É juntamente com a cara do presidente norte-americano Donald Trump que circula no Facebook um aviso “urgente” para todos os brasileiros, mas que pode alarmar qualquer pessoa que o leia. O texto tem falta de acentos, erros ortográficos e de concordância, o que é logo um primeiro sinal de alerta e de suspeita. Na publicação, lê-se que há um “perigo mortal” para os testes e máscaras comprados na China e que o aviso vem do governo americano. Tudo isto é falso.
A publicação garante que os Estados Unidos comunicaram ao Brasil que os testes e máscaras comprados na China chegam ao destino contaminados com o novo coronavírus, mas há vários detalhes que são destacados de forma confusa no texto e na imagem que o acompanha, que parecem ter o objetivo de causar o pânico.
Primeiro, “testes em laboratório dos Estados Unidos comprovaram” a presença do vírus, garante-se na publicação; segundo, os materiais em causa estão a ser “recolhidos à pressa” nos EUA; terceiro, no Brasil, o “patife Mandetta” encomendou “toneladas aos chineses”; quarto, é pedido às pessoas que não usem máscaras “entregues nas ruas ou hospitais”. Não é possível confirmar nenhuma destas coisas.
Não há qualquer informação sobre um eventual aviso dos Estados Unidos ao Brasil e muito menos sobre testes feitos em laboratório que tivessem detetado a presença do vírus em equipamento supostamente por estrear. Não foi possível encontrar notícias que citassem a Casa Branca com este tipo de declarações. Portanto, este aviso não pode ser oficial.
Esta não é a primeira vez que circulam publicações que afirmam que os equipamentos comprados na China para o combate à Covid-19 chegam aos países de destino já infetados. Por exemplo, no início de abril, começou a ser partilhado um vídeo que mostraria o FBI a apreender milhares de máscaras contaminadas vindas da China — afinal, como demonstrou o fact check do Observador, o material estava em perfeitas condições e estava a ser vendido no mercado negro por quantias exorbitantes.
Fact Check. FBI apreendeu máscaras infetadas com coronavírus vindas da China?
No caso atual, o “G1”, portal de notícias da rede “Globo”, contactou especialistas para descansar os brasileiros sobre a probabilidade de chegarem às mãos da população máscaras contaminadas. Contudo, as explicações são válidas no geral, incluindo para Portugal.
“Não há risco, seja em máscara, brinquedo ou tecido trazido da China. Não existe como, nesse período entre embalagem e voo de 24 horas, haver risco de contaminação. Não há possibilidade biológica de o vírus se manter vivo nessas condições”, garantiu o infecciologista Renato Kfouri, presidente do Departamento Científico de Imunizações da Sociedade Brasileira de Pediatria, à publicação.
Além disso, o post que circula no Facebook parece ter ido buscar detalhes a vários acontecimentos verdadeiros mas tirando-os do contexto. O jornal The Washington Post revelou a 18 de abril que no CDC, um laboratório de Atlanta, tinham sido contaminados kits destinados a testar a Covid-19. O problema aconteceu nos Estados Unidos, com produtos fabricados localmente, e não teve qualquer influência de materiais importados da China.
Quanto ao “patife Mandetta” do texto, esta é uma referência a Luiz Henrique Mandetta, que foi ministro da saúde do Brasil até 16 de abril, altura em que foi afastado por Jair Bolsonaro após inúmeras divergências sobre a forma de lutar contra a pandemia.
Mandetta ainda ocupava o cargo quando o Ministério da Saúde brasileiro comprou à China “240 milhões de máscaras para garantir a proteção de profissionais de saúde no atendimento a pacientes com coronavírus (COVID-19)”, diz a informação disponibilizada no site oficial a 8 de abril. Isto significa que o material nem sequer era destinado à população, como sugere a publicação que pede às pessoas que recusem “as entregues nas ruas ou hospitais”.
Conclusão
Os Estados Unidos não alertaram o Brasil para material contaminado a circular. Até agora, não há evidências sobre máscaras ou testes comprados na China que tenham chegado aos respetivos destinados já com o novo coronavírus. Houve contaminação de material, sim, mas num laboratório de Atlanta. O problema foi logo detetado e noticiado pelo “The Washinton Post”. No Brasil, é verdade que o agora ex-ministro da saúde Luiz Henrique Mandetta comprou milhares de máscaras no mercado chinês mas é mentira que o objetivo fosse distribuí-las nas ruas. A encomenda era exclusiva para os profissionais de saúde.
Assim, de acordo com o sistema de classificação do Observador, este conteúdo é:
De acordo com a classificação do Facebook, este conteúdo é:
FALSO: as principais alegações do conteúdo são factualmente imprecisas. Geralmente, esta opção corresponde às classificações “falso” ou “maioritariamente falso” nos sites de verificadores de factos.
Nota 1: este conteúdo foi selecionado pelo Observador no âmbito de uma parceria de fact-checking com o Facebook.
Nota 2: O Observador faz parte da Aliança CoronaVirusFacts / DatosCoronaVirus, um grupo que junta mais de 100 fact-checkers que combatem a desinformação relacionada com a pandemia da COVID-19. Leia mais sobre esta aliança aqui.