De acordo com os resultados preliminares do Censos 2021, Portugal perdeu mais de 214 mil residentes relativamente a 2011. Esta redução dever-se-á à baixa natalidade e também à emigração que continua em níveis equiparáveis às da década de 60, quando muitos jovens fugiam da guerra do Ultramar. Na semana passa escrevi sobre estes dados numa perspectiva económica, mas o certo é que o fenómeno também é interessante se pensarmos no país que os nossos filhos e netos poderão conhecer.

Os dados ainda precisam de ser trabalhados, mas é bastante provável que a maioria dos que emigram sejam portugueses de origem, nascidos e criados por cá. O que está a suceder pode ter resultados interessantes na forma como encaramos Portugal. Muitos dos que se vão embora são portugueses que procuram empregos no estrangeiro e, com o passar dos anos, podem não regressar ou, se o fizerem, o mais certo é que os seus filhos e netos não os acompanhem por não sentirem a mesma ligação a Portugal que têm com o país onde nasceram e vivem. No fundo, assistiremos a um fenómeno semelhante ao presenciado nas décadas de 60 e 70, mas com um pormenor que não deve ser negligenciado.

É que ao mesmo tempo que estes portugueses saem do país, o número de estrangeiros que adquire a nacionalidade portuguesa atinge níveis máximos. Só no ano passado foram 150 mil as pessoas que se tornaram portugueses. A maioria serão brasileiros e israelitas descendentes de judeus sefarditas portugueses. O que está a suceder pode ter resultados interessantes naquilo que entendemos por Portugal porque no futuro teremos cada vez mais portugueses de origem a viver fora de Portugal e um número crescente de portugueses que obtiveram posteriormente a nacionalidade e que, possivelmente, nem habitam no nosso país.

Ou seja, a alteração demográfica pode não se limitar a uma redução da população nem as suas consequências se reduzirão ao impacto que isso terá na sustentabilidade do Estado Social. Se as alterações que assistimos nos últimos dez anos continuarem, Portugal será um país menos homogéneo (o que até pode ser positivo pela diversidade cultural que traz) como ainda mais desequilibrado (o que já pode ser mais preocupante).

Um país desequilibrado não somente entre o litoral excessivamente povoado e um interior sem gente, mas entre uma população que se sente portuguesa mas que vive fora e outra que tem pouca ligação a Portugal mas que é parte integrante do país. Não querendo fazer qualquer juízo de valor, chamo simplesmente a atenção que o que entendemos hoje em dia como sendo Portugal se pode alterar profundamente nos próximos 50 anos. Talvez os Portugueses no final deste século serão bastante diferentes do que somos hoje e do que fomos no passado. Física ou culturalmente distantes, alguns viverão alheados do que se passa neste canto da Europa com a particularidade dessa distância poder ditar uma indiferença a que não estamos habituados.

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