A acusação mais comum feita ao CHEGA! por aqueles que não tencionam ilegalizá-lo (pois esses fazem outro tipo de acusações e, geralmente, de menor honestidade intelectual) é a de que é um partido demagogo, um partido populista.

Por tal afirmação não poder ser consubstanciada apenas pelo próprio nome do partido CHEGA! – registado com maiúsculas e o respetivo ponto de exclamação -, mas este servir como um evidente reforço dessa tese, aproveito o discurso de André Ventura na mais recente “convenção das direitas” para explanar um pouco mais claramente no que consiste essa demagogia.

A demagogia é uma ferramenta dos populistas que encontra a sua completa concretização na mobilização das massas.

Ora, as massas, acéfalas por se comportarem como uma manada ignorando a sua condição de indivíduos, evidentemente, não poderão ser mobilizadas pela Razão, mas apenas e somente pela Emoção.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

Comportando-se como demagogos, aqueles que querem tirar a esquerda do poder estão, somente, a utilizar o instrumento que lá a mantém, praticamente, desde o 25 de Abril – essa mesma Emoção.

Mas vamos a uns exemplos práticos de demagogia.

O clássico “click-bait

André Ventura não resiste aos seus propósitos eleitoralistas – entenda-se que a mais leve estagnação ou mínimo abrandamento da sua ascensão meteórica poderá levar à revolta dos seus militantes impacientes contra a sua própria pessoa.

Nesse sentido, não pôde deixar de afirmar que, à esquerda, tem de se dar “pancada política”.

Intenção dele: para o “seu” lado passar-se-á a mensagem que a esquerda tem de levar “pancada” e para o “outro” lado argumentará que a “pancada” é no campo da “política”. Sim, o raciocínio de André Ventura mede-se por lados – a polarização é um dos seus propósitos.

Este é o tipo de polémica e de ambiente em que tem prosperado e, já dizia o outro: “Em equipa vencedora, não se mexe!” Dando-lhe a importância que o caso merece, prossigo…

As causas

No discurso de André Ventura ficou claro, para os mais distraídos, que “mais nenhum partido é capaz de fazer frente à esquerda”.

Aliás, nem sequer sendo nas entrelinhas, mas esparramado em todo o discurso, ficou por demais evidente que mais nenhum partido se opôs ao método de nomeação do Procurador-Geral Europeu, nenhuma força política recusa veementemente a privatização da TAP ou ninguém acha que a carga fiscal é excessiva.

Mais ninguém, apenas ele, isolado, tal paladino (para não cair no cliché de Salvador da Pátria, com outras conotações) luta por estas causas!

Claro que não importa a veracidade deste tipo de afirmações, manifestamente falsas (bastará sair um pouco da “bolha” do CHEGA! e perscrutar a atividade dos outros partidos), pois, com este Governo, a existência de escrutínio – que tem havido! – combinada com a falta de prestação de contas/accountability irá sempre deixar a populaça de sobremaneira frustrada e, portanto, pronta, e ávida, ao acolher deste tipo de pregações.

A progressividade fiscal

André Ventura, nos primeiros cinco minutos de discurso, criticou aquela “direita afastada do povo” que discute a progressividade ou proporcionalidade fiscal, alegando que poucos – “0,03% dos portugueses”, para ser concreto –  se interessam por estes temas e que, logo, tornava-se impreterível falar do que o povo quer que se fale, de discutir o que o povo quer que se discuta.

Espante-se o leitor se lhe relatar que André Ventura acabou o discurso, depois de ter dito que Portugal já era mais pobre do que a Bielorrússia (gaffe em que pretendia sugerir que já éramos mais pobres do que a Roménia, gaffe sem importância, muito menos para os seus seguidores), a falar precisamente da progressividade fiscal e que, por esta ser exagerada, cerceava o desenvolvimento económico e impedia a progressão dos profissionais por via do seu mérito!

Adicionalmente, depois de dizer que era um tema que não merecia tempo de antena, dez minutos depois de ter falado sobre o mesmo, colocou a cereja no topo do bolo, acusando o PSD de não querer mudar este status quo com recurso a acordos parlamentares.

Ora, ficou por explicar quem, para além do CHEGA!, IL, CDS-PP e PSD, iria contribuir para uma aprovação da redução do número de escalões de IRS… serei eu que estou pouco informado sobre o arranjo parlamentar que temos de momento, com toda a certeza.

Identicamente, ficou por explicar que o aumento da progressividade fiscal foi mesmo uma das reversões deste Governo, ou seja, este tipo de medidas já tinha sido aprovada, em tempo devido e quando tinha mandato para isso, pelo próprio PSD.

O que mais surpreende, porém, nem será tanto o André Ventura, mas sim os maiores representantes da sua eficácia, isto é, os militantes do CHEGA!

Importa realçar, em nome do civismo, que a sua presença não tinha como não ser notada tal era a sua crença de que se encontravam num comício partidário e não num fórum de troca de ideias e debate civilizado. O espalhafato, as palmas e o circo político foram uma constante.

Convivendo e dialogando com alguns, como em qualquer democracia saudável, notei que saíram quase em êxtase após este discurso com várias falhas, desde as formais às de conteúdo, e pouco incomodados pareceram quando confrontados com todos estes aspetos, apelando ao pragmatismo eleitoralista e à necessidade de retirar a esquerda do poder.

Contudo, pessoalmente, prefiro seguir Poiares Maduro que, na mesma convenção, defendeu que “muitos entendem que a mera apresentação de uma alternativa não-socialista se sobrepõe à qualidade da mesma, mas esse não é o meu caso”.

Também não é o meu. Uma alternativa tem de ser coerente, tem de ser sustentada, tem de ser saudável e tem de ser radicalmente moderada.

A arrogância, a superioridade moral, a auto-apreciação como únicos arautos da vontade do povo, bem como donos da Razão e da Verdade, seriam características que, até há uns meses, apenas ousaria atribuir às forças políticas portuguesas de extrema-esquerda… temo que agora tenham uma nova companhia.

Portanto, CHEGA!, digo-vos: sim, CHEGA!… de demagogia. Vamos ao trabalho!