A aposta nacional na ferrovia faz sentido. As vantagens ambientais, económicas e sociais são de tal modo evidentes que parece senão atávico como, num país da nossa dimensão continental, em pleno século XXI, não conseguimos ainda conectar por comboio regular as principais cidades ou os nossos portos internacionais com o centro europeu.

O investimento ferroviário em novos troços e comboios preconizado na visão estratégica de Costa Silva e no PRR pode revolucionar o posicionamento económico de várias regiões, com novos fluxos de pessoas, bens e serviços, reequilibrando oportunidades e assimetrias que Portugal foi cavando na macrocefalia de Lisboa.

Neste contexto, a desvalorização da ferrovia por Coimbra é um clamoroso erro estratégico. Arrancar carris nas ligações regionais – feito em 2011 na relação com a Lousã e Miranda do Corvo – e arrancar de novo carris em 2021, que servem as ligações suburbanas e regionais entre as estações de Coimbra-A e Coimbra-B, é um desperdício de dinheiros públicos e um progressismo serôdio que centra a mobilidade no tráfego automóvel e contribui para o isolamento económico e social de Coimbra.

Em completo contra-ciclo, Coimbra arranca carris no Ano Europeu da Ferrovia 2021 e encerra a Estação Nova de Coimbra (Coimbra-A) onde passam, segundo dados oficiais da CP, 113 mil passageiros por mês!

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Em alternativa, propomos um alinhamento estratégico regional e nacional que recoloque Coimbra no mapa ferroviário português:

  1. Concretização da nova Estação Central de Coimbra, conforme o plano de Joan Busquets, cerca de 600 metros a norte de Coimbra-B, permitindo o acesso à ferrovia de alta velocidade e a deslocação em tempo inferior a 60 minutos para o aeroporto do Porto;
  2. Requalificação da Estação Nova de Coimbra (Coimbra-A), apostando no aumento das ligações sub-urbanas e regionais directas por comboio e na interface intermodal com SMTUC;
  3. Novos comboios rápidos entre Coimbra e Figueira da Foz, com duração inferior a 30 minutos;
  4. Reordenamento das soluções técnicas e plataforma logísticas na relação com o porto da Figueira da Foz e com as linhas do Norte, Oeste e da Beira Alta;
  5. Passe integrado urbano e sub-urbano entre CP, SMTUC, Transdev e outros operadores privados de transporte regional.

Em relação ao projecto do Sistema de Mobilidade do Mondego, propomos a recolocação do Metro ligeiro de superfície por carris no trajecto urbano de Coimbra, abandonando a recente opção por autocarros (BRT). Além disso, defendemos a solução inovadora de desnivelamento por afundamento simples (cut-and-cover) do trajecto entre Coimbra-B e Coimbra-A, numa distância de 1,5 quilómetros, que permite o redesenho urbano da frente de rio e a manutenção da função social e económica da Estação Nova na Baixa de Coimbra.

Trata-se de uma visão em completa divergência com a gestão municipal actual. Encerrar a Estação Nova de Coimbra (Coimbra-A) e manter Coimbra-B como apeadeiro nacional são opções erradas e escondidas dos cidadãos, apresentadas como factos consumados. O enorme aumento de autocarros previstos será um encargo financeiro substancial e um retrocesso no trânsito e na mobilidade suave local. Mais grave: a demissão da Câmara de Coimbra em relação à ferrovia de alta velocidade teve como consequência a omissão dessa prioridade de todos os documentos estratégicos nacionais e regionais 2030. O descarrilamento é óbvio.

Coimbra arrisca perder mais um comboio do desenvolvimento sustentável. A promessa eleitoral ridícula de um novo aeroporto em Coimbra consumiu a credibilidade no diálogo nacional sobre mobilidade. A ausência de sensibilidade para a promoção económica, para os desafios ambientais e para a inovação urbana fez o resto: uma política local sem visão integrada de futuro, com claro prejuízo para a fixação empresarial e de jovens e para a qualidade de vida global que podemos projectar nesta cidade.

Uma rede excelente de transportes urbanos, sub-urbanos, regionais e nacionais é absolutamente essencial para o relançamento económico e social de Coimbra e da região que deve liderar. As oportunidades de desenho urbano qualificado do espaço público e das variáveis de requalificação urbana e mobilidade exigem a convocação da capacidade crítica, técnica e universitária, numa escala europeia de planeamento urbano, que construa as boas práticas ambientais e sociais ao serviço das pessoas e da nossa casa comum.

Entre as duas visões opostas, a decisão última é dos cidadãos de Coimbra: juntos podemos embarcar no comboio do futuro. Mas temos que mudar de agulha!