Sempre que um cristão tenta salvar o cristianismo o resultado é mau. Um cristão deveria saber que é o cristianismo que o salva a ele, e nunca ele que salva o cristianismo. Mas o esquecimento disto traz, volta e meia, a arrogância da tentativa.
Aprendemos na Bíblia que é Jesus que nos salva e não nós que salvamos Jesus. Por que temos nós, então, a tentação de querermos salvar Jesus, e como é que na prática isso acontece? A tentativa absurda dos cristãos salvarem Jesus vem geralmente em forma de um esforço bem intencionado de relações públicas. Quando o cristão sente que o cristianismo anda na mó de baixo, tenta pô-lo para cima novamente (o facto de Pedro ter repreendido Cristo quando Cristo começou a falar da sua morte já era um prenúncio do problema).
Os cristãos bem intencionados (geralmente, o pior tipo de cristãos) puxam então a auto-estima do cristianismo para cima, corrigindo a visão que o cristianismo tem acerca de si e principalmente corrigindo a visão que os outros têm acerca do cristianismo. Embarcam estes cristãos num discurso que é mais ou menos assim: o verdadeiro cristianismo não é como vocês julgam que é, o cristianismo verdadeiro não cai nos erros em que todos concordamos que está a cair, etc. Para estes cristãos bem intencionados, o cristianismo verdadeiro conhece-se quando correctamente corrigido.
O cristianismo corrigido é a busca por um cristianismo à prova dos dedos que se lhe apontam. O cristianismo corrigido é, afinal, a procura do maior consenso possível. Um cristianismo assim deve ser sobretudo vencedor, indisputado nas vitórias que amealha, nas glórias que acumula. Um cristianismo corrigido assim poderá então mostrar historicamente a sua qualidade, indesmentível por todos aqueles que forem sensíveis a vitórias.
Menos do que isto, o cristianismo será divisor e dividido, chocante, radical, desordenado e, sobretudo e escandalosamente, derrotado. Quem quer um cristianismo derrotado? Precisamos de salvar o cristianismo destas derrotas, certo? Precisamos de salvar o cristianismo.
Enquanto protestante, venho de uma tradição que valoriza a reforma. Não será a reforma uma tentativa de salvar o cristianismo também? Espero que não mas não posso ter a certeza. Ainda assim celebro o facto de o cristianismo em que creio continuar tão flagrantemente derrotado ao ponto de os cristãos serem tentados em salvá-lo. Quando o cristianismo se tornar algo em que todas as pessoas concordam que ganhou, venceu finalmente o Diabo.
É precisamente por ver o cristianismo constantemente derrotado que sei que Cristo ainda está a fazer alguma coisa nele. O pior que nos pode acontecer é arranjarmos o talento de salvarmos o cristianismo.