Já o disse e escrevi muitas vezes. A gestão dos serviços públicos por privados não garante, por si só, que esses serviços sejam melhores. A grande reforma não pode ser a atribuição de serviços públicos à gestão privada. Nem isso pode constituir o cerne de um programa de governo. A reforma do sistema de saúde português precisa de muito mais. Mais do que tudo, precisa de investimento, muito investimento, e de uma grande revolução nas mentalidades dos governantes, dos prestadores e dos cidadãos.

Lamentavelmente, o pensamento concreto de alguma direita nacional ainda se atém à ideia de que privado é melhor do que público. A esquerda, em contraponto, glorifica a prestação exclusivamente pública para a garantia do direito da proteção à saúde.

Nem uma coisa, nem outra. Há mau, medíocre, sofrível, suficiente, bom e excelente em todos os setores de prestação de cuidados de saúde em Portugal. Tal como há de tudo nas diversas soluções possíveis para o problema da sustentabilidade sistémica da saúde dos Portugueses. Nenhuma, isoladamente, tem sucesso garantido.

A iniciativa privada e a liberdade de escolha não são a principal fonte da melhoria da qualidade e da garantia de acesso universal. Não são. Nem a única, nem a principal.  No entanto, precisamos de PPP e de mais PPP.

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Os hospitais que foram construídos sob a égide de um programa de parceria público-privada, não existiriam se essa parceria não tivesse existido. Nem nunca mais teremos, acreditem, hospitais de jeito se essas parcerias não voltarem a ser feitas. O Estado não tem dinheiro. O País não tem dinheiro e necessitará de investimento internacional.

Anunciar antecipadamente o fim da PPP do Hospital de Vila Franca é mais do que falta de senso. É estupidez. Desmotiva quem lá trabalha, desmotiva a entidade gestora e cria a ideia de perseguição ao Grupo Melo, os que também geriam o Hospital de Braga e que foi agora trazido para a esfera exclusiva da gestão pública. No caso de Vila Franca, por exemplo, convirá não esquecer a forma exemplar como essa PPP respondeu à procura durante o surto de legionella naquele município.

Mais, acabar com a possibilidade de renovações de contratos desincentiva quaisquer futuros investimentos em PPP que venham a ser necessárias e incentiva a que os privados apenas se concentrem na exploração de instalações próprias e para os clientes que possam pagar os serviços lá prestados.

Os hospitais PPP podem nem ser os melhores. Seguramente não são. Um dia, se o tempo e a paciência não me faltarem, explicarei porque desconfio da sacralização dos rankings e dos ratings. No entanto, os hospitais em regime PPP foram os mais escrutinados em toda a história dos hospitais portugueses. Foram os que mais pagaram ao Estado, basta só fazer contas às multas, e os que menos receberam em função do serviço prestado. Os hospitais PPP, graças a quem investiu neles, serviram populações, ensinaram alunos universitários, formaram profissionais e, no fim, deixam-nos o património edificado e os ganhos em saúde. Os hospitais PPP foram baratos. Foram, já o escrevi muitas vezes, um dos contributos mais importantes de anteriores governos do PS.

São os únicos hospitais do SNS onde se pagam incentivos e há contratos diferenciados em função do risco clínico, do grau de responsabilidade e da qualidade dos funcionários. Revertidos para a esfera pública, continuarão a pagar e a retribuir da mesma forma? Os funcionários do SNS, são muitos, que estão destacados nas PPP vão voltar aos hospitais de origem? Não será fácil contratar novos médicos especialistas, com o mesmo grau de experiência e diferenciação. Bem, os privados, incluindo os que gerem as PPP, ainda terão capacidade de contratar uns quantos. Quem perde? O SNS.

Agora, por dictat ideológico, e eu nem tenho nada contra as ideias que me pareçam ser boas, querem acabar com as PPP na saúde. Basta ler os jornais ou ver a TV, para assistir a uma campanha contra tudo o que mexe na esfera PPP. É preciso “fazer a cabeça” dos eleitores. Estão a enganá-los.

Há casos de má prática? Seguramente. Nada é perfeito na prestação de cuidados de saúde. Mas seria bom comparar a frequência de casos em todo o sistema, incluindo o SNS, ver a sua dimensão, rever as consequências e analisar as causas profundas, incluindo as estruturais. Não estou nada certo de que o SNS ganhasse na comparação.

Ao menos, devemos exigir isso, apresentem-nos as contas que determinaram a falta de interesse em lançar novo concurso para as PPP de Braga e Vila Franca. Não chega que nos digam que foi assim, porque sim.

PS- Desde já declaro que sou casado com uma médica, funcionária pública, que trabalha em regime de destacamento numa PPP. Logo, não precisou da PPP para ter emprego. Não foi, nem será por isso que mudarei de mulher ou de pensamento em política de saúde.