Adolfo Mesquita Nunes foi o estratega que há um ano deixou de herança um CDS com 1.9% de intenções de voto. Francisco Rodrigues dos Santos é o presidente que não conseguiu conduzir o partido a números mais altos. As coisas são como são: um dos principais responsáveis pelo declínio do CDS reclama agora a oportunidade para o salvar.

A semelhança com aquele clube de futebol que recorre à chicotada psicológica a meio da época é evidente. Como também é conhecido o desfecho habitual destes actos de desespero: o clube acaba o campeonato com um terceiro treinador, depois de o segundo ter revelado ser tão humano quanto o primeiro.

José Ribeiro e Castro costuma repetir uma ideia quando quer sublinhar a importância da Declaração de Princípios fundadora do partido: o CDS não é o partido de um líder, mas antes o partido de um conjunto de princípios e valores. Esta ideia deveria, por si só, moderar o entusiasmo nas apostas de salvação do CDS por um homem. Mas os princípios e valores são ainda o que aqui mais importa.

Nós no CDS conhecemos a medida exacta em que o pensamento político de Mesquita Nunes se aproxima e se afasta dos princípios e valores do partido. Este afastamento reapareceu no seu último artigo, quando culpa o CDS de “lidar mal com a contemporaneidade” – o artifício eufemístico a que habitualmente recorre para resumir as preocupações de natureza moral e cultural.

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Basta pensar no caso recente da família de Famalicão, que motivou a intervenção de pesos pesados da direita portuguesa a respeito da disciplina de educação para a cidadania. Uma preocupação que uniu Adriano Moreira, Ribeiro e Castro, Cavaco Silva e Passos Coelho não foi suficientemente persuasiva para unir todo o CDS.

Pergunto: Como é que uma causa de grande sensibilidade familiar e moral, que tem tudo a ver com a liberdade de educação, não é suficiente para unir o CDS? Como é que uma causa, que tem todos os ingredientes para unir liberais e conservadores no duplo combate contra o excesso de intervenção estatal, por um lado, e a desmoralização da sociedade, por outro, não é suficiente para unir o CDS?

Não há volta a dar: algo não está certo num partido em que até os mais devotos liberais enfiam o liberalismo na gaveta quando emergem à superfície preocupações morais e culturais que transcendem as meras preocupações económicas e jurídicas.

A generalidade dos portugueses reconhece os méritos pessoais e políticos de Mesquita Nunes. Mas os cinco deputados no Parlamento não são um acidente de percurso. Os 1.9% de intenções de voto em Janeiro de 2020 não são um acaso. Contemplar a possibilidade de o CDS ter o mesmo homem a protagonizar a estratégia que nos levou ao declínio e a presidência que nos levaria à salvação ilustra bem a farsa que na história se segue à tragédia.

Um pouco por todo o lado ouvimos dizer que a manutenção de Rodrigues dos Santos na liderança do CDS vai provocar a debandada dos liberais para a IL. Mas o inverso também seria verdadeiro: um CDS liderado por Mesquita Nunes agravaria a migração do voto conservador para o CH. Desta tenaz já não nos livramos, isso é certo.

Como também não nos livramos da exigência de abertura à totalidade da realidade que norteou o pensamento político dos nossos fundadores: o CDS não se pode dar ao luxo de decair no simplismo ideológico de uma IL, que diviniza o indivíduo e diaboliza o Estado, muito menos pode explorar a política de ressentimento de um CH, que desafia as regras mais elementares de dignidade e decência. É essa a nossa herança. É essa a nossa riqueza. É essa a nossa necessidade de originalidade e criatividade.

O último ano foi muito complicado: o estado de excepção tem reclamado medidas mais administrativas do que políticas, o nosso apoio a Marcelo Rebelo de Sousa deixou o palco político para outros actores e a novidade dos partidos emergentes à direita despertou todo o interesse da comunicação social. Tudo isto é verdade e justifica as dificuldades que a direcção de Rodrigues dos Santos vai tendo em projectar o CDS junto dos portugueses, mas não temos outro caminho que não passe por fazer mais e melhor.

Por entre a multiplicidade de respostas que vamos dando aos problemas do dia a dia, temos de conseguir cativar o nosso eleitorado potencial com mensagens políticas fortes, incisivas e claras: oposição à hegemonia do PS no Estado e na sociedade, respeito pela separação dos poderes institucionais, promoção do exercício das liberdades individuais sem descurar os deveres cívicos, preservação da estabilidade familiar, da autoridade e exigência nas escolas e da autonomia da sociedade civil.

Nuno Lobo é membro do Conselho Nacional do CDS