A vida política começa a parecer tão pantanosa como noutros tempos difíceis porque já passou a nossa já menos jovem, mas ainda enxuta, democracia.
É assim natural que a análise política coincida num diagnóstico de fim de ciclo. Mesmo os que admitiam a sobrevivência de Costa a todas as trapalhadas, perante o episódio recente com Marcelo, parecem aceitar que Costa arrisca tudo porque já não se importa com nada.
Aceitando este “mais cedo ou mais tarde” em que capitulará a actual legislatura, do que falta falar é da sucessão de António Costa, não tanto à frente de um Governo para Portugal, mas pelo menos de uma nova liderança para o PS.
Curiosamente, até há bem pouco tempo. a sucessão no PS parecia ter que ocorrer de forma quase dinástica. Seria alguém que António Costa indicasse ou, pelo menos que o actual Primeiro Ministro não contrariasse. A sombra de Pedro Nuno Santos e dos seus ainda influentes apaniguados pareceu esfumar-se com o caso deplorável da TAP.
Mas a verdade é que o pouco edificante caminho do Governo, abriu a porta a algo que ainda há uns meses parecia impensável. O ressurgimento da ala mais cultural ou moderada do PS, aquela que esta provavelmente melhor colocada para disputar o espaço ao centro com um PSD engasgado numa liderança que parece pouco convincente.
Falamos em primeiro lugar de Sérgio Sousa Pinto. Um homem desassombrado, corajoso e com poucas papas na língua. Não terá o instinto nem os rins de António Costa, mas é claro e vertical e não deixa crescer erva daninha à sua volta. Tem uma paixão pela história notável, na convicção que também tem que o futuro se constrói melhor depois de uma boa leitura do passado. Afinal, é a mesma condição humana que é desafiada, em ciclos de ida e de regresso que ocorrem num contexto sempre em mudança. E isso dá a Sousa Pinto eloquência e perspectica e, talvez mais importante, uma noção de planeamento e um princípio de pensamento estratégico que têm estado arredios do PS na última década.
Depois, assistimos muito recentemente a um suave “approach” de António José Seguro. Um Guterrista que partilha com Pedro Passos Coelho uma circunstância e uma fatalidade: foram os dois, num tempo comum, presidentes da Juventude de cada um dos seus Partidos e, ganhando os dois a António Costa foram, com total perplexidade, preteridos do lugar a que se candidataram pelo mesmo António Costa. António José Seguro é um homem sereno, exímio na negociação e inspirador do equilíbrio. É, para além de tudo, um conhecedor profundo da história e do aparelho do partido. Das suas virtudes e das suas declinações. É um humanista cristão e isso afasta-o das tentações de novas gerigonças ou de temas fracturantes que servem apenas para manter a extrema esquerda ligada à máquina de oxigénio.
E, finalmente, temos Francisco Assis. Um intelectual com uma verve fácil e acutilante. Por vezes ficamos a achar que lhe falta alguma inteligência emocional, mas a verdade é que me parece que isso é apenas fruto de um sentido de humor peculiar. Conhecedor dos corredores de Bruxelas que domina com um à vontade relevante, foi recentemente Presidente do CES onde manteve contacto assíduo com Organizações Públicas e Privadas e treino abundante de “concertação social”. Não apaixona tanto como Sérgio Sousa Pinto, mas partilha com ele a mesma preocupação cultural, o mesmo apego à substância ou essência das coisas. Não tem o sentido de Estado de António José Seguro, mas disputa com ele o conhecimento do “terreno” nacional e internacional.
Poderíamos falar ainda da referida sucessão dinástica. Quem próximo de Costa poderia ser? Mas só de pensar nisso sentimos a epidérmica falta de paciência que o desgaste deste Governo suscita. Costa é um sobrevivente, mas provavelmente também o coveiro de quem dele se aproxima.
E pronto, ficam para já as pistas que os novos dados favorecem. Que podem não galvanizar, mas também não desassossegam. É que, em relação ao PS, parece que Já estamos com saudades do futuro!