“O co-Fundador e ex-presidente da Greenpeace, Patrick Moore, descreveu as maquinações cínicas e corruptas que alimentam a narrativa do aquecimento global e das ‘alterações climáticas’.” É assim que a página de Facebook do site Notícias Viriato começa por descrever a sua publicação sobre Patrick Moore, que identifica como co-fundador da Greenpeace e como ex-presidente da mesma organização.

E as afirmações que o Notícias Viriato apresenta como sendo ditas por Patrick Moore têm tudo para surpreender vindas de um antigo dirigente da organização ambientalista, por contrariarem aquilo que a Greenpeace e a maioria da comunidade científica defende atualmente: que as alterações climáticas são uma realidade e que a ação humana está a contribuir para as acelerar. A publicação, partilhada a 17 de novembro, já conta com mais de 350 partilhas.

“É assumir a ciência como superstição e uma espécie de combinação tóxica de religião e ideologia política. Não há verdade nisto. É um embuste e uma fraude”, identifica-se na página como sendo uma afirmação de Patrick Moore, ajudada pelo argumento de autoridade de ser dita por um dos supostos fundadores da Greenpeace. As frases foram de facto proferidas por Patrick Moore numa entrevista ao site de extrema-direita norte-americano Breitbart, que foi em tempos dirigido por Steve Bannon, que está incluída na íntegra no site do Notícias Viriato. O que não é tão claro é a identificação sobre quem é de facto Patrick Moore.

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Quem é Patrick Moore?

Não é a primeira vez que Patrick Moore é apresentado como fundador da Greenpeace e que as suas opiniões controversas sobre as alterações climáticas são partilhadas pelo próprio — aliás, é ele mesmo que se identifica como “co-fundador” da organização na sua página de Twitter. Em março, numa entrevista à cadeia de televisão Fox News, afirmou que a “crise climática” é “não só fake news, mas também fake science [ciência falsa]” e que o dióxido de carbono é “o principal tijolo de toda a vida” — não comentando, contudo, as afirmações científicas de que as altas concentrações de dióxido de carbono, como ilustra a NASA, levam à criação de um efeito de estufa e ao aquecimento global.

As afirmações de Patrick Moore na Fox foram inclusivamente destacadas no Twitter pelo Presidente norte-americano, Donald Trump.

Moore é canadiano, nascido em 1947 em Port Alice. Estudou biologia florestal e ecologia, tendo inclusivamente feito um doutoramento em 1974, na Universidade de British Columbia, sobre a poluição da indústria mineira. Ao mesmo tempo, durante a juventude, juntou-se a outros ecologistas com preocupações semelhantes, que se envolveram naquilo que se viria a tornar o ramo canadiano da Greenpeace.

O aumento dos níveis de dióxido de carbono na atmosfera ao longo do tempo (NASA)

A organização, contudo, fez questão de reagir após a entrevista à Fox News, distaciando-se de Moore e recusando classificá-lo como fundador da Greenpeace. “Embora o senhor Moore tenha tido um papel importante na Greenpeace Canadá durante vários anos, não a fundou. Phil Cote, Irving Stowe e Jim Bohlen fundaram a Greenpeace em 1970”, diz a própria organização num esclarecimento emitido em março de 2019. Para sustentar a sua posição, a organização disponibiliza uma carta escrita por Moore em março de 1971, enviada à Greenpeace, pedindo para ter autorização a entrar no barco da organização para protestar contra os testes nucleares levados a cabo pelo governo norte-americano à altura.

Por outro lado, como aponta o site Snopes, o processo de formação da Greenpeace foi orgânico e complexo, havendo muita gente que se identifica como co-fundador e que não é reconhecido como tal pela organização. “Há uma antiga piada que diz que em qualquer bar em Vancouver (Canadá) pode-se sentar ao lado de um fundador da Greenpeace”, dizia um antigo artigo que constou do site da Greenpeace onde Moore é identificado como fundador do Don’t Make a Wave Committe, precursor da Greenpeace.

As ligações de Moore a indústrias poluentes

Segundo a BBC, a relação entre Moore e a organização deteriorou-se com o tempo e ele acabou por ser vetado pela própria Greenpeace de ocupar cargos de liderança dentro da organização. Em 1986, o próprio afastou-se. Desde então, como descreve na sua biografia no Twitter e no seu site, passou a identificar-se como “o ambientalista moderado” e a sua visão sobre as questões ambientais parece ter divergido bastante da defendida pela Greenpeace.

Após a sua saída, Moore fundou uma empresa de consultoria chamada Greenspirit Enterprises, como confirma a revista Esquire. Através dessa empresa, Moore passou a aconselhar várias empresas, por vezes de indústrias identificadas como poluentes, tais como a indústria química, madeireira ou até mineira (sobre a qual fez o seu doutoramento). A Greenpeace acusa mesmo Moore de ter “trabalhado para os poluentes durante muito mais tempo do que alguma vez trabalhou para a Greenpeace”.

Essa narrativa é sustentada num artigo da revista Wired de 2004, recuperado pelo Snopes, onde se pode ler que Moore se tornou “o porta-voz de alguns dos interesses que a Greenpeace foi fundada para combater” e dá alguns exemplos das afirmações do próprio: “Que a floresta amazónica está bem, que a barragem Three Gorges é a coisa mais inteligente que a China podia ter feito para obter energia e que a oposição a alimentos geneticamente alterados é equivalente a homicídio em massa”, diz a revista.

Para além disto, desde 2006 que Patrick Moore trabalha para o Instituto de Energia Nuclear, uma das maiores organizações do lobby nuclear nos Estados Unidos.

Conclusão

As declarações de Patrick Moore são absolutamente verdadeiras e consistentes com aquele que tem sido o seu pensamento e posicionamento público face às alterações climáticas ao longo dos últimos 30 anos. Contudo, há divergências sobre o facto de ser ou não fundador da Greenpeace, já que a organização não o reconhece como tal. Para além disso, saiu em rutura e está afastado da organização ambientalista há décadas, factos que o artigo do Notícias Viriato não explica. Ou seja, falta dar contexto aos leitores sobre quem é Patrick Moore e qual o seu percurso de vida face ao tema das alterações climáticas, já que identificá-lo apenas como “co-fundador” da Greenpeace e seu antigo presidente é incompleto.

Assim, de acordo com o sistema de classificação do Observador este conteúdo é:

Enganador

No sistema de classificação do Facebook este conteúdo é:

MISTO: as alegações do conteúdo são uma mistura de factos precisos e imprecisos ou a principal alegação é enganadora ou incompleta.

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