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A lei permite a fixação de um novo prazo?

Sim. A resposta é claramente positiva.

Expliquemos, em primeiro lugar, o enquadramento abstrato. O Código do Processo Penal (CPP) estipula que, caso existam arguidos em prisão preventiva, ninguém pode estar detido durante mais de um ano sem conhecer uma acusação formal por parte do Ministério Público (MP). O que implica acusar um arguido detido antes dos 12 meses de detenção ou soltá-lo, caso não tenha sido encerrada a investigação.

É verdade que o CPP define igualmente que um inquérito deve ser encerrado ao fim de 6 meses (nos casos mais simples e com arguidos detidos) e de 8 meses (para os casos que não têm arguidos detidos). Tal prazo pode ser alvo de prorrogação até aos 18 meses, caso o processo seja classificado de especial complexidade — classificação atribuída à Operação Marquês a 17 de junho de 2015.

No caso concreto deste inquérito, trata-se de um processo que se iniciou formalmente a 19 de julho de 2013. Argumenta a defesa de Sócrates que o processo já deveria ter terminado a 19 de outubro de 2015.

Mas estes prazos, de acordo com jurisprudência diversa dos tribunais superiores, são meramente indicativos. Basta para o efeito que o procurador titular dos autos justifique de forma fundamentada junto do seu superior hierárquico as razões do atraso para que a investigação continue.

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Quantos adiamentos já teve a Operação Marquês?

Verificaram-se dois adiamentos.

Depois de o procurador Rosário Teixeira o informar, em novembro de 2015, sobre as razões para a ultrapassagem do prazo de 18 meses definidos pela lei, o procurador Amadeu Guerra, diretor do Departamento Central de Investigação e Ação Penal (DCIAP), deu-lhe 30 dias para elaborar um relatório sobre o estado dos autos naquela época.

A 22 de dezembro de 2015, Amadeu Guerra deu mais 3 meses para que fosse feito novo balanço e, finalmente, a 30 de março de 2016 deu mais 6 meses para a conclusão dos trabalhos.

Em setembro de 2016, Amadeu Guerra informou Joana Marques Vidal, procuradora-geral da República, que não era possível proferir despacho de encerramento de inquérito devido ao alargamento do objeto da investigação, que tinha levado a um conjunto alargado de diligências que ainda não estavam cumpridas e a uma quantidade colossal de informação que ainda não estava analisada.

A procuradora-geral aceitou então promover um segundo adiamento de 6 meses — o que empurrou a conclusão para 17 de março de 2017.

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Quais as razões para os adiamentos anteriores?

Há dois grupos de razões.

O primeiro prende-se com o alargamento do objeto da investigação. O momento de viragem ocorre quando surgiram indícios, em 2016, de que os fundos que Hélder Bataglia, ex-líder da Escom, transferiu para Joaquim Barroca, ex-vice-presidente do Grupo Lena, tinham tido origem no Grupo Espírito Santo (GES). Como Barroca tinha confessado que Santos Silva utilizava as suas contas na Suíça como contas de passagem, o MP mudou a perspetiva do caso e passou a encarar o GES — e não o Grupo Lena — como o epicentro do alegado esquema de corrupção.

Por outro lado, os autos já tinham atingido uma dimensão muito significativa em setembro de 2016:

  • mais de 2900 documentos em suporte de papel;
  • mais de 9 milhões de ficheiros informáticos;
  • 260 apensos bancários anexos ao inquérito, a que correspondem mais de 200 mil registos bancários;
  • mais de 150 buscas e quase 130 inquirições e interrogatórios.

Por analisar, estava igualmente muita prova relevante que se encontrava armazenada em:

  • 13 computadores portáteis;
  • 7 discos externos;
  • 9 pen drives;
  • 8 DVD’s;
  • 5 telemóveis;
  • E 59 caixas de correio eletrónico.
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A Operação Marquês está a demorar muito tempo?

Não, se tivermos em consideração a complexidade e a importância histórica deste processo.

Ponto prévio importante: a Operação Marquês encontra-se na fase de inquérito — a primeira fase do processo penal. Esta fase terminará com um despacho de encerramento de inquérito, que poderá imputar formalmente alegadas práticas criminais aos cidadãos que foram constituídos arguidos neste processo.

Os autos da Operação Marquês iniciaram-se a 19 de julho de 2013. Ou seja, há 3 anos e 8 meses.

Comparando a fase de inquérito deste caso com outros, que investigam o mesmo tipo de criminalidade, chegamos a estas conclusões:

  • Caso Monte Branco

Foi aberto em 2011 e ainda não está concluído. Isto é, as investigações decorrem há cerca de 6 anos.

O titular dos autos é o mesmo da Operação Marquês: Rosário Teixeira.

A investigação permitiu desmantelar uma rede de branqueamento de capitais liderada por Francisco Canas (recentemente falecido) e por Michels Canals, que prejudicou o Fisco em mais de 100 milhões de euros.

  • Caso Furacão

A investigação iniciou-se em 2005 mas as últimas acusações apenas ocorreram no final de 2015 e em 2016. Isto é, mais de 10 anos após o início da fase de inquérito.

Estavam em causa crimes de fraude fiscal e de branqueamento de capitais, que derivavam de produtos de planeamento fiscal vendidos nos private banking do BES, BCP e BPN.

  • Caso dos Submarinos

O inquérito começou em 2005, mas os primeiros arguidos (Hélder Bataglia, Luís Horta e Costa e Pedro Ferreira Neto) só foram constituídos arguidos em 2014 — quando o caso estava à beira da prescrição. Os autos foram arquivados em dezembro de 2014. Ou seja, 9 anos depois do início das investigações.

  • Face Oculta

O processo, que investigava a rede de alegados favorecimentos que Manuel Godinho, o célebre sucateiro de Ovar, construiu em diversas empresas públicas, teve 34 cidadãos e 2 empresas como arguidos. Armando Vara, enquanto vice-presidente do Banco Comercial Português, foi um deles.

A investigação durou cerca de 2 anos. Começou em outubro de 2008 e terminou a 27 de outubro de 2010.

  • Caso Isaltino Morais

O caso que levou à demissão de Isaltino Morais de ministro das Cidades e do Ordenamento do Território do Governo de Durão Barroso iniciou-se 2002 e levou o ex-autarca de Oeiras a cumprir pena de prisão de 2 anos como culpado do crime de fraude fiscal qualificada — saiu da prisão em liberdade condicional ao fim de um ano.

A fase de inquérito do caso concentrou-se nas contas bancárias que Isaltino tinha na UBS da Suíça (o mesmo banco a que os arguidos Carlos Santos Silva, Hélder Batalgia, Joaquim Barroca e José Paulo Pinto de Sousa também recorreram) durou cerca de 4 anos. Iniciou-se em 2002 com uma carta anónima que continha os extratos bancários das contas suíças de Isaltino e terminou em janeiro de 2006.

Mais exemplos podem ser encontrados aqui.

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A procuradora-geral Joana Marques Vidal pode dar mais tempo à investigação?

Nada na lei impede a procuradora-geral da República de conceder um terceiro adiamento. A questão não é jurídica — é política, ou de gestão da imagem do Ministério Público.

Quando fixou o prazo em 17 de março de 2017, Joana Marques Vidal usou a sua prerrogativa hierárquica e determinou a aceleração processual do inquérito, mas fez questão de afirmar o seguinte:

A possibilidade de prorrogação do prazo concedido [de 180 dias] poderá ser admitida, a título excecional, mediante requerimento fundamentado dos magistrados titulares do inquérito e de respetiva informação hierárquica”

Isto é, a própria procuradora-geral deixou a porta aberta para nova prorrogação do prazo.

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Quais os procedimentos para a PGR estipular um novo prazo?

Em primeiro lugar, o procurador Rosário Teixeira e os restantes magistrados titulares do inquérito terão de requerer formalmente tal adiamento.

Por outro lado, Amadeu Guerra, diretor do DCIAP, terá de apreciar tal proposta e enviar uma avaliação sobre a mesma para a procuradora-geral.

Ao que o Observador apurou, tal pedido formal de adiamento ainda não foi solicitado pela equipa de investigação. Daí a posição oficial da Procuradoria-Geral da República referir que o prazo para a conclusão de inquérito continua a ser 17 de março.

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Quais as consequências de um novo adiamento?

A primeira consequência passa inevitavelmente por uma maior pressão política e da opinião pública sobre a procuradora-geral Joana Marques Vidal.

A partir do momento em que foi necessário recorrer à líder da PGR para conceder um adiamento do prazo de conclusão (e há quem defenda no MP que tal não era legalmente necessário), Joana Marques Vidal ficou ligada de forma mais direta ao desfecho do caso mais importante da história do MP.

Por outro lado, e sem colocar em causa a complexidade da investigação da Operação Marquês, José Sócrates marca pontos sempre que se verifica um adiamento. Afinal, a sua narrativa baseia-se na repetição até à exaustão de que a investigação não tem provas.

O MP, por seu lado, continua a não ter uma política de comunicação que lhe permita gerir a sua imagem junto da opinião pública. Apesar da evolução significativa que já ocorreu com a equipa da procuradora-geral Marques Vidal nesta área, a cultura judiciária continua a ser avessa a um esclarecimento pormenorizado dos casos judiciais.

O poder político também não vê com bons olhos a crescente eficácia da narrativa de José Sócrates. Esta segunda-feira, o Presidente da República já deu nota de um “desconforto geral” com a Justiça. Marcelo não se pronunciou diretamente sobre a Operação Marquês, mas as afirmações, proferidas numa conferência onde também estava Joana Marques Vidal foram vistas como um recado para a PGR.

Marques Vidal acabaria por afirmar, na mesma conferência, que “o sistema” judicial “não permite interferências políticas”.

E o Governo e o PS? As figuras relevantes continuam em silêncio.

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Ainda é possível emitir o despacho de encerramento de inquérito até dia 17 de março?

É difícil. Basta analisar o calendário dos interrogatórios conhecidos para esta semana.

Depois do interrogatório de José Sócrates durante esta segunda-feira, será ouvido Joaquim Barroca na quinta-feira — 24 horas antes de expirar o prazo definido pela procuradora-geral. O ex-vice-presidente do Grupo Lena deverá ser confrontado, entre outras matérias, com novos indícios relacionados com um alegado negócio imobiliário simulado em Luanda entre o seu grupo empresarial e uma empresa de Hélder Bataglia.

Por outro lado, diversas cartas rogatórias ainda não foram cumpridas. Dois exemplos:

  • de acordo com o jornal i, a Suíça ainda não enviou os dados bancários das contas de Henrique Granadeiro, ex-líder da Portugal Telecom, no Banco Pictet. Quem denunciou o nome de Granadeiro como tendo recebido cerca de 24 milhões de euros do ‘saco azul’ do GES terá sido o próprio Ricardo Salgado, como o Observador já tinha noticiado;
  • Angola também ainda não terá cumprido a carta rogatória para constituir José Paulo Pinto de Sousa, primo de José Sócrates, como arguido da Operação Marquês. O MP considera que aquele empresário luso-angolano foi o primeiro testa-de-ferro do ex-primeiro-ministro.

Por outro lado, existem ainda um conjunto de diligências que não são conhecidas mas que vão decorrer durante esta semana.

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Qual o eventual novo prazo para o encerramento?

Depende do risco que a procuradora-geral Joana Marques Vidal esteja disposta a correr. E depende igualmente da fundamentação que os procuradores titulares do inquérito utilizem num eventual pedido de adiamento do prazo.

Tendo em conta as práticas anteriores do procurador Rosário Teixeira em processos como o BPN, Monte Branco, Furacão, etc., o líder da equipa de investigação deseja um prazo o mais alargado possível. Para tal, terá de fundamentar de forma muito pormenorizada as suas razões. Resta saber se Marques Vidal o aceitará.

Se aceitar, poderá conceder cerca de metade dos 180 dias fixados a 14 de setembro de 2016. 60 a 90 dias poderá ser o tempo necessário para, por exemplo, cumprir as cartas rogatórias ainda pendentes.

Outra hipótese passa por uma extensão curta do prazo. A concessão de mais 15 ou 30 dias para análise dos interrogatórios que estão a ser realizados esta semana e para a conclusão da elaboração do despacho de encerramento de inquérito.

Caso se concretize a fixação de um novo prazo, ficam em aberto duas situações:

  • a avocação dos autos do processo por parte do diretor do DCIAP ou pela própria procuradora-geral da República e redistribuição por outro magistrado;
  • a abertura de inquéritos disciplinares aos magistrados titulares do processo.

Estas possibilidades são vistas no MP como remotas, dada a necessidade de coesão interna que é necessário demonstrar neste momento. Mas não estão completamente fora de hipótese, particularmente a instauração de inquéritos disciplinares.