No frente a frente entre Luís Montenegro e André Ventura, o líder do PSD fez várias referências ao passado do presidente do Chega como militante social-democrata. A determinado momento, Montenegro chegou mesmo a sugerir que Ventura o tentou apoiar para presidente do PSD. Na resposta, Ventura disse que não se lembrava disso e que, se alguma vez “achasse” que Montenegro deveria ser líder do partido, então estaria “meio confundido”. Acontece que Ventura achou isso mesmo. E achou por duas vezes.

Por duas vezes, André Ventura manifestou o apoio público a Luís Montenegro e tentou que o agora seu adversário à direita chegasse à liderança do PSD. A primeira vez que isso aconteceu foi no processo de sucessão de Pedro Passos Coelho. Depois da derrota das autárquicas de 2017, o antigo primeiro-ministro anunciou que iria deixar o cargo de líder do PSD e o partido entrou em convulsão. Rui Rio, há muito um crítico de Passos, já dava sinais de querer avançar. Era importante, por isso, encontrar um candidato que representasse a linha do passismo. Para muitos, Montenegro, que mantinha tudo em aberto, era o favorito.

É nesse contexto que André Ventura, então mais conhecido pela polémica candidatura à Câmara de Loures e pelos comentários que fazia na CMTV, decide anunciar publicamente o seu apoio à eventual corrida de Montenegro — que não chegaria a acontecer. A 4 de outubro de 2017, em declarações à Agência Lusa, Ventura disse o seguinte: “Na minha ótica, Rui Rio não pode nem deve ser o próximo líder. Sinceramente espero que Luís Montenegro ou Paulo Rangel avancem, porque este é o seu momento”.

Ora, Montenegro e Rangel acabaram por não avançar — seria Pedro Santana Lopes a ir a jogo contra Rui Rio, perdendo. Ainda assim, o destino de ambos voltaria a cruzar-se dentro do PSD. Em setembro de 2018, quando crescia a contestação a Rui Rio e Montenegro era assumidamente o líder da oposição interno ao então presidente do PSD, surgiu um movimento para convocar um congresso extraordinário e forçar a saída de Rio.

Era Ventura quem liderava esse movimento. Em declarações ao jornal i, a 18 de setembro de 2018, o então militante do PSD foi taxativo: “Tenho dito que Luís Montenegro é agora a única solução e nesta altura não pode virar as costas ao PSD”. Surgia nessa altura um movimento interno no PSD chamado “Chega de Rui Rio”, o verdadeiro embrião do partido que viria a nascer meses depois.

Montenegro quis cortar logo com qualquer tentativa de o empurrarem para a liça. A 5 de outubro, numa declaração ao Expresso, fechava essa porta: “Não concordo, não patrocino e não me condiciono por iniciativas que visem destituir o líder do PSD intempestivamente. Da mesma maneira que já disse que não pedirei licença a ninguém [para ser candidato à liderança], também digo que não avançarei para nada empurrado por ninguém”.

Três dias depois, Ventura saiu do PSD para fundar um novo partido, o Chega. “Fui traído, apunhalado pelas costas e enganado. Para a história ficarão aqueles que desde o início me apoiaram e incentivaram e depois vieram publicamente demarcar‐se; ficarão também as atitudes daqueles que, chamados à responsabilidade, dela fugiram e preferiram remeter‐se calculistamente a um futuro não muito distante, onde as previsíveis derrotas eleitorais tornarão tudo mais fácil”, disse à Lusa.

Conclusão

É inequívoco e objetivo que, por duas vezes, André Ventura tentou apoiar Luís Montenegro numa eventual disputa pela liderança do PSD. Na sucessão de Pedro Passos Coelho e, mais tarde, na tentativa de afastar Rui Rio.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

IFCN Badge