Estava à porta do INEM de Coimbra. As ambulâncias saiam dali rumo à sua missão de prestar auxílio aos doentes e Ana Gomes admitia estar “muito preocupada”. Tinha visto as imagens da noite passada das inúmeras ambulâncias à porta do hospital Santa Maria, em Lisboa, e do hospital de Torres Vedras, com dificuldades em fazer escoar os doentes Covid positivos que chegavam durante a noite. Mas a candidata não arrisca criticar as medidas adotadas pelo Governo de António Costa. A indignação vai toda para Marcelo Rebelo de Sousa.

O Governo até esteve bem na decisão de não fechar as escolas, e, quanto ao resto, é “ir vendo à medida que a situação vai evoluindo”. Mais do que uma necessidade do Governo de decretar medidas mais restritivas, Ana Gomes que é que se “redobre o sentido de responsabilidade” para a pandemia não se descontrolar de todo. Dias antes, em Cinfães, também tinha defendido as medidas de confinamento do Governo de António Costa, sobretudo por não ter decretado o fecho de escolas (fator que, no seu entender, só agrava as desigualdades) e, agora, com os hospitais em rutura, Ana Gomes lembra que “os recursos são finitos” e é preciso haver uma “consciência individual” disso mesmo.

Mas se é para apontar responsabilidades políticas, é o Presidente da República quem culpa por esta pressão nos hospitais. Foi ele que “minou” a possibilidade da requisição civil dos privados na saúde. “Isto tem de ser dito e os portugueses têm de saber isto: foi o professor Marcelo Rebelo de Sousa que determinou que, até hoje, a capacidade instalada não esteja a ser totalmente aproveitada e os recursos humanos também não estejam a ser totalmente mobilizados”, acusou, referindo-se ao decreto onde Marcelo estabelece a necessidade de haver “acordo” preferencial com os privados e não uma via unilateral de requisição.

Ao sexto dia de campanha, Ana Gomes continua empenhada em fazer all in em Marcelo Rebelo de Sousa, o seu adversário na corrida, ao mesmo tempo que não vai esquecendo a luta anti-Ventura. O batom continua nos lábios e Ana Gomes já nem precisa de espelho para o pôr — “há 50 anos que ando a pôr batom”. Fala em convergência útil à esquerda em jeito de apelo ao voto na sua candidatura, chama a si o feminismo e a luta pela igualdade de género, bem como a luta pela valorização dos jovens e das novas gerações, e este sábado até deixou duas promessas: paridade de género em todas as nomeações que dependam do chefe de Estado, e apoio ao movimento pelo fim das propinas.

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“Teria, ou terei, todo o gosto em votar em si”

Os apoios de socialistas a Ana Gomes vão surgindo a pouco e pouco, tímidos. Este sábado, Ana Gomes contou com parte da estrutura da concelhia do PS de Coimbra, nas pessoas de Manuel Leitão Cruz e Elísio Estanque, e contou com o apoio declarado do vice-presidente da câmara Carlos Cidade. Em Matosinhos, na véspera, tinha estado ao lado da presidente da câmara, a socialista Luísa Salgueiro, mas o apoio já não foi tão expansivo — era apenas “institucional”.

E este sábado aconteceu um mix curioso: Carlos Monteiro, autarca socialista da Figueira da Foz, não constava do programa da candidata, que teria uma reunião com a associação SOS Cabedelo, no rooftop de um hotel, mas apareceu meio de surpresa já na reta final do encontro. Não queria perder a oportunidade de deixar a Ana Gomes uma palavra de simpatia — não de apoio, porque um presidente da câmara não deve dizer em que os seus cidadãos devem votar. E as palavras que escolheu foram curiosas. “Não vou dizer em quem vou votar, mas a senhora embaixadora está dentro do leque de pessoas em quem eu teria, ou terei, gosto em votar”, disse. “Há outros candidatos” dentro desse leque, leia-se, Marcelo Rebelo de Sousa. Mas Carlos Monteiro “poderia, ou poderá”, votar em Ana Gomes. Ficou a dúvida.

Marcelo. Até Sócrates serve para atacar o PR

A sombra de André Ventura está sempre a pairar mas é Marcelo Rebelo de Sousa que Ana Gomes não perde uma oportunidade de atacar. Além da “culpa” por o Governo não ter avançado com requisição civil a preços justos aos privados da saúde, a candidata ainda desafiou Marcelo a responder aos “insultos” de André Ventura que geraram a onda de solidariedade do “batom vermelho”. E usou a carta de José Sócrates contra o Presidente da República. É que se Sócrates apenas ataca Ventura e Ana Gomes, e até “defende” Marcelo, por algum motivo é… E o motivo é simples: Marcelo não critica os  bloqueios da justiça relativamente aos mega-processos do BES e da Operação Marquês, Marcelo não fala da evasão fiscal, de corrupção, de branqueamento de capitais. Ela sim.

Ana Gomes agradece que Sócrates a tenha criticado e tenha poupado Marcelo. “É elucidativo”