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Sai em grande com a realização da Jornada Mundial da Juventude, mas não se livra das críticas dos sindicatos. “Se eu estivesse cá para tentar agradar a todos, ia vender gelados em vez de ser diretor da PSP”, disse Magina da Silva, sobre a queixa que apresentou por causa de um cartoon que o diretor nacional da PSP considerou tecer críticas sobre atos racistas por elementos da polícia. Essa foi a última polémica dentro da instituição ainda sob o seu comando.
Magina da Silva, que foi o primeiro comandante da Unidade Especial de Polícia (UEP), esteve três anos e meio como diretor nacional da PSP e é esta segunda-feira substituído pelo super-intendente chefe José Barros Correia, que ocupava o cargo de diretor dos Serviços Sociais da PSP e é também um homem mais próximo dos sindicatos – foi o primeiro presidente do Sindicato Nacional de Oficiais de Polícia.
Segundo a nota divulgada este domingo pelo Governo, foi o super-intendente Magina da Silva quem pediu para ser substituído. Na verdade, o seu mandato terminou no início de fevereiro — os mandatos para diretor nacional têm a duração de três anos e o de Magina da Silva começou em fevereiro de 2020. Mas o mandato acabou por ser renovado e tudo indicou que em causa estava mesmo a realização da Jornada Mundial da Juventude.
O plano de segurança para a vinda do Papa Francisco a Portugal estava a ser elaborado e era Magina da Silva quem estava a acompanhar o processo. E certo é que o agora ex-diretor nacional tem experiência nestes planos de segurança: esteve também envolvido na segurança da vinda do Papa Bento XVI a Portugal, em maio de 2010, e na cimeira da NATO que se realizou em Lisboa, nesse mesmo ano. Aliás, foi a propósito deste último evento que Magina da Silva defendeu que a PSP deveria avançar com a compra de blindados, que poderiam ser utilizados durante a cimeira e depois aproveitados para patrulhar “zonas urbanas sensíveis”.
No percurso de Magina da Silva, conhecido como frontal e por vezes criticado pelos seus comentários, ficam alguns episódios polémicos, como as palavras sobre o caso das alegadas agressões durante a detenção de uma mulher que recusou pagar bilhete numa viagem de autocarro, e cujo julgamento começa já no próximo mês, ou o caso da queixa-crime que apresentou sobre um cartoon publicado pela RTP.
E, agora, quanto ao futuro de Magina da Silva, a história repete-se: em 2020, entrou para substituir o antigo diretor Luís Farinha, que foi para o cargo de embaixador de ligação em Paris; entretanto, Luís Farinha saiu de Paris e o lugar será ocupado pelo super-intendente que tem também no currículo o título de campeão nacional de tiro dinâmico.
O “descuido bondoso” sobre a reestruturação do SEF
Internamente, uma das críticas dirigidas a Magina da Silva passa pela sua proximidade ao poder político. E a reestruturação do SEF fica no currículo do ainda diretor nacional da PSP. Depois da morte de Ihor Homeniuk, ucraniano espancado por agentes do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras no aeroporto de Lisboa, foi anunciado que os elementos desta polícia iriam ser distribuídos pelas restantes forças e serviços de segurança. Mas o anúncio veio do próprio Magina da Silva, quando deixou escapar aos jornalistas, depois de um encontro com Marcelo Rebelo de Sousa, que estavam a ser realizadas reuniões para “a fusão entre PSP e SEF”. Foi “proposto, de forma muito direta”, a fusão destes dois organismos, disse Magina da Silva.
Estas palavras obrigaram Eduardo Cabrita, na altura ministro da Administração Interna, a dizer que não cabia ao diretor nacional da PSP avançar esta informação. E Magina da Silva acabou por pedir desculpa, em entrevista à TSF: “Pedi-lhe desculpa imediatamente quando tive a noção da dimensão da extrapolação das palavras que proferi. Como digo, um descuido bondoso. Aprendo com os meus erros. O senhor ministro percebeu que foi um descuido bondoso e não afetou o nosso relacionamento institucional.”
Mas aquilo que foi descrito como um “descuido bondoso” acabaria por confirmar-se meses mais tarde, criando mais um foco de descontentamento interno, com os agentes a considerarem que a PSP não tem, neste momento, capacidade para assumir ainda mais funções — com a extinção do SEF, esta força de segurança ficará responsável pelo controlo das fronteiras, por exemplo.
E é aqui que começam as críticas dos sindicatos da PSP, por considerarem que o diretor nacional poderia ter tido outra postura, recusando ao Governo a passagem de competências do SEF para esta polícia. “Parece-me evidente. A PSP não tem condições, neste momento, para adquirir as funções e incumbências do SEF. Isso está mais que claro e o futuro dirá se temos razão, ou não”, disse Paulo Santos, presidente da Associação Sindical dos Profissionais da Polícia (ASPP).
A detenção de Cláudia Simões: “Um polícia a cumprir as suas obrigações”
O caso da reestruturação do SEF aconteceu em 2021, mas no ano anterior, e precisamente no mês em que foi nomeado diretor nacional — janeiro de 2020 –, estalou a primeira polémica: as alegadas agressões a Cláudia Simões.
Um vídeo que começou a circular pelas redes sociais mostrava uma mulher no chão, agarrada por um agente da PSP. A mulher tinha, alegadamente, recusado pagar o bilhete de autocarro da filha, um dos agentes da PSP acabou por dar ordem de prisão a Cláudia Simões, que acabou por ser levada para a esquadra e depois para o hospital com vários hematomas e ferimentos, incluindo no rosto.
Os três polícias envolvidos foram acusados pelo Ministério Público dos crimes de ofensas à integridade física, sequestro, injúria e abuso de poder e a mulher, Cláudia Simões, também acabou por ser constituída arguida por agressões a Carlos Canha, um dos três agentes da PSP envolvidos. Na altura, quando o caso começou a ter repercurssões públicas, foram também pedidas justificações ao recém nomeado diretor nacional da PSP, que defendeu sempre os seus homens. Em entrevista à TVI, Magina da Silva disse que tinha visto “um polícia a cumprir as suas obrigações e as normas que estão em vigor na PSP” e que, segundo o que tinha visto nas imagens, o agente “usou a força conforme a bíblia dos polícias”, em referência à Norma de Execução Permanente.
“Os polícias vêm da sociedade portuguesa e refletem todas as virtudes e todos os defeitos da sociedade portuguesa. As convicções e o que vai na cabeça de cada homem, eu não posso alterar. Agora, os comportamentos observáveis que eles expressam publicamente, isso eu posso avaliar e vou avaliar”, disse Magina da Silva, rejeitando qualquer acusação de racismo por parte da PSP.
A queixa-crime por causa de um cartoon
Outra polémica que marca o mandato de Magina da Silva à frente da Polícia é a queixa-crime apresentada pela PSP contra a RTP por causa de um cartoon sobre racismo nas forças de segurança. A animação publicada em julho deste ano pela estação pública de televisão tinha como título “carreira de tiro” e a direção nacional da PSP assumiu que a crítica que juntava agentes e racismo visava esta polícia e não teve dúvidas ao avançar com a queixa.
Foi “uma decisão difícil”, disse Magina da Silva. “Não é isso que gostaríamos de fazer, como é lógico, com qualquer órgão de comunicação social”, acrescentou.
O plano para encerrar esquadras em Lisboa e no Porto
No ano passado, em outubro, foi anunciado, pelo próprio diretor nacional da PSP, o plano para encerrar esquadras em Lisboa e no Porto. Numa lógica de reorganização, o objetivo seria fechar as portas das esquadras que se encontravam próximas de outras, concentrando assim mais agentes em menos esquadras e conseguindo, dessa forma, ter mais polícias a patrulhar as ruas.
“É uma equação matemática que não está sujeita a discussão. Quantas mais esquadras tivermos, menos polícias teremos na rua, nas unidades móveis, nos carros-patrulha, para acorrer a situações urgentes. […] Temos esquadras em Lisboa a 500 metros umas das outras, o que não faz sentido absolutamente nenhum”, avançou, há praticamente um ano, Magina da Silva em entrevista à Rádio Renascença e ao Público.
O plano da PSP foi entregue à tutela e o diretor desta polícia disse ainda que “é uma falsa sensação de segurança ter instalações [esquadras]”. “O que dá segurança é a polícia ter meios móveis para rapidamente acorrer a cidadãos que estão em apuros”, acrescentou.
Este plano, no entanto, gerou várias críticas por parte dos sindicatos, que se mostraram contra a intenção da direção nacional e defenderam que o encerramento de esquadras nunca se refletiu no aumento do número de efetivos nas ruas.
Sobre o encerramento de esquadras em Lisboa e no Porto, o Observador tentou perceber junto do Ministério da Administração Interna qual o estado deste processo, mas não obteve qualquer resposta até à publicação deste artigo.
As armas militares no lar de Vila Real, que gerou desconforto entre a PSP e as Forças Armadas
Pouco tempo depois de assumir o cargo de diretor nacional, a pandemia obrigou ao primeiro confinamento, logo em março de 2020. E, ainda nesse mês, mais uma polémica – depois da que envolveu a reestruturação do SEF. Desta vez, foi o mal-estar entre a PSP e as Forças Armadas.
Durante a descontaminação num lar em Vila Real, onde tinha sido identificado um surto de Covid-19, os militares da Polícia do Exército foram chamados para o local e formaram um cordão de segurança. Estavam armados e, por causa disso, a PSP identificou o comandante. De acordo com esta polícia, os militares não deviam estar armados.
O caso motivou a intervenção do Ministério da Administração Interna, foram feitos relatórios pela PSP e pelas Forças Armadas e o Chefe do Estado-Maior das Forças Armadas em funções nessa altura, almirante Silva Ribeiro, chegou a dizer que Magina da Silva tinha dado conta do erro e que lhe tinha telefonado para pedir desculpa.
Mas o diretor nacional desmentiu e explicou que o pedido de desculpa não estava relacionado com a atuação da PSP, mas sim pela divulgação de um e-mail interno. “O que vimos em Vila Real foi, claramente, uma função das forças de segurança. Não nos foi solicitado qualquer apoio, logo, não está de acordo com protocolo definido [colaboração entre as forças armadas e as forças de segurança]. A polícia fez o que tinha de fazer”, disse Magina da Silva.