O amor põe à sua guarda as nossas fraquezas. E é um tudo-nada Deus, de certa forma, no jeito com que nos convida a despirmo-nos, por completo, e a pormos sob a sua protecção medos, fraquezas e receios. Vergonhas, traumas e rancores. Mais os bocadinhos menos recomendáveis da nossa história. Os nossos lados menos “saudáveis”. E as pessoas cuja existência, em certos períodos, são, até para nós, um mistério difícil de compreender. Ao merecermos o colo e o mimo que ele nos dá, o amor faz com que as partes mais secretas e mais “feias” de nós, quando as partilhamos sem obstáculos e são aceites, acabem por se tornar naquilo que mais nos liga a quem o amor nos dá. Feitas as contas, talvez o amor nos arrebate com a verdade.

Habitualmente, chamamos amor a uma ideia. A um rasgo de intuição cujo caminho acabamos por desconhecer. Sem que, com isso, deixemos de acreditar nele. Ou de ir por diante, à sua procura. Depois, chamamos amor à sensualidade. Que nos leva, de ida e volta, infatigavelmente, dos sentidos até aos sentimentos. A seguir, a uma excentricidade. Quando ele se fica pela ideia com que começou. O que só é possível quando desistimos de nos confiar. E o medo ocupa grande parte do espaço que, dantes, a intuição atraía.

O que não deixa de ser desconcertante é que se sinta que muitas, muitas pessoas pareçam ser um bocadinho cínicas em relação ao amor. E a vivê-lo como se ele estivesse fora de moda. Fosse, quando muito, uma ilusão. Obstinada e persistente.

Hoje, fala-se mais dos perigos do amor. Como a co-dependência. Como se precisarmos de alguém e não admitirmos a nossa vida sem essa pessoa ao pé de nós fosse duma toxicidade doentia.

Ora, é curiosa a forma como se mente com meias-verdades. Uma dependência doentia acontece quando duas pessoas exigem, como prova de vida daquilo que confabulam como amor, uma dedicação exclusiva. O abandono de todas as relações que concorram com “ele”. Uma bolha. Um fingimento. Mas contar com alguém e ficar preso a essa pessoa são o contrário uma coisa da outra. Ficar preso é tudo o que o amor não é. Contar com alguém o passo em frente em direção à liberdade. Aquilo que nos guarda. Com intuição e com verdade.

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