Noutro dia, perguntaram-me como se educa um adolescente para o sucesso. E eu fiquei embaraçado. “Ter sucesso é eleger um sonho e lutar por ele” — respondi. “Em que mundo é que anda?”, perguntou-me o pai. “Neste”, respondi. Mas, muitas vezes, tenho a sensação de que quem anda “na lua” talvez não seja eu.

Porque aquilo a que se vai chamando sucesso parece supor que não se tenha derrotas, nem dúvidas, nem vitórias “a safar”. E que se tenha, invariavelmente, boas notas, claro. Que se saiba (quase sempre) aquilo que se quer. Que se passe por todas as mudanças da adolescência sem sobressaltos. Que se seja quase indiferente aos diversos momentos maus duma família e aos solavancos que o mundo dá, dentro do corpo e fora da escola. Que se ponha, em primeiro lugar, os estudos e só depois o namoro. Que se seja sossegado e se tenha “bom comportamento”. Que as grandes causas sociais ou a política não passem de “distracções”. Que, mal se terminem os estudos, se comece a trabalhar. Que se seja “bom” naquilo que se faz. E que se ganhe muito dinheiro, de preferência, muito depressa. Mesmo que o sucesso resulte dum “casamento de conveniência” e não de um grande amor.

A nossa ideia de sucesso torna os adolescentes infelizes! Porque “robotiza” a adolescência. E transforma miúdos saudáveis, que entram na escola a perguntar “Porquê?”, em “produtos normalizados”. E faz com que, contra a sua vontade, se tornem, um ror de vezes, exemplos infelizes de “inteligência artificial”. A nossa ideia de sucesso é muito pouco amiga dum pensamento livre, interpelante e “escutador”. Porque não lhes dizemos que não se chega ao sucesso sem fazermos perguntas, sem nos pormos em causa, sem hesitações e sem contradições. Que as escolhas são sempre uma renúncia à omnipotência. E que o sucesso não se constrói à margem do desejo. Sem “um sonho” pelo qual se lute. E sem paixão!

Mais grave, ainda, é que esta ideia de sucesso (que vamos alimentando de forma preguiçosa) pressupõe que os nossos filhos escolham aos 14 ou 15 — sem que vacilem — uma “carreira de sucesso” que vigore pelos próximos 55 anos. E que, tendo os adolescentes o “azar” de terem notas muito altas, eles “só” tenham que optar entre os cursos de medicina, de engenharia bio-médica, de gestão, na Universidade Nova, ou engenharia aero-espacial, no Técnico.

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Mas será que os mesmos pais que esperam todo este “sucesso” dos seus filhos são, eles próprios, um exemplo de sucesso em todas as áreas das suas vidas? E não estarão a exigir-lhes aquilo que os próprios pais fazem — hoje, inclusive — com imensa dificuldade como, por exemplo, escolher? E será que lhes dizem que ter sucesso é escolher não uma ou duas ou três mas inúmeras vezes, ao longo da vida?

O que se passa, então, nesta ideia de “sucesso”? Não será que associamos — por vezes, perigosamente — o sucesso às boas notas (independentemente do “pó de arroz” que muitos lhes põem, da adolescência que se hipoteca para as ter e do facto de termos passado a conviver com naturalidade com as equipas de “explicadores” a trabalhar para os adolescentes), como se, em todos os momentos, fosse sempre assim. E como se ter-se vida, autonomia, afoiteza, garra, tolerância à frustração, um pensamento próprio e convicções não fossem componentes indispensáveis para que eles se construam de forma mais saudável?

A nossa ideia de sucesso torna os adolescentes infelizes! Porque transforma miúdos saudáveis em “crianças de estufa”. Porque presume que um adolescente de sucesso é um “tecnocrata de mochila” aos 15 e um “ídolo” antes dos 30. A nossa ideia de sucesso torna os adolescentes infelizes porque presume que quanto maior for a notoriedade e mais dinheiro se ganhe, muito depressa, mais poderoso se seja e mais sucesso se tenha.

É uma ideia solitária, gananciosa e vaidosa de sucesso; que não devíamos reclamar para os adolescentes. E de fórmulas do género: “O importante não é viver; é saber viver; muito próxima do modo como “os outros” se transformam em “utensílios descartáveis”. Como se, à escala duma escolha de sucesso, a “fórmula” fosse: “Escolhe uma namorada rica. E, depois, faz como se faz com a água tónica da Schweppes; aprende a gostar”. Ao contrário, se os adolescentes pegarem em tudo aquilo que os encante e interesse, se uma escolha for a síntese de tudo aquilo que tenha a ver com eles, se juntarem sonho e paixão, e fizerem escolhas muito mais baseadas nisso do que, unicamente, nas notas que tenham, tornam-se singulares e inimitáveis em tudo o que fazem. Destacam-se, claro; quase sem quererem. E serão pagos para “brincar”. Não seria mais fácil para os adolescentes se déssemos todos um saltinho “à Terra”?