Recordo quando pela primeira vez surgiu a AD inspirada no instinto carismático de Francisco Sá Carneiro que acreditou que depois de alguns anos de balburdia e confusão revolucionária era possível que o Pais deixasse de ficar refém de uma esquerda errática e de motivações opacas, quase sempre ligadas a uma ordem internacional pouco clara.

Foi talvez a primeira vez que, pelo seu próprio pé, a direita galvanizou os portugueses e lhes deu a esperança de um País com desígnios: livre, mas idóneo, progressivo, mas ciente da sua História e dos seus desígnios.

Francisco Sá Carneiro tinha essa mística rara e magnética que nos fazia acreditar nele. Talvez pronunciada com a precocidade e a brutalidade do seu desaparecimento. A verdade é que a presença de Sá Carneiro foi inspiradora e insubstituível na democracia portuguesa.

Passaram 45-50 anos. Nunca a direita tinha perdido o seu alinho. Uma espécie de pudor ou de compostura de que Cavaco Silva, Durão Barroso e Passos Coelho para citar só alguns, foram exemplos bem ilustrativos. A Direita nunca esteve habituada ao populismo, à promessa fácil, à cenografia, ao radicalismo, à exploração do medo, ao protesto fácil e inconsequente.

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E porque será? Porque era demasiado educada ou ciosa dos seus princípios?

Talvez, mas diria, olhando pelo retrovisor que nem sempre, ou nem com todos os seus protagonistas. A direita era integra, contida e confiável nos seus compromissos porque tinha claramente uma lógica de poder. Se prometesse o que não podia, sabia que o pagaria mais à frente.

As promessas da direita porque não tinham que ceder a romantismos ou a desvelos sociais exagerados mais próprios da esquerda, eram fiáveis ou, pelo menos, mais fiáveis. E por isso a direita era numa palavra só – confiável. Os ciclos económicos, ou de promissora expansão ou de rigorosa recuperação foram invariavelmente liderados pela Direita.

Até que 40 e tal anos depois apareceu o Chega. No início, o partido de um homem só. Tinha-se zangado com o PSD que não confiou nele para melhores desígnios e iniciou um tirocínio de grande tração na CMTV, como comentador de futebol. A truculência com que defendia o (meu) Benfica, aguçou-lhe o instinto e o engenho. Estava preparado para outros palcos. Mas tinham que ser daquele foro, daquela raiz – populista, direto, sanguíneo e radical.

Fora essa a dialética aprendida, era essa a inspiração que lhe vinha de outros movimentos que despontavam numa Europa muito zangada com as suas classes dirigentes. O brando e tolerante social democrata transfigurou-se no acutilante e radical homem de extrema direita. Era, para além da correspondência com o tirocínio populista, o espaço que sobrava na geografia político-partidária portuguesa.

Claro que rapidamente lhe deram palco e voz e com ela, surfou as dificuldades não só da direita, mas de um sistema partidário a precisar de outra frescura e quiçá de outros protagonistas.

Claro a lógica de poder não existia. Nunca existiu. E por isso as pessoas que ia angariando para as suas fileiras eram também desempregados ou despedidos da política ou da “para-politica”. Só que piores que Ventura. Menos cultos, menos esperto, mais marginais. E o partido foi vendo uma boa parte dos seus mandatos desaparecerem por questões de ética, desalinho ou falta de preparação.

Hoje o Chega é ainda mais isso. Ventura embalado pelas sondagens, deslumbrado por apoios que nunca imaginou ter, só consegue fazer o que sabe. Prometer mais, ameaçar mais, protestar mais.

Ninguém com dois dedos de testa pode embarcar nesta aventura que não tem ideologia, mas não tem principalmente competências, nem projecto. Está fora do poder porque é aí que sobrevive. Alimenta-se de uma marginalidade que nunca será confiável.

Julgo que num cenário social tão dificl para Portugal e para a Europa, cansados de pandemias e de guerras, a curar as feridas de um contexto económico desfavorável e com poucas soluções percetíveis, queremos tudo menos aventuras. Que até nos poderiam dar algum gozo – o protesto inebria e desopila, mas nunca nos poderão dar qualquer Futuro!