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A Primeira Liga portuguesa está de volta, naquela que será a 87.ª edição. Dezoito equipas irão defrontar-se ao longo de 34 jornadas, mas só uma ouvirá o “We Are The Champions” em maio. Num campeonato que se prevê atípico, como foi o final do anterior, e em que anormalmente serão mais as zaragatoas no nariz do que os casos discutidos na televisão, fica o retrato musicado dos clubes que disputam a mais mediática prova de futebol em Portugal.

Sporting Clube Farense

Shakira: “Whenever, Wherever”

Em 2002, Portugal dançava ao som de “Whenever, Wherever” de Shakira, cantava “Come Away With Me” de Norah Jones, via a novela brasileira “O Clone” e a Juventude Leonina lançava o sucesso “Só Eu Sei Porque Não Fico Em Casa” para comemorar o título desse ano. Desde então, muita coisa mudou: do vencedor do campeonato às equipas que desapareceram, como UD Leiria, SC Salgueiros ou Beira-Mar, dos dirigentes carismáticos aos campos míticos. Mas há algo que não mudou e de que todos os que gostam de futebol tinham saudades: o Estádio de São Luís. O Farense fez uma longa travessia no deserto, mas está de volta à primeira divisão e só nos falta o bigode do Paco Fortes para ouvir novamente:

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“Whenever, wherever
We’re meant to be together
I’ll be there and you’ll be near”

Clube Desportivo Nacional

Cristina Branco: “Nevoeiro”

Quem também está de volta é o clube das estridentes madeirenses:

“Oh Nacional, Toca na bola, Não tenhas medo de sujar a camisola, Ela é de ouro, Ela é de prata, E a dos outros é da casca da batata.”

Uma pessoa bem que tenta alhear-se desse som, mas os sentidos estão bem alerta como resultado daquele recorrente nevoeiro da Choupana que não perdoa. Canta a Cristina Branco:

“Não sei quem sou nem quem és
Há muito perdi o rumo
Entre nevoeiro e fumo
Vou e venho nas marés
Não sei quem sou nem quem és”

E ficamos a pensar se não será uma provocação sobre quem é realmente o treinador principal e o adjunto da equipa. Por via das dúvidas, vou já inscrever-me no último nível do curso.

Portimonense Sporting Clube

Trem da Alegria: “Io Io”

A equipa de Portimão viveu uns últimos meses feita um “um brinquedinho divertido / Tenho certeza que você vai se amarrar / Duas rodinhas enroladas num barbante / Ele parece um biscoitinho recheado.” Entre o desce e não desce, a equipa que perdeu em campo manteve-se na primeira divisão porque paga aos seus jogadores, e isso devia ser algo inquestionável. O final da temporada passada foi um sprint quase épico, será que voltam na mesma forma?

Codecity

Paulo de Caravlho: “E Depois do Adeus”

“Quis saber quem sou
O que faço aqui
Quem me abandonou
De quem me esqueci
Perguntei por mim” 

E assim continua a confusão na primeira divisão. Clube de Futebol Os Belenenses só há um, por isso, embora este pareça o clube da Cruz de Cristo garantidamente não o é. A Liga de Clubes vai sorrindo e acenando enquanto o Belenenses SAD vira B SAD, depois Codecity e qualquer dia a equipa de Lisboa joga no Alentejo. Se a Liga não sabe quem é este clube, o que faz ele ali, quem o abandonou, como poderá opinar corretamente sobre tantas outras coisas como os horários dos jogos ou o cartão do adepto?

Clube Desportivo de Tondela

Samuel Úria: “É Preciso que eu Diminua”

O clube do distrito de Viseu continua na primeira divisão e o seu trajeto dos últimos anos mostra que há ali um projeto sustentado. Entre a irreverência dos mais jovens e alguns nomes mais experientes, o Estádio João Cardoso deverá ser um campo complicado para muitas equipas. E o Tondela vê-se agora com a dúvida de muitos clubes: manter ou tentar crescer? Porque como canta o tondelense Samuel Úria:

“Já não caibo numa casa
Onde o espaço é todo meu
Não são obras que me salvam
Eu só sei crescer”

Futebol Clube Paços de Ferreira

Woodkid: “Iron”

Os móveis de Paços de Ferreira mais parecem ser feitos de ferro desde que Pepa pegou na equipa dos castores. Cientes das suas dificuldades, quase sempre com um dos orçamentos mais baixos da primeira divisão, os pacenceses são uma equipa de lutadores, porque tal como Woodkid canta “I’m ready for the fight, and fate” e o destino é uma certeza: um treinador e o seu boné inigualável.

Boavista Futebol Clube

Os Pontos Negros: “Xadrez & Chanel”

“Queres viver sem rei nem roque
A anarquia é a tua lei
E apesar do teu forte ataque
O roque não se faz sem rei”

Assim cantavam os Pontos Negros. Esta letra não foi pensada para a história do Boavista porque, claramente, a nova época da equipa tripeira não será assente na anarquia. A chegada do empresário espanhol-luxemburguês, Gérard Lopez, à SAD oferece jogadores com muita qualidade ao plantel e parece que a equipa axadrezada pode mesmo ambicionar algo mais do que o meio da tabela.

Clube Sport Marítimo

Da Vinci: “Conquistador”

O clube das cores republicanas nasceu na Madeira, em 1910, enquanto representante da tradição ligada ao mar das gentes do Funchal. 110 anos depois não querem descobrir “um mundo novo / um sonho de poetas”, querem apenas “cantar novas vitórias / erguer orgulhosas bandeiras” que esta época tem de ser mais sossegada do que a anterior. E, claro, ganhar o grande derby da ilha.

Gil Vicente Futebol Clube

Glockenwise: “Muito Para Dar”

Os Glockenwise cantam “Estou nesta vida convencido que / Eu tenho muito para dar” e facilmente podia ser este o epitáfio do clube de Barcelos. Só que o Gil Vicente veio para ficar, muito à custa de Vítor Oliveira. O rei das subidas descobriu em Barcelos um novo desafio e já faltou mais para podermos encontrá-lo no Parque Fluvial em pleno Milhões de Festa. Certo, este arranque de campeonato pandémico trocou um pouco as contas aos gilistas, mas tenhamos calmo: o resultado final, imagine-se, só aparece no fim. Até lá, cantemos

Clube Desportivo Santa Clara

The National: “Santa Clara”

Tudo é uma boa desculpa para ouvir The National, mas se Matt Berninger canta Santa Clara e diz que “I don’t worry anymore, nothing like I did before / I don’t worry, I just watch them rolling back / I don’t worry anymore” é porque a campanha do clube açoriano será sossegada. Ele não se preocupa mais e é essa a lição a retirar aqui. Após dois anos com João Henriques e um trabalho de qualidade, a direção arriscou mudar para o vilacondense Daniel Ramos e a vontade de transformação é tanta que até já se equaciona mudar o emblema. Parece que também desejam que o emblema seja conhecido na China. E afinal até é fácil falar dos Açores sem referir os divinais bifes da Associação Agrícola de São Miguel.

Moreirense Futebol Clube

Gérard Calvi: “Astérix Le Gaulois”

Moreira de Cónegos é uma pequena freguesia povoada por irredutíveis minhotos que ainda resistem ao invasor. E a vida não é nada fácil para as guarnições de Braga e Guimarães que se deslocam ao Estádio Comendador Joaquim de Almeida Freitas. O clube pode não ter um Astérix ou um Obélix na frente de ataque, mas parece ter encontrado a poção mágica para se manter no convívio entre os grandes do futebol português.

Vitória Sport Clube

Paco de Lucia: “Entre dos Aguas”

“Después de haberte amado tanto
De haberte regalado mis noches de amor
Aquí me tienes de nuevo esperando”

Este podia ser o cântico dos fervorosos adeptos vimarenses. Habituados a nunca desistir, a nunca abandonar — mesmo quando desceram à segunda –, os adeptos veem agora o clube ser o único Vitória da primeira divisão. Por isso, esqueçam o Guimarães, o clube jogará com o seu nome e logo numa época em que a aposta é alta e veio de cavalo: Ricardo Quaresma, o cigano que pretende calar os racistas da cidade-berço.

Futebol Clube de Famalicão

Caetano Veloso: “Surpresa”

A equipa de Vila Nova de Famalicão foi a grande surpresa do campeonato transato. À mescla de jogadores experientes com empréstimos internacionais de grande qualidade juntou-se uma massa adepta que vivia intensamente a equipa. Os azuis e brancos eram dominadores em campo e fora dele mas já se sabe que só se consegue surpreender uma vez e este ano a fasquia parece mais alta.

Rio Ave Futebol Clube

Rancho Caxineiro: “Vira do Mar”

Poucos clubes representam tanto a sua comunidade quanto o Rio Ave. A poucos metros de Caxinas, importante ponto piscatório, o Estádio dos Arcos é o verdadeiro bastião da região. Zona onde se convive com a vida e com a morte, a saída de Carlos Carvalhal obrigará o Rio Ave a reinventar-se e logo numa época em que as competições europeias devem trazer um desgaste extra.

Sporting Clube de Portugal

Sérgio Godinho: “O Primeiro Dia”

“[…] E vem-nos à memória uma frase batida
Hoje é o primeiro dia do resto da tua vida

[…]

Dá-se a volta ao medo, dá-se a volta ao mundo
Diz-se do passado, que está moribundo”

O sportinguista Sérgio Godinho escreveu “O Primeiro Dia” em 1978, mas esta tema podia ser gizado para a época que agora começa. Todos os anos o Sporting é candidato ao título, pois é isso que se espera de um “grande”, todavia há sempre algo no caminho. Da pressão dos adeptos à menor qualidade dos planteis, da instabilidade governativa ao “azar”, os anos sem o campeonato vão-se acumulando. Será que é preciso um ano atípico para romper com a normalidade?

Sporting Clube de Braga

Berlin: “Take My Breath Away”

O Sporting de Braga está pronto para outros voos, é um facto. Nos últimos anos realizou um meritório trabalho de formação, construiu infraestruturas de qualidade, estabilizou as contas com um balanço claramente positivo e agora aposta em contratações sonantes e divulga-as com estrondo. Os Guerreiros do Minho vieram para ficar — com ou sem camisola 10 –, e os três grandes que se preparem.

Sport Lisboa e Benfica

Depeche Mode: “Personal Jesus”

O Benfica de setembro de 2020 precisa de um Jesus feito bem à medida dos sonhos de cada um. Somos todos treinadores de sofá — que as bancadas ficarão desertas mais uns tempos –, e todos sentimos que a salvação está naquele outro jogador que só por acaso não está ali. A temporada anterior terminou num descalabro quase de proporções bíblicas e na cabeça de alguns iluminados só o regresso de Jesus à terra podia devolver a glória. O sucesso europeu, no mais alto patamar, já ficou pelo caminho mas os benfiquistas sabem que a época é longa e Jesus tem a escola toda. Em maio logo se verá se temos mais jesuítas ou ateus.

Futebol Clube do Porto

Minda Da Gap: “Suspeitos do Costume”

Quando se fala de ganhar o campeonato nacional nos últimos 38 anos, Pinto da Costa é o suspeito do costume.  A ele juntou-se nas últimas temporadas o treinador Sérgio Conceição e mais alguns jogadores à Porto. Vivem segundo as palavras de Mind da Gap: “Fazemos o que temos de fazer, verdadeiros até morrer” e vão ganhando contra tudo e contra todos como tanto gostam de dizer e repetir. São, muito provavelmente, os favoritos ao título desta temporada. Só falta que usem a garra e o querer para outras lutas, como os direitos de todos os adeptos.