Foi o ano improvável, aquele que quando se somam todos os algarismos com a prova dos nove se reduz a zero. Este é o tempo de desejar, de pedir dias menos improváveis, mais estáveis. Eis sete desejos para 2017 feita em carta ao Pai Natal.

Já poucas são as crianças que acreditam no Pai Natal. Podemos chamar-lhe isso ou boas energias, ou ainda optimismos, no sentido em que inverte tendências. Assim como 2016 foi um ano negativamente improvável, também 2017 o poderia ser, mas positivamente. Aqui se deixam os desejos de baixa probabilidade. Na forma de uma carta ao Pai Natal

Querido Pai Natal,

Espero que estejas bem que nós por cá vamos andando cada vez com mais medo que o futuro destrua a paz, a liberdade e a prosperidade com que temos vivido na Europa e no Ocidente em geral. Aqui ficam sete pedidos para que consideres:

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1. Que a construção europeia reencontre o caminho que lhe garantiu a paz e a prosperidade em União. Sabemos que é um desafio difícil, uma perspectiva de baixa probabilidade. Nem que seja pelo que parece ser a inevitabilidade da saída do Reino Unido da União Europeia, um elemento que tanta falta vai fazer, sabemos que a mudança dificilmente será revertida. Mas gostaríamos que essa mudança servisse para acordar os políticos europeus para o monstro burocrático em que se transformou a Europa.

Uma boa ideia seria recuperar o objectivo de simplificar e eliminar regulamentos e directivas, que tinha sido colocado pela Comissão Barroso no sue primeiro mandato e que a crise financeira de 2007 acabou por engolir. A Europa da União está, também e especialmente, a ser corroída pela burocracia em que se transformou, cada vez mais afastada dos cidadãos. Quando um dia todos começarem a tomar consciência da dimensão dessa burocracia, e como ela come recursos e se auto-remunera, teremos muito mais cidadãos zangados com a Europa e a dar ouvidos aos discursos anti-europeus.

2. Que o terrorismo seja controlado e o Médio Oriente estabilizado. É um pedido talvez ainda mais difícil. Mas precisamos de tirar o medo do horizonte para que não destrua tudo o que construímos. Se cairmos nas ratoeiras do medo passaremos a ter fronteiras, fechados dentro de cercas, encerrados no proteccionismo. Uma realidade que muitos portugueses ainda viveram no tempo do Estado-Novo, um mundo a preto e branco que condena os povos à pobreza material e cultural.

Matar o medo controlando o terrorismo é uma condição necessária para o fracasso dos movimentos ou partidos quem defendem a saída do euro e o encerramento das portas aos imigrantes. É a nossa vida de liberdade, democracia e multiculturalismo que está ameaçada, por esse medo que o terrorismo tenta implantar entre nós. Um medo que, se vencer, nos condenará às trevas de um “mundinho” controlado por meia dúzia de pessoas em alguns países como Portugal. Que era como Portugal era antes do 25 de Abril de 1974.

3. Que a confiança no futuro regresse. Só conseguiremos construir projectos que nos dão apenas o ganha-pão no futuro se a confiança regressar. Caso contrário continuaremos a investir apenas naquilo que nos garanta um retorno a muito curto prazo. Um perfil de investimento que dita o sucesso da finança sobre a economia que, como bem sofremos, nos condena ou à estagnação ou a sucessivos ciclos de euforias e pânicos nas compras e vendas de uma e a mesma coisa, seja ela uma casa ou um derivado de acções de uma empresa.

A crise de 2007/2008 – como todas as outras cises do mesmo género ao longo da história – demonstrou que não se prospera pela finança pura, que as finanças são uma ferramenta e não um objectivo.

4. Que o novo presidente dos Estados Unidos Donald Trump seja uma agradável surpresa. O mundo inteiro esperou muito de Obama e pode hoje dizer-se que nos deu menos do que esperávamos. Não é desejar muito que Trump seja o espelho de Obama, “saia melhor que a encomenda”, usando a linguagem popular.

O choque expansionista que diz preparar para os Estados Unidos, com aumento da despesa pública em investimento e redução de impostos, pode ser a terapia que a economia norte-americana precisa e, contrariamente a países como Portugal, tem o poder monetário para aplicar.

Se a prosperidade regressar aos Estados Unidos é de esperar que Trump se esqueça das promessas de fechar as fronteiras dos Estados Unidos à imigração. Se a prosperidade regressar aos Estados Unidos, é racional esperar que volte a assumir o papel de locomotiva da economia mundial. Se a prosperidade regressar sólida aos Estados Unidos é racional esperar que as empresas chinesas muito endividadas possam ultrapassar a sua crise mais facilmente

5. Que o crescimento na Europa comece forte e sólido com mais consumo na Alemanha. Tal como os Estados Unidos, também a Alemanha tem poder e, mais ainda, margem financeira para avançar com um generoso plano de investimento público. Um desejo que, se se tornasse realidade, tiraria a Zona Euro da armadilha de estagnação sob ameaça de deflação em que se encontra.

Uma política orçamental alemã que seja expansionista é neste momento a chave para a resolução de uma das divisões europeias, aquela que separa o Norte do Sul, porque uns emprestaram e os outros se endividaram. A prosperidade gerada por mais procura na Alemanha é igualmente um contributo para ultrapassar a divisão entre o Leste e o Oeste sobre a imigração. Muitos imigrantes encontrariam trabalho e os cidadãos desses países sentiriam menos que eles são um peso. Mas esta, não esquecer, é uma carta ao Pai Natal.

6. Que o crescimento regresse a um ritmo tal que chegue rapidamente a Portugal antes de as taxas de juro aumentarem. Sabemos que as taxas de juro da dívida pública portuguesa viveram um ano a aumentar, sabemos que a tendência é para continuar, face à decisão do BCE que vai comprar menos dívida pública a partir da próxima Primavera.

Para Portugal não enfrentar sérios problemas de financiamento das suas contas públicas é preciso que o crescimento seja mais elevado (ou que a inflação aumente) ainda antes de começarmos a sentir o peso dos juros mais altos. Precisamos por isso de uma América a crescer mais e depressa e de uma Alemanha a crescer mais e depressa.

7. Que Portugal consiga atrair investimentos para projectos que criam empregos e exportam. É uma das mais urgentes necessidades do país. Embora o ano de 2016 tenha sido uma agradável surpresa em matéria de criação de emprego, precisamos de mais e especialmente de projectos privados do género do que foi a Autoeuropa. Um último desejo apenas para Portugal é que todos sejamos mais prudentes na nossa gestão financeira, evitando entrar em euforias consumistas. A dimensão da nossa dívida total exige que se poupe para o futuro.

Aqui termina a carta, Pai Natal, com o desejo de Boas Festas.