Vale a pena voltar a lembrar que, sempre que foi bem gerida, a TAP nunca precisou da ajuda do Estado, tal como sucedeu ininterruptamente entre 1995 e 2021, porque o seu negócio assenta na extraordinária localização de Lisboa no centro do Atlântico e na herança cultural da História que construímos a partir dessa localização.

E que os famigerados prejuízos, de menos de mil milhões de euros, da holding e não da companhia aérea, que serviram de pretexto para as injustas alegações que se fizeram para justificar o tipo de ajuda de Estado concedida em 2021, tinham sido principalmente acumulados pela carioca VEM, que fora a maior empresa de manutenção aeronáutica da América Latina, comprada por um preço baixíssimo em 2005 à VARIG, numa espécie de compensação por a TAP dela ter herdado em 2000 o excelente CEO Fernando Pinto e as primeiras rotas para a Europa.

Tenhamos presente que, entre 2015 e 2019, imediatamente antes da pandemia, sem quaisquer ajudas do Estado, a companhia aérea TAP tinha conseguido renovar metade da sua frota por forma a poder adicionar 40 voos semanais para os EUA aos voos para o Brasil e para África, que já eram 70 por semana cada.

E que em 2022, imediatamente após a pandemia, o número de voos semanais entre o Brasil e Portugal cresceu para mais de 80 e dois anos depois, em 2024, para mais de 90, o que consolidou a posição de liderança pela TAP dos voos entre a Europa e o Brasil, que ocupa há mais de uma década.

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Ou seja, graças à boa gestão acumulada neste século, de Fernando Pinto, de Antonoaldo Alves e, desde abril de 2023, de Luís Rodrigues, a TAP ultrapassará este ano os 2 milhões de passageiros transportados entre o Brasil e a Europa, 33 por cento do mercado, não sendo portanto de espantar que suscite tanto interesse por parte das companhias europeias que concorrem diretamente com ela.

Agora que, e muito bem, o governo da AD tomou finalmente a decisão de devolver a Lisboa os 650 hectares da Portela e construir um novo aeroporto nacional nos 7,5 mil hectares do Campo de Tiro em boa hora mandado instalar em Alcochete por Dom Carlos, um ano antes do seu bárbaro assassínio, a TAP pode encarar o futuro com ainda maior confiança.

Com efeito, o binómio constituído por uma saudável companhia de bandeira e um grande entreposto aéreo, implantado onde possa crescer até às cinco pistas e aos 100 milhões de passageiros, a dimensão atual do aeroporto de Atlanta, dois pulmões dum serviço público crucial para a nossa autonomia estratégica, é indispensável à conversão da ímpar posição geográfica de Portugal no alicerce principal das nossas ligações ao hemisfério americano e ao continente africano.

Seria no entanto avisado que, ao abrir de novo o capital da TAP a accionistas privados, não se caísse no erro que constituiu a venda em 2012 da totalidade do capital da concessionária de todos os aeroportos portugueses, cuja elevada rentabilidade estrutural a habilita a construir o novo aeroporto nacional sem qualquer custo para o contribuinte fiscal mas que, em consequência do modelo de privatização, passou a estar exclusivamente ao serviço dos interesses de um único acionista, que tanto podem coincidir com o interesse público como não – vide a sua insistência durante anos a fio em que o novo aeroporto nacional fosse localizado nos exíguos mil hectares da base aérea do Montijo e não em Alcochete.

Não há de facto razão atendível para que o caminho seguido para preservar a nossa autonomia estratégica no sector bancário, através da manutenção do maior banco nas mãos do Estado enquanto não houver accionistas portugueses com músculo para, em parte ou no todo, o substituírem, não seja aplicável a um sector tão crucial como o das nossas relações aéreas diretas com o além-mar lusófono e com a nossa diáspora.

A declarada disponibilidade de um português, com provas dadas na economia mundial, para contribuir para que a maioria do capital da TAP permaneça em mãos nacionais, privadas e ou públicas, e para criar condições para que o subsídio de 3,2 mil milhões de euros que a empresa recebeu seja restituído, é portanto muito oportuna e devia ser acolhida de braços abertos.

Tanto mais que, como consequência do processo de reestruturação a que foi injustamente submetida, que a Comissão Europeia não impôs a nenhuma outra companhia aérea subsidiada durante a pandemia, a TAP teve que abrir mão de quase 7 mil slots por ano a favor de companhias aéreas low cost.

A ambição de Carlos Tavares devia aliás ser que, depois de saldada a dívida para com o Estado, a TAP emparceirasse com companhias aéreas sediadas nos outros membros da CPLP, e ou nos países limítrofes de cada um deles, reforçando assim a nossa autonomia estratégica nas ligações com estados com abundantes recursos donde felizmente provem uma parte crescente do talento, da competência e da iniciativa que a nossa economia requer, onde temos raízes insubstituíveis e para onde os portugueses inevitavelmente continuarão sempre a sentir-se atraídos.

Ao contrário do que a ideologia ainda prevalecente nos quer continuar a fazer crer, a nacionalidade dos acionistas, sobretudo no caso de empresas que produzem bens ou serviços públicos com impacto relevante na autonomia estratégica nacional, não é indiferente, porque a prosperidade, assim como a democracia, não existe em abstrato mas no seio de uma comunidade nacional, e portanto é incontornavelmente interdependente do respetivo Estado-nação.