz das mulheres na Igreja.

Tal como na questão do celibato, cabe agora ao Papa Francisco fazer ou não aprovar mudanças legais que permitam a criação desse novo estatuto para as mulheres na Igreja Católica.

O roubo da estátua indígena que marcou a derrota conservadora

Com mais ou menos votos contra, o que é certo é que o documento final do sínodo — com a proposta de exceção à regra do celibato, os apelos à inclusão das mulheres na hierarquia e a recomendação de criação de um rito litúrgico que incorpore os elementos indígenas — foi aprovado, o que tem sido interpretado como uma vitória da ala mais progressista da Igreja sobre os tradicionalistas.

Porém, o Sínodo não acabou sem ficar marcado por um episódio de vandalismo praticado por fiéis ligados à ala mais conservadora, e pelo qual o próprio Papa Francisco se viu forçado a pedir desculpa.

A polémica estalou entre os meios de comunicação conservadores logo no primeiro dia do Sínodo, quando um grupo de católicos oriundos de tribos indígenas da Amazónia levaram a Roma uma estátua de madeira e a utilizaram numa cerimónia com o Papa Francisco nos jardins do Vaticano. A estátua, que retrata uma mulher nua grávida e representa, para aquelas comunidades, a vida e a fertilidade, foi classificada como um ídolo pagão incompatível com a fé cristã por meios conservadores como o LifeSiteNews ou o Church Militant.

A estátua que representa a vida e a fertilidade esteve presente numa cerimónia nos jardins do Vaticano antes de ser roubada

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Durante os primeiros dias do Sínodo, a polémica à volta da estátua de madeira capturou a discussão — ao ponto de o porta-voz do Vaticano ter intervindo para explicar que a estátua não representava nenhuma deusa pagã, mas era um símbolo da vida e da fertilidade para algumas comunidades amazónicas que foram convidadas para participar no sínodo.

Já na última semana do Sínodo, surgiu um vídeo na internet — difundido, novamente, através dos meios de comunicação católicos — que mostra duas pessoas a entrar na igreja romana de Santa Maria in Traspontina (que durante o Sínodo acolheu muitas celebrações de comunidades católicas oriundas de tribos amazónicas) e a roubar quatro daquelas estátuas que estavam colocadas num dos altares laterais. Mais à frente, é possível ver as mesmas pessoas a atirar as estátuas ao rio Tibre.

As imagens divulgadas nos sites tradicionalistas receberam muitos comentários positivos, elogiando a “coragem” dos “verdadeiros católicos” que retiraram os “ídolos pagãos” do interior da igreja. Até o cardeal alemão conservador Gerhard Müller, ex-prefeito da Congregação para a Doutrina da Fé afastado em 2017 pelo Papa Francisco, falou sobre o roubo, afirmando que “o grande erro foi trazer os ídolos para dentro da igreja, não retirá-los”.

De maneira oposta pensou o Papa Francisco e a maioria dos bispos presentes no Sínodo. Alguns dias depois, após a divulgação das imagens, o Papa abriu uma das sessões de trabalho do sínodo com um pedido de desculpa, na qualidade de “bispo de Roma”, a todos os que se sentiram ofendidos com o roubo das estátuas.

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