“Não vamos ter no Governo políticos racistas, nem oportunistas, nem populistas” – declarou Luís Montenegro a Maria João Avillez que o entrevistava para a CNN. Daqui concluiu a Pátria escrita e falada que Luís Montenegro estava a dizer não a uma geringonça com o Chega. Convenhamos que a ou a Pátria é ingénua ou Luís Montenegro é parvo. Que as duas coisas aconteçam em simultâneo também não é de excluir, porque em Portugal os azares costumam andar aos pares.
Comecemos pela ingenuidade da Pátria: “Não vamos ter no Governo políticos racistas, nem oportunistas, nem populistas” – diz Montenegro. Mas isto quer dizer exactamente o quê? Que Luís Montenegro está a excluir pessoas que tanto podem ser do Chega como doutros partidos? Como todos sabemos existem políticos racistas, oportunistas, e populistas no Chega e em todos os outros partidos, logo afirmar que “Não vamos ter no Governo políticos racistas, nem oportunistas, nem populistas” é uma espécie de redondo vocábulo e nada mais.
Já se Luís Montenegro quis com isto dizer que não fará acordos pós-eleitorais com o Chega está a ser parvo porque não é aritmeticamente possível à direita governar sem os votos do Chega; porque, ao contrário do que gostaríamos que fosse verdade, o eleitorado de Ventura não o penaliza caso ele não viabilize um governo minoritário PSD; porque um acordo pós-eleitoral é a melhor forma de tirar o Chega do local onde ele cresce: a oposição pela oposição e, por fim mas não por último, se Luís Montenegro procura libertar-se da ratoeira da questão Chega com estas declarações bem pode preparar-se para o embate porque o PS não vai deitar fora a sua táctica de maior sucesso.
Neste momento, em que tudo aquilo que depende do Governo parece desmoronar-se, a aposta na insuflação do Chega e a colocação do Chega no centro da discussão política tornou-se a táctica infalível do PS. Mesmo que para tal se entre no terreno do absurdo, como aconteceu esta semana, quando na Assembleia da República, numa sessão igual a centenas de outras, Edite Estrela, que presidia aos trabalhos, interrompeu o deputado Pedro Frazão, do Chega, que perorava sobre a agricultura, ou mais precisamente sobre o que aquele deputado diz ser o desinteresse da esquerda pelos agricultores. A intervenção seguia sem nada de relevante até que Pedro Frazão proferiu o nome de Lula da Silva. Nesse momento Edite Estrela interrompe-o. O deputado protesta. Num ápice Edite Estrela passou da citação enfatuada d’O Mostrengo de Pessoa “Aqui (…) sou mais do que eu” com que tentava calar Pedro Frazão para o pé de chinelo do “Esteja caladinha” dirigido à deputada Rita Matias.
Basta ver duas horas do canal parlamento para perceber que nada justificava a interrupção por parte de Edite Estrela da intervenção do deputado Pedro Frazão (muito menos a forma como se dirigiu à deputada Rita Matias). Intervenções similares são produzidas com as devidas adaptações ideológicas todas as sessões por todas as bancadas, Mas este momento aparentemente absurdo torna-se num facto lógico se o virmos como parte de uma táctica particularmente bem sucedida do PS: fazer crescer o Chega. A repetição de incidentes desta natureza é mais que certa. (Para já a 25 de Abril e com o alto patrocínio do Presidente da República, a vinda de Lula da Silva ao parlamento será o pretexto para mais um destes momentos.)
Não é o PSD que tem de se demarcar do Chega. É o PS que tem de deixar de fazer do Chega o eixo da vida política portuguesa. Mas não o fará. Nos filmes os cobardes escondem-se atrás de quem podem para se proteger. Na política há quem se esconda atrás dos radicais para conseguir passar por corajoso e, mais perversamente ainda, por imprescindível ponto de equilíbrio.
Infelizmente para nós é isto que estão a fazer aqueles a quem o voto dos portugueses colocou em Belém e em São Bento.
Ps. Não sei se Boaventura Sousa Santos é culpado de assédio. Espero sinceramente que a justiça burguesa que tanto criticou lhe valha para dar a sua versão dos factos. Sobre o Centro de Estudos Sociais é que não tenho dúvidas: trata-se de um caso de assédio à inteligência e ao dinheiro dos contribuintes. Uma espécie de máquina falante do patois do politicamente correcto em que não se consegue identificar nada de cientificamente relevante.