A doença arterial periférica resulta da obstrução das artérias dos membros inferiores e superiores, causada, na maioria das vezes, pelo crescimento de placas ateroscleróticas. Essas placas formam-se devido à aterosclerose, um processo que ocorre por acumulação de colesterol nas paredes arteriais e se associa a uma resposta inflamatória.

É um processo progressivo, que se inicia em idade jovem e tem uma evolução que depende de fatores genéticos e do estilo de vida, nomeadamente alimentação, tabagismo e nível de atividade física. É uma causa importante de patologia cardiovascular, estando na origem de doenças que provocam grande limitação ou mesmo a morte.

Em 2019, a doença arterial periférica afetava cerca de 56,4 milhões de pessoas entre os 40 e 70 anos em todo o mundo e cerca de 70 milhões de pessoas com mais de 70 anos. Este é um marcador de risco cardiovascular, uma vez que se associa frequentemente a doença no território coronário e cerebrovascular e, portanto, ao aumento do risco de enfarte ou AVC.

Compreender os fatores de risco para o desenvolvimento da doença arterial periférica é fundamental para conseguirmos apostar na prevenção, no diagnóstico atempado e no tratamento eficaz. A diabetes mellitus é um deles. Enquanto fator de risco para a aterosclerose, contribui para o risco de doença arterial periférica, que corresponde a uma causa de frequente limitação em pessoas com diabetes ou até de morte. Esta é uma doença em crescimento a nível mundial, estimando-se que 1 em cada 10 pessoas tenha diabetes. Segundo dados da Sociedade Portuguesa de Diabetologia, em 2021, a prevalência no país era de 14%, com um aumento de 20% relativamente aos últimos 10 anos. Foi responsável por cerca de 3% das mortes ocorridas em 2020 e uma causa importante de amputação.

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A doença arterial periférica nas pessoas com diabetes é frequentemente silenciosa, surgindo os primeiros sinais apenas em fases avançadas da doença. A diabetes mellitus pode igualmente afetar as fibras nervosas – neuropatia  diabética –  causando diminuição ou perda de sensibilidade, o que pode levar a traumatismos repetidos no pé e à consequente formação de feridas. Assim, a avaliação regular dos pés por profissionais de saúde é essencial, para evitar a evolução para lesões mais complexas com risco de amputação.

Sendo uma doença que só dá sinais muito tarde e que está associada a um elevado risco de complicações, o rastreio da doença arterial periférica está recomendado nos doentes com diabetes há mais de 10 anos, uma vez que a prevalência neste grupo ronda os 25%. Esse rastreio vai permitir um diagnóstico mais atempado, sendo assim possível iniciar mais cedo o tratamento, diminuindo o ritmo de evolução e o risco de complicações, como a amputação. Por outro lado, estando a doença arterial periférica relacionada com outras patologias cardiovasculares, a deteção precoce e o tratamento adequado reduzem o risco global de morte e de complicações como o enfarte ou AVC.

A doença arterial periférica tem uma apresentação variável: em quase metade dos doentes não apresenta sinais, noutra parte manifesta-se como uma dor que surge após caminhar determinada distância e que alivia com o repouso, designada por “claudicação intermitente”. Numa proporção menos significativa, revela-se através de uma dor constante, mesmo em repouso, ou provocando feridas nos membros, o que corresponde a uma forma mais grave da doença, denominada isquemia crítica ou, mais recentemente, isquemia ameaçadora de membro. Esta apresentação necessita de uma avaliação urgente por um médico.

No entanto, sabe-se que a maioria dos doentes não tem progressão da doença para o estadio de isquemia crítica, se houver um controlo estrito dos fatores de risco. As pessoas com diabetes são uma exceção, que têm mais frequentemente uma doença silenciosa, sendo a dor em repouso e/ou feridas no membro inferior – pé diabético – uma forma de apresentação mais comum do que a claudicação, daí a pertinência do rastreio neste grupo.

A presença desta doença pode ser confirmada através de exames simples, não invasivos, como a medição de índice tornozelo-braço ou eco-Doppler arterial do membro. O tratamento passa inevitavelmente pelo controlo de fatores de risco, através da adoção de estilos de vida saudável – como alimentação equilibrada, abstenção tabágica e exercício físico regular – e instituição de medicação. A intervenção cirúrgica para melhorar a circulação no membro é ponderada apenas quando existe risco de perda de membro ou a claudicação se mantém muito limitante, apesar das medidas adotadas. Esta pode ser realizada através de técnicas endovasculares (cateterismo) e da cirurgia clássica (aberta), dependendo do risco do doente e das características da doença.

A doença arterial periférica é uma patologia crescente tendo em conta os hábitos da sociedade moderna e o incremento mundial da diabetes mellitus. Carece de uma abordagem multidisciplinar, com médicos e profissionais de saúde de diversas áreas, em que o controlo dos fatores de risco, recorrendo à adoção de um estilo de vida saudável e a terapêutica farmacológica são o tratamento basilar de todos os doentes. São estas medidas que mais se relacionam com uma melhoria do prognóstico cardiovascular, com redução do risco de complicações e mesmo de morte.

Quando associada à diabetes mellitus, esta doença requer um diagnóstico mais precoce, daí a recomendação de rastreio e um acompanhamento mais regular, de forma também multidisciplinar, uma vez que se correlaciona com um menor número de complicações, nomeadamente a amputação. No grupo de doentes com risco de perda de membro ou claudicação que não melhora com as medidas instituídas, a cirurgia deve ser ponderada, sempre tendo em conta o risco-benefício, e, se indicada, instituída assim que possível.

Rita Soares Ferreira formou-se em Medicina pela Faculdade Medicina da Universidade de Lisboa e completou a sua formação em Angiologia e Cirurgia Vascular no Hospital de Santa Marta – ULS São José, onde mantém a atividade assistencial atualmente. Integra também a equipa de Angiologia e Cirurgia Vascular do Hospital CUF Tejo e da Clínica CUF Miraflores. É docente na NOVA Medical School.

Arterial é uma secção do Observador dedicada exclusivamente a temas relacionados com doenças cérebro-cardiovasculares. Resulta de uma parceria com a Novartis e tem a colaboração da Associação de Apoio aos Doentes com Insuficiência Cardíaca, da Fundação Portuguesa de Cardiologia, da Portugal AVC, da Sociedade Portuguesa do Acidente Vascular Cerebral, da Sociedade Portuguesa de Aterosclerose e da Sociedade Portuguesa de Cardiologia. É um conteúdo editorial completamente independente.

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