Contra quase todas as expectativas e para choque de muitos, o odiado e desprezado Donald Trump venceu as eleições presidenciais nos EUA. Mais: esse ódio e esse desprezo foram muito provavelmente fundamentais para abrir caminho à sua vitória. Mesmo incorrendo na deselegância de uma auto-citação, não resisto a recordar o que escrevi há poucos dias sobre o tema:
“Contra quase todas as expectativas iniciais, Donald Trump ganhou as primárias republicanas e tornou-se o mais heterodoxo candidato presidencial do GOP desde há muitos anos. Uma vez dado esse passo, as expectativas e previsões apontavam quase em uníssono para um passeio fácil de Hillary Clinton até um triunfo eleitoral expressivo e inequívoco. A poucos dias das eleições presidenciais nos EUA, e uma vez mais contra quase todas as expectativas iniciais, Trump parece ter pelo menos algumas hipóteses reais de ser o próximo Presidente dos EUA.”
Uma análise aprofundada da vitória de Trump envolverá certamente a articulação de muitos factores diferentes, mas entre eles figurará certamente com destaque a reacção de muitos eleitores contra o que identificaram como uma campanha concertada do establishment a favor de Hillary Clinton. Neste aspecto, nada do que Trump dissesse ou fizesse poderia ser tão mobilizador da base de apoio que o elegeu como a atitude sintetizada nas lamentáveis declarações de Hillary sobre o “basket of deplorables” que apoiaria Trump.
Não terá sido por acaso que Trump conseguiu alguns dos maiores avanços face aos resultados de Romney em 2012 precisamente no Rust Belt e em particular junto de segmentos tradicionais do eleitorado do Partido Democrata. O primeiro passo para compreender e lidar adequadamente com as consequências da eleição de Trump será, pois, não repetir os erros, enviesamento e arrogância com que a sua candidatura e campanha foram analisadas.
André Azevedo Alves é professor do Instituto de Estudos Políticos da Universidade Católica Portuguesa