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Plenário do Tribunal Constitucional tomou decisão por unanimidade
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Plenário do Tribunal Constitucional tomou decisão por unanimidade

Plenário do Tribunal Constitucional tomou decisão por unanimidade

Tribunal Constitucional reforça decisão sobre não prescrição dos crimes de corrupção de Sócrates

Constitucional uniformiza interpretação sobre a contagem da prescrição do crime de corrupção e descarta definitivamente acórdão usado pelo juiz Ivo Rosa no caso Marquês. Decisão tomada por unanimidade

É uma espécie de game over para a tese que levou o juiz Ivo Rosa a declarar como prescritos os crimes de corrupção passiva que o Ministério Público (MP) imputa ao ex-primeiro-ministro José Sócrates. Por recurso do próprio MP num caso diferente da Operação Marquês, o Tribunal Constitucional (TC) uniformizou a interpretação sobre o início da contagem do prazo de prescrição dos crimes de corrupção e decidiu que tal contagem só se inicia com o recebimento do último suborno — confirmando assim o acórdão n.º 370/2023 proferido em junho de 2023, revelado em exclusivo pelo Observador.

Recorde-se que o Tribunal da Relação de Lisboa decidiu em janeiro pronunciar José Sócrates pela prática de 22 crimes, incluindo três de corrupção passiva, anulando a decisão de Ivo Rosa e afirmando que o prazo de prescrição máximo de tais ilícitos é de 18 anos e que a contagem do mesmo se inicia em 2014.

Tribunal Constitucional reforça tese do MP sobre a não prescrição dos crimes de corrupção na Operação Marquês

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A decisão do TC, que por si só é muito relevante, tem uma força reforçada por ter sido tomada a 23 de janeiro último por unanimidade e por colocar no caixote do lixo constitucional o acórdão n.º 90/2019 que teve o conselheiro Cláudio Monteiro como relator e que inspirou o juiz Ivo Rosa a declarar a prescrição dos crimes imputados a Sócrates na decisão instrutória de 2021. “Este acórdão não é vinculativo, mas irá ter uma enorme força persuasiva sobre os tribunais judiciais e as interpretações que os juízes das diferentes instâncias seguirão”, refere fonte judicial.

Por que razão o MP interpôs recurso?

Tal como o Observador noticiou em junho de 2023, o recurso do MP para o plenário constitucional era obrigatório. A lei determina que tal recurso é “obrigatório” quando o MP assume a posição processual de recorrente ou recorrido e quanto o TC toma posições contraditórias sobre a inconstitucionalidade de determinada norma penal.

Ora, foi precisamente o que aconteceu com o acórdão n.º 370/2023 proferido em junho de 2023 pela 2.ª secção do TC. Tendo como relator o conselheiro António José da Ascensão Ramos, aquele acórdão censurou e colocou em causa o acórdão n.º 90/2019 de 6 de fevereiro de 2019 que teve como relator o conselheiro Cláudio Monteiro. Como?

O recurso do MP para o plenário constitucional era obrigatório. A lei determina que o titular da ação penal, que zela pelo princípio da legalidade no nosso ordenamento jurídico, tal recurso é "obrigatório" quando o MP assume a posição processual de recorrente ou recorrido e quanto o TC toma posições contraditórias sobre a inconstitiucionalidade de determinada norma penal.

Grosso modo, o acórdão do conselheiro António José da Ascensão Ramos, aprovado por unanimidade da 2.ª secção do TC, decidiu que é constitucional a norma do Código Penal que permite a interpretação de que o prazo de contagem dos crimes de corrupção apenas se inicia após o recebimento da última contrapartida patrimionial e não patrimonial.

O conselheiro Ascensão Ramos assumia mesmo que o seu acórdão entrava em “flagrante colisão” com o acórdão do conselheiro Claúdio Monteiro — que amplamente citado pelo juiz Ivo Rosa na sua decisão instrutória. Daí que o recurso do MP fosse inevitável — além de obrigatório.

O caso que deu origem ao acórdão do TC

O recurso do MP para o plenário tem origem no recurso do empresário Fernando Rodrigues Gouveia, responsável da empresa construtora MRG que já foi acusado e condenado em vários processos relacionados com as Parcerias Público-Privadas (PPP) que propôs a várias autarquias.

Um desses casos, envolveu os ex-autarcas Álvaro Amaro e Luís Tadeu (de Gouveia) que foram condenados a três anos e meio de prisão com pena suspensa, enquanto Júlio Sarmento (ex-presidente da Câmara de Trancoso) foi condenado a uma pena de prisão efetiva de sete anos pelos crimes de prevaricação de titular de cargo político, corrupção e branqueamento de capitais.

Tribunal Constitucional uniformiza interpretação sobre prescrição dos crimes de corrupção

Ora, o primeiro recurso a chegar ao TC teve origem na defesa do empresário Fernando Rodrigues Gouveia. Este começou por ser condenado em 2021 pelo Tribunal Judicial de Portalegre a cinco anos de prisão efetiva pelos crimes de corrupção ativa de titular de cargo político, corrupção ativa e branqueamento de capitais.

Os ex-autarcas envolvidos eram João Burrica (ex-presidente da Câmara de Campo Maior) e Rui Pingo (ex-presidente da Assembleia Municipal de Campo Maior) — que foram acusados pelo Ministério Público dos crimes de prevaricação, de corrupção passiva e branqueamento de capitais por terem alegadamente recebido cerca de 335 mil euros (divididos pelos dois) de Rodrigues Gouveia através de duas empresas de consultadoria. Tudo para alegadamente beneficiar a empresa MRG na adjudicação da construção do complexo de piscinas em regime de PPP.

Após a Relação de Évora ter mantido as condenações da 1.ª instância, e ter rejeitado a inconstitucionalidade alegada pela defesa do líder da MRG, entrou o recurso no Constitucional que deu origem ao acórdão n.º 370/2023.

O que os acórdãos contraditórios decidiram

O relator António da Ascensão Ramos e os juízes conselheiros Gonçalo Almeida Ribeiro, Assunção Raimundo, José Eduardo Figueiredo Dias e Mariana Canotilho foram unânimes e rejeitaram de forma clara os argumentos da defesa do empresário condenado pelos crimes de corrupção ativa. Entrando em colisão com o acórdão de Claúdio Monteiro que tinha sido aprovado pelos conselheiros José Teles Pereira e João Pedro Caupers (ex-presidente do Tribunal Constitucional) mas que teve o voto de vencida da conselheira Fátima Mata-Mouros

As diferentes visões resumem-se de forma simples:

  • Cláudio Monteiro entendia que o crime de corrupção consumava-se com o acordo/pacto corruptivo. “O crime tem de se entender nessa altura consumado, também para efeitos do início do curso do prazo prescricional, independentemente do que venha a suceder mais tarde no âmbito do pacto corruptivo firmado”. A consumação do crime por via do recebimento, a tal fase posterior ao acordo, viola o “princípio da legalidade penal”, daí a “inconstitucionalidade material” dessa leitura, lê-se no Acórdão n.º 90/2019 que foi citado por diversas vezes pelo juiz Ivo Rosa na decisão instrutória da Operação Marquês e que legitimou a sua decisão de declarar prescritos os crimes de corrupção imputados a José Sócrates;
  • Já Ascensão Ramos, apoiado por unanimidade pela 2.ª Secção do TC, admitem que as normas que suportam os crimes de corrupção ativa e passiva do Código Penal e de leis especiais para os titulares de cargos políticos permitem a leitura de que o crime se consuma com o acordo. Mas também permitem o entendimento objetivo de que, “quando tem a entrega subsequente à promessa, opera uma atualização do momento de consumação do delito”, lê-se no acórdão n.º 370/2023. Mais “ainda que a infração se tenha por típica ou formalmente consumada com a prática do primeiro, a persistência na ação ofensiva do bem jurídico deslocará o ponto de consumação material para a realização do último facto lesivo”, conclui o relator Ascensão Ramos.

A uniformização decidida pelo TC por unanimidade

É precisamente a esta leitura do acórdão de Ascensão Ramos que o acórdão n.º 73/2024 adere, por decisão tomada por unanimidade pelo plenário do TC e até com a aprovação do conselheiro Teles Pereira — que tinha votado a favor do acórdão n.º 90/2019.

No texto do seu recurso, o MP começa por dizer que o acórdão subscrito por Cláudio Monteiro “marca um ponto de disrupção relativamente ao entendimento da doutrina penal preponderante e da jurisprudência unânime dos tribunais criminais e superiores”.

No texto do seu recurso, o MP começa por dizer que o acórdão subscrito por Cláudio Monteiro "marca um ponto de disrupção relativamente ao entendimento da doutrina penal prepondorante e da jurisprudência unânime dos tribunais criminais e superiores".

Ora, o plenário do TC decidiu aderir à tese do acórdão n.º 370/2023, segundo a qual o crime de corrupção consuma-se com o recebimento da última contrapartida, que tal é decisivo para “efeitos prescricionais” e que nada disto viola o princípio da legalidade imposto pela Constituição — o que “possui abundante respaldo no ordenamento jurídico-penal”.

“É esta a jurisprudência que se reitera”, afirma o plenário do TC de forma a que não existam mais dúvidas.

Do ponto de vista prático, o TC uniformiza a interpretação constitucional aceitando que é a data do recebimento da última vantagem ou suborno (o tal “último facto lesivo”, referido no acórdão n.º 370/2023) que é o ponto fulcral para o início da contagem do prazo de prescrição.

Tese do MP sobre não prescrição dos crimes de corrupção reforçada com estudo jurídico

Para o TC, passou a ser claro que a “consumação (material) localiza-se no último acto praticado”, logo o “início do prazo prescricional” do crime de corrupção situa-se na “execução do último facto típico [recebimento da contrapartida], não no primeiro [acordo]”, lê-se no acórdão aprovado por unanimidade pelos conselheiros Ascensão Ramos (que voltou a ser o relator), José Carlos Loureiro, José Eduardo Figueiredo Dias, Rui Guerra da Fonseca, Maria Benedita Urbano, Carlos Medeiros Carvalho, Gonçalo Almeida Ribeiro, Dora Lucas Neto, Mariana Canotilho, Joana Fernandes Costa, Afonso Patrão, José João Abrantes (presidente do TC) e José Teles Pereira.

A declaração de voto de Teles Pereira

Por ter sido um dos três conselheiros que aprovaram o acórdão de Claúdio Monteiro, Teles Pereira fez questão de juntar uma declaração de voto para explicar a sua mudança de posição.

Começando por referir que a “questão da inconstitucionalidade da norma em causa nos presentes autos não era em fevereiro de 2019, como não é ainda hoje, isenta de debate sério e profundo, na jurisprudência e doutrina”.

"A verdade é que não se pode seriamente ignorar (...) o sentido de que o prazo de prescrição do crime de corrupção (...) é contado a partir da data em que ocorra a entrega de uma dada vantagem ao funcionário, e não a partir da data em que ocorra a promessa dessa vantagem", lê-se na declaração de voto do conselheiro Teles Pereira.

Contudo, uma série de novos estudos sobre a matéria em Portugal (do qual se destaca o de Nuno Brandão e outros estudos publicados no Brasil e em Itália) conduziram Teles Pereira a “uma última reflexão” que foi consolidada com a discussão que precedeu a tomada de posição pelo plenário do TC.

Daí que, apesar dos argumentos de Cláudio Monteiro serem “razoáveis”, tenha que verificar-se um “reposicionamento” de Teles Pereira. “A verdade é que não se pode seriamente ignorar (…) o sentido de que o prazo de prescrição do crime de corrupção (…) é contado a partir da data em que ocorra a entrega de uma dada vantagem ao funcionário, e não a partir da data em que ocorra a promessa dessa vantagem”, lê-se na declaração de voto do conselheiro Teles Pereira.

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