Índice
Índice
Tem o nome da flor nacional de Angola. A Welwitschia Mirabilis não é uma planta qualquer, nada tem de delicada, nem de perfumada, é gigante e muito resistente. Designada como o “polvo do deserto”, pois vive exclusivamente no deserto do Namibe, que se estende do sul de Angola ao norte da Namíbia, esta planta rasteira de caule grosso pode durar até mais de mil anos. “Desgrenhada”, chamam-lhe “a planta imortal de Angola” — e há quem a use como emblema da resistência angolana. E a “aula” de botânica acaba aqui.
Não se sabe o que passaria pela cabeça de quem deu o nome à segunda filha do ex-Presidente de Angola, mas o simbolismo só pode agradar a Welwitschea José dos Santos, também conhecida por Tchizé.
Nos últimos anos, desde que o pai saiu do poder, tem erguido bem alto a voz contra o governo de João Lourenço, dizendo estar a defender o povo angolano, a Constituição da República e o próprio MPLA. Porém, ganhou particular protagonismo desde o internamento e a morte de José Eduardo dos Santos (JES), na sexta-feira dia 8, em Barcelona, dividindo opiniões.
O tom das acusações subiu ao ritmo veloz das suas palavras, enquanto dava conta pública da indignação contra o que acredita que se passou nos últimos meses e dias de vida do pai. Tchizé já disse que iria até “às últimas consequências” no que afirma ter sido “o último desejo” do senhor absoluto de Angola durante 38 anos. Leia-se: não ser enterrado em solo angolano enquanto o seu sucessor, João Lourenço, reinar.
Amiga de Milucha
Na mira dos ataques desta mulher de 43 anos têm estado a madrasta, Ana Paula dos Santos; o médico do pai há 16 anos, João Afonso; os seguranças; a tia Marta, irmã de José Eduardo; e até, de alguma maneira, os irmãos que não estiverem do seu lado. Mas o principal objeto da raiva expressa de Tchizé é o atual Presidente. Sem medos ou rodeios, acusa-o de ser “corrupto, criminoso e ditador”, palavras que vai estendendo ao seu governo e ao MPLA, o partido pelo qual foi deputada eleita três vezes e de cujo Comité Central fez parte e foi suspensa.
Nada disto espanta quem a conhece. “Ela é assim, refilona, respondona, desde pequenina”, conta ao Observador uma amiga da mãe que se lembra de uma “menina alegre, sempre a correr e a brincar” na casa dos avós no Cruzeiro, um bom bairro de Luanda, onde viviam os funcionários públicos portugueses.
A avó brava que tirava os sapatos, a sua mãe de criação e heroína real
“Tchizé nasceu de uma grande paixão, um amor arrasador que se tornou impossível e isso, de alguma forma, pode ter marcado a sua infância”, assegura ao Observador uma amiga que acompanhou o início do namoro entre Milucha [como é conhecida a mãe, Maria Luísa Abrantes], e Zédu, [como os angolanos tratam o ex-Presidente de Angola].
“Ela nunca soube o que era viver na mesma casa com o pai, contrariamente a Isabel. E, embora nunca me tenha falado nisso, percebia-se nela uma certa mágoa”, conta uma amiga que pediu para não ser identificada (“A Tchizé ferve em pouca água, eu não lhe pedi autorização para falar ao Observador e não quero arranjar problemas”).
Não que isso tenha determinado a sua personalidade impulsiva e frontal, “por vezes a raiar mesmo a má educação”, segundo outra fonte, amiga da mãe nos anos 70: “Creio que aqui jogam os genes da mãe, mulher muito emocional, e, sobretudo, os da avó Emília”.
Tchizé sempre considerou a avó materna, filha de um soba africano, o seu exemplo, mas por outras razões. Há cerca de três meses, publicou na sua página do Instagram uma homenagem a Maria Emília Perdigão Abrantes: “(…) Foi a minha mãe de criação e a maior referência da minha infância e adolescência”.
Enumerando o papel da avó na organização de eventos solidários, Tchizé escolhe-a como “a sua heroína na vida real” e inspiração para o seu percurso. “Foi para continuar o seu legado de co-fundadora da OMA que muito cedo entrei para aquela organização e foi inspirada na sua bondade e solidariedade sem limites que criei o TEA CLUB e todas as minhas obras e projetos sociais e solidários”.
A amiga de Milucha, que conheceu a sua mãe, tem outras memórias: “A avó era brava, discutia muito e zangava-se com os vizinhos. Usava o típico pano africano amarrado na cintura, que só trocava pelo vestido quando saía de casa. Não gostava de calçar sapatos, mas, se por acaso os tinha, quando se irritava tirava-os. O avô não, era muito calmo, muito educado, o senhor Abrantes era um funcionário público muito respeitado”, acrescenta.
Por isso a luandense não estranhou a entrevista que Tchizé deu na passada segunda-feira à CNN Portugal, onde durante cerca de 42 minutos falou sem parar, disparou em várias direções e atacou quase tudo e todos.
“Foi um autêntico ‘buldozer’” comenta um elemento do Bureau Político do MPLA ao Observador. “Subestimaram-me”, respondeu Tchizé a um dos seus 9.590 mil seguidores no Instagram. “Eu de parva não tenho nada”, escreveu na mesma publicação, onde compara a sua prestação televisiva com a de Marinho e Pinto numa entrevista, em 2009, a Manuela Moura Guedes, na TVI, em que o antigo bastonário da Ordem dos Advogados portugueses não deixou a jornalista falar.
“É uma pessoa que, se for arranhada, morde”
“E não tem mesmo nada de parva”, confirmam algumas das pessoas contactadas pelo Observador em Luanda e Portugal, para quem a entrevista de Tchizé não surpreendeu. “Ela é mesmo assim, diz o que tem a dizer, da maneira que quer dizer, no momento em que quer dizer”, adianta uma das suas ex-colaboradoras na TPA (Televisão Pública de Angola). “É a melhor encarnação do dito ‘pessoa sem papas na língua’”.
Não se diga que “é maluca, ou tresloucada, como já ouvi por aí, não é”, avisa o almirante André Mendes de Carvalho. “Miau”, como é conhecido em Angola, foi contemporâneo de Tchizé na Assembleia Nacional, então como deputado da CASA-CE, Convergência Ampla de Salvação de Angola, coligação de que era presidente e pela qual ainda se senta hoje no parlamento. O almirante, que tal como o irmão e o pai figuram numa lista de opositores a José Eduardo dos Santos, guarda uma boa impressão da filha:
Durante o tempo em que ela foi deputada, era uma pessoa que agia com muita honestidade. Ao contrário de muita gente dentro daquele grupo parlamentar [MPLA] que levantavam situações e causas apenas para agradar, ela só levantava questões porque achava que tinham fundamento”.
Sendo da oposição, lidou com Tchizé “com muita normalidade, ela não fazia marcar a sua condição de filha do Presidente da República”. Tinha uma boa relação com os adversários políticos, de alguns era mesmo amiga, como por exemplo do Raul Danda (vice-presidente da Unita que morreu em maio de 2021).
Almirante "Miau"
“É uma pessoa inteligente, que fala com aquela rapidez toda, que as pessoas estranham, mas é igual à mãe, que é muito emocional. Mas é honesta e corajosa”, afirma Miau.
O político exclui a possibilidade de Tchizé estar a agir politicamente por conta de outrem ou de se estar a aproximar da oposição ao MPLA. “É verdade que ela disse que o pai antes de morrer, desgostoso com João Lourenço, lhe confessou que queria uma alternância política e que seria melhor votar na oposição”.
Todavia, mesmo admitindo que este braço-de-ferro entre o governo de Angola e uma ala da família de JES, de que Tchizé é a face mais visível, possa ter um impacto negativo nas pretensões eleitorais do MPLA, em agosto, “Miau” considera que o que motiva Tchizé “não é o querer ajudar a oposição mas a revolta que sente pela forma como a família foi tratada”.
E não, “não tem ninguém a manipulá-la”, acredita o almirante. Nem está sob a influência da mãe, que tem uma velha rivalidade com Ana Paula, a ex-primeira dama. “Tchizé é muito senhora de si mesma, e tem uma força interior muito grande”, sublinha, antes de concluir: “Não é maluca, é uma pessoa coerente, mas é uma pessoa que, se for arranhada, morde”.
A guerra antiga entre enteada e madrasta
Welwitschea José dos Santos terá nascido em 1978, em Luanda (a biografia publicada na sua página no Facebook não refere data de nascimento), um ano antes de o pai entrar no Futungo de Belas, como sucessor de Agostinho Neto. Tchizé não viveu na casa presidencial, pois a relação dos pais, que tiveram juntos mais um filho, José Eduardo Paulino, de nome artístico Coréon Du, não era bem aceite pelo MPLA.
A vida e o poder de José Eduardo dos Santos, o pai da Corte de Luanda
José Eduardo dos Santos, cujo traço namoradeiro não é segredo para ninguém, ainda estava casado com Tatiana Kukanova, a russa campeã de xadrez, mãe de Isabel, quando se “apaixonou loucamente” por Milucha, conta uma das amigas que acompanhou o romance.
Nascera há pouco tempo um outro filho, fora do casamento, de “Necas”, José Filomeno “Zénu”, mas “ele gostava muito da Milucha”, garante a amiga. “Nós acompanhávamos as voltas que ele dava para conseguir levar a namorada nas comitivas quando viajava para o estrangeiro, ouvíamos os telefonemas entre os dois quando estavam separados e víamos como gostavam um do outro”. Eram muito diferentes: Milucha, uma “mulher bonita, extrovertida, animada e divertida” e ele “homem bonito mas introvertido e calado”. Ela ficava “furibunda com as infidelidades dele, terminava a relação, mas passados quinze dias já estavam os dois muito melados novamente”, sorri a amiga de então.
José Eduardo queria casar com a mãe de Tchizé, mas o Comité Central do MPLA não deixou. Enquanto uma amiga diz ao Observador que era porque “Milucha” fazia alguns escândalos (terá puxado os cabelos a “Necas” na rua, num assomo ciumento) a investigadora Margarida Paredes, apesar de concordar, dá uma outra perspetiva.
Margarida Paredes
“Como o primeiro marido de Milucha, o médico Tilu, foi fuzilado na repressão à revolta nitista do 27 de Maio, ela não encaixava no papel de primeira-dama imaculada, sem um passado problemático. A DISA [polícia política de Angola] tê-la-à avisado que, se quisesse o papel de amante, tudo bem, mas se tencionasse casar-se com ele, a matavam“, disse ao Observador a antropóloga portuguesa que esteve na guerrilha do MPLA e escreveu o livro Combater Duas Vezes, Mulheres na Luta Armada em Angola (editora Verso da História, 2015).
“Milucha era muito independente, não se incomodava com o que dissessem dela, chegava a ser provocadora. Ainda me lembro de ela entrar num Congresso do MPLA vestida com umas calças pretas por baixo dos joelhos, justas às pernas, sandálias de tiras pretas com salto agulha, camisola preta com um ousado decote e um enorme laço na cabeça vermelho com bolinhas brancas. Fez-se um silêncio total na sala, só se ouvia o barulho dos saltos à medida que Milucha descia a rampa. Num partido que era marxista-leninista esta indumentária era considerada um desvio pequeno-burgês, ou pior, e aparecer assim no Congresso era uma provocação”, recorda Margarida Paredes.
Tchizé vivia com a mãe, mas o pai fazia parte da sua vida. Ainda há pouco tempo, publicou uma foto no Instagram em que JES (com Milucha ao lado) está a cantar-lhe os parabéns pelo seu quarto aniversário.
Mas quando a mãe foi para os Estados Unidos, depois do casamento, em 1991, de José Eduardo com Ana Paula (perfil que já se encaixava nos cânones do MPLA), terá passado durante algum tempo a ver menos o pai.
Houve um período, conta uma amiga de Milucha — que voltou a casar e teve mais dois filhos, gémeos —, em que na escola não sabiam que ela e o irmão eram filhos do Presidente da República. A mãe suportaria sozinha os custos, até que um dia veio a Angola e viu a vida de luxos que Ana Paula e os filhos tinham. Muito furiosa, “chegou à escola dos filhos e disse que eles eram filhos do Presidente da República de Angola, e foi a partir daí que ele começou a dar dinheiro para as crianças”, recorda a mesma fonte.
As relações de Tchizé com a madrasta, que viu entrar no círculo familiar quando já teria 13 anos, nunca foram muito suaves. As da mãe também não. É muito conhecido um vídeo em que, no casamento da filha de Bornito de Sousa (atual vice-presidente de Angola), Milucha sai intempestivamente do lugar quando o casal presidencial está a passar no corredor central da igreja e, determinada, dá dois beijos a JES, ignorando a primeira dama.
Solidária com a mãe, Tchizé chegou mesmo a acusar Ana Paula de se achar “dona de Angola” e de ter obrigado Milucha a “exilar-se” durante 21 anos nos EUA. Mas a tensão entre as duas nunca tinha atingido o nível que alcançou quando Ana Paula deixou José Eduardo dos Santos em 2017, ao abandonar o poder e ir viver sozinho para a “Casa Amarela”, a mansão de Miramar. Sozinho não, irrita-se Tchizé. Nesta sexta-feira voltou a publicar duas fotos nas redes sociais tiradas em 2017, quando morava com o pai, lembrando que só dali saiu quando decidiu abandonar o país por se sentir ameaçada.
A ex-primeira dama ficou em silêncio enquanto o marido era acusado de ter deixado os cofres vazios, de ser corrupto e de ter favorecido filhos e amigos à custa dos cofres públicos. E nada disse quando alguns dos enteados começaram a ser processados judicialmente. Mas Tchizé e Milucha nunca se calaram. A antiga namorada ficou sempre do lado de JES, visitava-o na “Casa Amarela” e defendeu-o, às vezes de um modo desabrido, publicamente. Disse que o fazia por “convicção” e não por ter sido favorecida pelo antigo namorado. “Fui a pessoa mais humilhada pelos serviços dele”, disse numa entrevista.
Milucha foi mesmo recebida por José Eduardo quando este esteve recentemente em Angola, na casa de Miramar. A mesma sorte não teve Ana Paula. Segundo Tchizé, o marido não a quis ver.
O conflito entre madrasta e enteada agravou-se quando Ana Paula chegou a Barcelona, mais de quatro anos depois de estar separada do marido, “com três malas”, contou Tchizé. Instalou-se para cuidar de José Eduardo dos Santos, já muito débil, e terá provocado o afastamento desta filha da casa do pai.
Segundo Tchizé, era ela quem, juntamente com o irmão Coréon Du (que disse numa entrevista que o pai era mais maternal do que a mãe Milucha), tratava de JES, desde março deste ano, quando o pai regressou depois de seis meses em Angola. Ficou um mês e meio, até Ana Paula e a meia-irmã Joseana aparecerem e ela ter saído de Barcelona, mas permanecido em Espanha, “suficientemente perto” para o ajudar se fosse necessário.
A animosidade entre as duas ganhou foro judicial quando Tchizé levantou formalmente a suspeita na polícia espanhola contra a madrasta, de negligência e maus tratos, numa alegada tentativa de homicídio do pai. E, na entrevista à CNN, a filha de JES tentou contar mesmo episódios pouco abonatórios de Ana Paula enquanto garantia ter “subido a pulso” na vida e “às vezes contra a vontade” de José Eduardo dos Santos. Contrariamente aos irmãos Zenu e Isabel, o pai nunca a “nomeou para nada”, sublinhou.
Os negócios milionários que não constam da nota biográfica
Se Isabel diz ter começado o seu percurso no mundo dos negócios ainda criança, a vender ovos, Tchizé não fica muito atrás. Identifica s sua habilidade para fazer dinheiro ainda na adolescência, uma espécie de instinto, nada que tenha aprendido nos bancos das escolas antes desse momento revelador ou mesmo a seguir.
Na verdade, no seu percurso escolar (enumerado na biografia publicada no Facebook), nos Estados Unidos, Angola, Portugal e Reino Unido, onde se licenciou em comunicação social, “com especialização em Produção de Imprensa pela Regent’s University”, em Londres, não figura nenhuma formação empresarial, de gestão ou de economia.
E, no entanto, Tchizé diz-se, além de “comunicadora”, uma empresária a quem o pai “não deu dinheiro para começar a fazer negócios”.
Tinha 17 anos e viu uma oportunidade de negócio na discoteca da irmã Isabel. Organizou o primeiro réveillon do Miami Beach e “algumas das mais famosas e lucrativas festas de fim de ano e não só em Angola”, explica na sua nota biográfica. A entrada para estes eventos custava 1o0 dólares por cabeça e chegavam a ter lotação esgotada de 2.000 pessoas, escreve também.
E a partir daí segue-se uma exaustiva lista de atividades profissionais, que começa em 2000 com a criação e direção da revista Tropical, e quatro anos depois com a versão angolana da Caras.
Ainda antes de dezenas de alíneas sobre espectáculos ou programas que produziu, alguns em parceria com o Brasil, surge a informação de que foi administradora do Banco de Negócios Internacional, o BNI, entre 2006 e 2008.
Tchizé dos Santos
Mas nem uma linha sobre o Banco Prestígio, nem uma palavra sobre a Semba — em todo o trabalho desenvolvido na TPA2, Televisão Pública de Angola, ou no lançamento da TPA Internacional, não aparece o nome da empresa criada com o irmão, mas sim a sua intervenção como técnica responsável. E nem existe a mais telegráfica menção à sua (e do irmão Coréon Du e do então marido) diamantífera Di Oro, que recebeu em 2016 uma licença de prospeção inserida num consórcio por decreto presidencial, ou seja, por José Eduardo dos Santos. Ou ao seu polémico negócio imobiliário da Talatona (que, reconheceu um dia, a tornou rica), à sua empresa offshore, à SEOP ou aos seus negócios em Portugal.
“Uma sardinha no meio dos tubarões”
Vale a pena olhar para pelo menos três dos negócios que Tchizé omite da sua nota biográfica.
A produtora Semba Comunicações, fundada em 2006, é propriedade dos dois irmãos, Tchizé e Coréon Du. No seu palmarés, tem sucessos como a novela Windeck (que foi transmitida em Portugal e nomeada para os prémios Emmy’s) e o documentário I Love Kuduro (que passou em Portugal, exibido no festival DocLisboa).
A controvérsia rebentou quando, por ajuste direto, o Estado angolano contratou a empresa de Tchizé, a Westside Investments, uma sociedade offshore, para a gestão da TPA2 (canal 2 da televisão pública) que mais tarde subcontratou a Semba, dos dois filhos do então Presidente. Posteriormente, ficou também sob a responsabilidade da Semba a TPInternacional, entretanto lançada por Tchizé. Mas não só. A Semba foi também contratada para melhorar a imagem de Angola interna e externamente. O site MakaAngola, do activista e jornalista Rafael Marques, fundador da ONG Ufolo, calcula que, só em 2016, em contratos com o Estado, a empresa recebeu 87 milhões de euros.
Como “celebração do contrato multimilionário entre o Ministério da Comunicação Social e a empresa Westside Investments, a sócia maioritária, Tchizé dos Santos”, ofereceu ao seu representante legal em alguns negócios “um bónus de 500 mil dólares, enquanto a filha do Presidente se atribuiu a si própria, com fundos do erário público, o prémio de um milhão e meio de dólares”, escreveu Rafael Marques no MakaAngola em 2012.
Será precisamente por causa da Westside Investments que Tchizé é alvo de um inquérito criminal em que é suspeita de fraude fiscal e branqueamento de capitais, em Portugal.
Isabel dos Santos com 17 processos abertos em Portugal. Tchizé tem 1,4 milhões congelados
Tchizé queixou-de ter tido as suas contas bancárias ilegalmente congeladas e que o Estado português lhe deve uma indemnização — e, segundo ela, não é o único. Depois de repetir que merecia ser condecorada pelo que fez por Angola, a ex-deputada ainda atirou na entrevista à CNN: “Se tive algum benefício, neste momento o governo angolano deve-me uma indemnização brutal, muito maior do que qualquer oportunidade de fazer negócio que eu possa ter tido; tudo o que fiz em Angola foi proveitoso e enriqueceu o Estado”.
A saber: “A gestão da TPA onde formei quadros, [o impulso] para a criação de uma indústria de audiovisuais, que não existia, o lançamento da TPA internacional”. Ou, mais recentemente, a abertura “do melhor restaurante de Angola” e o Tea Club (associação que forma vendedoras ambulantes para as tirar da rua e dar-lhes micronegócios bem como jovens empreendedores, e organiza outras atividades de índole social, cultural e desportivo). Uma das suas últimas iniciativas depois de deixar o seu país foi criar um canal no YouTube de lifestyle para o mundo lusófono, que já disse ser o seu grande sonho.
Com as suas ações, Tchizé argumenta que formou e criou emprego para mais de 30 mil pessoas e que, em contrapartida, o Estado angolano a tem difamado, causando dano à sua imagem.
Rafael Marques
O negócio imobiliário da Talatona terá dado a Tchizé o dinheiro para criar a Westside. O MakaAngola explicou, em 2019, como este processo complexo se terá passado e que se pode resumir assim:“Inicialmente, Higino Carneiro [na altura o general era governador de Luanda, deputado e membro do Bureau Político do MPLA, além de amigo de JES] ‘oferece’ a Tchizé um terreno no Talatona, que esta vende a uma empresa privada por 18 milhões de dólares (mais de 18 milhões de euros na altura), a qual, por sua vez, o vende por 20 milhões de dólares à Sonangol (Estado angolano), que, entretanto, o abandona.”
O terreno foi entregue em junho de 2004 a uma empresa de Tchizé, a Luzy, Sociedade de Gestão e Negócios, ainda sob registo provisório. A escritura do direito de superfície, citada por Rafael Marques, diz que é atribuído a título gratuito mas Tchizé garante que foi um erro e que numa adenda devia constar o valor pago, 250 mil euros que pediu emprestados ao BAI. O MakaAngola não viu a adenda. “Nunca pedi dinheiro aos pais”, disse em 2019 a filha de José Eduardo dos Santos. “E até posso perder o [Banco] Prestígio, mas também não vou pedir emprestado à minha irmã [Isabel dos Santos].”
Tchizé contou ao portal de Rafael Marques que desistiu do condomínio previsto para esse terreno, e que o vendeu a uma empresa de que já não se lembrava do nome, por 18 milhões de dólares. “Enriqueci. Não posso negar que foi justamente este terreno a minha fonte de enriquecimento”, reconheceu então ao MakaAngola. “Daí criei o BNI [Banco de Negócios Internacional] com o Dr. [Mário] Palhares, Ricardo Viegas d’Abreu [actual ministro dos Transportes], Mário Dias, Pisoeiro e Carlos Rodrigues”, descreveu a empresária. “Por ser uma sardinha no meio de tubarões”, acabou por vender a sua quota no banco fazendo “muito dinheiro”. E a partir daí foi “criar a Westside e já tinha a ideia toda da nova grelha da 2 [TPA]. Assim cresci”, justificou.
A Sociedade de Empreendimentos e Obras Públicas (SEOP) “beneficiou de contratos do Estado na ordem dos 650 milhões de dólares” para reabilitar estradas, entre 2008 e 2014, denunciou Rafael Marques no seu portal.
O MakaAngola explica que a SEOP era detida em 51% das ações pela ACAPIR, Sociedadade e Empreendimentos e Negócios Ltda, em que Tchizé tinha 80% do capital social e o então marido 20%. Os outros 49% da SEOP pertenciam aos filhos dos “então titulares dos ministérios das Finanças e das Obras Públicas” e ao administrador da Fundação Eduardo dos Santos bem como a um testa de ferro de Tchizé, adianta Rafael Marques,
De acordo com a investigação publicada no MakaAngola em 2021, sem mão-de-obra, estaleiros ou equipamentos próprios, a SEOP “subcontratou a empresa chinesa Jiangyuan para executar” as várias obras que lhe foram adjudicadas, e que em vários casos, ainda não foram concluídas.
E se, de repente, um desconhecido lhe oferecer flores?
Há ainda um outro negócio de que Tchizé não fala na sua nota biográfica, que está repleta de iniciativas de cariz social e solidário. O da Central de Frutas do Painho, na região do Cadaval, em Portugal, que exporta principalmente pêra rocha para seis países mas não para Angola. Em 2012, a angolana comprou 30% desta empresa através da Goodness Country, e tê-lo-à feito mais por causa do então marido, Hugo Pêgo.
Foi com este casamento, que alguma imprensa portuguesa chamou de quase real e faustoso, que em Portugal se começou a olhar para a segunda filha de José Eduardo dos Santos.
Tchizé dos Santos
O momento em que Hugo e Tchizé se conhecem parece saído de um anúncio publicitário dos anos 80 a um desodorizante em spray: “E se, de repente, um desconhecido lhe oferecer flores… “. Em 2002, Tchizé estava num bar das Docas de Lisboa, o Café da Ponte, quando cruzou o olhar com um engenheiro agrónomo da zona de Santarém. O jovem ofereceu-lhe um ramo de flores e passaram a noite a dançar, sem que o português soubesse que tinha nos braços a filha do Presidente de Angola. Só o soube um mês depois de estarem a namorar.
“Foi amor à primeira vista”, dizia então o pai de Hugo Pêgo ao Correio da Manhã, enquanto Tchizé era menos direta do que é seu hábito: “O momento em que nos conhecemos foi de pura magia (..) Só posso dizer que houve alguma ousadia de uma das partes”.
Casaram em 2003, um ano depois de a guerra civil ter acabado, numa festa que foi muito comentada e deu lugar a alguns desmentidos. Tchizé foi vestida por Augustus, o criador de moda português seu padrinho que comentou ao jornal 24 horas:
Estava linda. Levava um vestido justo com cauda em seda selvagem, com um corpo de Ypres e mantilha de renda feita especialmente na Bélgica”.
O casamento realizou-se no jardim do Palácio da Cidade Alta, a residência oficial do Presidente, juntou 600 convidados — incluindo o primeiro-ministro português, Durão Barroso — durante três dias e foi servido pelo hotel Ritz de Lisboa. O custo terá ascendido a um milhão de dólares, conforme foi noticiado na altura, mas Tchizé sempre negou esse valor sem adiantar qualquer outro. E ainda disse à revista Lux que, se tivesse deixado a mãe fazer-lhe o casamento que ela queria, teria sido muito maior.
“A minha mãe, uma consultora extraordinária, uma mulher brilhante, que sempre me disse que se o meu pai não fosse quem era e se eu não tivesse tanta preocupação em zelar pela imagem dele, ela me fazia um casamento de sete dias, com o melhor possível… Porque é uma mulher que trabalhou a vida toda e só tem uma filha. Aí é que iam ver o casamento que eu ia ter.”
A imprensa cor de rosa portuguesa chegou a dizer que a noiva levava uma coroa de diamantes, mas não era verdade, lamentou Tchizé à Lux. “Podia ter levado, como muitas noivas em Angola, mas não levei. A tiara que levei na cabeça não é de diamantes. Foi-me oferecida como complemento do vestido pelo costureiro Augustus”. Para provar que não quis um casamento de ostentação como foi descrito, contou que houve joalharias que quiseram emprestar-lhe peças caras e não aceitou.
“Quando fechei os olhos e imaginei o meu casamento não idealizei uma coroa de diamantes. Imaginei um vestido sóbrio e elegante. Foi o que aconteceu. A mantilha foi feita por uma pessoa que me é muito querida e o Augustus desenhou o vestido e pôs-me a tiara na cabeça. Eu olhei para o espelho e achei tudo maravilhoso e lá fui casar feliz da vida.”
Em 2015 separaram-se, depois de terem tido dois filhos, que o casal sempre privou do olhar público, com raríssimas excepções.
A vida partidária aos 5 anos, a suspensão do MPLA aos 41 e a “corista da oposição”
Hugo Pêgo, que sempre acompanhara a mulher nas lides políticas, já não foi visto no congresso extraordinário do MPLA em dezembro de 2014. Tchizé cumpria então o seu segundo mandato como deputada do partido, teria ainda um terceiro, mas que não levaria até ao fim, e não por vontade própria.
A ex-deputada gosta de dizer que é a única filha da família que é política. Iniciou-se cedo na vida partidária. Tinha cinco anos quando entrou para a OPA, a Organização do Pioneiro Angolano, e foi ao seu primeiro acampamento político. Seguiram-se outros, muitos desfiles e marchas em comícios. Em 2004 tornou-se militante do MPLA e da OMA, Organização da Mulher Angolana (estrutura feminina do partido) e foi eleita deputada pela primeira vez em 2008 e depois em 2012 e 2017.
“Fui deputada por mérito”, disse na segunda-feira na CNN, “cheguei lá pela OMA, organização onde os homens não entram, por isso não podia ser o Presidente JES a indicar-me, aliás ele nunca me indicou para nada”.
Entra para o comité central do MPLA em 2016 para um mandato que deveria terminar em 2021. Não o consegue cumprir, assim como não levou até ao fim o seu mandato de deputada. Foi suspensa, do Comité Central, enquanto lhe acontecia destino semelhante no parlamento, onde acabou por perder o mandato.
Rafael Marques
Tchizé, que tem acusado repetidamente o governo angolano de a perseguir, bem como à família de José Eduardo dos Santos, chegou a pedir a destituição do Presidente João Lourenço, o que foi demais para a cúpula do partido, que a retirou da direção do partido.
Por outro lado, dizendo que corria perigo de vida e revelando ameaças de morte, acabou por abandonar o país em 2019. O grupo parlamentar do MPLA começou por aconselhá-la a suspender o mandato devido às suas ausências superiores a 90 dias, mas a Assembleia acabou por lho retirar depois de instaurado um processo disciplinar.
A ex-deputada diz que o processo foi ilegal, e que viola os seus direitos fundamentais pois não teve direito ao contraditório nem a inquérito. A Comissão de Mandatos, Ética, e Decoro Parlamentar da Assembleia Nacional, presidida por Justino Pinto de Andrade, do Bloco Democrático, fez saber que em causa não estavam as posições críticas e pessoais mas sim as ausências prolongadas e reiteradas da deputada às sessãos do parlamento. E também informou a imprensa que, depois de ter tentado sem sucesso entregar a notificação a Tchizé (no escritório que a representava em Luanda terão dito que não a recebiam por não terem indicação para tal), resolveu enviá-la por email.
De costas voltadas para o governo e para o partido, a quem não poupa críticas ácidas, a ex-deputada tem lançado escadas para a oposição e chegou a deixar no ar a ideia de que a poderia estar a financiar. Isso mesmo aconteceu na segunda-feira, na CNN, ao insurgir-se pelo facto de ter as suas contas congeladas em quase todos os países para onde vai, por informações prestadas pelo palácio da Cidade Alta.
Mandaram cartas para Portugal, Mónaco, Inglaterra, Nações Unidas a dizer que sou suspeita de branqueamento de capitais, inclusive de incitação à violência, associação criminosa e terrorismo! Sim, porque, segundo o Estado angolano, as pessoas que supostamente financiam a oposição são terroristas”.
Que não restem dúvidas, esclarece Adalberto da Costa Júnior, líder da UNITA, ao Observador: “Não há qualquer financiamento, nem dela, nem de qualquer outro membro da família à oposição”. O principal adversário não se refere apenas ao seu partido, já que este ano são vários os partidos que se uniram debaixo da bandeira do “Galo Negro” para, em bloco, fazerem frente ao MPLA nas urnas.
Em dezembro de 2021, Rafael Marques chamava-lhe a “principal corista da oposição”. Num artigo publicado no seu portal, o MakaAngola, sublinhou a existência de “uma grande confusão no espaço cívico e político nacional”. Isto, porque se romperam “as fronteiras anteriormente demarcadas entre os principais beneficiários da pilhagem em Angola, no anterior e no actual governos, a oposição e a sociedade civil. Quem mais intrigas promove e mais barulho faz nas redes sociais parece comandar a passada e os ânimos dos cidadãos consumidos pelo desejo de mudança e pela lei do menor esforço”.
Rafael Marques concretizava a seguir: “Certamente poucos entendem que o barulho de Tchizé – a maior influenciadora digital na agitação política – pouco ou nada tem a ver com as dificuldades por que os angolanos passam. É uma luta pessoal de quem perdeu o lugar à mesa da pilhagem do país”.
Nesta sexta-feira, o responsável pela Ufolo, Centro de Estudos para a Boa Governação, vai mais longe. Num artigo intitulado “Julgamento do morto” traça um paralelismo entre o que se está a passar no clã de Eduardo dos Santos e o romance de Manuel Rui, O morto e os vivos. E conclui: “Ninguém esperaria que a figura que, para o bem e para o mal, mais marcou a vida dos angolanos no período pós-independência acabasse por ter o seu corpo disputado em praça pública, sem nenhum do decoro que é devido aos mortos, por um membro da sua prole. No fim, a sentença sobre a sua inglória provém da própria família. Ao contrário do que acontece no livro de Manuel Rui, não é o aparato judicial que julga o morto, mas sim a própria filha, que publicamente torna óbvio tudo o que o morto fez e não fez”.
Um clã que só nas fotografias das redes sociais parece unido
A julgar pelo seu discurso, Tchizé, que tanto quanto se sabe não terá queda para a música, como alguns dos irmãos — mas foi atriz, aos 23 anos, na novela “Vidas Ocultas” onde contracenou com o galã Fredy Costa — não poderia estar mais em desacordo com Rafael Marques. Invoca sempre, claro está, o interesse dos angolanos e do MPLA, enquanto reivindica justiça real e independente para si e para a sua família. Mas nem sempre as suas palavras se parecem alinhar no mesmo propósito. A começar pelos meios-irmãos.
As imagens do Instagram mostravam, até ao internamento e morte de José Eduardo dos Santos, uma família aparentemente unida. Tchizé aparece com alguma frequência ao lado de Isabel, que é geralmente mencionada na comunicação social como a preferida do pai. “Essa ideia de ser sempre a segunda filha, por vezes incomodava-a”, arrisca dizer uma amiga dos tempos da adolescência.
E “à Tchizé deve-lhe ter custado o lugar de exclusão oficial que a mãe ocupou enquanto viveu com o JES”, pensa Margarida Paredes.
“As miúdas até se davam bem”, recorda uma amiga da mãe de Tchizé, “mas a Milucha nem sempre queria muita proximidade”. Quando ela “ficou nos Estados Unidos aqueles anos todos”, as irmãs aproximaram-se.
No entanto, no auge do Luanda Leaks, Tchizé, que não perde uma oportunidade para dizer que a saúde do pai também se foi deteriorando por ver como os filhos eram “perseguidos por João Lourenço”, pareceu pouco solidária com a irmã mais velha. Desafiou Isabel a devolver 75 milhões a Angola e agora deixou um aviso: se for a Luanda, ao funeral, “vai ser vista como uma grande traidora, vai ser igual a João Lourenço”.
Luanda Leaks. Irmã de Isabel dos Santos desafia empresária a devolver 75 milhões a Angola
E se, por um lado, se insurgiu com o que estava a acontecer com Zénu, vindo a público mostrar o seu receio de que o irmão homem mais velho viesse a morrer na cadeia, por outro lado não deixou de dizer na televisão que o pai o nomeou para o Fundo Soberano tal como a Isabel para a Sonangol, dando a entender que foram beneficiados.
Também parece desvalorizar a ligação de alguns irmãos ao pai. Por exemplo, disse que José Eduardo preferia estar na Europa, junto dos filhos, do que sozinho em Angola. Ora, fora do país, só estão Tchizé, o irmão Coréon Du — que segundo ela, saiu por ser vítima de homofobia — e Isabel.
Em Luanda, estão não só os três filhos que José Eduardo teve com Ana Paula, como também Zénu e Joess, que todos os dias ia ver o pai enquanto ele lá esteve, de acordo com relatos da imprensa angolana.
Parece que José Eduardo dos Santos tinha razão quando disse que “prestou mais atenção à união do país do que à união dos filhos”, recordou o jornalista angolano Nelson Francisco Sul à CNN Portugal. No mesmo sentido parece ir Milucha quando, na morte de JES, publicou no Instagram: “Tarde concluímos que eramos felizes e não sabíamos. Só se atinge a felicidade pessoal quando a família está unida, mas priorizaste sempre a unidade nacional”.
Segundo Nelson Francisco, “tirando os aniversários ou em casos de doença, eram poucos os encontros entre os filhos”, o que incomodaria o pai, de acordo com Bento Santula, advogado e professor na Universidade Católica de Angola: “A grande dor de José Eduardo dos Santos era ter os filhos desavindos”.
O núcleo familiar mais restrito — mãe, pai e irmão — nunca recebeu nenhuma farpa de Tchizé, apesar de José Eduardo dos Santos, que sempre louvou publicamente, ter sido ligeiramente beliscado, e “por tabela”, quando a ex-deputada disse ter sido um erro a nomeação da irmã Isabel para a Sonangol.
Já se viu que nem o MPLA (que tem as cores do clube de Tchizé, o Sport Luanda e Benfica, de que foi presidente) escapa à crítica cortante da política mais seguida nas redes sociais em 2019, de acordo com vários órgãos de comunicação social de Angola. Mas não deixa de espantar a frase lapidar, usual na voz de analistas e adversários partidários: “O problema não é o José Eduardo dos Santos nem o João Lourenço, é a máquina do MPLA”.
E se Miau e Rafael Marques têm razão e Tchizé não tem motivações políticas neste ataque feroz que faz a João Lourenço, não é menos verdade que conseguiu lançar a suspeição sobre a morte do pai. Resta saber se a 24 de agosto, dia das eleições angolanas, essa dúvida se manifesta nas urnas.
“Haja bom senso, que parece não abundar por vezes na cabeça emotiva de Tchizé”, diz um dirigente do MPLA. “Angola tem 33 milhões de habitantes, cerca de 14 milhões de votantes, pensa mesmo que esta voz que clama nas redes sociais a partir da Europa será ouvida por muitos?”, pergunta, antes de realçar a expressão bíblica:
“Não se engane, esta não é a voz que clama no deserto, a Welwitschia Mirabilis é que é a flor nacional de Angola”. E não cresce no jardim da família que esteve quase quatro décadas no poder.